CARACTERÍSTICAS DA FAMÍLIA SARCOPHAGIDAE APLICADAS À ANÁLISE FORENSE Thara Nunes Silva ¹ Paulo Roberto Martins Queiroz ² ¹Bióloga. Aluna da Pós-Graduação em Biociências Forense, pela Universidade Católica de Goiás/IFAR. ²Biólogo. PhD. Biologia Animal. UnB. Professor do IFAR/PUC-GO. Endereço: IFAR Instituto de Estudos Farmacêuticos. SHCGN 716 BL B Lj 05 Brasília-DF CEP: 70770-732. E-mail: [email protected] Resumo Os Sarcophagideos são considerados dipteros secundários em cadáveres. Essa revisão bibliográfica teve como objetivo a união de informações pertinentes sobre a família dentro da entomologia forense. Ciência baseada no estudo dos insetos associados a decomposição humana com a finalidade médico-criminais. É possível determinar o IPM (intervalo pos mortem), ou seja, o tempo decorrido após a morte de um indivíduo; como ocorreu e quaisquer anomalia nos tecidos, como a ingestão de drogas lícitas e ilícitas anterior a morte. A entomologia forense vem crescendo exponencialmente no Brasil desde os anos 90, sendo o primeiro caso registrado no século XII na China. Vários fatores influênciam na colonização da carcaça, como a umidade, temperatura e localização geográfica. Ocorrendo as fases de decomposição. Concluindo, o estudo aprofundado dos Sarcophagidae permite um esclarecimento da sua participação em cadáveres. É necessário uma interligação dos estudos acadêmicos com a realidade dos procedimentos legais. Palavras-chave: decomposição, sucessão cadavérica, dípteros, IPM, drogas. Characteristics of the family Sarcophagidae applied to forensic analysis Abstract The Sarcophagideos are considered secondary flies in cadavers. This review aimed unity of relevant information on the family within the forensic entomology. Science-based study of insects associated with human decomposition in order medico-criminal. It`s possible to determine the PMI (postmortem interval), in the time elapsed after the death of an individual, as has occurred and any abnormality in tissues such as the ingestion of licit and illicit drugs prior to death. Forensic entomology in Brazil has been growing exponentially since the year 1990; the first case was recorded in the twelfth century in China. Several factors influence the colonization of the carcass, such as humidity, temperature and geographical location. Occurring stages of decomposition. In conclusion, the detailed study of Sarcophagidae allows a clarification of its participation in cadavers. It`s needed a connection from the academic studies to the actual legal proceedings. Keywords: decomposition, succession mortis, flies, IPM, drugs. 1. INTRODUÇÃO A entomologia forense é o estudo de insetos e artrópodes associados às questões criminais, sendo utilizada como uma ferramenta em crimes contra pessoas, por exemplo. É necessário o conhecimento detalhado de taxonomia, biologia e ecologia de insetos para uma análise fiel. No Brasil, existe um número elevado de especialistas que conduzem pesquisas que auxiliam na determinação das características individuas das variadas espécies (PUJOLLUZ, 2008). Os insetos exploram várias fontes de alimento como, por exemplo, frutos, fungos, fezes e carcaças de animais. A estrutura dessas fontes de alimento está em constante mudança química e estrutural (GOMES; VON ZUBEN, 2004), utilizando essa matéria orgânica como uma fonte de alimento (proteínas) para o desenvolvimento ovariano das fêmeas adultas ou para o desenvolvimento de suas formas imaturas (OLIVEIRA-COSTA, 2003). Dentro da vasta gama de insetos, existem os insetos necrófagos, que utilizam como fonte de recursos, as carcaças de animais (OLIVEIRA-COSTA, 2008). No entanto, essas espécies podem ser agrupadas de acordo com sua disposição ecológica (CARVALHO; LINHARES, 2001), podendo ser divididas em: necrófagas, são aquelas que além de se alimentar diretamente dos tecidos da carcaça, também a utilizam como um substrato de criação; os parasitóides e/ou predadores das espécies necrófagas, espécies onívoras que se alimentam de mais de um tipo de matéria orgânica; e as espécies que visitam a carcaça em busca de refúgio, postura ou por ser um micro-ambiente favorável, ou seja, propício para a postura dos ovos ou imaturos, que tenha temperatura e umidade elevadas e que possua uma quantidade de matéria orgânica suficiente para suprir a