O que o Brexit realmente significa?

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CAPITAL & ECONOMICS
O que o Brexit realmente significa?
VISÃO GERAL
A turbulência no mercado financeiro e a incerteza global aumentaram bruscamente nas horas que se
seguiram ao referendo do Reino Unido, no dia 23 de junho, sobre sua adesão à União Europeia. As
ações despencaram, enquanto os operadores tentavam entender as implicações para os negócios e a
economia global. Com votação de 51,9% a favor de deixar a união contra 48,1% para ficar, a libra caiu
ao seu ponto mais baixo em quase trinta anos.
A renúncia do Primeiro Ministro Britânico, e dois anos de negociações sobre as condições da saída do
RU, indicam que este período de incerteza provavelmente se prolongará. Embora existam várias opções
para o futuro do RU, é improvável que haja muita clareza sobre as condições da negociação durante
algumas semanas, enquanto o partido conservador que se encontra no poder no RU procura um novo
líder para assumir o cargo de Primeiro Ministro, e outros estados-membros da União Europeia decidem
quais os próximos passos que desejam dar.
Estes são tempos complexos e de volatilidade, com muitos fatores em rápida evolução a serem
considerados. Quanto a empresas com cadeias de abastecimento, mercados ou operações no RU ou no
âmbito mais amplo da UE, existe a probabilidade de ocorrer, pelo menos, alguma perturbação.
Acompanhar as implicações prováveis e as mais especulativas, e planejar nessa conformidade, tudo isso
exigirá muita atenção e agilidade.
Reunimos algumas das reações iniciais e análises de todas as partes do mundo. Na situação atual, a
única coisa que está clara sobre o que acontecerá em seguida, é que muito pouco está claro, e que o
anseio de clareza será lentamente atendido ao longo de vários meses, ou até anos.
DETALHAMENTO
O Impacto sobre a Economia Global
A UE é o maior mercado do mundo, com 500 milhões de consumidores, e um PIB combinado nominal
de $18,5 trilhões. Quaisquer alterações nas futuras relações comerciais ou políticas do RU ou da UE
poderão ter implicações significativas para a economia mundial num momento em que o seu potencial
de crescimento já é incerto na esteira da crise financeira e da desaceleração chinesa.
“Não é provável que a incerteza que envolve este evento desapareça rapidamente. Apesar de o choque
para o RU ou globalmente não ser das proporções daquele provocado pelo Lehman, e não ser
suscetível de provocar uma recessão global é mesmo assim um evento bastante negativo. Incertezas
importantes envolvem o impacto na economia Europeia – onde além da probabilidade de, pelo menos,
um breve período de recessão no RU, é possível que ocorra uma queda no crescimento econômico da
Europa como um todo. Qualquer revés na economia europeia implica maior enfraquecimento do
crescimento global, que será refletido nos EUA e em outros países através tanto de canais comerciais
como de canais do mercado financeiro (e.g., o fortalecimento do dólar dos Estados Unidos).” – Tapan
Datta, Sócio, Responsável Global pela Alocação de Ativos, Aon Hewitt.
“Em resposta ao referendo britânico para sair da União Europeia, os mercados de ações dos Estados
Unidos registraram um movimento maior que o resultante de qualquer eleição presidencial nos últimos
60 anos… a sabedoria convencional parece indicar que a saída da Grã-Bretanha da União Europeia
resultará em perturbação econômica que ecoará através do Atlântico.” – The New York Times, 24 de
junho, 2016
“No momento, não podemos confiar muito em quaisquer previsões pontuais. Os sinais do efeito
produzido na economia pelo referendo de hoje são claramente negativos, dada a incerteza econômica.
Contudo, o tamanho da incerteza é menos claro. ” – Declaração do Bank of America Merrill Lynch, 26 de
junho, 2016
“Apesar de as exportações brasileiras para o RU responderam por apenas 1,5 por cento do total dos
negócios comerciais das nações Sul Americanas, o impacto do Brexit no sentimento é visto como tendo
colocado os países de mercados emergentes com grandes déficits de conta corrente numa posição mais
vulnerável. Uma fuga volumosa para a segurança poderia acabar por colocar ainda mais pressão sobre
as moedas de alto rendimento.” – Bloomberg, 24 de junho, 2016
“Para a economia global, poderá haver uma redução cumulativa de ~0.5 p.p. em relação à nossa base
de referência, entre a presente data e o final de 2017. Tal enfraquecimento do contexto global
provavelmente teria peso sobre a opinião da Reserva Federal. Os nossos economistas nos Estados
Unidos já não esperam que a Reserva Federal aumente as taxas este ano.” – Estrategista Chefe de Ativos
Cruzados, Morgan Stanley
O Impacto sobre o Reino Unido
O Primeiro Ministro do RU renunciou, e o principal partido de oposição está enfrentando um desafio de
liderança. Foram feitas sugestões de que a Escócia e a Irlanda do Norte, e talvez até Londres – todos
votaram para permanecer na UE, com margens significativas – poderiam tentar conseguir maior
independência do governo de Westminster. O país está atravessando uma crise constitucional, e seu
futuro rumo e até sua composição política não ficaram claros na sequência imediata do referendo.
