FACULDADE DE PARÁ DE MINAS Curso de Pedagogia Denis Carlos da Rocha Um olhar sobre o processo de ensino-aprendizagem da criança surda no primeiro ano do ensino fundamental Pará de Minas 2013 Denis Carlos da Rocha Um olhar sobre o processo de ensino-aprendizagem da criança surda no primeiro ano do ensino fundamental Monografia apresentada à Coordenação de Pedagogia da Faculdade de Pará de Minas como requisito parcial para a conclusão do curso de Pedagogia. Orientadora: Prof. Esp. Marleide de Oliveira Machado. Pará de Minas 2013 Denis Carlos da Rocha Um olhar sobre o processo de ensino-aprendizagem da criança surda no primeiro ano do ensino fundamental Monografia apresentada à Coordenação de Pedagogia da Faculdade de Pará de Minas como requisito parcial para a conclusão do curso de Pedagogia. Aprovada em: _____ / _____ / _____ _________________________________________________________________________ Prof. Esp. Marleide de Oliveira Machado __________________________________________________________________________ Prof. Dr. Flávio Marcus da Silva DEDICATÓRIA Dedico este trabalho, em primeiro lugar e acima de tudo, a Deus, que pela intercessão de Nossa Senhora da Piedade, me deu a oportunidade, a graça, a saúde e a força necessária para concluir mais esta grande etapa da minha vida. A todas as pessoas que fizeram nascer em mim o amor pela Língua Brasileira de Sinais – Libras, em especial às minhas amigas intérpretes Marleide de Oliveira Machado (minha orientadora), Cássia de Almeida Camargos e Lucimar Rosana Cândido Gomes. Aos meus alunos Jordan, Danúbia e Vinícius pelo apoio e incentivo. Ao meu amigo-irmão Lucas Alexander, pela parceira e sintonia incomparável. Ao meu aluno J.P., que está me proporcionando um aprendizado que carregarei por toda minha vida. A toda comunidade surda de Pará de Minas que vem me mostrando a cada dia o encanto de suas mãos. E, finalmente, a todos aqueles que, direta ou indiretamente, colaboraram para a realização desta pesquisa. Pela Vida. Àquele que guiou meus passos, Iluminou meu caminho, Confortou-me nos momentos de desespero, Encorajou-me diante do desânimo, Ouviu minhas preces e súplicas, Fortaleceu minhas fraquezas, E me deu a Dádiva da Vida. Alcancei Sabedoria e Conhecimento. Sem Ti, Oh meu Deus, nada disso seria possível. Quero seguir pela longa jornada da vida repleto de teu Amor e tuas bênçãos. "A gaivota cresceu e voa com suas próprias asas. Olho do mesmo modo como que poderia escutar. Meus olhos são meus ouvidos. Escrevo do mesmo modo que me exprimo por sinais. Minhas mãos são bilíngues. Ofereçolhes minha diferença. Meu coração não é surdo a nada neste duplo mundo..." O vôo da gaivota - Emmanuelle Laborrit RESUMO O presente trabalho tem por objetivo contribuir para a compreensão do processo de alfabetização e letramento da criança surda e promover uma reflexão de como acontece a sua inclusão nas séries iniciais do ensino fundamental nas escolas da rede pública de ensino. Esta pesquisa foi realizada em uma escola pública estadual da cidade de Pará de Minas/MG e a metodologia utilizada foi de revisão bibliográfica e estudo de caso. O desenvolvimento da pesquisa e a fundamentação teórica buscam esclarecer ao leitor, através de um breve histórico da educação de surdos, como foi entendido e tratado o processo de alfabetização e letramento deles através dos tempos. Também sugere um novo olhar sobre esse processo, com base no estudo de caso de um aluno surdo de seis anos de idade, do primeiro ano do ensino fundamental e em estudos recentes realizados na área, por pesquisadores renomados e engajados na luta pela inclusão plena, de direito e de fato, das pessoas surdas, sobre a aquisição da linguagem e da língua de seu país, com suas influências no processo de escolarização, caminhos e descaminhos da inclusão. Através do trabalho de campo, foi possível tecer algumas considerações sobre o tipo de educação oferecida à criança surda observada, como também a forma em que acontece o processo de comunicação e socialização com a comunidade escolar e, em especial, com seus colegas de classe ouvintes. A análise dos resultados obtidos na pesquisa sugere dificuldades de comunicação, de acesso e de oportunidades iguais em um sistema educacional baseado na comunicação oral-auditiva e que não reconhece as diferenças, dificuldades de socialização, de abstração de conceitos comuns no dia a dia de uma criança e também acadêmicos, dentre outros fatores que podem dificultar ou mesmo incapacitar a criança surda no meio acadêmico e para a vida em sociedade. Palavras-chave: Educação de Surdos. Alfabetização. Letramento. Comunicação. Inclusão. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO............................................................................................................... 2 ALGUNS ASPECTOS DA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DE SURDOS, SEUS DESDOBRAMENTOS E INFLUÊNCIAS NA ATUALIDADE.................................... 2.1 A educação de surdos: um breve percurso histórico................................................. 2.2 Metodologias utilizadas na educação de surdos........................................................ 2.2.1 Oralismo...................................................................................................................... 2.2.2 Comunicação total...................................................................................................... 2.2.3 Bilinguismo.................................................................................................................. 2.3 As bases legais que garantem a inclusão de alunos surdos nas escolas de ensino comum................................................................................................................................. 2.4 As implicações na inclusão de alunos surdos nas escolas de ensino comum........... 08 09 09 15 17 18 19 20 23 3 A AQUISIÇÃO DA LÍNGUA ORAL E ESCRITA POR CRIANÇAS SURDAS..... 28 3.1 Implicações linguísticas na educação de surdos........................................................ 28 3.2 O processo de alfabetização e letramento de crianças surdas.................................. 34 4 DESCRIÇÃO DO ESTUDO DE CASO REALIZADO............................................... 38 4.1 Objetivo geral............................................................................................................... 38 4.2 Objetivos específicos..................................................................................................... 38 5 METODOLOGIA UTILIZADA NA PESQUISA........................................................ 39 6 RELATO DAS OBSERVAÇÕES.................................................................................. 42 7 ANÁLISE DOS QUESTIONÁRIOS APLICADOS..................................................... 47 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................... 51 REFERÊNCIAS................................................................................................................. 53 APÊNDICES....................................................................................................................... 56 8 1 INTRODUÇÃO Esta pesquisa surgiu a partir do interesse em aprofundar mais os conhecimentos acerca da Língua Brasileira de Sinais - Libras, após cursar a disciplina oferecida como parte da grade curricular do Curso de Pedagogia da Faculdade de Pará de Minas – FAPAM. Com o passar do tempo, houve um aperfeiçoamento dos conhecimentos sobre a língua de sinais e ampliação do contato com a cultura surda da região, o que suscitou dúvidas e questionamentos que deram vida a essa pesquisa. Ao iniciar o trabalho como intérprete numa escola da rede estadual da região, houve a percepção de que a educação de alunos surdos é uma temática que tem sido muito discutida no cenário da inclusão. O indivíduo surdo enfrenta muitos obstáculos, mas no contexto, parece ser o maior deles o da comunicação que, consequentemente, leva a outras questões dificultadoras. Partindo desses pressupostos, foi realizada uma investigação dos caminhos e descaminhos que essa temática vem alcançando. Sem deixar de esclarecer que ainda estão sendo levantados vários estudos na área da surdez para buscar maneiras de pensar e compreendê-la melhor. No contexto observado, acredita-se que o momento mais crítico da vida de um deficiente auditivo está relacionado ao seu processo de inserção na sociedade e na aquisição da linguagem e de uma língua compartilhada. Sendo assim, sua inserção na escola comum deve ser pensada de forma muito cuidadosa. O objetivo principal da investigação realizada foi analisar todos os aspectos que envolvem o processo de alfabetização e letramento da criança surda em uma escola da rede pública estadual da cidade de Pará de Minas, bem como observar o tipo de educação oferecida a ela. Buscou-se também conhecer as possibilidades de acesso ao conhecimento e as possibilidades de evolução dos níveis de alfabetização e letramento oferecidos a essa criança, tendo como ponto de vista a perspectiva de educação bilíngue em que a Libras é considerada a primeira língua e a Língua Portuguesa oral ou escrita, segunda. Este estudo torna-se relevante, pois procura revelar problemas implicados em experiências de inclusão e tentativas de alfabetização de alunos surdos, indicando a necessidade de pensar formas de adaptação e socialização de crianças ouvintes com as não ouvintes e de utilização de metodologias adequadas e um ambiente linguístico favorável à alfabetização e letramento de crianças surdas. 9 2 ALGUNS ASPECTOS DA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DE SURDOS, SEUS DESDOBRAMENTOS E INFLUÊNCIAS NA ATUALIDADE 2.1 A educação de surdos: um breve percurso histórico Diante da realidade educacional brasileira, a educação de pessoas com algum tipo de deficiência tornou-se um desafio e talvez seja um reflexo histórico dessa modalidade de educação no Brasil e no mundo. A história da educação especial revela que durante muitos séculos as pessoas com deficiência eram evitadas, ignoradas e até mesmo abandonadas. O que havia de aprendizado escolar era muito particular. Os marcos históricos são importantes para que se possa entender os rumos que essa modalidade de ensino veio assumindo ao longo dos séculos e, nesse sentido, Lacerda (1998, p. 1) afirma que é somente a partir do século XVI que a educação especial começa a ser estudada e defendida por médicos e educadores. No que tange à Educação de pessoas Surdas, que é o tema desta pesquisa, é também nessa época que se começa a admitir a possibilidade de aprenderem através de procedimentos pedagógicos, tendo em vista o desenvolvimento do pensamento, a aquisição de conhecimentos e a comunicação com os ouvintes. Mas, infelizmente, o marco principal foi o descaso por essas pessoas. Na Antiguidade, os surdos eram considerados como incapazes de aprender e restavam a eles os trabalhos mais desprezíveis, viviam sozinhos e eram ignorados pela sociedade. A surdez era eliminada com a morte ou com o abandono. (BAGGIO; CASA NOVA, 2011, p. 23). Assim, torna-se impossível pensar que num contexto como esse, houvesse qualquer tipo de alfabetização e instrução desses indivíduos que eram vistos como incapazes de aprender. Esse fato deixou uma dívida histórica que reflete até hoje no sistema educacional e na sociedade como um todo. Nesse sentido Soares (2005, p. 11-12) afirma que, Um trabalho de caráter histórico referente a uma área da Educação Especial, no caso, a educação do deficiente auditivo, deve, primeiramente, romper com o comportamento vicioso, de procurar explicações no interior dela própria, ignorando seu caráter duplamente fragmentário. 