Jornal de Negócios Segunda-feira 16 de Outubro 2006 18 | ECONOMIA . ANÁLISE DA CTOC ELSA COSTA E SANDRA BERNARDO Reinvestimento do valor de realização de um imóvel A tributação do ganho obtido na venda de um imóvel e o reinvestimento do valor de realização é um tema que,não obstante ser inúmeras vezes abordado,gera sempre dúvidas, conforme verificamos da nossa experiência, quer pessoal quer profissional. Para dificultar, o impresso que se destina a declarar este tipo de rendimento - Anexo G, à modelo 3 do IRS - não é muito claro em termos do preenchimento e possui algumas lacunas nem sempre devidamente resolvidas por parte da Administração Fiscal. Analisemos de um modo muito sintético e em termos práticos como funciona este processo A alienação de um bem imóvel gera uma determinada mais-valia que resulta da diferença entre o valor de realização (preço de venda) e o valor de aquisição (preço de compra). Esta mais-valia concorre em 50% para o englobamento,ou seja,50% do valor da mais-valia obtida será sujeita a tributação. O valor de aquisição do imóvel será actualizado através da aplicação dos coeficientes de desvalorização monetária(1), por parte da Administração Fiscal, caso já tenham decorrido 24 meses da sua data de aquisição. A mais-valia obtida e sujeita a tributação poderá não ser tributada caso se verifique o reinvestimento. Este só é permitido para habitação própria e permanente e caso seja realizado no prazo e condições previstas no Código do IRS. O reinvestimento pode ser total ou parcial e os valores dos empréstimos bancários (antigo e novo) devem ser considerados na determinação do valor a reinvestir e do valor reinvestido, rubricas que permitem calcular a percentagem da mais-valia que será tributada quando o reinvestimento é parcial. O valor efectivamente sujeito a tributação será englobado juntamente com os restantes rendimentos de outras categorias e do agregado familiar para efeitos de determinação da taxa correspondente. Note-se que existem dois aspectos distintos a ter em conta que são, por um lado, o cálculo da mais valia obtida e que será englobada para tributação, por outro, o cálculo do valor a reinvestir na aquisição do novo imóvel,por forma a beneficiar da exclusão da tributação. Estes não devemserconfundidos, como tantas vezes acontece,e devem ser calculados de acordo com as especificações de cada um, partindo do princípio que a mais valia obtida será tributada na mesma proporção do valor não reinvestido. É com o intuito de incutir mais clareza a esta questão que surge a nossa análise, que vai ter base num exemplo prático onde colocaremos quatro cenários possíveis com determinados pressupostos. Pressupostos do exemplo: 1 - Inexistência de coeficientes de correcção monetária e de despesas e encargos 2 - Todas as operações ocorreram após 1 de Janeiro de 1989 – após a entrada em vigor do Código do IRS; 3 - Ambos os imóveis são para habitação própria e permanente e a aquisição da nova habitação é efectuada dentro do prazo e condições previstas para o reinvestimento; Siglas utilizadas: VR – valor de realização da habitação antiga VA – valor de aquisição da habitação antiga +V – mais-valia EB – valor em dívida ao banco referente à habitação antiga,no momento da venda VNA – valor de aquisição da nova habitação NEB – valor do novo empréstimo bancário contraído com aquisição da nova habitação EXEMPLO Valor de aquisição da habitação antiga Valor de venda da habitação antiga Empréstimo bancário em dívida Valor de aquisição da nova aquisição +V = VR – VA Como o valor reinvestido é superior ao valor a reinvestir,estamos perante um caso de reinvestimento total, logo: Mais-valia tributável = 0 2ª Hipótese Na nova aquisição, verifica-se o recurso ao crédito (empréstimo bancário) pela quantia de 230.000 €. Tabela 3 Variáveis VR VA +V EB VNA NEB Valores Valores 280.000 € 200.000 € 80.000 € 160.000 € 350.000 € 230.000 € Valor a reinvestir = 120.000 (valor realização – valor em dívida ao banco) Valor reinvestido = 120.000 (valor nova aquisição –valor novo empréstimo) Mais-valia tributável = 0 200.000,00 € 3ª Hipótese 280.000,00 € Na nova aquisição, verifica-se o recurso a financiamento bancário pelo montante de 302.000 € 160.000,00 € 350.000,00 € 80.000,00 € 1ª