“A disputa da liderança conservadora se estenderá, pelo menos, até o princípio do mês de outubro,
talvez mais… O novo Primeiro Ministro poderá convocar uma eleição geral. Poderá levar mais de meio
ano para que a Grã-Bretanha tenha um líder capaz de enfrentar a miríade de crises que hoje dominam
o país. O país não tem todo esse tempo.” – The Economist, 26 de junho, 2016
“A incerteza após o resultado do referendo provocará uma desaceleração abrupta no crescimento do
PIB no curto prazo, à medida que as empresas adiam investimentos e consideram alterações no
ambiente jurídico e regulatório. Crescimento no prazo médio provavelmente também será mais fraco
em decorrência de condições menos favoráveis para as exportações destinadas à UE, menor imigração,
e redução no investimento estrangeiro direto.” – Declaração da agencia Fitch de classificação de crédito,
27 de junho, 2016
“Não obstante as consequências rumorosas do referendo… O nosso ponto de vista como banco é que o
RU continua sendo uma grande e bem desenvolvida economia, com boas perspectivas no longo prazo.
É o nosso mercado interno, e a nossa função aqui como banco de referência é a de ajudar para que
seja bem-sucedido.” – Ross McEwan, Diretor Executivo, RBS
O Impacto sobre o Emprego no RU
Um dos enfoques-chave da campanha do referendo foi a imigração, sendo que o princípio fundamental
da UE de liberdade de movimento de pessoas foi criticado por uma série de problemas, desde pressões
sobre os serviços públicos e coesão social até desemprego. Menor facilidade de emprego para
trabalhadores da UE no RU ou trabalhadores do RU em outras partes da UE poderá reduzir o acesso a
talentos, e também aumentar as incertezas de funcionários que atualmente trabalham fora de seu país
de origem. Ao mesmo tempo, algumas multinacionais já indicaram que poderão considerar transferir
operações e funções do RU para outros países da UE, de forma a manter o acesso ao Mercado Único
da União Europeia.
“Alguns setores da economia do Reino Unido passaram a valer-se de trabalhadores da UE: respondem
por quase 8 por cento dos 5.7 m de pessoas que trabalham em lojas, hotéis e restaurantes, por
exemplo. Não ficou claro se a política de imigração posterior ao Brexit permite trabalhadores de baixa
qualificação… Três quartos dos cidadãos da UE que atualmente trabalham no RU não atendem as atuais
exigências para emissão de vistos para trabalhadores que não sejam da UE.” – The Financial Times, 24
de junho, 2016
“A maioria dos líderes empresariais (britânicos) acha que o referendo do Brexit não é bom para eles, e
consequentemente os planos de investimento e de contratação de pessoal estão sendo postergados ou
reduzidos.” – Simon Walker, Diretor Geral, Institute of Directors
O Impacto sobre a União Europeia
A decisão do segundo maior estado-membro da UE de sair da união gerou ondas de choque que se
propagaram até Bruxelas. Além das apreensões imediatas envolvendo as negociações sobre as futuras
relações entre o RU e a UE, já se fala sobre uma futura reforma significativa da própria União Europeia
na sequência do Brexit para fortalecer os restantes 27 estados-membros e tornar a união mais resistente
a futuros choques.
“O RU tem sido o estado-membro (da UE) com a perspectiva mais global. Sem ele, há o risco de
estreitar o foco da UE para desafios regionais, o que precisa ser evitado.” – Stefan Lehne, Professor
Visitante, Carnegie Europe
“Para muitos votantes Europeus, a Europa parece ser parte do problema, não a solução, o que é muito
preocupante. Existe o risco do efeito dominó. Existe o sentimento generalizado de que a UE precisa de
reformas. Aqueles que acham que a UE é parte da solução, precisam fazer muito mais para redesenhála.” – Pier Carlo Padoan, Ministro das Finanças da Itália
O Impacto sobre os Mercados Financeiros
Londres é um dos centros financeiros mais importantes do mundo, e alguns argumentam que, em
parte, tal deve-se à sua posição dentro da UE, que proporciona às empresas ali presentes acesso ao
mercado mais amplo da União Europeia.
Surgiram sugestões que, no caso de um Brexit, parte do
acesso poderia ser negado. O RU é também a quinta maior economia do mundo, portanto, quaisquer
incertezas que ali surjam terão provavelmente um efeito cascata contínuo em todo o sistema financeiro
global.