necessidade por recursos pelos imaturos. A colonização ocorre logo após a morte, se a carcaça estiver em temperatura ambiente (ANJOS, 2010). Existe uma grande diferença na composição da entomofauna nos diversos biomas e, dessa forma, torna-se necessária a observação da região geográfica para o conhecimento dos padrões existentes. Segundo alguns estudos, como o de Moura (2004), o autor afirma que as espécies necrófagas dispõem de uma distribuição agregada sobre os recursos; Finn (2001), delinea três características: a imprevisibilidade temporal, a variação espacial e a alta riqueza, o que faz das comunidades necrófagas um modelo compatível com as hipóteses de estruturas de comunidades e evolução. Gurevitch et al. (2002) e Savage et al. (2004) relatam que a dinâmica das populações e as condições ambientais variam de acordo com as alterações de cada habitat, o que determina sua ocupação e dinâmica, assim ocorre uma variabilidade considerável dentro das populações de dípteros localizados em regiões separadas. Por isso, a necessidade de ferramentas que viabilizem a identificação de espécies (WELLS; WILLIAMS, 2007). Na decomposição, os padrões e taxas, assim como, os fatores bióticos e abióticos podem ser influenciados por uma variedade de fatores, entre eles estão a temperatura, a umidade e a incidência luminosa. Assim, é possível determinar o tempo de permanência dessas espécies na carcaça, utilizando o período de desenvolvimento dos imaturos (SHALABY; CARVALHO; GOFF, 2000). E, com base nesses dados, é possível determinar o intervalo post-mortem (IPM) do indivíduo. Oliveira-costa (2003), afirma que os sarcofagídeos podem ser utilizados como bioindicadores no intervalo post-mortem de cadáveres humanos em decomposição, tendo considerável importância nos estudos de entomologia forense. Existem dois modelos utilizados em investigações criminais para estimar o IPM: a determinação da idade das larvas ou pupas de diferentes espécies coletadas no local da morte e a partir dos estudos de sucessão cadavérica utilizando, principalmente, carcaças que estejam em um estado avançado de decomposição (BRYRD; CASTNER, 2001). Nos estudos de sucessão, as famílias Calliphoridae, Sarcophagidae e Muscidae são os dípteros mais utilizados em estudos referentes ao IPM, pois fazem parte de 60% das espécies encontradas em carcaças (MISE, 2006). Segundo Galindo (2009), os sarcofagídeos são vivíparos, considerado um dos grupos mais abundantes dentro dos muscóideos sendo encontrados, na sua maioria, em regiões com temperaturas elevadas. As fêmeas depositam suas larvas no primeiro ínstar, geralmente são saprófagas, mas em alguns casos podem parasitar outros insetos ou invertebrados e, também, possuem em torno de 400 gêneros com mais de 2.000 espécies descritas dentro da literatura (MARCHIORI et al., 2003). Em virtude da limitação de textos agregando informações a respeito da biologia das principais famílias de interesse forense, há a necessidade de produção de trabalhos que envolvam um maior aprofundamento das peculiaridades de Sarcophagidae. Dessa forma, há a preocupação de se organizar informações a respeito da biologia das espécies da família Sarcophagidae, tais como, as principais espécies que atuam na sucessão cadavérica, análise dos estágios de desenvolvimento dos imaturos de Sarcophagidae para a determinação do intervalo post-mortem (IPM), uso desses dípteros na detecção de drogas presentes no cadáver e a dinâmica dessas espécies na colonização de carcaças. Por isso, há necessidade de um trabalho bibliográfico que permita agrupar todas essas informações referentes às espécies dessa família de importância forense. O presente trabalho teve como objetivo descrever as principais características biológicas das espécies da família Sarcophagidae de interesse forense. 2. METODOLOGIA Foi feita uma revisão bibliográfica sobre os diversos aspectos da biologia dos sarcofagídeos dentro da entomologia forense. A busca foi realizada por meio de busca em base de dados, tais como, Scielo, NCBI, EBSCO, Science Direct e outros disponíveis. Ainda, foram utilizados livros relacionados ao assunto. 