10 Baggio e Casa Nova (2011, p. 24) afirmam ainda que, “é só a partir do ano de 1755 que surgem informações sobre os surdos em situações educacionais que privilegiam o uso da língua de sinais e a presença de professores surdos na educação de surdos”. As situações educacionais que envolviam os surdos foram ganhando espaço. Entretanto, como afirma Lacerda (1998, p.1-2), era comum na época manter em segredo o modo como se ensinava aos surdos. Cada pedagogo trabalhava de forma independente e não havia partilha de conhecimentos. Assim, torna-se difícil ter conhecimento dos trabalhos que eram desenvolvidos nessa época e, com isso, muitos deles se perderam. Ainda de acordo com essa autora, os surdos que se beneficiavam das técnicas de leitura e escrita para desenvolver habilidades tais como leitura labial e articulação das palavras, eram muito poucos. Dessa forma, “a educação especial foi constituindo-se como um sistema paralelo ao sistema educacional geral, até que por motivos morais, lógicos, científicos, econômicos e legais, surgiram as bases para uma proposta de unificação.” (MENDES, 2006, p. 388) E, assim, a educação especial, que era um sistema paralelo, não era uma modalidade, era um sistema à parte, tomou novos rumos passando a existir de forma unificada com a educação regular. A Inclusão propõe a unificação dos sistemas. Entende-se, hoje, por Educação Especial, (...) um processo educacional definido em uma proposta pedagógica que assegure recursos e serviços educacionais especiais, organizados institucionalmente para apoiar, complementar, e em alguns casos substituir os serviços educacionais comuns de modo a garantir a educação escolar e promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades educativas especiais, em todas as etapas e modalidades da educação básica. (BRASIL, 2001, p. 39). As origens dos debates sobre inclusão escolar tiveram suas raízes em solo norte americano, mais especificamente nos Estados Unidos. Mendes (2006, p. 391) menciona que, por causa da força de penetração da cultura desse país, o movimento pela inclusão ganhou a mídia e o mundo ao longo da década de 1990. Ainda de acordo com a autora, a reestruturação das escolas aumentou também a consciência e o respeito à diversidade, produzindo mudanças no papel da escola. Nesse sentindo, Glat (2007, p. 20) sustenta que, A Educação Inclusiva significa um novo modelo de escola em que é possível o acesso e a permanência de todos os alunos, e onde os mecanismos de seleção e discriminação, até então utilizados, são substituídos por procedimentos de identificação e remoção das barreiras para a aprendizagem. Para tornar-se inclusiva a escola precisa formar seus professores e equipe de gestão, e rever as formas de interação vigentes entre todos os segmentos que a compõe e que nela interferem. Precisa realimentar, sua estrutura, organização, seu projeto político-pedagógico, seus recursos didáticos, metodologias e estratégias de ensino, bem como suas práticas 11 avaliativas. Para acolher todos os alunos, a escola precisa, sobretudo, transformar suas intenções e escolhas curriculares, oferecendo um ensino diferenciado que favoreça o desenvolvimento e a inclusão social. Nesse resgate histórico, evidencia-se uma lentidão na construção de um sistema educacional que atenda a “todos” e respeite a diversidade em suas necessidades, sem perder de vista o acesso aos conhecimentos e fluxo de aprendizagem. Portanto, podemos identificar, na atualidade, desafios específicos na educação de pessoas com deficiência e especificamente na educação de pessoas surdas que podem advir desse contexto e serem acentuados, ainda hoje, por outras situações. A educação de surdos no Brasil e especificamente na cidade de Pará de Minas é, ainda, um assunto muito inquietante pelas dificuldades já citadas e também pelas limitações linguísticas, de comunicação, de representação política, pela falta de profissionais capacitados e efetivação de políticas públicas e educacionais que deem vez e “voz” aos surdos, que reconheçam, de fato, a diferença, conforme já dizia Skliar (2012, p. 25-26), A educação dos surdos pode muito bem ser definida, ao menos em nosso continente, com uma história de impossibilidades. A impossibilidade de se falar para e pelos surdos, a impossibilidade dos surdos de se falarem para e pelos ouvintes e por eles mesmos, e a impossibilidade dessas falas serem reunidas, visando à organização de uma política educacional que reconheça a diferença. Marcada por várias tendências pedagógicas e correntes filosóficas que devem ser compreendidas em seu momento histórico, a educação escolar de pessoas com surdez nos reporta não somente a questões referentes aos seus limites e possibilidades, como também aos preconceitos advindos de sua participação na educação escolar. Foi dentro de um contexto histórico conturbado que se começa a traçar gradativamente uma educação pautada em princípios pedagógicos, mesmo que equivocados, e que possibilitem, hoje e futuramente, que o surdo possa apropriar-se de sua cultura e constituir-se como sujeito de fato, conforme diz Soares (2005, p. 25), Com relação à utilização da escrita na educação de surdos, nos séculos XVI e XVII, cabe indagar se a escrita teria sido empregada, não como um conhecimento valorizado e exigido para inserção social, tal como ocorreu nos séculos posteriores, mas como um recurso que podia ser utilizado em substituição à fala. Haveria, então, nesse caso, uma priorização da linguagem escrita secundarizando-se a linguagem oral, não pelo fato de se julgar necessário ao surdo a obtenção desse tipo de conhecimento, mas, sim, por se constituir em elemento facilitador para sua participação social. 12 Ainda no século XVII, diferentemente de seus contemporâneos que priorizavam a fala e a escrita na educação de surdos, o abade de L’Epée foi o precursor da língua de sinais e criou a primeira escola de surdos do mundo, o Instituto Nacional de Surdos-Mudos de Paris, no ano de 1755, que adquiriu fama internacional. L’Epée acreditava que ensinar o surdo a falar era perder tempo, contudo era necessário ensinar-lhe a língua gestual. A escola fundada por L’Epée é considerada o marco da formação das comunidades surdas e da luta pelos direitos de cidadania do surdo, principalmente, o direito de utilizar a língua de sinais. (...) No Brasil, os ideais do abade chegaram pelas mãos de Hernest Huet, professor Francês que, em 1857, a convite de D.Pedro II, fundou o Instituto Nacional dos Surdos-Mudos. (BAGGIO; CASA NOVA, 2011, p. 24-25). A utilização da língua de sinais possibilitou um avanço histórico nas conquistas e reconhecimento do surdo pela escola e pela sociedade. Todavia, surgiram várias críticas que iam de desencontro aos métodos utilizados pelo abade francês. A maioria desses críticos eram pedagogos oralistas, tais como Heinicke, na Alemanha. Lacerda (1998, p. 3) afirma que “Heinicke é considerado o fundador do oralismo e de uma metodologia que ficou conhecida como o ‘método alemão’. Para ele, o pensamento só é possível através da língua oral, e depende dela. A língua escrita teria uma importância secundária”. No final do século XVIII, começaram a aparecer divergências entre os pedagogos que discutiam o método mais adequado para a educação dos surdos. Nesse sentido Baggio e Casa Nova (2011) salientam que, enquanto os adeptos de L’Epée defendiam o uso da língua de sinais, outros renomados educadores, como Samuel Heinicke, defendiam o método oral que priorizava o ensino da fala. Em decorrência dessas divergências, em 1880, deu-se a realização do congresso de Milão, Esse congresso é considerado um marco histórico devido à completa mudança que trouxe a respeito da surdez e da educação dos surdos mundialmente. Organizado por uma maioria oralista, teve como principal resultado o banimento da língua de sinais e eleição da metodologia oral como exclusiva para a educação dos surdos (...) As decisões tomadas no Congresso de Milão levaram a que a linguagem gestual fosse praticamente banida como forma de comunicação a ser utilizada por pessoas surdas no trabalho educacional (...). (BAGGIO; CASA NOVA, 2011, p. 26). Ainda de acordo com essas autoras, após esse congresso, desaparece a figura do professor surdo e termina a convivência pacífica entre a língua falada e a linguagem gestual na educação dos surdos, trazendo inúmeros prejuízos para a educação dos surdos. 13 Oralismo, ou método oral, é o processo pelo qual se pretende capacitar o surdo na compreensão e na produção de linguagem oral e que parte do princípio de que o indivíduo surdo, mesmo não possuindo o nível de audição para receber os sons da fala, pode se constituir em interlocutor por meio da linguagem oral. (SOARES, 2005, p. 1). Assim, no mundo todo, a partir do Congresso de Milão, o oralismo foi vastamente difundido. Foi um período de repressão da expressão gestual dos surdos os quais foram proibidos de utilizarem as línguas de sinais. Isso não revelou avanço no processo educacional deles conforme discorre Lacerda (1998, p. 4), citando (JOHNSON et al., 1991; FERNANDES; 1989), que faz uma importante consideração diante dessa abordagem: O oralismo foi o referencial assumido e as práticas educacionais vinculadas a ele foram amplamente desenvolvidas e divulgadas. Essa abordagem não foi, praticamente, questionada por quase um século. Os resultados de muitas décadas de trabalho nessa linha, no entanto, não mostraram grandes sucessos. A maior parte dos surdos profundos não desenvolveu uma fala socialmente satisfatória e, em geral, esse desenvolvimento era parcial e tardio em relação à aquisição de fala apresentada pelos ouvintes, implicando um atraso de desenvolvimento global significativo. Somadas a isso estavam as dificuldades ligadas à aprendizagem da leitura e da escrita: sempre tardia, cheia de problemas, mostrava sujeitos, muitas vezes, apenas parcialmente alfabetizados após anos de escolarização. Diante de vários estudos e análise de diversas fontes bibliográficas, constata-se que a partir do congresso de Milão, inicia-se uma longa batalha em defesa do direito de se utilizar a língua de sinais novamente, tendo o ano de 1880 como clímax da história, quando os surdos travam um duelo entre o direito de usar a língua de sinais e/ou o oralismo. Eles são obrigados a abandonar a sua cultura, a sua identidade e incorporar-se totalmente às práticas ouvinistas e nenhum outro evento teve impacto maior do que esse na vida e na educação de surdos. Seus efeitos e ruptura ainda são lembrados, até hoje, pelas comunidades surdas. Entretanto e felizmente, apesar da proibição do uso de sinais nas escolas, os surdos continuaram a usar sua língua nos espaços de convivência. De acordo com Lacerda (1998, p. 5), “apesar da proibição, raramente se encontrava uma escola ou instituição para surdos que não tivesse desenvolvido, às margens do Sistema, um modo próprio de comunicação através dos sinais”. Mas foi somente a partir de 1960 e início dos anos 70 que apareceu uma nova concepção de educar os surdos em substituição ao oralismo puro. (GONÇALVES; SANTOS, 2012). Foi nessa época, após o fracasso do Oralismo para muitos surdos que não tiveram o sucesso esperado na leitura labial e aquisição da fala, que surgiu a Comunicação Total, desenvolvida, segundo Sá (1999), por Dorothy Shifflet, professora secundária, mãe de uma 14 menina surda, que descontente com os métodos oralistas, começou a utilizar um método que combinava sinais, fala, leitura labial e treino auditivo em uma escola na Califórnia, denominando seu trabalho de Total Approach – Abordagem Total. A Comunicação Total consistia no uso simultâneo de palavras e sinais, ou