“Os mercados financeiros ao redor do mundo provavelmente permanecerão tumultuados, enquanto o
longo e complicado processo de divórcio político e econômico da UE estiver sendo negociado. As
consequências para a economia real serão comparáveis apenas às da crise financeira de 2007-2008.” –
George Soros, Presidente, Soros Fund Management
“Enquanto a Grã-Bretanha permanecer no mercado único, a cidade continuará sendo um grande centro
financeiro Europeu. Se amanhã, a Grã-Bretanha deixar de fazer parte do mercado interno, a cidade não
poderá manter o seu passaporte Europeu.” – François Villeroy de Galhau, Governador, Bank of France
“Preocupações com pânico financeiro parecido com o da falência de Lehman Brothers ou da
inadimplência da Grécia, por enquanto, parecem infundadas. No entanto, a queda das ações é sinal da
existência de novos riscos para a perspectiva econômica global.” – The Wall Street Journal, 26 de junho,
2016
“Para avaliar o impacto global desse resultado surpresa, é importante olhar além do canal comercial.
Uma vez que os canais financeiros, de confiança, e psicológicos sejam considerados, o nosso aviso é o
de não subestimar a extensão e profundidade do contágio da Ásia através do mercado financeiro.” –
Declaração de Nomura, 25 de junho, 2016
O Impacto sobre o Comércio Mundial
O RU tem sido um dos defensores mais fortes da redução de barreiras tarifárias com o resto do mundo,
sendo a segunda maior economia da UE. A sua retirada da UE provavelmente não fará da UE um
mercado menos importante, porém, a sua tradicional defesa do comércio livre dentro e além do bloco –
inclusive para a proposta Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento entre os EE.UU. e a UE –
pode tornar futuros acordos comerciais mais restritivos.
“A União Europeia é um dos maiores blocos comerciais do mundo, sendo também um parceiro
comercial importante da China e dos Estados Unidos. Se houver rompimento, tal poderá resultar em
muita incerteza global, e muitos negócios comerciais terão que ser restruturados. ” – CNN Money, 24 de
junho, 2016
“Se o RU sair da UE, haverá negociações posteriores. Portanto, serão necessárias negociações entre o
RU e a UE; entre o RU e a UE; o RU e outros membros da Organização Mundial do Comércio (OMC); e
os países nos quais a UE tem áreas de livre comércio. Existem muitos cenários por aí, e a maioria deles
poderá resultar em condições menos favoráveis para o comércio.” – Roberto Azevêdo, Diretor Geral,
Organização Mundial do Comércio
“O voto para sair da UE significa um retrocesso para uma abordagem cooperativa, e poderá jogar água
fria em várias iniciativas ao redor do mundo, que envolvem negociações para integração do mercado e
livre comércio.” – Yorizumi Watanabe, Professor de Política e Economia Internacional, Universidade de
Keio, Tóquio
“É difícil falar e fazer um julgamento sobre o impacto direto na economia chinesa. Se o Brexit é um
marco importante na reversão da globalização, acho que é muito negativo para o mundo, e muito
negativo para a China.” – Huang Yiping, Professor, Universidade de Pequim, e membro do Comitê de
Política Monetária, People’s Bank of China
Enfrentando a Incerteza
A única coisa certa neste momento é que nada é certo. Apesar de ter votado pela saída da UE, a GrãBretanha não apresentou qualquer estratégia para sua saída, ou uma visão para suas futuras relações
com a União Europeia. Existem várias possibilidades, inclusive um segundo referendo, porém todas
apresentam possíveis desafios sociais, econômicos e políticos. Em meio à incerteza imediata e choque
decorrente deste referendo histórico, fica claro que será necessário algum tempo para determinar uma
nova estrutura.
“Não obstante este momento histórico gerar volatilidade no curto prazo nos mercados de capitais é
importante observar que o impacto regulatório da referida decisão ocorrerá gradativamente ao longo
de um período de, pelo menos, dois anos, enquanto o RU negocia os termos de sua saída. Se, por um
lado, nos próximos dias haverá bastantes comentários e especulação sobre o impacto do Brexit, ainda
levará algum tempo para entendermos todas as implicações sobre talentos, inovação, investimento
estrangeiro, redes comerciais e de fornecimento.” – Steve McGill, Presidente do Grupo, Aon Plc.
“A Grã-Bretanha tem muito mais dúvidas que respostas, após o referendo da semana passada, sendo
que alguns analistas políticos argumentam que o Brexit não é inevitável, apesar de ter sido aprovado
nas urnas.” – Fortune, 7 de junho, 2016
“Será o mesmo RU, e a mesma União Europeia, exceto pelo fato de termos de negociar com eles
separadamente, e de lidar com eles separadamente. Acho que quando o mundo conseguir entender
isso nos próximos dias à medida que a situação se acalmar, as economias em termos tanto de
mercados de ações como monetários começarão a se estabilizar.” – Arun Jaitley, Ministro das Finanças,
Índia
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