O MARKETING PÚBLICO COMO ESTRATÉGIA DE GOVERNANÇA Luiz Ernesto Mellet1 RESUMO O propósito deste artigo é enfatizar a importância que o marketing ganhou a ponto de ser visto hoje como uma peça importante na engrenagem burocrática da administração pública brasileira. Sem querer esgotar o assunto, o que se pretende aqui é apresentar um painel de conceitos destacando, por meio de uma breve pesquisa bibliográfica, alguns célebres autores que se debruçaram sobre o assunto. Paralelo aos conceitos pertinentes à matéria buscar-se-á demonstrar a valoração das ferramentas de marketing como elemento norteador para gestores na condução de políticas públicas. Palavras chave: marketing, administração pública, planejamento. 1 Luiz Ernesto Mellet Especialista em Propaganda e Marketing – Universidade Federal de Pernambuco – Recife, 2000; Mestre em Ciências da Religião – Universidade Católica de Pernambuco – Recife, 2009; Pós-graduando em Gestão Publica – Faculdade Venda Nova do Imigrante – Recife , 2015. 1 ABSTRACT The purpose of this article is to emphasize the importance that marketing has gained about to be seen today as an important piece in the bureaucratic gear Brazilian public administration. Without wanting to exhaust the subject, what is intended here is to present a panel highlighting concepts through a brief literature review, some famous authors who have studied the subject. Parallel to the relevant concepts to the matter will get up to demonstrate the valuation of the marketing tools as a guiding element for managers in the conduct of public policies. Keywords: marketing, public administration, planning. 1- INTRODUÇÃO O conceito moderno de marketing surgiu nos anos 50 do século passado com o forte avanço da indústria dos Estados Unidos empenhada na reconstrução e aparelhamento da infraestrutura nas cidades da Europa Ocidental e da Ásia arruinadas na Segunda Guerra. O Plano Marshall destinou cerca de 13 bilhões de dólares ao longo de quatro anos. (...) O dinheiro foi aplicado em assistência técnica e econômica e, ao fim do período de investimento, os países participantes viram suas economias crescerem muito mais do que os índices registrados antes da Segunda Guerra Mundial. A Europa Ocidental gozou de prosperidade e crescimento nas duas décadas seguintes e viu nascer a integração que hoje a caracteriza. Por outro lado, os Estados Unidos solidificavam sua hegemonia mundial e a influência sobre vários países europeus, enquanto impunha seus princípios a vários países dos outros continentes também. Já na década de 1950, os países que foram arruinados na Segunda Guerra Mundial apresentavam seus primeiros sinais de recuperação e crescimento.2 A acirrada competição entre as empresas pelos mercados e a conquista dos consumidores da então emergente classe média americana trouxeram novos paradigmas de consumo. Já não bastava fabricar produtos e oferecer serviços com qualidade e a preços compatíveis. Para alavancar a receita e aumentar a margem de lucro, as empresas tinham que conquistar o cliente. O poder de escolha passou para as mãos do consumidor. Cabendo ao cliente agora a decisão final sobre a compra, destacar os produtos e serviços frente à concorrência, cada vez mais forte, passaria a ser uma questão de vida ou morte. As novas regras exigiram das corporações a adoção de práticas como pesquisa de mercado e o alinhamento dos artigos conforme as necessidades e características dos 2 JUNIOR, Antonio Gasparetto Plano Marshall. 2015. Disponível em: ˂www.infoescola.com/historia/planomarshall/˃ 2 compradores. O jogo consistia, sobretudo, em ofertar o melhor custo-benefício e criar atributos e benefícios para atrair o consumidor. Nos centros financeiros, a publicidade de produtos invadiria os meios de comunicação de massa na mesma rapidez em que eclodiam as agências de propaganda. A lógica do mercado passou a orientar as ações das empresas. Os canais de distribuição se multiplicaram e no seu rastro vieram novos conceitos de aplicações do marketing como o marketing de relacionamento, fidelização, database, o marketing social, individual, interativo, o marketing institucional e, entre outros, o marketing público. Surgido diante a necessidade das empresas de se sobressair em meio à concorrência, o marketing desprendeu a sua influência fora do domínio das organizações privadas tendo suas estratégias cada vez mais sendo utilizadas nos setores de governo para atingir metas de excelência na qualidade dos serviços prestados à sociedade. Dessa forma, este trabalho busca refletir a aplicação de algumas ferramentas do marketing na gestão pública e