seja, no uso simultâneo de uma língua oral e de uma língua sinalizada. Ainda nessa época, após estudos realizados na área da Linguística, começou-se a comprovar que as línguas de sinais são línguas legítimas com status linguístico e tão completa e complexa quanto qualquer outra língua. Alguns autores se posicionaram criticamente em relação a essa modalidade mista, acreditando que o uso simultâneo de duas línguas resulta numa mistura que confunde, já que a língua oral majoritária se sobrepõe à língua de sinais. Essa prática do uso da comunicação total recebeu também o nome de “bimodalismo”, encorajando o uso inadequado da Língua de Sinais, já que a mesma tem gramática diferente das línguas orais. A modalidade Bilíngue é uma proposta de ensino que propõe o acesso dos sujeitos surdos a duas línguas no contexto social e escolar. As pesquisas têm mostrado que essa proposta é a mais adequada para o ensino de crianças surdas, tendo em vista que considera a Língua de Sinais como primeira língua e, a partir daí, se passa para o ensino da segunda língua que, no caso do nosso país, é o Português que pode ser na modalidade escrita ou oral. Na ideologia de bilinguismo, as crianças surdas precisam ser postas em contato primeiramente com pessoas fluentes na Língua de Sinais, sejam seus pais, professores ou outros. Em 1984, a UNESCO declarou que a língua de sinais deveria ter o mesmo reconhecimento que outros sistemas linguísticos, e no Brasil a Língua Brasileira de Sinais (Libras) foi reconhecida e oficializada através da lei federal 10.436 de 24 de abril de 2002 (BRASIL, 2002) e regulamentada através do Decreto n° 5.626 de 22 de dezembro de 2005 (BRASIL, 2005) que assim a define, Art. 1º É reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua Brasileira de Sinais - Libras e outros recursos de expressão a ela associados. Parágrafo único. Entende-se como Língua Brasileira de Sinais - Libras a forma de comunicação e expressão, em que o sistema lingüístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constituem um sistema lingüístico de transmissão de idéias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil. Art. 2º Deve ser garantido, por parte do poder público em geral e empresas concessionárias de serviços públicos, formas institucionalizadas de apoiar o uso e difusão da Língua Brasileira de Sinais - Libras como meio de comunicação objetiva e de utilização corrente das comunidades surdas do Brasil. 15 Art. 3º As instituições públicas e empresas concessionárias de serviços públicos de assistência à saúde devem garantir atendimento e tratamento adequado aos portadores de deficiência auditiva, de acordo com as normas legais em vigor. Art. 4º O sistema educacional federal e os sistemas educacionais estaduais, municipais e do Distrito Federal devem garantir a inclusão nos cursos de formação de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério, em seus níveis médio e superior, do ensino da Língua Brasileira de Sinais - Libras, como parte integrante dos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs, conforme legislação vigente. Parágrafo único. A Língua Brasileira de Sinais - Libras não poderá substituir a modalidade escrita da língua portuguesa. Diante desse histórico da educação de surdos, da pesquisa realizada e do estudo de caso, é possível verificar, na atualidade, que ainda persiste uma considerável desigualdade entre surdos e ouvintes e muitos problemas vêm sendo enfrentados quando o assunto é a inclusão de alunos surdos nas classes de ensino comum, pois geralmente o acesso a sua língua materna é tardia, dificultando o acesso aos conhecimentos socialmente construídos. Isso nos leva a refletir sobre a necessidade de um atendimento diferente e qualificado nas escolas, que supram às suas peculiaridades e também de revisões e adaptações curriculares. Os surdos são usuários de outra língua, de modalidade gestual-visual, diferente do grupo majoritário que utiliza uma língua oral-auditiva e, além das diferenças linguísticas, ainda existem as diferenças culturais que acentuam ainda mais esta desigualdade. Em relação à sociedade, faz-se necessário que aprenda a conviver com essas diferenças. É uma tarefa ampla e de todos, não apenas da escola e do professor, pois o surdo é um cidadão comum e de direitos, que vive e convive em sociedade e que grita por uma inclusão plena e não apenas escolar. Ainda é preciso que haja mais investimentos em políticas públicas voltadas para a educação das pessoas surdas. Os surdos estão inclusos na rede comum de ensino, porém falta preparo por parte da comunidade escolar para que, de fato, ocorra uma aprendizagem significativa que vá de encontro a todas as suas habilidades, capacidades e limitações. 2.2 Metodologias utilizadas na educação de surdos As bases teóricas e filosóficas que têm orientado a educação de surdos são baseadas em três grandes correntes: o oralismo, a comunicação total e o bilinguismo e, conforme Soares (2005, p. 3), “na educação de surdos, a maioria das pesquisas tem-se prendido ao estudo da linguagem, ora voltado à língua de sinais, ora voltados à linguagem oral; atualmente, parecem predominar os estudos voltados à língua de sinais”. 16 Diante desse contexto e enfatizando o processo de alfabetização e letramento do aluno surdo, torna-se ainda mais minucioso o olhar diante desse aluno que está iniciando o seu contato com o conhecimento formal e convívio social. Dessa maneira, Quadros (1997, p. 28), afirma que, Considerando o aspecto psicossocial, a criança surda irá integrar-se satisfatoriamente à comunidade ouvinte se tiver uma identificação bastante sólida com o seu grupo; caso contrário, ela terá dificuldades tanto numa comunidade quanto na outra, apresentando limitações sociais e lingüísticas algumas vezes irreversíveis. Um aspecto a ser observado, de acordo com Quadros (1997, p. 40), é que já podemos falar em avanços no processo educacional da criança surda, que apesar de estarem em andamento, de não serem realidade na maioria das escolas, torna-se relevante serem citados em estudos e pesquisas de forma a fundamentá-los. Dentre os avanços mais importantes podemos citar: a) o reconhecimento da pessoa surda como cidadã, integrante de uma comunidade surda com o direito da aquisição da LIBRAS como primeira língua; b) o uso da língua de sinais nas escolas para garantir o desenvolvimento cognitivo; c) a aquisição da língua portuguesa como segunda língua e; d) a inclusão de pessoas surdas nos quadros funcionais das escolas. Com base nessa realidade mais animadora, é importante então tomar conhecimento das correntes filosóficas e teóricas que têm norteado a educação de surdos através dos tempos para melhor apoiá-los em suas necessidades. Teremos o cuidado de evitar julgamentos de certo ou errado, pois todas elas dependeram do contexto histórico em que surgiram e objetivaram melhorar a educação dos surdos. Se houve equívocos, eles sempre existiram e haverão de existir no processo contínuo de construção e reconstrução dos processos educacionais. Em cada uma das correntes metodológicas e filosóficas houve beneficiados e não só prejudicados, conforme relatos históricos. Há de se conhecer todas elas e utilizá-las de acordo com a vontade e necessidade da pessoa mais importante nesse processo: o aluno surdo. 17 2.2.1 Oralismo Conforme já citado neste estudo, o Congresso de Milão foi o ponto de partida para adotar o oralismo como meio mais adequado no ensino de surdos e até hoje é a metodologia predominante em alguns países. “Essa concepção fundamenta-se na recuperação da pessoa surda, chamada de ‘deficiente auditivo’, e enfatiza a língua oral em termos terapêuticos”. (BAGGIO; CASA NOVA, 2011, p. 39) com técnicas muito bem definidas como: treinamento auditivo; treinamento da fala e exercícios de leitura labial. De acordo com Soares (2005, p. 5), na utilização do método oral, tem-se a impressão de que a escolaridade do surdo é colocada em segundo plano. São exaustivos treinos auditivos e de fala, muitas vezes de forma descontextualizada, como pré-requisito para o acesso aos conteúdos acadêmicos. A opção pelo método oral parte do pressuposto de que, A criança surda deve inicialmente ser introduzida na linguagem oral antes de iniciar seu conhecimento através da escrita. Isso significa que todos os conceitos relacionados às disciplinas contidas no currículo escolar devem inicialmente ser aprendidas através da linguagem oral e, a partir desta aquisição, é que gradativamente vai sendo exposto o conteúdo escolar. A aquisição da linguagem oral é pré-requisito para a aquisição da linguagem escrita e, por isso, é dada maior ênfase nas atividades de treinamento dos órgãos fono articulatórios e aproveitamento dos resíduos auditivos. (SOARES, 2005, p. 2). Estudos desenvolvidos revelaram uma evolução na aquisição da linguagem por alguns surdos expostos ao método oral, mas também evidenciaram contrapontos em relação a utilização deles, Em relação ao oralismo, alguns aspectos do trabalho educativo foram melhorados e que os surdos, no final do processo escolar, conseguem compreender e se comunicar um pouco melhor. Entretanto, segundo essas análises avaliativas, eles apresentam ainda sérias dificuldades em expressar sentimentos e idéias e comunicar-se em contextos extra-escolares. Em relação à escrita, os problemas apresentados continuam a ser muito importantes, sendo que poucos sujeitos alcançam autonomia nesse modo de produção de linguagem. Observam-se alguns poucos casos bemsucedidos, mas a grande maioria não consegue atingir níveis acadêmicos satisfatórios para sua faixa etária. (LACERDA, 1998, p. 6). Muitas vezes, surdos que eram atendidos pelo método oral comunicavam-se precariamente, uma vez que eles não compreendiam os sinais e nem adquiriam, de fato, uma língua oral. De acordo com grande parte dos teóricos e pesquisadores, o uso do método oral puro trouxe como consequência um retrocesso nas conquistas educacionais dos sujeitos 18 surdos e embora fosse forte a sua influência, os surdos organizavam-se, clandestinamente, em associações para viverem sua cultura e, principalmente, fortalecerem sua identidade. 2.2.2 Comunicação total De acordo com Lacerda (1998, p. 7), “o que a comunicação total favoreceu de maneira efetiva foi o contato com sinais, que era proibido pelo oralismo, e esse contato propiciou que os surdos se dispusessem à aprendizagem das línguas de sinais (...)”