Deputado José Chaves (PTB-PE)

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Deputado José Chaves (PTB-PE)
Pronunciamento na Câmara dos
Deputados, em 7 de maio de 2008.
A produção de biocombustíveis e etanol
no Brasil e a crise mundial de alimentos.
Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados.
Num primeiro momento, alguns expoentes dos chamados organismos multilaterais
transformaram os biocombustíveis e o etanol nos vilões da crise de alimentos que,
praticamente, envolve todo o planeta.
Asseguram que o uso de terras férteis para a produção de biocombustíveis e de
etanol ― até pouco tempo elogiada por autoridades dessas mesmas instituições ― reduz
a área plantada com culturas tradicionais, a exemplo do trigo e do arroz.
O Relator Especial da ONU para o Direito à Alimentação ― o suíço Jean Ziegler
―, generalizou, afirmando que “o fomento à produção de biocombustíveis é um crime
contra a humanidade”.
Na última quarta-feira, em relatório entregue, apressadamente, ao Secretário-Geral
da ONU, o FMI culpou o etanol americano e o europeu pelo aumento, em escala mundial,
nos preços dos alimentos.
Essa posição foi, agora, seguida pelo novo Relator Especial para o Direito à
Alimentação, Olivier De Shutter, segundo o qual “as metas estabelecidas para a produção
de biocombustíveis pelos Estados Unidos e pela União Européia são irresponsáveis.
Estou pedindo o congelamento de todos os investimentos nesse setor”.
O problema aí está na palavra todos, não se sabendo se Shutter inclui o Brasil em
seu pedido de moratória.
Senhoras e Senhores Deputados, a refinada orquestração contra os biocombustíveis
e o etanol encobre pesados interesses de megagrupos financeiros internacionais, além de
políticas econômicas, como as dos Estados Unidos e da União Européia, que ajudaram a
desequilibrar a oferta e a demanda mundial por alimentos.
Podem-se citar alguns desses interesses.
Em primeiro lugar, Senhor Presidente, registro o protecionismo praticado por
americanos e europeus ao etanol que produzem, no valor anual de 40 bilhões de dólares
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em subsídios, mantendo reprimida a expansão agrícola na América Latina e na África,
que poderiam converter-se em celeiros mundiais de alimentos.
Isso sim é que é um “problema moral”, “um crime contra a humanidade”, mas Jean
Ziegler preferiu transferir a culpa pela crise de alimentos à produção de biocombustíveis
e etanol, atingindo, implicitamente, o Brasil.
A propósito, Senhor Presidente, é incompreensível que as instituições ditas
multilaterais (ONU, FMI, BIRD, FAO) desconheçam que o Brasil utiliza menos de 1%
do seu território na produção de cana-de-açúcar, que o nosso etanol alcança uma
produtividade de sete mil e quinhentos litros por hectare e já abastece mais da metade da
frota brasileira de veículos.
Por outro lado, é estranho que a ONU tenha demorado tanto a esclarecer a opinião
pública mundial sobre como são viabilizados os biocombustíveis e o etanol, produzidos
na Europa e nos Estados Unidos.
Com efeito, Senhor Presidente, os produtores americanos recebem 20 bilhões de
dólares de subsídios por ano, mas só conseguem extrair três mil litros de etanol por
hectare de milho.
É necessário que digam, com todas letras, que o milho nos Estados Unidos está
sendo desviado para o etanol, o que reduz a produção de grãos como o arroz, essencial
para o reforço alimentar em regiões menos desenvolvidas do mundo.
Os órgãos multilaterais não são claros, igualmente, sobre o etanol produzido na
Europa.
Nesse Continente, Senhoras e Senhores Deputados, já se produz quase dois bilhões
de litros de etanol, a partir da uva, da beterraba e, mais recentemente, do trigo.
Os especialistas indicam que “até 2010, a produção de etanol, a partir do trigo, vai
explodir na França, que está avançando, gradativamente, sobre áreas de produção de
alimentos”.
Por sua vez, aqueles organismos dão-nos a impressão de terem ignorado a elevação
da renda das famílias, nos países emergentes, um fato auspicioso que jogou no mercado
cerca de um bilhão de novos consumidores, o que pressionou fortemente os preços dos
alimentos.
Em segundo lugar, na esteira da carência mundial, entraram em cena os
especuladores, apoiados em poderosos fundos de commodities, em busca de alto retorno
financeiro nos mercados futuros de alimentos e metais, alternativamente à taxa básica de
juros americana.
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Para se ter uma idéia do poder desses fundos especulativos, entre 2005 e 2008, os
preços futuros de grãos e sementes deram um salto de 163%, os preços dos fertilizantes
subiram 60%, os do arroz, 70%; os da soja, 87% e os do trigo, 130%.
Enquanto isso, o agricultor francês planta trigo subsidiado para a produção de
etanol, e Jean Ziegler acha isso “compreensível”...
Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados.
O etanol e os biocombustíveis integram a nova matriz de “energia limpa”, cujas
fronteiras de expansão não podem recuar, sob pena de o Brasil renunciar à sua condição
de país livre.
Numa espécie de resposta às pressões que o acusam de cometer crime contra a
humanidade e pedindo a suspensão da produção de nossa “energia limpa”, o Brasil está
iniciando a moagem da maior safra de cana de sua história: 632 milhões de toneladas,
prevendo-se a produção de 27 bilhões de litros de álcool e 35 milhões de toneladas de
açúcar.
Tudo isso, repito, com a utilização de menos de 1% do território nacional.
Por isso, tem razão o presidente Lula ao afirmar que é muito fácil, de uma cadeira
na Suíça, tecer considerações que, no mínimo, revelam desconhecimento da nossa
realidade.
Esse assunto é da maior gravidade e pode atingir a vida de mais de 100 milhões de
pessoas, mas o Brasil não tem nenhuma responsabilidade por sua eclosão, como bem
destacou o FMI em sua “mea culpa” da última quinta-feira, depois referendada pela
ONU.
Contudo, em que pese essa constatação, o Brasil não está isento de fazer o seu
“dever de casa”, ou seja, gerenciar inteligentemente os seus recursos naturais e as
tecnologias desenvolvidas para o setor, estimular a força criadora do seu grande povo.
Ao encerrar, Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, aproveito para
lançar um grito de alerta para os empecilhos e dificuldades que os países dominantes
ainda colocarão no caminho do nosso desenvolvimento pleno.
Os desafios de hoje são apenas o começo de longas batalhas a travar nos campos
econômico e diplomático.
O terreno está minado, mas o Brasil pode ganhar a guerra.
Muito obrigado.
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