a contribuição que podem dar no aperfeiçoamento da governança. O artigo foi desenvolvido em duas seções nas quais – juntamente aos conceitos inerentes aos temas em questão – tecemos algumas reflexões consideradas pertinentes. Na primeira, fazemos um resumo da evolução da administração pública no Brasil a partir do modelo patrimonialista, mas com especial ênfase na transição da forma burocrática para a gerencial e os efeitos produzidos no serviço público com essa interação. Na segunda, analisamos a utilização de algumas ferramentas do marketing como instrumentos norteadores das ações de governo. Desse modo, buscaremos um entendimento de como a administração gerencial, com as normas internas e regulamentos rígidos herdados do modelo burocrático de administração, se configura com as regras flexíveis voltadas ao ambiente externo que caracterizam o marketing, a fim de aperfeiçoar o atendimento às demandas do cidadão e o alcance positivo dos resultados organizacionais na gestão pública. 2- DESENVOLVIMENTO 2.1 Tipologia e evolução da administração pública no Brasil Administração pública é um termo que envolve três definições: a subjetiva, objetiva e formal. 3 Sob o aspecto subjetivo, a Administração Pública é o conjunto de órgãos e pessoas jurídicas; sob o aspecto objetivo, compreende as atividades do Estado destinadas à satisfação concreta e imediata dos interesses públicos; e sob o aspecto formal, é a manifestação do Poder Público decomposta em atos jurídico-administrativos dotados da propriedade da auto-executoriedade, ainda que de caráter provisório.3 A administração pública no Brasil experimentou três formas básicas: patrimonialista (1530 a 1930), burocrática (1930 a 1985) e gerencial (atual). Esses modelos de administração evoluíram ao longo da nossa história político-social procurando cada um acomodar-se às exigências da época e a superação das deficiências apresentadas pelo modelo anterior. Contudo, nenhum foi completamente sobrepujado pelo outro. No modelo patrimonialista o Estado funcionava como extensão do poder do soberano. É típico das monarquias absolutistas dos países europeus nas quais os servidores possuíam títulos de nobreza concedidos pelos governantes como prova de gratidão e também como estratégia de defesa a interesses próprios. Os governantes consideravam o Estado como propriedade deles, misturando a coisa pública e a privada numa relação perniciosa que acabava descambando em nepotismo e corrupção. O capitalismo industrial e a democracia nas sociedades livres exigiram uma administração pública profissionalizada e que atendesse aos princípios constitucionais como isonomia e moralidade. Com o Estado liberal surge a administração pública burocrática que jogaria o modelo patrimonialista no lixo da história. Sobre este momento, observa Bresser Pereira: Surge na segunda metade do século XIX, na época do Estado liberal, como forma de combater a corrupção e o nepotismo patrimonialista. Constituem princípios orientadores do seu desenvolvimento a profissionalização, a ideia de carreira, a hierarquia funcional, a impessoalidade, o formalismo, em síntese, o poder racionallegal Os controles administrativos visando evitar a corrupção e o nepotismo são sempre a priori. Parte-se de uma desconfiança prévias nos administradores públicos e nos cidadãos que a eles dirigem demandas. Por isso são sempre necessários controles rígidos dos processos como, por exemplo, na admissão de pessoal, nas compras e no atendimento a demandas.4 Com o fim das duas guerras mundiais, os países se viram no esforço de reerguer não somente sua economia, mas rever sua política também. Uma nova sociedade emergia em várias partes do mundo e reclamava por educação, saúde e moradia. Ao mesmo tempo em que o Estado abraçava novos deveres e responsabilidade para com o cidadão, o pensamento neoliberal proclamava que as diretrizes do mercado seguiam regras próprias. Esta conjuntura 3 OLIVEIRA, Fernando Andrade de. Conceituação do Direito Administrativo. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, vol. 120, 1995, p 14. 4 PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. Plano diretor da reforma do aparelho do estado. Brasília, Presidência da República, Imprensa Oficial, 1995, p 15. 