Hipótese: Não há recurso a financiamento bancário para aquisição da nova habitação. centagem proporcional da mais-valia que será sujeita a tributação. Esta percentagem será determinada a partir do quociente entre o valor efectivamente reinvestido e o valor total a reinvestir,neste caso,entre 48.000,00 € e 120.000,00 €. Assim, por forma a determinar a percentagem do valor que foi reinvestido, teremos: Percentagem = (48.000/120.000) x 100 = 40,o que significa que foi reinvestido 40% do valor que havia a reinvestir Ou seja, 60% do valor não foi reinvestido, logo O valor disponível é totalmente utilizado na nova aquisição, pelo que o reinvestimento é total. Tabela 1 Variáveis nova aquisição –valor novo empréstimo) Mais-valia tributável = 60% x 80.000, € = 48.000,00 € O valor para englobamento será: Englobamento = 50% x 48.000,00 = 24.000,00 € 4 ª Hipótese Na nova aquisição, verifica-se o recurso a financiamento bancário pelo montante de 350.000 €, ou seja, pelo valor total do custo da nova habitação. Tabela 5 Variáveis Valores VR VA +V EB VNA NEB 280.000 € 200.000 € 80.000 € 160.000 € 350.000 € 350.000 € Valor reinvestido = 0 (valor nova aquisição –valor novo empréstimo) Não existindo qualquer reinvestimento, não há exclusão tributária da mais valia, ou seja: Mais-valia tributável = 80.000,00 € Englobamento = 50% x 80.000,00 = 40.000,00 € Quadro resumo dos 4 exemplos apresentados, com indicações para preenchimento do anexo G: Com os exemplos expostos, as variantes equacionadas e a tabela comparativa, esperamos poder contribuir para o esclarecimento de algumas dúvidas relacionadas com este tema bem como para um eficaz planeamento fiscal dos contribuintes que se deparem com este tipo de situação. A transmissão de um imóvel é uma operação bastante frequente nos dias de hoje e o ganho obtido, sendo sujeito a tributação, deve ser devidamente ponderado, evitando-se, deste modo, surpresas desagradáveis, como seja o pagamento de imposto que não seria esperado. O recurso ao financiamento bancário é um elemento importante que deve ser devidamente equacionado. Legislação: Código do IRS - Artigos 9º, 10º e 43º a 51º Nota: (1) Estes coeficientes são aprovados por Portaria e Valor a reinvestir = 120.000 (valor realização - valor em dívida ao banco) publicados anualmente em Diário da República, podendo ser consultados no site da Direcção-Geral dos Impostos (www.dgci.min-financas.pt) em: Informação fiscal/Legislação/Portarias. Para imóveis alienados durante o ano de 2006,vigora a Portaria n.º 429/2006, de 3 de Maio. Tabela 4 Variáveis VR VA +V EB VNA NEB Valores 280.000 € 200.000 € 80.000 € 160.000 € 350.000 € 302.000 € Tabela 6 1ªhipotese 2ªhipotese 3ªhipotese 4ªhipotese VR 280.000 280.000 280.000 280.000 linha 401 VA 200.000 200.000 200.000 200.000 linha 401 +V 80.000 80.000 80.000 80.000 não é indicado no anexo EB 160.000 160.000 160.000 160.000 campo 503 VNA 350.000 350.000 350.000 350.000 NEB 0 230.000 302.000 350.000 Valor reinvestido (VR-EB) 120.000 120.000 48.000 000 Valor reinvestido (VR-NEB) 350.000 120.000 48.000 0 Tabela 2 Variáveis VR VA +V EB VNA NEB Valores 280.000 € 200.000 € 80.000 € 160.000 € 350.000 € 0€ Valor a reinvestir = 120.000 (valor realização - valor em dívida ao banco) Valor reinvestido = 350.000 (valor Valor a reinvestir = 120.000 (valor realização - valor em dívida ao banco) Valor reinvestido = 48.000 (valor nova aquisição - valor novo empréstimo) Estamos aqui perante um caso de reinvestimento parcial já que o valor a reinvestir - 120.000 € - não foi totalmente utilizado na compra da nova habitação, apenas uma parte foi utilizada. Sendo reinvestido apenas parte do valor haverá que apurar qual a per- Reinvestimento +V tributável (50% da +V) Total, porque valor Parcial, porque Total, porque Não existe, reinvestido é valor reinvestido é valor reinvestido é porque não há superior ao valor igual ao valor a inferior ao valor a valor a reinvestir reinvestir reinvestir reinvestido 0 0 24.000 40.000 Anexo G não é indicado no anexo não é indicado no anexo campo 504 * campos 505 a 508 --------- (*) Em nossa opinião este é um dos campos problemáticos do Anexo G, pois as dúvidas relativas ao seu preenchimento podem provocar uma incorrecta utilização dos valores colocados