3. DISCUSSÃO 3.1. Entomologia forense A ordem Diptera está entre os insetos que possuem um grande destaque na entomologia forense. Dipõe de características marcantes, tais como, a presença de um par de asas menbranosas, um par de asas modificadas que possuem a função de equilíbrio, na forma de haltéres, clava ou balancins (OLIVEIRA-COSTA, 2003). Considerada por Thompson (2006), a ordem de maior diversidade e com ampla catalogação em toda região biogeográfica. Na história humana, o uso de insetos na busca por respostas para problemas legais ocorre há centenas de anos. Na China do século XII, Sung T’zu foi o primeiro a praticar essa abordagem na solução de um caso de homicídio, no qual a presença de moscas em uma ferramenta em particular foi identificada como provável arma do crime. Após essa descoberta, o dono da ferramenta confessou o ato delituoso (BENECKE, 2001). Segundo estudo realizado por Barros et al. (2008), existe uma vasta diversidade de Sarcophagidae encontrados em cadáveres no Brasil. Sendo registrado por Carvalho e Linhares (2001) existem cerca de 21 espécies na área de São Paulo; em outro trabalho observou-se 19 espécies de Sarcophagidae na região do Rio de Janeiro. Amorin (2009), descreve 194 espécies de Sarcophagidae distribuídas em vinte estados brasileiros. No Brasil os gêneros Oxysarcodexia e Peckia são as que possuem uma maior abundância e riqueza presentes em carcaças. Com um total aproximado de 24,7% e 10,3%, respectivamente. O gênero Sarcophaga com apenas 5,2%. Do território brasileiro utilizando de estudos comparativos de cada espécie catalogada entre os anos de 1938 e 2008, a região do nordeste apresenta um percentual de sarcofagídeos em torno de 68,4% (AMORIN, 2009). A entomologia forense cresceu em termos de estudos e conhecimentos e, ao longo do tempo, apareceram autores que abordaram esse assunto de forma diversificada como, por exemplo, na área de mapeamento de dados geográficos, análises moleculares, aplicacões ecológicas, biológicas ou mesmo da lei (CERRIGATO, 2009). Foi criado em 2002 um projeto (Centro Nacional de Entomologia Forense) financiado pelo Departamento de Justiça, CNPq e Secretaria Nacional de Segurnaça pública, em Brasília–DF, com o propósito de realizar estudos que envolvem a sucessão de artrópodes e manter uma rede de informações com os outros laboratórios que atuam na área (GOMES; VON ZUBEN, 2006). Estudos realizados por Barros et al. (2008), utilizando carcaças de suínos na região de Branzlândia–DF, observou uma abundância elevada de Oxysarcodexia, em seguida pelo gênero Peckia. Em 2006, em local semelhante, constatou-se que as larvas de Peckia trivittata são as primeiras a colonizarem as carcaças, realizando todo o processo de colonização de carcarças antes mesmo que as larvas de califorídeos chegassem ao terceiro ínstar. No arquipélogo de Fernando de Noronha, três espécies de Sarcophagidae mostraram presentes: Peckia chrysostoma, Oxysarcodexia thornax e Tricharaea accidua, surgindo novos registros com o avanço de novas pesquisas (COURI et al., 2008). Rosa (2007) confirma uma grande prevalência de Sarcophagidae com 67,14% de ocorrência, sendo desses, os mais abundantes os indivíduos do gênero Oxysarcodexia presente em todos os estágios de decomposição. Apesar da grande dificuldade de identificação, muitas vezes identificados por meio da análise do aparelho reprodutor masculino. A ordem Peckia, apresenta adultos emergidos nas áreas de colonização criadas nas carcaças, sendo possível coletar no terceiro dia, vários imaturos no segundo estágio de desenvolvimento. De acordo com Martinez-sanchez et al. (2000), existem descritos na literatura sete espécies pertencentes a ordem Sarcophaga. Dentre elas, duas ocorrem no Brasil, a Sarcophaga (liopygia) argyrostoma e Sarcophaga (liopygia) ruficanis, com alta distribuição geográfica. Ainda alguns experimentos realizados por Rinehart et al. (2001), utilizando Sarcophaga crassipalis durante a diapausa com a realização de choques de calor, foi possível determinar que a regulação da proteína 70 (hsp70) com a diapausa, possui um papel importante para a produção dessa proteína que influencia diretamente na dormência dos dipteros. Espécies de Sarcophaga, em seu primeiro ínstar desenvolvem-se em 24 horas. Já alguns autores afirmam, por meio de experimentações laboratoriais, que o seu desenvolvimento se dá em 15 horas. Essa discrepância está associada com o intervalo entre as observações e os variados fatores que influenciam o desenvolvimento