4 se fortaleceu com a queda do muro de Berlim e o desmantelamento da União Soviética. A partir daí o aparelho do Estado evoluiria para o modelo gerencial. O foco da administração gerencial é o aumento da qualidade dos serviços e a redução dos custos. Para isso, propõe o desenvolvimento de uma cultura organizacional orientada para resultados que faça girar – com economia de tempo e recursos – a máquina estatal de modo a atender as demandas da sociedade com mais eficiência. Finalmente a coletividade passa a ocupar o centro das atenções. É preciso agora prestar contas ao cidadão. Kliksberg afirma: A nova administração pública põe fim à arbitrariedade burocrática, pois os direitos do cidadão e sua igualdade ante a administração são escrupulosamente respeitados. Para isso, identifica os cidadãos, presta-lhes contas, enfim, ajusta-se às suas reais necessidades.5 (...) A grande tarefa a ser realizada compreende, entre outros aspectos, a revisão dos serviços de atendimento ao público com vistas a sua maior eficiência e humanização. Isto implica repensar profundamente os modelos organizacionais vigentes6. Ainda que tenha sido um aprimoramento, o modelo gerencial não se desligou completamente dos princípios da administração burocrática. Ao contrário, a administração pública gerencial se apoia na antecessora da qual conserva – ainda com certos ajustes – alguns dos seus principais fundamentos. Bresser Pereira analisa que: A administração pública gerencial constitui um avanço e até certo ponto um rompimento com a administração pública burocrática. Isto não significa, entretanto, que negue todos os seus princípios. Pelo contrário, a administração pública gerencial está apoiada na anterior, da qual conserva, embora flexibilizando, alguns dos seus princípios fundamentais como a admissão segundo rígidos critérios de mérito, a existência de um sistema estruturado e universal de remuneração, as carreiras, a avaliação constante de desempenho, o treinamento sistemático. A diferença fundamental está na forma de controle, que deixa de basear-se nos processos para concentrar-se nos resultados, e não na rigorosa profissionalização da administração pública, que continua um princípio fundamental.7 O afrouxamento que a administração pública gerencial trouxe à rigidez das regras do modelo burocrático foi copilado da estrutura organizacional modelada pelas empresas privadas. Porém, há substanciais diferenças entre elas. Destaca Bresser Pereira: A administração pública gerencial inspira-se na administração de empresas, mas não pode ser confundida com esta última. Enquanto a receita das empresas depende dos pagamentos que os clientes fazem livremente na compra de seus produtos e serviços, a receita do Estado deriva de impostos, ou seja, de contribuições obrigatórias, sem contrapartida direta.8 5 KLIKSBERG, B. Como transformar o Estado. Para além de mitos e dogmas. Brasília, Enap, 1992, p 85. ________. Redesenho do Estado para o desenvolvimento sócio-econômico e a mudança: uma agenda estratégica para discussão. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, jul./set. 1994, p 28. 7 PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. Plano diretor da reforma do aparelho do estado. Brasília, Presidência da República, Imprensa Oficial, 1995, p 16. 8 Ibdem. p 16. 6 5 O mercado controla as ações da empresa enquanto o comando da administração pública gerencial se dá por meio da sociedade, ou melhor, dos agentes designados através do voto para representá-la. Outra diferença crucial é que a administração de empresas – fazendo uso das técnicas do marketing – está voltada para o lucro e a maximização da satisfação do seu stakeholder. A administração pública gerencial, por sua vez, está diretamente voltada para o interesse público. Afirma Bresser Pereira: Na burocracia pública clássica existe uma noção muito clara e forte do interesse público. (...) Para a administração pública burocrática, o interesse público é frequentemente identificado com a afirmação do poder do Estado. Ao atuarem sob este princípio, os administradores públicos terminam por direcionar uma parte substancial das atividades e dos recursos do Estado para o atendimento das necessidades da própria burocracia, identificada com o poder do Estado. O conteúdo das políticas públicas é relegado a um segundo plano. A administração pública gerencial nega essa visão do interesse público, relacionando-o com o interesse da coletividade e não com o do aparato do Estado.9 2.2 O marketing no setor público Segundo Lambin, o marketing pode ser compreendido como: O processo social voltado para satisfazer as necessidades e os desejos de pessoas e organizações, por meio da criação da troca livre e competitiva de produtos e serviços que geram valor para as partes envolvidas no processo.10 Outra definição de marketing muito propagada – na qual estão inclusas as atividades de marketing – é a da American Marketing Association (AMA), que considera o seu composto como “o processo de planejar e executar a concepção, precificação, promoção e distribuição de ideias, produtos e serviços”. O marketing empresarial e o marketing institucional se diferenciam no desenvolvimento de práticas apropriadas para atingir objetivos específicos às suas respectivas instâncias de produção e consumo. As ações de marketing praticadas no mercado material – através das trocas de bens por moeda – caracterizam o marketing empresarial. Nesta transação reside a manutenção, sobrevivência e crescimentos dos negócios. Por outro lado, o marketing institucional se aplica ao conjunto de trocas num mercado simbólico, mas a sua essência está igualmente na manutenção, sobrevivência e crescimento das instituições que a praticam, tenham elas fins lucrativos ou não. O gerencialismo que se observa na gestão pública no Brasil traz no seu bojo a influência das formas de administração anteriores. De modo que se faz necessário lançar luz 9 Ibdem. p 17. LAMBIN, Jean Jackes. Marketing Estratégico. Lisboa, McGraw-Hill, 2000, p 103. 10 6 sobre a perspectiva dos modelos patrimonialista e burocrático para entender a necessidade de adaptação da prática de governança no atual cenário. Isso por si só justifica a adoção do instrumental do marketing na revitalização e otimização dos processos na máquina estatal. Dessa forma, as organizações públicas passaram a fazer uso de recursos do marketing empresarial como suporte complementar às suas ações institucionais. Ou seja, a utilização das técnicas do marketing como estratégia no aperfeiçoamento dos serviços prestados ao atendimento das demandas da sociedade a fim de obter a boa reputação gerencial e o reconhecimento pela implementação de políticas públicas bem sucedidas. Com a reforma nos anos 90, o Estado brasileiro passou a não mais responder diretamente pelo incremento econômico através da produção de bens e serviços. Cabia ao setor privado – por meio da privatização de empresas estatais – administrar as atividades que, de uma maneira ou outra, terminavam sendo controladas pelo mercado. Ao governo cabia fortalecer-se no papel de árbitro como regulador da ordem econômica e social. Ainda que se constitua na teoria ainda um conceito em construção, pode-se dizer, todavia, que o marketing público se refere às ações do marketing governamental. Ou seja, o marketing e suas relações aplicados no contexto do ambiente público que envolve a gestão da cidadania. O dicionário de comunicação assim define o marketing público: Conjunto dos instrumentos, estratégias e ações de marketing adequados a órgãos públicos (especialmente o poder executivo em níveis federal, estadual ou municipal) e voltados para os diversos segmentos da população e do mercado.11 Trata-se de um processo social em que as necessidades da coletividade são identificadas e expandidas para o conjunto de instituições, independentemente de quem ocupa cargos políticos. Dessa forma, estabelecem-se diferenças básicas com o marketing político, ou seja, o marketing público é desvinculado do processo eleitoral, em suas distintas fases, e é contrário ao personalismo e ao patrimonialismo. Sendo assim, deve ser empregado no setor público como filosofia de trabalho, voltada para o interesse público e para os princípios fundamentais da constituição brasileira. (...) o marketing público reforça a ideia de cidadão-cliente, um usuário dos serviços públicos que tem direitos que vão além dos de consumidor. A filosofia do marketing empregada na administração pública tem como orientação, também, a produtividade, a eficiência, a eficácia e a sustentabilidade.12 11 RABAÇA, C.arlos A; BARBOSA, Gustavo G. Dicionário de Comunicação. Rio de Janeiro. Editora Campus,-Elsevier, 2007, p 471 12 OLIVEIRA, Lourenço; COSTA, Américo; MIRANDA, Adílio; MESQUITA, Daniel; PEREIRA, José. O marketing público no contexto da reforma gerencialista do estado. Canoas. Revistas de Gestão do Unisalle, v.2, n.2, set. 2013, p 109. 