. Conforme menciona a autora, paralelamente ao desenvolvimento das propostas de comunicação total, estudos sobre línguas de sinais foram se tornando cada vez mais estruturados. Baggio e Casa Nova (2011, p. 41) apresentam uma definição sobre a Comunicação Total citada frequentemente, A comunicação Total é uma proposta flexível no uso de meios de comunicação oral e gestual. Consolida-se mais como filosofia do que como um método de educação. Fundamenta-se no respeito às diferenças, e em uma maneira própria de entender o surdo como pessoa e não como portador de uma patologia de ordem médica. Enfatiza que as línguas de sinais e as línguas orais são línguas autênticas, equivalentes em níveis de qualidade e importância. Privilegia a comunicação e a interação e não apenas a língua (ou línguas). Defende a utilização de qualquer recurso lingüístico, seja a língua de sinais, a linguagem oral ou os códigos manuais, bem como o uso de aparelhos de amplificação sonora, trabalho de desenvolvimento de pistas auditivas e leitura orofacial para facilitar a comunicação com as pessoas surdas. Baggio e Casa Nova (2011) continuam suas exposições afirmando que no Brasil, a comunicação total firmou-se com o nome de bimodalismo – método que envolve a combinação das duas modalidades: sinais e fala. Essa metodologia substitui ou complementa os recursos utilizados por métodos exclusivamente orais e defende a ideia de que a língua de sinais é a língua natural dos surdos e essa, por sua vez, constitui-se em elemento indispensável na sua cultura. Quadros (2003, p. 26) se posiciona acerca do Oralismo e Bimodalismo nas escolas brasileiras de uma forma que vale a pena ser mencionada para fundamentar ainda mais esse estudo, As duas primeiras fases constituem grande parte da educação de surdos no Brasil. Ainda hoje estão sendo desenvolvidos o oralismo e o bimodalismo nas escolas brasileiras; porém, há algo que está aflorando nas comunidades de surdos e isto tem afetado os educadores de surdos. As comunidades surdas estão despertando e 19 percebendo que foram muito prejudicadas com as propostas de ensino desenvolvidas até então e estão percebendo a importância e valor da sua língua, isto é, a LIBRAS. Além desse despertar, os profissionais da área da surdez estão tendo acesso a informações que são resultados de pesquisas e estudos sobre as línguas de sinais, possibilitando assim uma retomada dos conceitos estruturados de surdez e língua de sinais. Assim, a educação de surdos no Brasil está entrando em uma terceira fase, que caracteriza um período de transição. Os estudos estão apontando numa direção de uma proposta educacional bilíngüe. A utilização da comunicação total, ou bimodalismo, é considerada ineficaz para muitos teóricos, dentre eles, Quadros (1997). Segundo ela, o bimodalismo acaba por desconsiderar a riqueza estrutural da língua de sinais, desestruturando também o português, artificializa a comunicação e desconsidera implicações sociais da surdez. Sendo assim, os autores chegam a afirmar que a comunicação total serve mais aos pais e professores ouvintes do que aos alunos surdos. Muitos surdos expostos a essa metodologia continuaram com defasagens tanto na leitura e na escrita como no conhecimento dos conteúdos escolares. 2.2.3 Bilinguismo De acordo com Gonçalves e Santos (2012), o bilinguismo é considerado por muitos autores como uma abordagem educacional, cujo objetivo é habilitar o surdo a utilizar-se de duas línguas: a língua de sinais como língua primeira e em seguida a língua majoritária de seu país. Habilitar é mais que permitir, expor, ter contato, é tornar-se competente nas duas línguas e não apenas ter acesso a fragmentos dela. Esse modo de educar surdos contrapõe aos demais modelos anteriores conforme relata Lacerda (1998, p. 7), O modelo de educação bilíngüe contrapõe-se ao modelo oralista porque considera o canal viso gestual de fundamental importância para a aquisição de linguagem da pessoa surda. E contrapõe-se à comunicação total porque defende um espaço efetivo para a língua de sinais no trabalho educacional; por isso advoga que cada uma das línguas apresentadas ao surdo mantenha suas características próprias e que não se "misture" uma com a outra. Nesse modelo, o que se propõe é que sejam ensinadas duas línguas, a língua de sinais e, secundariamente, a língua do grupo ouvinte majoritário. A língua de sinais é considerada a mais adaptada à pessoa surda, por contar com a integridade do canal visogestual. Porque as interações podem fluir, a criança surda é exposta, então, o mais cedo possível, à língua de sinais, aprendendo a sinalizar tão rapidamente quanto as crianças ouvintes aprendem a falar. Ao sinalizar, a criança desenvolve sua capacidade e sua competência lingüística, numa língua que lhe servirá depois para aprender a língua falada, do grupo majoritário, como segunda língua, tornando-se bilíngüe, numa modalidade de bilingüismo sucessivo. Essa situação de bilingüismo não é como aquela de crianças que têm pais que falam duas línguas diferentes, porque nesse caso elas aprendem as duas línguas usando o canal auditivo-vocal num bilingüismo contemporâneo, enquanto no caso das crianças surdas, trata-se da aprendizagem de duas línguas que envolvem canais de comunicação diversos. 20 Mas é importante ressaltar que não basta ofertar uma educação bilíngue. Quadros (1997, p. 28) argumenta que “além de ser uma proposta bilíngue, deve ser bicultural para permitir o acesso mais rápido e natural da criança surda à comunidade ouvinte e para fazer com que ela se reconheça como parte de uma comunidade surda”. A oferta de educação bilíngue exige um compromisso por parte das políticas públicas, da família e de toda a comunidade escolar para que seja respeitada a produção linguística da criança surda e suas peculiaridades a fim de ocorrer uma aprendizagem significativa. 2.3 As bases legais que garantem a inclusão de alunos surdos nas escolas de ensino comum A Constituição Federal de 1988 elege, em seus artigos, o direito à cidadania e à dignidade da pessoa, a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3º, inciso IV). Na Constituição é efetivamente garantido o direito de todos à educação de qualidade, bem como o atendimento às necessidades de cada um. Estabelece que o atendimento educacional especializado às pessoas portadoras de deficiência deveria ser, preferencialmente, na rede regular de ensino e em seu artigo 205 explicita que, A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (BRASIL, 2003). Portanto, os alunos com deficiência devem sim estar juntos com os demais alunos dentro de uma escola comum. E, para que isso ocorra, é necessário haver oferta de uma educação especial de fato, com todos os apoios necessários. O Brasil fez opção pela construção de um sistema educacional inclusivo ao concordar com a Declaração Mundial de Educação para Todos e ao mostrar consonância com os postulados produzidos em Salamanca (Espanha) em 1994, onde foi produzido um documento oficial que legalizava a inclusão dos alunos surdos nas salas regulares de todas as Instituições escolares com acompanhamento especializado e direito de ser respeitado na sua língua – a língua de sinais. Esse documento ficou conhecido mundialmente como a Declaração de Salamanca. 21 A partir daí, passa-se então a pensar em um processo mais aprofundado de inclusão e essa declaração é tida como o mais importante marco mundial na difusão da filosofia da educação inclusiva. A educação especial reveste-se de novo conceito e as propostas pedagógicas passam a incorporar os discursos do “educar para a diversidade” e do “respeito às diferenças”. (FEDERAÇÃO NACIONAL DE EDUCAÇÃO E INTEGRAÇÃO DOS SURDOS, 2005). Interessantemente, a Declaração de Salamanca (1994) aponta algumas linhas de ações específicas buscando reconhecer as diferenças e, dentre elas, algumas que fazem referência à educação de surdos que são, muitas vezes, desconsideradas, ainda hoje, pelos órgãos competentes na promoção da educação para todos, As políticas educativas deverão levar em conta as diferenças individuais e as diversas situações. Deve ser levada em consideração, por exemplo, a importância da linguagem dos sinais, como meio de comunicação para os surdos, a ser assegurado a todos os surdos, acesso ao ensino da linguagem de sinais de seu país. Face às necessidades específicas de comunicação de surdos e de surdos-cegos, seria mais conveniente que a educação lhes fosse ministrada em escolas especiais ou em classes ou unidades especiais nas escolas comuns. Mesmo desconsiderada em vários pontos, essa declaração suscitou a criação de várias outras leis, decretos e orientações que foram surgindo para regulamentação e organização do almejado Sistema Educacional Inclusivo. A LDBEN - Lei 9394/1996, Lei de diretrizes e bases da educação nacional, em seu art. 58 Cap. V (BRASIL, 1996) define a Educação Especial como modalidade escolar para educandos portadores de necessidades educacionais especiais, ofertada preferencialmente na rede regular de ensino. Determina ainda que é dever de toda instituição de ensino receber esses alunos e que cabe aos pais a escolha da instituição. As Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (Resolução CNE/CEB nº. 02/2001) no artigo 2º também orienta: Os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos, cabendo às escolas organizarem-se para o atendimento aos educandos com necessidades educacionais especiais, assegurando as condições necessárias para uma educação de qualidade para todos. (BRASIL, 2001, p. 39). O Parecer 424/03 e a Resolução 451/03, do Conselho Estadual de Educação, propõem e fixam normas para a Educação Especial na Educação Básica no Sistema Estadual de Ensino de Minas Gerais. 22 A proposta inclusiva é abrangente e refere-se a todos os alunos, inclusive aos que têm deficiência e propõem ressignificar ações na educação escolar garantindo o acesso para a aprendizagem acadêmica. No que diz respeito à educação de surdos, a Lei 10.436, promulgada em 24 de Abril de 2002, reconhece a Libras como meio legal de comunicação e expressão das comunidades surdas brasileiras. Ainda afirma que os sistemas educacionais devem garantir a inclusão do ensino da Libras nos cursos de licenciatura, observando que ela não poderá substituir a modalidade escrita da língua portuguesa. O Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005 regulamenta a Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras, e o art. 18 da Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000 que determina a obrigatoriedade da acessibilidade e dá providências também sobre a língua de sinais. Sobre o Decreto, Gonçalves e Santos (2012, p. 233), dizem: Esse documento instaura na educação especial o que estamos defendendo como educação bilíngüe para os Surdos. Então o fato de ter um decreto que legaliza a LIBRAS como sistema lingüístico viso-motora no Brasil, e ainda contemplar uma estrutura gramatical, pode definir a partir de então a construção da identidade surda dentro do espaço escolar como grande objetivo educacional. Daí a importância de começar na alfabetização o processo de conhecimento dessa língua para os não ouvintes. Apesar de considerarmos como política educacional recente, podemos afirmar que no Brasil já se conseguiu avançar no que diz respeito à inserção dessa lei e, por conseguinte, na valorização do bilinguismo. Sabe-se hoje, que a Política de Inclusão Educacional do MEC – Ministério da Educação e Cultura, pressupõe que todos os alunos devem participar das classes comuns da rede de ensino com igualdade de oportunidades, respeitados os ritmos e estilos de aprendizagem, desenvolvendo atitudes, habilidades e valores no convívio com a diversidade. Sugere que as Escolas Especiais realizem uma revisão conceitual envolvendo os aspectos técnico-pedagógicos, administrativo e financeiro revisando seus projetos pedagógicos e seus regimentos, considerando o direito de todos à educação, a não discriminação e à inclusão educacional e social. Orienta a criação de serviços de apoio pedagógico especializado, destacando o caráter transitório das matrículas em escolas especiais. Orienta que os sistemas de ensino dotem seu quadro funcional com professores capacitados e especializados; prevê um currículo flexível, considerando o significado dos conteúdos, a metodologia de ensino, os recursos didáticos e os processos de avaliação adequados ao desenvolvimento de todos os alunos, em consonância com o Projeto Político Pedagógico. Orienta a atuação colaborativa do professor especializado e professores intérpretes das linguagens e códigos aplicáveis; prevê os apoios necessários à locomoção, aprendizagem e comunicação; professores itinerantes intra e 23 interinstitucionais, professores apoio e a realização de apoios pedagógicos complementares ou suplementares com procedimentos, equipamentos e materiais específicos no contra turno. São muitas leis que garantem e legitimam a educação inclusiva no Brasil. Podemos dizer que há um arsenal delas apesar de muitas não terem, ainda, saído do papel. Isso nos sugere que ela não se efetive somente com atos legais, mas sim com ações realizadas na escola e na sociedade com intuito de efetivar o compromisso de transformar nossa sociedade injusta e excludente numa sociedade mais justa e igualitária. Enfim, os surdos têm direitos legais e humanos de estarem incluídos no sistema comum de ensino. 