do imaturo. Em cadáveres, em uma faixa de temperatura em torno de 26 ºC aproximadamente, os imaturos desenvolvem-se entre 13 a 15,5 dias comprovando que a temperatura corpórea enfluencia no metabolismo das larvas (GUYTON; HALL, 2006). As larvas da Sarcophaga (Bercaea) africa são encontradas em restos de animais, geralmente em fezes humanas e lavatórios, em estudos realizados por Prado; Castro et al. (2010), foi observado quais espécies de Sarcophagidae são atraídas por carcaças de porcos, sendo essa espécie muito utilizada para a determinação do IPM. Ocasionalmente podem causar miíases em humanos. Espécies específicas podem ser encontradas colonizando corpos em variados países como, por exemplo, Sarcophaga (Helicophagella) hirticrus na península ibérica (ROMERA et al., 2003); Sarcophaga (Helicophagella) melanura, é representada abundantemente em cadáveres na Espanha e Sarcophaga (sarcophaga) em portugal (CARLES-TOLRÁ; ROSADO, 2009). Ribeiro (2003), com base em observações, descreve que existe uma variação na preferência de larviposição entre as espécies. Isto é mais comum inicialmente na colonização de orifícios naturais do corpo e, posteriormente, nas áreas pilosas e de elevada umidade. Segundo Archer (2003), espécies de Oxysarcodexia preferem fezes para a larviposição, sugerindo a sua utilização como fonte de proteínas para o acasalamento ou desenvolvimento dos ovócitos. Peckia (Pattonela) intermutans é um sarcofagídeo encontrado nas Américas. Experimento realizado por Rosa (2007) descreve que as larvas abandonaram a carcaça no sexto dia de inverno e na época de verão no terceiro dia. Discrepâncias entre os dias se devem pela capacidade de desenvolvimento dos imaturos em diferentes temperaturas e umidades. Comportamento não observado na maioria dos estudos nos quais se utilizam a carcaça como subtrato de larviposição e criação das larvas. Já Peckia (Squamatodes) tivitatta é considerada uma espécie restrita ao bioma do Cerrado, na literatura não existem registros de importância forense para essa espécie. Provavelmente, isso se deve pela falta de informações das suas características morfológicas. Já em estudo realizado por Anjos (2010), Sarcophagidae representou 72,8% do total de espécies encontradas em carcaças de lagartos e uma frequência de 0,8% em carcaças de codornas apesar da grande abundância. Ainda, no mesmo experimento, foram observadas espécies de Sarcophaga em carcaça de gambá. Moreti et al. (2009) observaram em carcaças de cobras, 27 larvas de Sarcophagidae no segundo ínstar, sendo identificados em sua maioria como machos, sendo possível apenas identificar uma fêmea, classificados especificamente como Microcerella halli às quais possuem preferência por animais em decomposição. 3.2. Principais espécies que atuam na sucessão cadavérica A sucessão ecológica parte do princípio de que os cadáveres são colonizados ao longo da sua decomposição por vários organismos, podendo ocorrer alternância de espécies ou mesmo substituição. É improvavél a obtenção de dados falsos porque as mudanças ocorrem de maneira rápida o que inviabiliza a colonização sucessiva do substrato. Então, de fato um processo confiável (TURCHETTO; VANIN, 2004). Não é um processo projetado e, sim, contínuo com a adição de novas espécies ao longo do tempo. Dessa forma, não é a substituição repentina de espécies com o decorrer da decomposição (MOURA; MONTEIROFILHO; CARVALHO, 2005). Como indicador forense, as espécies são utilizadas como indicador de acordo com as fases bem definidas, mas em estudos realizados em Pernambuco revelaram que em climas temperados, ocorre a sobreposição de gerações das espécies encontradas, dificultando a determinação de uma espécie para um determinado estado de decomposição. Por isso, o cuidado com a identificação de uma associação temporal com o cadáver (CRUZ; VASCONCELOS, 2006). De acordo com as análises forenses, as famílias Calliphoridae e Sarcophagidae, apresentam maior potencial informativo por serem os dípteros que colonizam o corpo em primeiro lugar e apresentam uma sucessão previsível de espécies com o avanço do processo de decomposição (CAMPOSSO et al., 2001). Martinez; Duque; Wolff (2007) realizaram um trabalho de sucessão ecológica na Colômbia, muito semelhante ao clima do Brasil, identificando cinco estágios de decomposição