A FORMAÇÃO DE LEITORES COMPREENDEDORES ATRAVÉS DE OFICINAS DE LEITURA Márcia Rita de Campos Aluna do 4º período do Curso de Pedagogia – UEMG/Barbacena Ms. Elaine Leporate Barroso Faria Professora e Pesquisadora da UEMG/Barbacena RESUMO Este plano visa a elaboração de oficinas de leitura para aguçar a curiosidade dos alunos, despertar o interesse pela leitura e escrita, incentivar o hábito da leitura, destacar a importância do domínio da língua, promover o desempenho oral e o desenvolvimento de argumentos, estimular o leitor à um pensar organizado, reflexivo e crítico e aplicar técnicas de codificação, retenção e recordação das informações. PALAVRAS CHAVE: leitura, cognição, compreensão, oficina. INTRODUÇÃO O ato de ler implica muito além da alfabetização entre outras técnicas de iniciação estudantil, processos que ocorrem em nossa mente e que nos possibilitam dar sentido ao que lemos. Os conceitos de leitura, compreensão e cognição, definidos a partir da perspectiva teórica da Psicologia Cognitiva são apresentados para o entendimento da relação entre leitura e compreensão da leitura. A cognição influencia na vida escolar, considerando o fato de que o processo de leitura acompanha o estudante por toda sua trajetória acadêmica. Desta forma, o conhecimento prévio é a base da compreensão, em que o leitor relaciona texto e contexto em que está inserido. A partir do conhecimento prévio se dá a possiblidade de compreensão e assimilação de novas informações. No âmbito educacional é importante o ensino do uso estratégias cognitivas e metacognitivas da leitura desde os primeiros anos do Ensino Fundamental. Mediante pesquisa realizada anteriormente no projeto de pesquisa intitulado “As habilidades cognitivas na compreensão da leitura”, por meio da atividade extensionista, colocamos em prática os conhecimentos adquiridos. 279 Segundo o Programme for International Student Assessment 2012 (PISA) o Brasil ocupa o 55º lugar em leitura em um ranking de 65 países no Programa Internacional de Avaliação de Alunos e confirma o baixo desempenho dos alunos brasileiros em leitura em língua materna. Não é muito diferente do de 2009, quando o país assumiu a 53ª posição em leitura em que o Brasil obteve 375 pontos, ficando em penúltimo lugar entre os 42 países participantes da avaliação internacional, sendo o país de melhor pontuação a Coreia com 552 pontos. (OECD, 2006, 2009), dados estes que evidenciam a necessidade de um projeto que atenda crianças de rede pública, para que se sintam motivadas e obtenham melhora na leitura e na compreensão. O objetivo deste projeto é o de fazer com que alunos do Ensino Fundamental I, da rede pública, que estejam em situação de fracasso escolar, tenham a oportunidade de melhorarem em leitura e compreensão, o que posteriormente os auxiliarão em sua caminhada acadêmica, visto o fato de que todas as áreas de instrução acadêmica necessitam da leitura e compreensão de textos. A LEITURA PELA PERSPECTIVA COGNITIVA Para Piaget a cognição humana era como uma forma específica de adaptação biológica de um organismo complexo a um ambiente complexo. O sistema cognitivo que ele idealizou é, extremamente ativo, pois seleciona e interpreta ativamente a informação ambiental à medida que constrói seu próprio conhecimento. (FLAVELL; MILLER; MILLER, 1999). O conhecimento se faz presente em quase todos os momentos da vida humana, a leitura por sua vez é indispensável a sobrevivência no mundo atual, fatos estes que justificam a importância de saber ler e compreender, para acumulação de conhecimentos. A cognição exibe dois aspectos simultâneos e complementares que Piaget denominou de assimilação e acomodação, percebemos que a assimilação está ligada a aplicação do saber já adquirido para interpretar os eventos do ambiente, enquanto a acomodação ajusta o conhecimento em resposta de um objeto ou evento. Portanto a assimilação refere-se a adaptar os estímulos externos às estruturas mentais internas, enquanto a acomodação faz o processo reverso, adapta as estruturas mentais aos estímulos externos. (FLAVELL; MILLER; MILLER, 1999). A assimilação e a acomodação são aspectos cognitivos de interpretação em relação ao ambiente, o primeiro adapta os estímulos externos às estruturas mentais internas e o segundo faz o processo contrário, ou seja, adapta as estruturas mentais aos estímulos internos. 280 Segundo Palinscar e Perry (1995) apud Joly e Marini (2006), a leitura envolve habilidades cognitivas, especialmente as relacionadas à solução de problemas para decodificar e compreender textos. Na visão de Flanagan, Ortiz, Alfonso e Mascolo (2002) decodificar está relacionado ao reconhecimento de símbolos gráficos, representados por letras ou palavras, partindo de uma análise que permite ao leitor atribuir-lhes significado. A compreensão em leitura envolve entender o significado sintático e semântico desses símbolos no contexto de um texto, sendo assim a leitura uma habilidade cognitiva. A leitura envolve muito mais do que saber ler, requer a habilidade de entender a mensagem transmitida e que está implícita no texto por meio de conhecimento prévio armazenado em nossa memória. Uma compreensão eficiente leva o indivíduo a fazer inferências, quer requer