7 À primeira vista, associar o marketing ao setor público pode soar contraditório. Afinal o marketing tem suas raízes fincadas na maximização do lucro das empresas. Entretanto, a evolução proveu ao marketing, no correr dos anos, um cabedal de aplicativos que se presta a muitos fins, inclusive com funções capazes de contribuir na gestão pública. O marketing de relacionamento, por exemplo, serve para estreitar os laços entre os agentes do governo e a sociedade, uma vez que a percepção do cidadão sobre as propostas de políticas públicas podem apontar caminhos de custos menores, mais ágeis e eficientes aos gestores. Essa interlocução entre os agentes públicos e a população é o que se denomina “democracia deliberativa” que, por si só, representa um campo fértil de ação para o marketing de relacionamento. Luchamann afirma: A democracia deliberativa constitui-se como um modelo ou processo de deliberação política caracterizado por um conjunto de pressupostos teórico-normativos que incorporam a participação da sociedade civil na regulação da vida coletiva. Trata-se de um conceito que está fundamentalmente ancorado na ideia de que a legitimidade das decisões e ações políticas deriva da deliberação pública de coletividades de cidadãos livres e iguais. .13 Basicamente, o marketing de relacionamento busca formas permanentes de interlocução estabelecendo um canal direto e permanente com o cliente. Essas características se encaixam perfeitamente com os propósitos da democracia deliberativa. Uma definição mais abrangente compreende o marketing de relacionamento por meio de objetivos. Segundo Evans: É o processo pelo qual uma empresa constrói alianças a longo prazo com seus clientes em potencial e compradores existentes, em que ambos – vendedor e comprador – são direcionados a um conjunto comum de objetivos específicos. Esses objetivos compreendem: 1. entender as necessidades do comprador; 2. tratá-lo como parceiro; 3. assegurar que os funcionários satisfaçam as necessidades do comprador, permitindo-lhes o exercício de iniciativas além das normas; 4. fornecer aos compradores a melhor qualidade possível.14 Na citação acima, ao trocarmos o termo comprador por cidadão e funcionário por servidor, podemos ter noção da adaptabilidade do marketing de relacionamento no contexto da gestão pública. A promoção do diálogo deve ser um processo continuo de governo para o estabelecimento da confiança necessária na construção das políticas públicas com a participação efetiva da sociedade civil nas decisões. Sobre isso, assinala Bresser Pereira: O paradigma gerencial contemporâneo, fundamentado nos princípios da confiança e da descentralização da decisão, exige formas flexíveis de gestão, horizontalização de estruturas, descentralização de funções, incentivos à criatividade. Contrapõe-se à ideologia do formalismo e do rigor técnico da burocracia tradicional. À avaliação 13 LUCHMANN, Ligia H. Hahn. Possibilidades e limites da democracia deliberativa: a experiência do orçamento participativo em Porto Alegre. Campinas, SP. Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, 2002, p 37. 14 EVANS, J. R.; LASKIN, R. L. The relationship marketing process: a conceptualization and application. Industrial Marketing Management, n.29, p 439. 8 sistemática, à recompensa pelo desempenho e à capacitação permanente, que já eram características da boa administração burocrática, acrescentam-se os princípios da orientação para o cidadão-cliente, do controle por resultados e da competição administrada.15 Quando adotada pela administração pública, as técnicas do marketing facilitadoras do relacionamento enfatizam o planejamento estratégico. Focado na construção de objetivos e metas cujo desempenho são monitorados por indicadores próprios e customizados para um determinado fim – o de mensurar com exatidão estatística a evolução de uma política pública ou a eficiência de algum serviço prestado –, o planejamento estratégico surgiu pela necessidade das empresas privadas de se sobressair num mercado de alta competitividade, de modo a sustentar vantagem competitiva sobre a concorrência. Não demorou muito para os gestores públicos descobrirem o planejamento estratégico. Afinal, trata-se de um bem bolado esquema capaz de exercer um efetivo controle na condução das ações de governo estabelecidas através da consulta à sociedade. Bresser Pereira afirma: Um programa mercadológico é um instrumento para se pensar com antecedência, para se estabelecer com clareza os objetivos e as estratégias, para se coordenar e equilibrar recursos humanos e materiais de modo a maximizar os resultados com o emprego de um mínimo de esforços; é um meio de se distribuir responsabilidades, de se controlar e reavaliar atividades.16 Daí então o caminho estava aberto para que as políticas públicas passassem a ser controladas por mecanismos de aferição de resultados como, por exemplo, o ciclo PDCA – Plan (Planejar), Do (Executar), Check (Checar), Act (Agir), a metodologia do Balanced Scorecard (BSC), que mede o desempenho organizacional sob quatro perspectivas: financeira, dos clientes, dos processos internos e do aprendizado e crescimento; e a matriz SWOT (Strenghs, Weaknesses, Opportunities, Threats), que consiste na observação de dados que caracterizam o ambiente interno e externo da empresa. São três peças da engrenagem do planejamento que vem sendo aplicadas pela máquina estatal com sucesso. O PDCA, BSC e SWOT foram importantes na criação do Modelo de Gestão de Pernambuco, instituído em 2007. Tendo como base estratégias e constante monitoramento das ações de governo, este planejamento alavancou a economia permitindo o crescimento do Estado a índices superiores que os do país nos últimos anos. 15 PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. Plano diretor da reforma do aparelho do estado. Brasília, Presidência da República, Imprensa Oficial, 1995, p 17. 