e quais famílias seriam indicadores dos períodos de decomposição. Entre as espécies estudadas, Calliphora nigribasis (Calliphoridae) e Peckia (Pattonela) intermutans (Sarcophagidae) na fase fresca, sendo essa espécie de sarcofagídeo comumente presente tanto na Colômbia quanto no Brazil; Compsomyiops verena (Calliphoridae) na fase de inchaço; algumas espécimes de Oxysarcodexia (Sarcophagidae) em fases mais avançadas e, na fase seca, a presença de coleópteros. A primeira fase, correspondente à decomposição fresca, identificou-se a presença de adultos de Muscidae e Sarcophagidae. Para a fase do inchaço, foram encontrados ovos e larvas de Calliphoridae e adultos de Vespidae. Na fase ativa, estariam presentes as larvas de Sarcophagidae; para o estágio mais avançado seriam as larvas de Piophilidae; e a fase seca, as larvas de Histeridae e Scarabaeidae, ocorrendo o deslocamento do cadáver por arraste e movimentação (WOLFF et al., 2001). Essa divisão da decomposição cadavérica está baseada em um método utilizado e aceito de forma unâmine pelos médicos legistas para determinar a data da morte em humanos, denominadao de cronotanatodiagnóstico (GARCIA-ROJO, 2004). Arnoldos et al. (2001) e Castillo (2002) afirmam que os sarcofagídeos são colonizadores secundários em todas as épocas do ano, exceto no verão pois experimentos realizados em Madri e na Colômbia verificaram ser os primeiros dípteros a colonizar a carcaça. Apesar da necessidade de compreensão dos processos de sucessão de dípteros, a mínima variação de fatores pode implicar na modificação de comportamentos necessitando, assim, um investimento constante na inovação de métodos e técnicas que garantam a acurácia dos resultados que possam ser limitantes da causa, presença ou ausência de substâncias nas carcaças (MILLER; NAPLES, 2002). 3.3. Análise de imaturos para a determinação do IPM É de extrema importância a acurácia na identificação de insetos presentes na decomposição, assim como, conhecer as características biológicas e ecológicas. A determinação correta do IPM depende do local do óbito e do deslocamento do corpo (MAGAÑA et al., 2006). Segundo Neves (2009), existem duas situações que dificultam a estimativa do IPM: a exclusão de espécies do substrato e a redução do tempo necessário para o desenvolvimento. O agregado de larvas cria um microclima com uma temperatura mais elevada do que a temperatura ambiental, devido a sua agregação. Este fator pode acelerar o desenvolvimento dos imaturos e, ainda, matar as larvas que se encontram no centro (SLONE; GRUNER, 2007). Porém, por exemplo, nos sarcofagídeos, existe uma dificuldade pelo grande número de espécies, a falta de diferenças morfológicas, poucas descrições detalhadas dos caracteres morfológicos e nas fases imaturas torna-se mais difícil por suas características semelhantes a outras espécies (THYSSEN et al., 2005), sendo necessário o desenvolvimento em laboratório. Yang (2006) afirma que o comportamento de oviposição também possui a sua importância, pois é fundamental nos sistemas de seleção de um determinado habitat o contexto de interações individuais, afetando a abundância e distribuição das espécies, assim como, a manutenção de ecossistemas. Os ovos eclodirão sincronizados e, como resultado, as larvas se movimentarão sobre o corpo e se alimentarão em bando. Isto resulta em uma disseminação de microrganismos e produção de enzimas digestivas, facilitando o consumo da maioria das partes moles. Atingindo seu tamanho máximo, podem levar vários dias, param a alimentação e começam a migrar para longe da fonte de alimento, reduzindo o ritmo de predação, pois assim não permanecem visíveis a outros animais que estejam a procura de alimento (ERZINÇLIOGLU, 2003). O ciclo de vida dos Sarcophagidae difere dos Calliphoridae pelo fato de não ovipositarem e, sim, depositam as larvas já em seu primeiro estádio no substrato. Como conseqüência, é necessário um desenvolvimento mais lento dentro do corpo da fêmea. Por esse motivo, a produção de descendentes é menor se comparado com as famílias Calliphoridae e Muscidae (RINEHART, 2000). Para a sobrevivência da prole, a fêmea deve escolher o local adequado, uma vez que, as larvas possuem pouca mobilidade sendo dependentes completamente da escolha das fêmeas (NAVARRO-SILVA, 2009). A fêmea pode utilizar sinais