do leitor a observação de informações que estão apenas sugeridas no texto ou que esteja relacionada com conhecimentos anteriores sobre o assunto. Então, o leitor utiliza no processo de compreensão de um texto, um conjunto de processos metacognitivos, sendo que a estratégia mais utilizada para monitorar o entendimento é o próprio objetivo que todo leitor adota, isto é, o de obter significado ou o de realizar um esforço para conseguir uma representação coerente do material lido. Assim, esta estratégia promove a realização de julgamentos por parte do leitor sobre o entendimento do texto. O desenvolvimento cognitivo é formado por vários processos mentais que estão envolvidos na vida do ser humano desde o início do ciclo da vida e que avança de acordo com as experiências vivenciadas. Assim, a cognição acompanha o indivíduo por toda a vida e principalmente, constitui fator de integração social. O conhecimento em uma determinada área do saber está ligado a leitura e compreensão de textos nesta área e isso remete a importância da leitura e da educação tanto na formação acadêmica, quanto na vida intelectual do indivíduo. A leitura é indispensável aos universitários porque, através dela, se dá o acesso ao conteúdo das várias disciplinas curriculares e à produção científica, mas a habilidade de leitura tem papel importante na escola, que tem como principal objetivo o ensino de conceitos por meio de práticas que requerem habilidade de leitura. Podemos dizer que quanto mais lemos, mais aprimoramos nossa capacidade de compreensão do mundo e por meio da leitura crítica estabelecemos relações entre o texto e o contexto (FARIA, 2011; FARIA; MOURÃO-JÚNIOR, 2013). O USO DE ESTRATÉGIAS DE LEITURA 281 Segundo Oliveira, Boruchovitch e Santos (2007) apud Faria (2011), tem sido preocupante o aumento do número de estudantes em situação de fracasso escolar. Os professores buscam explicações para o não aprendizado do aluno, atribuindo a ele a culpa por seu baixo desempenho ou a características do ambiente. Por outro lado, o aluno, frente ás dificuldades de aprendizagem, se considera incapaz e pouco inteligente. Estudos comprovam que maus leitores não somente recebem menos instrução em compreensão, como é exigido deles mais tempo de prática de leitura oral, com contínuas interrupções para corrigir erros; no entanto, não recebem propostas de reflexões ao conteúdo do texto. Conforme Coelho e Correa (2010) apud Faria (2011), se focalizados os erros ortográficos e gramaticais, que compreende um nível mais básico de leitura, deixa de construir o sentido total do texto. Os leitores devem ser orientados para monitorarem sua compreensão, utilizando padrões de avaliação semântica de alto nível, possibilitando o monitoramento nos níveis mais baixos que são relacionados aos aspectos formais do sistema de escrita. Em contrapartida desta colocação, a oficina de leitura se mostra uma boa alternativa, para que os alunos aprendam a ler para compreender e não para um bom desempenho oral sem retenção das informações contidas no texto, para tanto podemos utilizar as estratégias cognitivas de leitura. Com o uso de estratégias cognitivas, o aluno tende a melhorar significativamente sua compreensão leitora. São processos mentais que o mesmo já utilizava involuntariamente, quando o aluno vem a conhecê-las, ele se apropria das estratégias e começa a identificar em que momento usá-las e qual estratégia deve usar. Especulam sobre a origem da habilidade metacognitiva, a qual deve ser mediada pelos recursos disponíveis na memória de trabalho. Explicam que à medida que os processos básicos de leitura se tornam mais eficientes, consumindo assim menos espaço na memória de trabalho, estes espaços provavelmente tornam-se livres para atividades como o monitoramento da compreensão. O leitor que domina a habilidade de monitorar textos tem capacidade para aumentar o grau de complexidade dos textos a serem lidos, de acordo com a eficiência nos processos básicos de leitura, o leitor abre um espaço na memória de trabalho para monitorar sua compreensão. À medida que o aluno lê e observa que não compreendeu o que leu, e volta ao texto em busca de informações, ele está realizando uma atividade de metacognição, que seria o monitoramento de sua própria compreensão. Para Gonçalves (2008) apud Faria (2011), existem diferenças entre leitores proficientes e não proficientes, e o grau de compreensão do texto está relacionado a dois 282 fatores que explicam as diferenças entre eles, o conhecimento prévio do leitor e as estratégias de compreensão, ambos podem melhorar com a idade e o ensino. Encontramos nos textos ideias implícitas que necessitam do uso de inferências, baseadas no conhecimento prévio do leitor, para a sua compreensão. As inferências possibilitam ao leitor ler nas entrelinhas. As inferências permitem ao leitor dar coerência ao texto que se lê, para que dele extraia novas informações e evoque informações que devem ser adicionadas ao texto para a sua completude. Esta estratégia não consegue ser evocada se o leitor pausa muitas vezes a leitura e não consegue visualiza-la como um todo, em um contexto geral. Se o leitor interrompe sua leitura para, por exemplo, buscar ajuda no dicionário