16 PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A programação do esforço mercadológico. Revista Marketing, n.7, v.2, 1968, p 24. 9 O planejamento estratégico no setor público consiste num conjunto de ações que analisam os fatores internos, externos, objetivos e metas para a construção dos programas de políticas públicas. No contexto do Estado, o marketing público reforça a ideia de cidadãocliente, um usuário dos serviços públicos que tem direitos que vão além dos de consumidor. Portanto, a filosofia de marketing empregada na administração pública está orientada para a produtividade, a eficiência, a eficácia e a sustentabilidade das políticas públicas que, quando bem aplicadas, tende a promover a dinâmica da máquina estatal. 3- CONCLUSÃO A introdução na administração pública das técnicas gerenciais modernas a partir da reforma do Estado brasileiro – o Decreto-Lei 200, de 1967, transferiu algumas atividades para sociedades de economia mista, autarquias e fundações. Por isso alguns autores consideram como o verdadeiro início da reforma da administração pública no Brasil na qual, alternando ciclos de avanços e recuos, culminaria com o Plano da Reforma do Aparelho do Estado, em 1995 – deslocou, neste século, o cidadão do papel de expectador das ações de governo para o de protagonista e agente ativo dessas ações. Então a administração pública gerencial passaria a enxergar o cidadão não somente como um contribuinte de impostos, mas também cliente e mandatário dos serviços do governo. De modo que os resultados da ação do Estado são considerados bons não porque os processos administrativos estão controlados, mas porque as necessidades da coletividade estão sendo atendidas. O cidadão passa agora a ser, de fato, o cidadão-cliente. Neste novo contexto político-social, o marketing sai dos escritórios das empresas privadas e alcança os gabinetes dos gestores públicos para se transformar numa importante ferramenta de gestão organizacional. Conclui-se que o marketing vem acrescentar ao estudo das organizações públicas uma visão inusitada, pois ao enfocar o cidadão – suas aspirações, manifestações e demandas – a máquina estatal revela o seu potencial de adaptação e sobrevivência na confusa realidade atual. 10 Contudo, a aplicação do marketing só se realiza num ambiente onde a interlocução entre os agentes de governo e a população se dê num processo contínuo. E essa disposição ao diálogo, por sua vez, só pode ocorrer na democracia deliberativa, na qual a cidadão ganha voz e tem participação ativa na condução de políticas públicas e nos processos administrativos cujos resultados favoreçam o bem-estar da coletividade e à formação de uma sociedade mais justa e igualitária. 4- REFERÊNCIAS EVANS, J. R., LASKIN, R. L. The relationship marketing process: a conceptualization and application. Indu strial Marketing Management, n.29, p 439. KLIKSBERG, B. Como transformar o Estado. Para além de mitos e dogmas. Brasília, Enap, 1992, p 85. JUNIOR, Antonio Gasparetto Plano ˂www.infoescola.com/historia/plano-marshall/˃ Marshall. 2015. Disponível em: LAMBIN, Jean Jackes. Marketing Estratégico. Lisboa, McGraw-Hill, 2000. LUCHMANN, Ligia H. Hahn. Possibilidades e limites da democracia deliberativa: a experiência do orçamento participativo em Porto Alegre. Campinas, SP. Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, 2002, p 37. OLIVEIRA, Fernando Andrade de. Conceituação do Direito Administrativo. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, vol. 120, 1995. 11 OLIVEIRA, Lourenço; COSTA, Américo; MIRANDA, Adílio; MESQUITA, Daniel; PEREIRA, José. O marketing público no contexto da reforma gerencialista do estado. Canoas. Revistas de Gestão do Unisalle, v.2, n.2, set. 2013, p 109. PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. Plano diretor da reforma do aparelho do estado. Brasília, presidência da República, Imprensa Oficial, 1995. RABAÇA, C.arlos A; BARBOSA, Gustavo G. 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