2.4 As implicações na inclusão de alunos surdos nas escolas de ensino comum As tentativas de inclusão de alunos surdos nas escolas de ensino comum trouxeram, ao longo dos tempos, sérias implicações. À medida que essa inclusão está acontecendo, presencia-se um choque de culturas e valores advindos das duas comunidades em questão. Estudar em escolas de ensino comum que ofereça uma educação de qualidade é uma expectativa que está presente em todas as famílias e não difere nas famílias das crianças surdas e várias são as razões que fazem com que essas famílias procurem escolas de ensino comum, conforme aponta Botelho (2002, p. 15-17), Estudar em escolas para ouvintes faz parte das expectativas de muitos surdos e de seus pais. (...) Uma das razões que explicam porque muitos pais procuram as escolas comuns para seus filhos surdos é que a opção da escola especial oferece um modelo não pedagógico, que subestima os surdos e suas capacidades cognitivas. A autora deixa claros seus argumentos perante esse ponto de vista, As escolas especiais, baseadas no modelo clínico, que entende a surdez como déficit e doença, reduzem as expectativas de aprendizado dos estudantes surdos. Somam-se a este contexto outros equívocos – como o de achar que ter colegas surdos compromete o aprendizado, ou que ouvintes aprendem mais rápido do que os surdos e por isso é melhor tê-los como colegas. (BOTELHO, 2002, p. 47). Atualmente tem-se falado muito em mudanças educacionais para os surdos. Repensar essa proposta, na verdade, é uma tarefa desafiadora e inúmeras polêmicas têm se formado em torno do fato. Damázio (2007, p. 14) discorre sobre isso com muita responsabilidade e clareza, 24 A inclusão do aluno com surdez deve acontecer desde a educação infantil até a educação superior, garantindo-lhe, desde cedo, utilizar os recursos de que necessita para superar as barreiras no processo educacional e usufruir seus direitos escolares, exercendo sua cidadania, de acordo com os princípios constitucionais de nosso país. No entanto, existem posições contrárias à inclusão de alunos com surdez nas turmas comuns em decorrência da representação da surdez como incapacidade ou a não consideração da sua diversidade linguística. (DAMÁZIO, 2007) Segundo Skliar (2012, p. 19), ao se falar do processo de inclusão dos surdos na escola regular, fala-se de inclusão ou de assimilação? Quais serão os surdos incluídos, em quais escolas, de que ouvintes? O autor ainda constatou que, A partir dessas variáveis é possível entender o fracasso educacional para os surdos como um conjunto de subfracassos que não podem conformar-se como um sistema coerente de explicação. O olhar dos surdos sobre o fracasso, se refere sobretudo a uma questão ligada à falta de acesso à língua de sinais e a um processo demorado de identificações com outros surdos. Os professores ouvintes, por sua vez, falam mais acerca da própria formação e da perda significativa de seu papel como educadores. Em outras palavras, as interpretações e representações do fracasso constituem sistemas divergentes. Vale destacar que amparos legais são importantes e necessários na inclusão de alunos com necessidades educativas especiais como os já aqui citados, entretanto não é somente isso que promove uma inclusão de fato. Gonçalves e Santos (2012, p. 226), ressaltam que, A inclusão como direito aos alunos com necessidades educativas especiais ainda é muito recente, perante anos de exclusão que essa clientela vivenciou tanto na escola como na sociedade. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN 9394/96, em seu artigo 59, capítulo V, que dispõe sobre a Educação Especial, assegura uma educação de qualidade para os alunos com necessidades especiais. No entanto a LDBEN não garantiu a promoção de capacitação dos profissionais que trabalham com essa clientela, tornando o processo de inclusão um conceito vazio para o docente de alunos especiais, assim como para os próprios discentes. Embora se perceba que o debate acerca da inclusão tem sido um assunto recorrente, a legislação, ao mesmo tempo em que ampara o acesso das crianças a rede comum de ensino, não define obrigatoriedade e até admite a possibilidade de escolarização que não seja nela. A legislação não está traduzida em ações políticas e não chega às escolas e muito menos às salas de aula. (MENDES, 2006). Levando em consideração que o debate sobre a inclusão vem invadindo os espaços públicos e privados envolvendo questões econômicas, sociais e políticas, o uso da palavra inclusão, de acordo com Baggio e Casa Nova (2011, p. 65), “nos remete a dois pontos 25 fundamentais: se existe a necessidade de incluir, é porque algo ou alguém se encontra fora”. Dessa forma, Quadros (2003, p. 85) faz uma importante análise: Na verdade, caracteriza-se a educação com base na exclusão. Se se propõe uma educação inclusiva, supõem-se a existência de excluídos. Assim, a reflexão deve ser feita tendo em vista esta oposição que sustenta a política educacional nacional.(...) Dessa forma, a educação deveria estar calcada em um plano que atenda de fato as diferenças no contexto brasileiro: diferenças sociais, políticas, lingüísticas e culturais. Todavia, a realidade reflete a inclusão de todos visando a atender interesses políticos que têm base na homogeneidade. Os resultados dessa insistência são familiares tanto para os profissionais que atuam na educação, bem como, para os intelectuais da educação: o fracasso escolar dos silenciados, dos oprimidos. De acordo com Lunardi (2004), como processo educativo, a educação especial tem como objetivo central a inclusão dos alunos com necessidades educativas especiais no ensino regular com oferta de apoio, professores capacitados, complementações e adaptações curriculares. No entanto, é preciso entender que essas implicações trazem consigo grandes responsabilidades e desafios que promovem esse espaço inclusivo. Diante dessas constatações, Marchesi (2004) enfatiza os debates que são gerados acerca dessas propostas inclusivas fazendo um paralelo e mostrando-nos aspectos negativos e positivos que suscitaram nesses debates que se travaram no campo da educação das crianças surdas. Os críticos veem essa possibilidade como negativa alegando em síntese que: a) a integração marginaliza a linguagem de sinais, que é necessária para a comunicação das pessoas surdas e para a construção de sua própria identidade; b) os professores das escolas de ouvintes não têcm formação suficiente; c) os alunos surdos têm sérias dificuldades de comunicação oral e, por isso, a integração social com seus colegas pode não ocorrer, mesmo estando na mesma turma; d) os alunos surdos não podem acompanhar as informações transmitidas oralmente, o que leva a aumentar seus problemas de aprendizagem. Diante dessas razões, os defensores das opções integradoras destacam vantagens que reduziriam os inconvenientes anteriormente descritos: a) os alunos surdos têm maiores possibilidades de interação com colegas ouvintes, o que favorece a aquisição da linguagem oral; 26 b) as expectativas e os estímulos para a aprendizagem são maiores nas escolas de integração; c) a integração prepara a futura e necessária integração das pessoas surdas na vida ativa e profissional; d) a integração deve ser feita nas condições adequadas, pois de outra forma seria negativa. Entre essas condições, é preciso destacar a existência de um projeto educacional e curricular da escola, que leve em conta a realidade das crianças surdas: professores preparados, incorporação de vários alunos surdos em cada classe e utilização da comunicação visual. Diante das perspectivas atuais sobre a Educação Inclusiva Brasileira, Mendes (2006, p. 396) faz uma importante consideração, Ao longo dos últimos trinta anos, tem-se assistido a um grande debate acerca das vantagens e desvantagens, antes, da integração escolar, e, mais recentemente, da inclusão escolar. A questão sobre qual é a melhor forma de educar crianças e jovens com necessidades educacionais especiais não tem resposta ou receita pronta. Na atualidade, as propostas variam desde a idéia da inclusão total – posição que defende que todos os alunos devem ser educados apenas e só na classe da escola regular – até a idéia de que a diversidade de características implica a existência e manutenção de um contínuo de serviços e de uma diversidade de opções. Ainda de acordo com essa mesma autora, estudos nacionais indicam que faltam aspectos básicos para garantir não apenas o acesso, mas a permanência e o sucesso desses alunos com necessidades educacionais especiais matriculados em classes comuns. Assim, todas as pessoas envolvidas com o ensino/aprendizagem da escola devem ter compromisso com a inclusão e devem cooperar para que aconteça o sucesso do processo educativo dos alunos da educação especial. Os alunos surdos, especialmente as crianças em fase de alfabetização, têm o direito de frequentar uma escola de ensino regular com educação de qualidade e receber atendimento especializado. A Educação Inclusiva é uma prática inovadora que está enfatizando a qualidade de ensino para todos os alunos exigindo que a escola se modernize e que os professores aperfeiçoem suas práticas pedagógicas. É um novo paradigma que desafia o cotidiano escolar brasileiro. E nesse sentido, para Gonçalves e Santos (2012, p. 234), (...) a escola é uma das primeiras oportunidades que a criança surda tem para aprender a conviver com outras crianças, além de ser um espaço de construção de sua identidade, fora do ambiente familiar. Outros objetivos implícitos voltados para os alunos surdos na escola é a oportunidade de adquirir conhecimentos acumulados 27 da humanidade e tornar-se cidadão consciente de seus direitos e deveres, além de preparar-se para o mercado de trabalho e para o seu desenvolvimento pessoal e social. O fato de o professor não estar preparado para receber o aluno surdo e não conhecer as implicações da surdez tende a fazê-lo duvidar do potencial do aluno surdo e atribuir suas dificuldades à surdez, A falta de compreensão e de produção dos significados da língua oral, o analfabetismo massivo, a mínima proporção de surdos que têm acesso a estudos de ensino superior, a falta de qualificação profissional para o trabalho, etc., foram e são motivos para três tipos de justificações impróprias sobre o fracasso na educação dos surdos. Em primeiro lugar, está a atribuição do fracasso aos surdos - fracasso, então, da surdez, dos dons biológicos naturais. Em segundo lugar, está a responsabilidade dos professores ouvintes por esse fracasso. E, em terceiro lugar, está a localização do fracasso nas limitações dos métodos de ensino - o que reforça a necessidade de purificá-los, de sistematizá-los ainda mais, de torná-los mais rigorosos e impiedosos com relação aos surdos. (SKLIAR, 2012, p. 18). O mesmo autor ainda ressalta que nos três tipos de justificações mencionadas, evita-se toda uma possível denúncia acerca do fracasso da instituição-escola, das políticas educacionais e da responsabilidade do Estado. Levando em consideração suas pesquisas, enfatiza também que, O que fracassou na educação dos surdos foram as representações ouvintistas acerca do que é o sujeito surdo, quais são os seus direitos lingüísticos e de cidadania, quais são as teorias de aprendizagem que refletem as condições cognitivas dos surdos, quais as epistemologias do professor ouvinte na sua aproximação com os alunos surdos, quais são os mecanismos de participação das comunidades surdas no processo educativo, etc. (SKLIAR, 2012, p. 18-19). Será que se pode chegar à conclusão de que a educação dos surdos não fracassou mesmo depois de tantas considerações acerca de um sistema educacional inclusivo? Será que a educação apenas conseguiu os resultados previstos em função dos mecanismos e das relações de poderes e de saberes atuais? Estas questões são muito complexas e necessitam de uma ampla reflexão e de mudanças significativas em nosso sistema educacional para que de fato as dificuldades enfrentadas pelos alunos surdos possam ser minimizadas. 