químicos ou visuais como recurso para a melhor escolha do local da oviposição, por meio desse comportamento é possível identificar algum tipo de perigo, como a presença de um predador. São capazes de modificar seu comportamento pela presença ou não de competidores ou predadores (ECHEVERRY, 2007). Constatou-se esse comportamento em um estudo realizado por Almeida (2009), ocorrendo uma inibição ou redução da oviposição a substratos contendo larvas. Oliveira-Costa et al. (2001) constataram que Peckia (P) intermutans, desenvolve-se tanto na época de verão como na chuvosa, sendo os mais abundantes sarcofagídeos no cerrado. Esta família é considerada uma indicadora de IPM no estado de São Paulo e encontrada em grandes quantidades em cadáveres na região do Rio de Janeiro. 3.4. Entomotoxicologia A entomotoxicologia é a análise e detecção de sustâncias presentes nos insetos ao se alimentarem das carcaças, auxiliando na identificação de drogas lícitas ou ilícitas utilizadas pelo cadáver (INTRONA; CAMPOBASSO; GOFF, 2001). Este procedimento é bastante eficaz quando não existe vestígio suficiente na forma de tecidos, sangue ou urina de cadáveres que estejam em um nível elevado de putrefação para a determinação de compostos atípicos no cadáver (PIEN et al., 2004). É considerado, segundo Gangliano-Candela; Aventaggiato (2001), uma alternativa de fácil manipulção, apresentando um número reduzido de contaminantes. Em contrapartida, Tracqui et al. (2004) não consideram essa ferramenta confiável, por sua complexidade, pois existem inúmeros fatores que influenciam na concentração das amostras como, por exemplo, a estabilidade das drogas nos restos humanos, nos quais as larvas foram retiradas e a cinética farmacológica das substâncias existentes de cada substância nos imaturos quando for assim determinada. Campobasso et al. (2004), ainda apontam que a não presença de alguma substância na larva não exclui, necessariamante, a ausência do componente no cadáver. O uso abusivo de alguma droga pode ficar tão proeminente sendo possível determinar a quantidade relativa a partir de larvas. Mas em um estudo realizado por Tracqui et al. (2004) ao detectarem um conquetel de drogas (antidepressivos, fenotiazinas, opiáceos, entre outras) coletadas de cadáveres e tecidos em estado de decomposição não conseguiram estabelecer uma relação entre as concentrações existentes nas larvas e nos tecidos humanos, ou seja, ocorreu uma discrepância entre as concentrações. Já Lima (2009) relata que imaturos de Sarcophagidae apresentavam maior concentração de ecstasy do que encontradas nos tecidos do cadáver. A explicação para tal diferença se deve, provavelmente, pela deposição das substâncias na cutícula dos insetos em forma de excreção, ocorrendo uma bioacumulação. Em casos de envenamento, pode ocorrer uma conclusão errada se for estimado o IPM por meio do desenvolvimento das larvas, possuindo uma correlação negativa na colonização de dípteros (LIMA, 2009). Lima (2009) realizou estudos com Sarcophagidae sobre os efeitos da cocaína no desenvolvimento da fase larval quando a droga foi introduzida em fígados de coelhos. Então, foram observados dois tipos de padrão, o primeiro em que tanto as colônias controle como as de dose letal da droga para humanos apresentavam, aproximadamente, a mesma taxa de crescimento enquanto as colônias tratadas com dose letal e as com duas vezes a dose letal desenvolveram-se mais rápido. Quase dez anos depois, GOFF et al. (1994) e LIMA (2009) pesquisaram uma droga comum de abuso nos Estados Unidos, conhecida como PCP (fenciclidina), utilizada comumente por veterinários com efeito anestésico, ao observar o desenvolvimento de imaturos de P. ruficornis, observaram uma mudança no comportamento pós-alimentar, ocorrendo um desenvolvimento acelerado. Em 2001, Musvasva et al., criaram larvas de Sarcophaga tibilis em vários substratos com variadas concentrações de hidorcortisona ou sódio-metohexital e perceberam uma redução no desenvolvimento em ambos os casos, verificando uma tendência oposta ao do estágio larval. Em seus experimentos, as larvas foram capazes de eliminar uma variedade de drogas de diferentes classes e se conseguirem eliminar antes da sua pupação, sua dieta não exerce influência em seu desenvolvimento e comportamento. Em alguns casos de mortes não naturais, foi analisado a partir de um estudo de Cerrigato (2009), comparando uma variabilidade na abundância de espécies de acordo com uma determinada condição de morte. Nesse caso, em homicídios/suicídios observou-se um número elevado de moscas. Em seguida, as mortes com presença de sangue e, por último, a morte natural, sendo possível fazer uma aferição a partir da quantidade de moscas presentes na carcaça. 