Covas e o marketing eleitoral Hélio Duque Nesse tempo de rapina nacional é importante destacar homens públicos que dignificaram a administração pública, pelo testemunho de vida que deixaram. O saudoso Mário Covas foi um homem público diferenciado e tenho muito orgulho de ter sido seu amigo. Em 1969 era o líder do MDB, na Câmara dos Deputados. Foi cassado pelo regime militar, voltando ao parlamento em 1982, após a aprovação da anistia. Ficou pouco tempo, eis que Franco Montoro, eleito governador de São Paulo, o indica para ser o prefeito de São Paulo. Engenheiro competente inovaria com sua administração que priorizaria a periferia paulistana. Em 1986, com 8,5 milhões de votos se elegeria senador. Na Assembléia Constituinte, democraticamente eleito líder do PMDB, sendo referência na aprovação do texto constitucional. Em tempo: O PMDB daquela época era a voz da oposição democrática. Não era o partido da propina de Eduardo Cunha, Jucá, Renan, Sarney, Lobão e outros energúmenos políticos que o controlam nos dias atuais e sepultam a sua história. Em 1989, candidato à presidência da República, pelo PSDB, que ajudou a fundar, após sair do PMDB, assistiu os brasileiros e as suas elites elegerem o “caçador de marajás” Fernando Collor, anos depois afastado da curul presidencial por “impeachment”. Em 1994, Covas se elegeria governador de São Paulo, tornando-se herdeiro de uma administração caótica e mergulhada em grande crise econômica e financeira. O desafio seria o de sanear e incrementar reformas na administração do grande Estado brasileiro, recolocando a paulicéia no rumo certo do desenvolvimento. Reeleito em 1998, não cumpriria a integralidade do mandato, vitimado por doença devastadora que o mataria. Na Constituinte, Mário Covas sempre defendeu que o “horário político gratuito”, nas redes de rádio e televisão, deveria ser realizado ao vivo com a presença dos candidatos debatendo as suas propostas. Combatia o marketing eleitoral por ser vendedor de ilusão, vazio de conteúdo político e mistificador da opinião pública. Infelizmente prevaleceu a vontade da maioria, institucionalizando a falsificação no processo eleitoral brasileiro. O marqueteiro político assumiu o papel de principal protagonista nas eleições em todos os quadrantes do Brasil. Os “dudas mendonças” e os “joãos santanas” se multiplicaram nas “terras brasilis”, estipendiados por orçamentos bilionarizados. O dinheiro da corrupção passou a ser o grande irrigador das disputas eleitorais nos municípios, estados e nas presidenciais. Os “bonecos falantes”, diante das redes de televisão, falam dos desafios a serem enfrentados, lendo “teleprompter” (equipamento acoplado às câmaras de vídeo que exibe o texto a ser lido pelo político). O debate e o verdadeiro conhecimento dos problemas nacionais passaram a ser ditados mentirosamente pelos marqueteiros de plantão. Hoje a vida política brasileira é artificialmente fabricada pelas equipes do “marketing eleitoral”. O despreparo, a incompetência e o oportunismo aventureiro passaram a ser regra geral, garantindo a proliferação do contubérnio corruptor e corrupto. A dilapidação das instituições gerou a patologia e as bactérias que infestaram a vida republicana, onde o dinheiro da corrupção garante mandatos no executivo e no legislativo. O recente “Manifesto à Nação”, lançado pelos advogados Modesto Carvalhosa, José Carlos Dias e Flávio Bierrenbach, preconiza mudanças e reformas na vida política brasileira, destacadamente na estrutura dos poderes republicanos. Formulam propostas na direção correta para eliminar o descalabro e irresponsabilidades que vem tendo vigência na política nacional. O Manifesto à Nação defende a restauração das instituições através reforma estrutural, política e administrativa indispensáveis. Avança na eliminação do foro privilegiado, adoção do voto distrital, fim das coligações eleitorais em quaisquer eleições, além da distribuição de igual tempo por partido no horário eleitoral gratuito para as eleições majoritárias. Certamente são propostas que jamais serão aprovadas em uma reforma política com o 0, Os seus autores resgatam a proposta e o pensamento do sempre atual e saudoso Mário Covas, quando propõem: “Eliminação de efeitos de marketing das campanhas eleitorais, devendo os candidatos se apresentar no horário gratuito pessoalmente, com seus programas e para rebater críticas.” Hélio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Foi Deputado Federal (1978-1991). É autor de vários livros sobre a economia brasileira.