28 3 A AQUISIÇÃO DA LÍNGUA ORAL E ESCRITA POR CRIANÇAS SURDAS 3.1 Implicações linguísticas na educação de surdos Alfabetizar transcende a interpretação de sinais gráficos, do aprender a ler e escrever. Significa preparar para a vida, para ser capaz de situar-se no mundo das informações, ser habilidoso, poder participar da sociedade agindo e interagindo-se com ela. Ensinar a ler e a escrever é um desafio que vai além da alfabetização em sentido restrito. Entretanto, conforme Lodi (2009), as práticas de leitura e escrita na maioria das vezes estão desvinculadas do contexto social, limitando-se a conhecimentos gramaticais. Os estudos de Quadros (2003) e Lodi (2009) revelam que a Libras deve ser a L1 (primeira língua) da criança surda e a língua portuguesa deve ser sua L2 (segunda língua). Desse modo, as autoras também ressaltam que conhecer o desenvolvimento da linguagem e conhecer as condições que se impõem ao processo de aquisição de uma segunda língua deve ser o ponto de partida para qualquer profissional que objetive trabalhar com o ensino da língua portuguesa para surdos. Segundo Quadros (1997, p. 108), Uma criança adquire sua primeira língua – L1 – de forma natural e espontânea, ou seja, essa língua não é ensinada: ninguém ensina ninguém a falar, simplesmente se aprende a falar. Da mesma forma com as crianças surdas, ninguém ensina a sinalizar, mas de forma natural se aprende a sinalizar. Ao refletir sobre o processo de letramento de crianças surdas é preciso pensar sobre a língua que ela utiliza, sobre a língua de sinais brasileira, sobre o contexto social, familiar e escolar em que ela está inserida. Na concepção de Soares (2010, p.18), Letramento é o resultado da ação de ensinar ou de aprender a ler e escrever: o estado ou a condição que adquire um grupo social ou um indivíduo como consequência de ter-se apropriado da escrita. O termo letramento está relacionado, então, à habilidade em usar diferentes tipos de textos escritos, compreendê-los, interpretá-los e extrair informações deles. Por outro lado, o termo clássico “alfabetização” limita-se ao domínio da leitura e escrita e é o termo utilizado para referir à aprendizagem da leitura e escrita nas séries iniciais. Quadros (2003) afirma que a Declaração de Salamanca considerou uma das coisas mais peculiares da educação de surdos: a questão da língua. No entanto, ainda assim, a língua 29 é apenas mencionada nos documentos através de recomendações, mas não de inserção e viabilização de um ensino tendo como espinha dorsal a língua de sinais inviabilizando ou dificultando os dois processos em questão quando se trata de crianças surdas: alfabetização e letramento. É relevante ressaltar que a constituição e a aprendizagem de uma língua devem levar em consideração todas as particularidades do sujeito e tendo em vista que o sujeito é surdo, é importante levar em consideração a recomendação, Recomenda-se que a educação dos surdos seja efetivada em língua de sinais, independentemente dos espaços em que o processo se desenvolva. Assim paralelamente as disciplinas curriculares fazem-se necessário o ensino da língua portuguesa como segunda língua, com a utilização de materiais e métodos específicos no atendimento às necessidades educacionais do surdo. (SALLES, 2004, p. 47). O processo de alfabetização dos surdos é um desafio. Não só pela questão da surdez em si, mas também pela diversidade de situações em que cada um apresenta. Muitos deles não adquiriram, ainda, nem a sua língua materna, que é a língua de sinais, para receber o apoio adequado do intérprete educacional ao ser inserido na escola. O surdo inicia, logo no começo, um processo de aquisição de duas línguas de modalidades tão diferentes ou é relegado a ficar à margem de todo o processo, como reflete Lodi (2009, p. 36-37), Por serem usuários e necessitados de uma linguagem diferente essas questões de alfabetização e letramento se tornam ainda mais complexas. Os surdos apresentam domínio e conhecimentos diferentes em relação a LIBRAS. Muitos deles não têm acesso a ela e ficam sujeitos a comunicação gestual caseira. (...) O acesso tardio e aceitação dessa língua acarreta em níveis de conhecimento bastante variáveis. (...) A postura dos ouvintes frente aos surdos tendem a pressupor que o domínio da LIBRAS é apenas um fato que faz valer a existência do surdo. Não é comum a utilização de metodologias diferenciadas no processo de alfabetização dos alunos surdos como é previsto na legislação e isso os coloca em desvantagem em relação ao seu grupo etário. De acordo com Quadros (1997), no Brasil não existe uma metodologia “pronta” e “verificada” empiricamente para o ensino de L2 para surdos, então o ideal seria que ele já chegasse à escola tendo domínio, pelo menos, da L1. Que fosse exposto a um ambiente linguístico em Libras desde a mais tenra idade e que ao chegar à escola tivesse o intérprete educacional que intermediasse todo o processo. A detecção precoce da deficiência auditiva torna-se imprescindível, uma vez que otimiza os processos terapêuticos e aumenta a probabilidade de se aproveitar ao 30 máximo o potencial de linguagem expressiva e receptiva, de alfabetização, do desempenho acadêmico e do desenvolvimento social e emocional das crianças. (SANTOS; LIMA; ROSSI 2003, p. 17). Considerando que o surdo é usuário da Língua Portuguesa como segunda língua, é necessário salientar que muitas vezes o processo de alfabetização e letramento das crianças surdas seguem caminhos diferentes se comparadas às crianças ouvintes. De acordo com Skliar (2012, p. 41), “os educadores e demais profissionais envolvidos no espaço escolar, na melhor das hipóteses, são ‘estrangeiros’ que se aproximam da língua de sinais e da cultura visual, mas privilegiam a modalidade oral-auditiva, a fala, como ato cotidiano de comunicação”. Reportando a nossa realidade, para que se possa entender um pouco mais sobre as especificidades na aquisição da linguagem por crianças surdas, torna-se fundamental entender que, Sua escrita é semelhante à escrita de estrangeiros aprendendo a língua portuguesa e, portanto, o domínio da leitura e da escrita está intimamente relacionado com as práticas de leitura e escrita que a escola e o ambiente lingüístico oferecem. Em segundo lugar, devemos considerar a importância do conhecimento da língua de sinais, por parte do surdo e do professor, para o desenvolvimento de estudos comparativos entre a língua de sinais e a língua portuguesa, estabelecendo relações e diferenciações entre esses dois sistemas lingüísticos. Em terceiro lugar, é relevante considerar a metodologia de ensino de língua portuguesa: o ensino está centrado em descrições de regras gramaticais da língua? O ensino prioriza o conhecimento do significados das palavras isoladas? Tais contextos não oferecem condições suficientes para que o aluno tenha um bom desempenho em leitura, análise textual e produção de textos. Qual é a concepção de língua e de ensino de língua vigente na escola? Acreditamos sinceramente que, uma vez alfabetizada, a criança surda deve, no ensino fundamental, praticar a tradução, a leitura e a produção de textos. (LUNARDI, 2004, p. 107). Além das questões já citadas e das reflexões acerca da linguagem como fator de suma importância para o desenvolvimento dos processos mentais da criança surda, ainda cabe refletir que aprendizagem e desenvolvimento estão inter-relacionados desde os primeiros dias de vida e que adultos, em primeiro lugar os pais, têm um papel determinante no desenvolvimento delas. A aprendizagem está associada ao lugar que a criança ocupa dentro do contexto no qual está inserida, às expectativas que os adultos criam a seu respeito e Quadros (1997, p. 108) faz uma importante reflexão sobre isso, O desenvolvimento sócio-emocional também deve ser garantido na relação dos pais com as crianças.A criança precisa ter a oportunidade de conceber sua própria teoria de mundo através de suas experiências diárias e do diálogo com as pessoas que a rodeiam. Isso significa que a escola deve ir além da relação profissional e, conseqüentemente, abranger a relação pais e filhos. Os pais, normalmente, não sabem ser pais de crianças surdas. Além disso, eles não conhecem a língua de sinais. 31 Para que sejam assegurados os três objetivos mencionados até então, é fundamental que sejam previstos programas que incluam os pais das crianças e a interação desses com adultos surdos. Portanto, podemos perceber que a fala e a postura do adulto exercem um papel determinante na formação de conceitos pela criança surda. A forma como a criança interage com o mundo é orientada pela cultura na qual está inserida e torna-se importante que ela estabeleça vínculos com adultos que partilham da sua língua natural, sendo nesse caso, no Brasil, a Libras. Os estudos de Quadros (1997) e Salles (2004) mostram bem como o papel do surdo adulto é importante na educação das crianças surdas em uma proposta bilíngue. Ele se torna fundamental, pois oportuniza o desenvolvimento da linguagem, aquisição da língua e constituição da identidade dessas crianças. Quadros (1997) ainda diz que deve haver um lugar dentro da escola (ou em outro lugar) para desenvolver o pensamento e a linguagem da criança surda. Caso contrário, a criança surda não terá chances de apresentar um domínio razoável da língua portuguesa. Ampliando essa discussão, Damázio (2007) argumenta que tendo em vista o desenvolvimento da capacidade representativa e linguística dos alunos com surdez, a escola comum deve viabilizar um atendimento educacional especializado no contra turno para o ensino da Libras como primeira língua e o ensino da Língua Portuguesa como segunda. O direito da criança surda de acesso ao conhecimento, bem como ao atendimento educacional especializado, é previsto em lei e indispensável em uma proposta inclusiva. Damázio (2007, p.37-38) ainda aponta questões importantes que estão vinculadas ao atendimento educacional especializado, sendo os mais relevantes: a) o Atendimento Educacional Especializado com o uso de Libras ensina e enriquece os conteúdos curriculares promovendo a aprendizagem dos alunos com surdez na turma comum; b) a qualidade dos recursos visuais é primordial para facilitar a compreensão do conteúdo curricular em Libras; c) a organização do ambiente de aprendizagem e as explicações do professor em Libras propiciam uma compreensão das ideias complexas contidas nos conhecimentos curriculares; 32 d) o Atendimento Educacional Especializado em Libras oferece ao aluno com surdez segurança e motivação para aprender, sendo, portanto, de extrema importância do aluno na classe comum. Outra questão importante de ser analisada na alfabetização de surdos diz respeito à sua escrita, pois como observou Quadros (1997), o processo de aquisição da L2 não é natural para a criança surda. As características intrínsecas à forma escrita