Relato de Intervenção em saúde mental por suspeita de assédio moral no trabalho. Autor: Marcelo Donizetti Dearo Menato Fiscal de Saúde Pública CEREST São João da Boa Vista - SP Objetivo: Iluminar o trabalho das equipes de Vigilância Sanitária em Saúde do Trabalhador frente às dificuldades de intervenção em saúde mental através deste relato de caso. Contextualização: • Paciente: T.R.N. • Idade: 23 anos • Encaminhamento: Ambulatório de Saúde Mental. • Traços Pré-Mórbidos: Histórico de Síndrome do Pânico • Queixa: Crise alérgica e Transtorno Depressivo intensificado pelas relações de subordinação no trabalho. Contextualização: A Sra. T.R.N. vêm ao CEREST relatando no seu histórico ter passado por uma crise de síndrome do pânico e que, no momento, iniciou um acompanhamento psiquiátrico devido às situações sofridas no serviço. Diz trabalhar há nove meses como consultora de clientes em uma empresa de eletrodomésticos. Faz a função de arrumação do estoque e elaboração das ordens de serviços. Após o mês de dezembro devido à sobrecarga de trabalho tem sofrido com crises de rinite de dois em dois meses, com atestados de dois dias a cada episódio; refere perda de apetite e perda de peso. Neste contexto o gerente da loja começou a destratá-la dizendo que “deveria largar do marido, pois, é ele que lhe causa alergia”, chamou-a de “estragada” e após o atestado psiquiátrico passou a referir-se a funcionária como louca, dando risada e dizendo ser idiota. Providência Iniciais: Fiscalização alegando “vistoria de rotina” para verificação das condições de trabalho e dos aspectos organizacionais e preservando a identidade da trabalhadora. Situações encontradas: Embora os técnicos do CEREST se apresentassem devidamente documentados com crachás e inclusive com a viatura estacionada à porta do estabelecimento, de modo visível a todos os funcionários, o gerente nos recepciona de forma rude sem se preocupar em contextualizar seu comportamento com a situação de fiscalização e com as normas de boa educação e respeito sociais, interrompendo o discurso de orientação sobre as condições de trabalho, não apresentando receptividade e com postura de afronta apesar de apresentadas às devidas legislações. Foram desta forma, constatados fortes indícios da presença de assédio moral no trabalho, além da ausência de local para refeição e riscos ergonômicos no transporte de mercadorias. Indícios Encontrados: • Ausência de local para refeição e descanso; • Sanitários dispostos com chaves causando constrangimento no uso; • Riscos ergonômicos nas atividades de transporte de carga manual; • Dificuldade nas atividades de fiscalização do CEREST por resistência do Gerente local; não caracterizando obstrução. • Gerente com postura de afronta e sem contextualizar os comportamentos com as normas de respeito sociais e de boa educação (Perfil Assediador). Legislação Utilizada: De acordo com o código sanitário lei 10.083 de 23 de setembro de 1998, apresentou-se os o conteúdo que se segue: Artigo 29º - A saúde do trabalhador deverá ser resguardada, tanto nas relações sociais que se estabelecem entre o capital e o trabalho, como no processo de produção. § 1º - Nas relações estabelecidas entre o capital e o trabalho estão englobados os aspectos econômicos, organizacionais e ambientais da produção de bens e serviços. Artigo 30º - São obrigações do empregador, além daquelas estabelecidas na legislação em vigor: I - manter as condições e a organização de trabalho adequadas às condições psicofísicas dos trabalhadores; Artigo 31º § 1 - informar aos trabalhadores, CIPAs e respectivos sindicatos sobre os riscos e danos à saúde no exercício da atividade laborativa e nos ambientes de trabalho; dentre outros. Termo de Ajuste de Conduta X Termo de Comum Acordo: Quem pode tomar? Segundo a lei, o Termo de Ajuste de Conduta - TAC pode ser tomado por qualquer órgão público legitimado à ação civil pública, como o Ministério Público, a Defensoria Pública, a União, os Estados-membros, os Municípios, o Distrito Federal, as autarquias, as fundações públicas (Lei n. 7.347/85, art. 5º; CDC, art. 82). Estratégia de Intervenção: Optamos em comunicar a matriz da empresa (Fora de nossa abrangência) e por meio da própria estrutura organizacional solicitar as adequações, visto se tratar de empresa que vincula à marca a satisfação dos colaboradores e que por isso, teoricamente, não permitiriam depreciação do nome da instituição. Conforme o art. 31 inciso I, solicitamos a instalação de placa ou cartaz em local visível de fácil apreciação e leitura com a definição de assédio moral, como identificar e agir. Solicitamos a elaboração de um código de ética da empresa e a entrega aos funcionários e ao sindicato da categoria, com a apresentação das fichas de entrega e protocolo do sindicato, fomentando o envolvimento do sindicato nas questões de saúde e assédio moral. A aplicação de avaliações de clima organizacional com apresentação dos resultados ao CEREST e a criação de espaços de confiança para o acolhimento dos funcionários, direto na matriz com pessoa especializada, sem riscos de retaliações e garantidos os encaminhamentos necessários, com custeio por parte da empresa dos tratamentos médicos nos casos de nexo do trabalho. Diferencial do Trabalho: • Devido aos fatores pré-morbidos partimos da possibilidade de agravamento das condições de saúde; • Intervenção sob suspeita de assédio moral, não existia documentação ou provas substanciais para um processo trabalhistas; • Inversão do ônus da prova trabalhista; cabe a empresa provar que o local é saudável aos trabalhadores; • Discurso da paciente legitimado através das condições ambientais e da observação dos modos de gestão; • Notificação da empresa a nível central fora da nossa área de abrangência, como estratégia de intervenção; • Termo de Ajuste de Conduta; • Acompanhamento das adequações. Recomendações: A dor emocional é real e não deve ser tratada de outra forma, por trás de um discurso de subjetividades se constrói a alienação das práticas de preservação da saúde mental. mental. É óbvio que tudo no ambiente de trabalho afeta as crenças pessoais e a realidade interna do indivíduo, por isso, basta muitas vezes a mudança física de poucos componentes para a melhora dos sintomas mentais (um local para a refeição e descanso, um ambiente que permita a socialização dos funcionários), isto posto e unido à aquisição do conhecimento, através da educação dos riscos que os trabalhadores estão expostos, livra o indivíduo da culpa, do sofrimento de ser o autor da própria doença e o coloca em posição ativa de defensor da sua sanidade e dos colegas, assim o reintegra à realidade de uma vida social plena. plena. À saúde pública cabe o investimento nos agentes de saúde tirandotirando-os desta posição de alienação, fomentando o engajamento e a ousadia para intervir inclusive no plano subjetivo. subjetivo. Muito Obrigado! Autor: Marcelo Donizetti Dearo Menato CEREST São João da Boa Vista – SP [email protected] (19) 3623-1973