para entender o significado de uma palavra nova, ele pode perder o real significado desta no contexto. A OFICINA DE LEITURA Para Juric et al (2007) apud Faria (2011), há um grande número de investigações a respeito das dificuldades em leitura que consideram as falhas no processo de decodificação. A confusão a respeito das demandas da tarefa de leitura, a pobreza de vocabulário, os problemas de memória, a falta de treinamento em estratégias de compreensão, o escasso controle da compreensão das diferenças no modo de ensinar para bons e maus leitores são fatores que influenciam neste processo. Os alunos participantes da oficina foram selecionados a partir de avaliação de seus desempenhos em compreensão de leitura, no ato da leitura oral, e em outras investigações a respeito da leitura e compreensão observadas pelos professores destes alunos. O projeto assiste a 16 alunos do Ensino Fundamental I da Escola Municipal Jovelino Jacinto Furtado, na zona rural do Faria, Barbacena, em situação de fracasso ou baixo desempenho. As oficinas estão sendo realizadas nas dependências da escola em horário diferente do período escolar, acontecem uma vez por semana, com a duração de 50 minutos. É promovido o acesso a diferentes textos em seus suportes originais como jornais, revistas, livros de literatura, livros didáticos, gêneros que circulam nas diversas mídias eletrônicas como os e-mails, bate-papos. É utilizado o acervo da biblioteca e o material didático utilizado pelos alunos. Foi realizada uma sondagem com os alunos sobre seus hábitos de leitura e fluência verbal, para só então elaborar a dinâmica e as atividades das oficinas. Os alunos participantes do projeto tem se interessado devido à ludicidade de como vem sendo aplicado e mostram-se motivados à melhorarem em leitura e interpretação textual. É notória a dificuldade na retenção de informações e na oralidade, dificuldades que vêm sendo trabalhadas com maior atenção. É ressaltada a importância da organização textual, 283 visando o uso de estratégias metacognitivas para a compreensão leitora. A relação entre compreensão da leitura e desempenho escolar é estreita, e a competência em leitura é uma das habilidades fundamentais para o sucesso em todas as áreas do saber. Este estudo contribui para a formação de professores e para a promoção de práticas de ensino da leitura favorecedoras da formação do leitor crítico. E contribui com o fortalecimento da educação básica porque propõe ações junto ao sistema de ensino público através de atividades técnicas e científicas construindo um espaço de diálogo e de reflexões críticas. CONSIDERAÇÕES FINAIS Através das oficinas de leitura, os leitores devem ser orientados a monitorarem sua compreensão, considerando que muitas vezes alunos os não compreendem textos simples. Desta forma, um leitor hábil é aquele que usa as estratégias cognitivas e metacognitivas, usando também atividades de planejamento e estratégias de automonitoramento na leitura. O leitor proficiente mostra-se ativo diante do texto e possui objetivo sobre o que irá ler, o que analisar, revisar e questionar o significado do que leu, determinar significados desconhecidos e lidar com inconsistências no texto. Para tanto, usa seu conhecimento prévio para realizar inferências. Assim, leitores que sabem fazer uso de estratégias, que sabem como e quando usa-las, são considerados leitores estratégicos. A oficina oferece aos alunos esta oportunidade de conhecer e fazer uso de estratégias, que eles provavelmente não tinham conhecimento, e a partir de orientações, entender o que se lê, ler com maior habilidade e reter as informações lidas. Boruchovitch (2001) apud Faria (2011), atenta para a necessidade de professores e educadores desenvolverem um trabalho preventivo que propicie a formação do leitor independente, crítico e reflexivo, e a atuação conjunta entre escola e família, elementos fundamentais considerando que a competência em leitura inclui fatores motivacionais, cognitivos e contextuais. O conhecimento em leitura e compreensão está voltado para a vida acadêmica e social do sujeito, onde lhe é exigido o tempo todo, conhecer e entender o mundo a sua volta, bem como sempre buscar aprender sobre ele, suas inovações, suas obrigações e direitos enquanto cidadão, para que seja um agente histórico-social, crítico, de mudança, e exerça sua cidadania sem nenhum tipo de limitação. 284 REFERÊNCIAS ANDRADE, M. W. C. L.; DIAS, M. G. B. B. Processos que levam à compreensão de textos. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 11, n. 1, p. 147-154, jan./abr. 2006. FARIA, E. L. B. Estratégias de compreensão da leitura: perspectivas teóricas. Mal-Estar e Sociedade, Ano IV, v. 6, pp. 83-98, 2011. FARIA, E. L. B.; MOURÃO-JÚNIOR, C. A.. Os recursos da memória de trabalho e suas influências na compreensão da leitura. Psicologia, Ciência e Profissão, v. 33, n. 2, p. 288303, 2013. FLAVELL, John H.; MILLER, P. H.; MILLER, S. A. Desenvolvimento cognitivo. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 1999 JOLY, M. C. R. A.; MARINI, J.A. S. Metacognição e Cloze na avaliação de dificuldades em leitura. Questões de pesquisa e práticas em Psicologia Escolar. São Paulo: Casa do Psicólogo®, 2006. 285