impossibilitam dar a ela o mesmo tratamento da forma da língua sinalizada ou falada. A autora ainda argumenta que, No caso da criança surda, ela deverá ter contato com a língua escrita através de estórias, de textos, de registros das suas atividades em sala de aula. Inicialmente, tais registros podem ser elaborados pelo professor. Os textos devem apresentar um conteúdo interessante e significativo, além de serem adequados ao nível lingüístico dos alunos. Pesquisas evidenciaram que simplificações de textos não são recomendáveis, pois comprometem a coerência e coesão dos mesmos. A criança surda deve ter oportunidade de “ler” tais registros de forma a tornar a leitura parte do cotidiano escolar e ela deve sentir-se capaz de realizar a tarefa. Taglieber observa que é muito importante que o texto não seja muito difícil para não desencorajar o aluno e que, por outro lado, não seja muito simples, não apresentando nenhum desafio para o leitor. (QUADROS, 1997, p. 96). Ao discutir a questão da leitura e da escrita, tanto em crianças surdas quanto em crianças ouvintes, é preciso que se leve em consideração diversos fatores para que a criança possa internalizar o prazer em aprender a língua escrita e falada. Quadros (1997, p. 99) ainda salienta que “a escrita exige habilidades específicas que só podem ser desenvolvidas quando se tem domínio da linguagem”. Então, há uma questão a ser respondida: como se dará a construção de uma alfabetização bilíngue se a criança surda conviverá em ambiente onde a linguagem que predomina não é a utilizada por ela? Dessa forma, a autora ressalta que os surdos precisam dominar a língua de sinais, pois é nessa língua que eles aprendem que palavras, frases, sentenças e parágrafos significam algo e que palavras devem ser situadas em um contexto. (QUADROS, 1997, p. 99). Observando as considerações feitas pela autora, torna-se relevante fazer uso de mais uma de suas citações. De acordo com ela, Para se falar em ensino de leitura e escrita para surdos deve-se, em primeiro lugar, reavaliar o tipo de língua a que eles estão sendo expostos. Para as pessoas que ouvem, “falar e ouvir” são variantes de uma mesma estrutura lingüística. A leitura apresenta, em pelo menos algum nível, uma relação com os sons das palavras. Entretanto, para pessoas surdas não existe a associação entre sons e sinais gráficos, a língua escrita é percebida visualmente. Os sinais gráficos são símbolos abstratos para quem nunca ouviu os sons e entonações que eles apresentam. É uma linguagem silenciosa. (QUADROS, 1997, p. 98). 33 Em outro estudo feito por Quadros (2003), a autora chama a atenção pelo modo como tem sido visto esse processo de aquisição da linguagem por crianças surdas. De acordo com ela, as crianças surdas têm sido alfabetizadas através de um processo similar às crianças ouvintes que dispõe do português como primeira língua. Ainda ressalta que os professores desconhecem a experiência visual surda e suas formas de pensamentos que são expressas através de uma língua visual-espacial: a língua de sinais. Por várias vezes, a língua de sinais é misturada com o português. Diante dessas constatações é notável que o resultado de tudo isso seja o fracasso educacional no qual os surdos são expostos. E ainda, de acordo com a autora, atribuem o fracasso a sua própria condição (não ouvir) e não às condições reproduzidas pelo sistema. Além dos aspectos já abordados, Quadros (2003) ainda cita dificuldades de ordem social, cultural e política levando em consideração que a linguagem é essencial ao ser humano para o estabelecimento de vários tipos de relações e que não seria diferente na educação e em especial na educação de pessoas surdas. Por esse motivo, a educação de surdos sempre envolveu o reconhecimento ou não da língua de sinais, a língua das pessoas surdas. Nesse momento, capta-se a diferença essencial do ser surdo: sua linguagem. É de fundamental importância voltar a atenção para todos os aspectos linguísticos da criança surda afim de que de fato a linguagem oral e escrita sejam trabalhadas de forma efetiva. É fato que existe uma série de problemas na educação de surdos que fazem referência à linguagem ou a falta dela e Quadros (2003, p. 101-102) cita alguns deles, O primeiro grande entrave é a questão da linguagem: como a escola regular vai garantir o processo de aquisição da linguagem através da língua de sinais brasileira? A partir dessa questão surgem tantas outras... Quem serão os interlocutores das crianças surdas na escola comum? Como a escola vai garantir o acesso aos conhecimentos escolares na língua de sinais brasileira em escolas que utilizam o português como língua oficial? Como a escola regular de ensino vai garantir ao aluno surdo o seu processo de alfabetização na escrita da língua de sinais brasileira? Como será a ele garantido o acesso ao português com estratégias de ensino baseadas na aquisição de segunda língua? São tentativas de alfabetizar os surdos com base no ensino do português para crianças ouvintes. A criança surda simplesmente é colocada em contato com a escrita do português para ser alfabetizada em português. (QUADROS, 2003). Contudo, como já destacado, o aluno surdo precisa de uma metodologia diferenciada de ensino em relação ao ouvinte para aprender a língua portuguesa, considerada sua segunda língua. 34 3.2 O processo de alfabetização e letramento de crianças surdas Práticas de leitura e de escrita fazem-se presentes em todos os níveis de ensino e são fundamentais na formação tanto de alunos surdos quanto de alunos ouvintes. A leitura colabora para a formação de cidadãos críticos e reflexivos. De acordo com Soares (2010), ler e escrever requer uma multiplicidade de habilidades, comportamentos e conhecimentos e cabe à escola desenvolver essas competências em seus alunos de forma contextual e prática. A mesma autora ainda tece algumas considerações sobre ler, ser letrado ou alfabetizado, Um conjunto de habilidades e comportamentos que se estendem desde simplesmente decodificar sílabas ou palavras até ler Grande Sertão Veredas de Guimarães Rosa...Uma pessoa pode ser capaz de ler um bilhete, ou uma história em quadrinhos, e não ser capaz de ler um romance, um editorial de jornal...Assim: ler é um conjunto de habilidades, comportamentos, conhecimentos que compõe um longo e complexo continuum: em que ponto desse continuum uma pessoa deve estar, para ser considerada alfabetizada, no que se refere à leitura? A partir de que ponto desse continuum uma pessoa pode ser considerada letrada, no que se refere à leitura? (SOARES, 2010, p. 48). Refletindo sobre as indagações de Soares (2010) e com foco na alfabetização e letramento de pessoas surdas, outras e muitas perguntas ainda poderão ser feitas. Os alunos surdos brasileiros estão conseguindo ler de verdade ou estão apenas decodificando algumas palavras e lendo fragmentos da língua portuguesa? Eles estão tendo acesso a práticas de leitura adequadas e eficazes no seu processo de letramento? Estão sendo alfabetizados com metodologias adequadas? São inúmeros questionamentos que iremos discutindo ao longo do capítulo. Cagliari (2005) define a leitura como atividade fundamental desenvolvida pela escola para a formação do aluno como cidadão. O melhor que a escola pode oferecer aos alunos deve estar voltado para a construção de um sujeito leitor. Ele fala da leitura como uma atividade extremamente complexa que envolve problemas não só semânticos, culturais, ideológicos, filosóficos, mas também fonéticos. Muitas vezes os alunos não atingem resultados satisfatórios nas provas não porque não sabem a matéria, mas sim porque não sabem interpretar, entender o que lhe é perguntado. Sendo assim, se a escola desenvolver a competência leitora em seus alunos, já terá cumprido boa parte de seus objetivos uma vez que ela propicia uma diversidade de conhecimento. E como será a vida de quem não sabe ler? Como será seu acesso neste mundo letrado? O mesmo autor fala sobre isso: “a leitura é a extensão da escola na vida das pessoas. A 35 maioria do que se deve aprender na vida terá de ser conseguido através da leitura fora da escola. A leitura é uma herança maior do que qualquer diploma”. (CAGLIARI, 2005, p. 148). O papel da escola no processo de aquisição das habilidades de leitura, escrita e letramento é de grande responsabilidade de acordo com Martins (2011, p. 19-20): Sabe-se que a maneira pela qual o professor concebe o processo de aprendizado e orienta suas ações de ensino em sala de aula comum poderá afastar ou aproximar a criança de eventos de letramento em diferentes contextos sociais nos quais a leitura e a escrita são valorizadas. Tendo conhecimento de que ler é um processo complexo até mesmo para quem é usuário da língua oral e que tem acesso pleno ao seu uso, pode-se imaginar como deve ser ainda mais trabalhoso para um “estrangeiro” que tem o canal principal de utilização da língua inoperante, que não tem acesso e nem faz uso dela de forma efetiva e que utiliza outra modalidade de língua, uma língua gestual visual, como é o caso dos surdos. Muitos autores já pesquisaram esse assunto e falam da necessidade e do direito de um letramento visual de acordo com Goés (2003, p. 13), O ‘letramento’ visual, implicado nas significações da imagem, é um processo que não pode ser negligenciado para a educação de qualquer criança, em especial da criança surda. A riqueza dessa via pedagógica é apontada por dados sobre a interação das crianças surdas com materiais visuais como textos ilustrados ou textos em imagens. A criança surda deverá ter a oportunidade de aprender a ler utilizando a Libras, de ser ensinada na sua própria língua. A Língua de Sinais, própria da cultura surda é o sistema mediador da criança surda por excelência, assim como é a melhor forma de construir sua identidade, além de ser a melhor forma de introduzi-las no meio social e no universo escolar, inferindo diretamente no meio psicossociocultural desse sujeito. (GONÇALVES; SANTOS, 2012, p. 229). Martins (2011) afirma que a língua de sinais desempenhará as mesmas funções que a linguagem oral exerce no desenvolvimento cognitivo e linguístico para os ouvintes, pois ela propiciará aos surdos a constituição de conhecimento de mundo e de língua que serão usadas na escrita. “É com a língua de sinais que a criança será inserida nas práticas discursivas e que lhe será apresentada diferentes gêneros textuais – será nessa língua que a criança produzirá e lerá seus primeiros textos”. (LEBEDEFF, 2004, p.135). 