3.5. Dinâmica de colonização no cadáver A abundância e riqueza de espécies são determinadas pela quantidade de espécies presentes em um determinado habitat e a diversidade refere-se a variedade de espécies (RODRIGUES, 2004). Da mesma maneira que as drogas podem alterar o desenvolvimento de imaturos por retardar ou acelerar seu metabolismo. O mesmo se aplica às condições do corpo como, por exemplo, a submersão ou soterramento, há modificações da fauna colonizadora, o que torna os dados de sucessão cadavérica, na maioria dos casos, inválidos, comparando com cadáveres expostos, pois não são capazes de alcançar o corpo em profundidades maiores que alguns centímetros (WALLACE et al., 2008). Segundo Valle et al. (2007) em um relato de pesquisa da dipterofauna sazonal associada a cadáveres no município de São Paulo, a frequência de Sacophagidae em um cadáver foi de 10%. Isso deve-se, provavelmente, pela decrescente oferta de nutrientes aos imaturos, causando consequentemente uma redução no número de indvíduos presentes no cadáver. A Presença de Califorídeos juntamente com os sarcofagídeos não exerce influência na colonização do cadáver e não necessariamente vai resultar em copetição, uma vez que, as duas famílias usam a carcaça de maneiras diferentes, assim como, seu período de desenvolvimento (SOUZA; KIRST; KRUGER, 2008). A ordem Peckia, possui o tempo médio de desenvolvimento de, aproximadamente, 18 dias na estação chuvosa e 16 dias na estação seca. A velocidade de desenvolvimento é mais acelerada quando existe a presença de baixa umidade e precipicitação pluviométrica, podendo ocorrer pequenas variações entre as espécies dessa ordem (OLIVEIRA-DA-SILVA, 2006). 4. Conclusão Por meio da investigação é possível determinar fatores importantes para a solução de investigações médico-legais. Existem espécies que corroboram com fatos ainda não esclarecidos no andamento das investigações, dentre eles, os Sarcophagidae. Apesar de poucos estudos realizados, a aplicação da entomologia forense se mostra como estratégia metodológica decisiva, visto que o estudo do ciclo de vida, hábitos e sucessões das famílias de Diptera podem ser a chave para a determinação de um acontecimento em um período de tempo. Além disso, esses estudos podem ser consolidados por meio de contribuições do ambiente, tais como, temperatura e umidade. No Brasil, a entomologia forense certamente não atingiu seu ponto crítico em investigações, mas vem crescendo de maneira satisfatória e com o surgimento de novos estudos que possibilitem um esclarecimento ou mesmo uma proposta metodológica, é possível assim averiguar instumentos utilizados, se o cadáver apresenta alguma substância lícita ou ilícita em seus tecidos, por meio da análise desses organismos. Isso apenas aumenta a importância e a necessidade de estudos, pois tornam-se uma ferramenta crucial em investigações de cunho forense. Mas é necesário a cooperação e consolidação dos trabalhos acadêmicos de entomologia forense com a realidade da polícia para que aja maior aproveitamento das informações. 5. Bibliografia ALMEIDA, L. M.; MISE, K. M. Diagnosis and key of the main families and species of South American Coleoptera of forensic importance. Revista Brasileira de Entomologia, v. 53, p. 227-244, 2009. AMORIM, J. A. Levantamento de sarcofagídeos (Diptera) do Brasil incluindo caracterização molecular de Peckia (Pattonella) intermutans (Walker). 2009. 98 f. (Dissertação mestrado em biologia de parasitas e microorganismos) – Universidade Estadual Paulista - Instituto de Biociências, Botucatu, 2009. ANJOS, V. A. Ocorrência de muscóideos necrofágos em carcaças de animais silvestres no município de Capão do Leão, RS, Brasil Pelotas, 2010. 34f. ( Monografia Conclusão de curso) - Instituto de Biologia - Universidade Federal de Pelotas. Pelotas, 2010. ARCHER, M. S.; ELGAR, M. A. 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