36 Levando em consideração todas as possibilidades e dificuldades da criança surda no acesso ao conhecimento formal, o trabalho com a leitura poderá ser intenso e difícil. A criança surda terá que fazer um esforço maior que a criança ouvinte para que aprenda a ler. Seu desenvolvimento demandará muito mais tempo, principalmente se as condições não forem favoráveis, como descreve Martins (2011, p. 20), Na maior parte dos casos de surdez, os alunos ingressarão no aprendizado da leitura e da escrita na educação básica, a partir de um domínio deficitário de uso de um sistema lingüístico convencional, quer seja ele oral ou gestual. Devido a essa condição adversa, semelhante às condições educacionais dos alunos ouvintes, os surdos também enfrentarão dificuldades em seu processo de letramento. Para facilitar o processo de aquisição da língua de sinais, no caso daqueles que ainda não a dominam, e também a alfabetização e letramento visual das crianças surdas, o professor haverá de propiciar atividades contextualizadas, utilizar de recursos visuais (figuras, vídeos, desenhos) para que ela possa interpretar e compreender o texto. Segundo Reily (2003, p. 167) “pouco se faz na escola no sentido de levar os alunos a explicitarem os processos intuitivos de leitura de imagens presente em todo tipo de portador de texto/imagem da vida cotidiana”. Sendo assim, deve-se ter em mente que é preciso que a escola, no caso de alunos surdos, considere a leitura da imagem como parte da leitura do texto. Svarttholm citado por Quadros (1997) sugere que a criança surda tenha contato com textos escritos desde a fase pré-escolar e observa a autora que não há razões de exigir a leitura e escrita nessa fase. Svarttholm sugere que a escrita nessa fase não tenha fins escolares, mas que sirva para preparar os alunos para o ensino da segunda língua. Quadros ainda afirma que, após essa fase, a leitura passa a ser um dos objetivos escolares. (QUADROS, 1997). Mesmo sabendo das dificuldades enfrentadas no processo de alfabetização e letramento da criança surda, em especial no que diz respeito à leitura, Martins (2011, p. 30), recomenda que ela não seja excluída de nenhuma proposta pedagógica, Se a criança surda tiver oportunidades de mediar situações significativas de constituição de linguagem por intermédio da leitura e o planejamento educacional orientar-se para os pontos fortes, ou seja, para os olhos, e não para a falta – a audição –, talvez isso favoreça novos modos de compreender o letramento dos surdos e a organização de práticas educacionais inclusivas. Sabendo-se então da importância das práticas inclusivas em favor da criança surda, os professores assumem um papel imprescindível na elaboração das práticas pedagógicas que 37 visam o letramento visual. Para favorecer esse processo e também a inclusão desses nas escolas, é oferecido o serviço de intérprete educacional na sala de aula, como previsto em lei. A participação atuante do intérprete pode ajudar a minimizar algumas dificuldades e limitações próprias da criança surda. 38 4 DESCRIÇÃO DO ESTUDO DE CASO REALIZADO 4.1 Objetivo geral Investigar como ocorre o processo de ensino-aprendizagem da criança surda numa escola da rede pública de Pará de Minas através de uma perspectiva bilíngue. 4.2 Objetivos específicos a) estudar os processos de aquisição da linguagem oral e escrita por crianças surdas assim como os desafios e percalços encontrados nesse processo; b) conhecer algumas pesquisas que abordam a temática da educação inclusiva de crianças surdas, seus caminhos e descaminhos; c) observar e descrever as práticas pedagógicas do professor no que diz respeito ao processo de ensino-aprendizagem do aluno surdo; d) fazer uma análise do tipo de educação oferecida aos alunos surdos no ciclo inicial de alfabetização; e) analisar as formas de comunicação utilizadas pelo professor e alunos ouvintes com o aluno surdo em sala de aula na fase de alfabetização. 39 5 METODOLOGIA UTILIZADA NA PESQUISA A pesquisa foi realizada dentro do enfoque qualitativo, uma pesquisa-ação em que foram utilizadas três estratégias importantes: observação em campo, estudo de caso, entrevistas e levantamento bibliográfico. O universo da pesquisa foi uma criança surda na faixa etária de seis anos regularmente matriculada em uma escola de ensino comum da rede pública do município de Pará de Minas. A observação aconteceu na turma onde essa criança surda está inserida. O foco principal foi conhecer as práticas pedagógicas que são desenvolvidas, pela escola e pelo professor, em prol da alfabetização e educação dessa criança. Ludke e André (1986) ressaltam a importância dos estudos de caso justamente naquilo que eles têm de único, de singular, enfatizando, porém que essa singularidade se destaca por constituir-se em uma unidade dentro de um sistema mais amplo. Por essa busca de relações entre a parte e o todo foi realizado o estudo de caso que se constitui, também, em um estudo qualitativo. “A pesquisa qualitativa abrange um entendimento específico da relação entre o tema e o método”. (FLICK, 2009, p. 95). Durante o trabalho de pesquisa, o apoio foi o aluno surdo que era o sujeito em foco e também as práticas da professora regente e demais profissionais da equipe educacional da escola observada. Os estudos qualitativos baseiam-se na especificidade do objeto das ciências sociais com características diferentes do objeto das ciências exatas, valorizando as manifestações subjetivas e comportamentais para a compreensão dos fenômenos. (AZEVEDO; AZEVEDO, 2000). Em função da natureza qualitativa e exploratória desta pesquisa ainda foram utilizadas entrevistas semiestruturadas com a professora e pedagoga da escola. A entrevista com a professora ocorreu somente depois de uma análise mais profunda do contexto escolar no qual a criança surda estava inserida para obtenção dos dados necessários a essa pesquisa. Além disso, foi realizada uma pesquisa bibliográfica apurada que fundamentou os achados desta pesquisa. A pesquisa de natureza qualitativa tem o ambiente natural como sua fonte direta de dados e o pesquisador como seu principal instrumento. (LUDKE; ANDRÉ, 1986). Foram utilizados registros das observações de campo, interpretação e relato das situações observadas. Isso significa que, os olhos, os ouvidos e a atenção foram ferramentas imprescindíveis para o êxito desta. As reflexões foram feitas a partir da análise das possíveis 40 implicações pedagógicas que emergiram dos dados tendo-se o cuidado de não se posicionar diante deles ajuizando valores ou práticas. É importante ressaltar novamente que esta pesquisa trata-se de uma pesquisa-ação. O pesquisador esteve a todo tempo envolvido diretamente no contexto pesquisado. Atuou a todo instante como intérprete dessa criança e procurou agir imparcialmente perante todas as situações ocorridas para que obtivesse êxito na análise e compreensão dos dados. Essa imparcialidade foi importante, pois possibilitou mobilizar todos os participantes chamando-os para uma reflexão da temática em questão. A todo instante houve respeito e flexibilidade na aceitação dos pontos de vista e estratégias de comunicação da professora com o aluno surdo. O trabalho foi pautado em princípios éticos, mantendo em sigilo o nome da escola e dos sujeitos da pesquisa e proporcionou um processo de reflexão-ação-reflexão diante do processo de ensino aprendizagem da criança surda. A pesquisa-ação reconhece que o problema nasce, num contexto preciso, de um grupo em crise. O pesquisador não o provoca, mas constata-o, e seu papel consiste em ajudar a coletividade a determinar todos os detalhes mais cruciais ligados ao problema, por uma tomada de consciência dos atores do problema numa ação coletiva. (BARBIER, 2002, p. 54). Esse pesquisador acrescenta ainda que, Nada se pode conhecer do que nos interessa (o mundo afetivo) sem que sejamos parte integrante ‘actantes’ na pesquisa, sem que estejamos verdadeiramente envolvidos pessoalmente pela experiência, na integralidade de nossa vida emocional, sensorial, imaginativa, racional. (BARBIER, 2002, p.70-71). A observação possibilitou entender como e porque os processos são realizados e oportunizou a identificação de problemas para serem propostas melhorias. Segundo Rampazzo (2005, p. 35): Observar é aplicar atentamente os sentidos a um objeto, para dele adquirir um conhecimento claro e exato. A observação é de importância capital nas ciências: sem ela, o estudo da realidade e de suas leis, se reduz a simples conjetura e adivinhação; com ela realizam-se pesquisas e descobertas. Este trabalho mantém em sigilo o nome da escola, do aluno surdo e dos professores participantes, mas no final do trabalho, a instituição de ensino pesquisada e os docentes serão 41 avisados dos resultados da pesquisa e receberão uma cópia do trabalho para conhecimento e avaliação. 42 6 RELATO DAS OBSERVAÇÕES O aluno J.P, de seis anos de idade, regularmente matriculado e frequente no primeiro ano do Ensino Fundamental, tem perda auditiva neurossensorial de grau profundo bilateral diagnosticado em fevereiro de 2010. Está protetizado bilateralmente desde 2011. Realizou acompanhamento no setor de educação de surdos da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais - APAE de Pará de Minas. No ano de 2011, realizou acompanhamento fonoaudiológico semanal e atendimento educacional especializado na sala de recurso multifuncional. Por decisão da família, J.P. iniciou atendimento fonoaudiológico na comunidade em janeiro de 2013. Inicialmente foi proposto atendimento fonoaudiológico com frequência semanal, com uma proposta baseada no “oralismo” com enfoque na leitura labial. De acordo com relatório fonoaudiólogico, J.P. possui transtorno específico no desenvolvimento da fala e da linguagem. É um aluno frequente, teve somente uma falta durante todo esse período. Depois de algum tempo em que estava na escola, descobriu-se que ele era acompanhado na sala de A.E.E. (Atendimento Educacional Especializado) no contra turno duas vezes por semana na própria escola. Com o intuito de observar a dinâmica das aulas, se o professor adotava alguma organização didática e metodológica específica com ele, como era o processo comunicativo dele com os demais colegas ouvintes do grupo e como se dava a participação e aprendizagem em sala de aula, houve participação e observação do pesquisador nas aulas do professor regente e de ensino religioso além de observação das estruturas administrativas e pedagógicas. Iniciaram-se as observações em meados do mês de fevereiro, a partir do momento em que o pesquisador começou a atuar como intérprete desse aluno e por tratar-se de uma observação participante, na qual ele faz parte do processo, procurou, a todo instante, manter a ética e a imparcialidade diante das situações observadas e informações coletadas. As observações eram feitas diariamente e se estenderam até o final do mês de abril. Portanto, foram mais de dois meses de intensas observações perante as práticas da professora regente, da professora de Ensino Religioso e também acerca da comunicação do aluno surdo com os alunos ouvintes e demais funcionários da escola. Os questionários foram aplicados somente após um período extenso de observação. No início do ano letivo, a classe do aluno J.P. era composta por 32 alunos na faixa etária entre 5 a 6 anos. Era uma turma bastante heterogênea e possuía, além do aluno com 43 surdez, outro aluno com deficiência, acompanhado de uma professora apoio. Os alunos possuíam diferentes níveis de conhecimento, sendo que alguns apresentavam sérias dificuldades de comportamento e aprendizagem. Em meados do mês de março, atendendo à solicitação da escola, a Superintendência Regional de Ensino (SRE) autorizou a divisão da turma para viabilizar o processo de alfabetização e letramento dessas crianças. Foi formada uma nova turma e atualmente a classe do aluno J.P. possui 18 alunos matriculados e frequentes e é caracterizada por ser uma turma muito agitada em determinadas aulas, dependendo da postura do professor. No início das observações percebeu-se que o aluno não conseguia estabelecer satisfatoriamente uma comunicação com seu intérprete, com as professoras e demais alunos e apresentava bastantes dificuldades nos conteúdos escolares. De acordo com relatos da família e funcionários da escola, sua inicialização na aquisição da Libras foi muito tardia. Recebia atendimento na APAE e era tratado como uma criança com TDAH até três anos. Faz uso de medicamento controlado para conter sua agitação e nervosismo. Sua surdez foi “constatada” em 2010 e daí em diante iniciou-se o trabalho com a aquisição da Libras. Nos primeiros contatos com J.P., foi possível perceber que ele apresentava sérias dificuldades na compreensão de simples sinais da Libras e conhecia poucas letras do alfabeto manual, além de apresentar problemas de comportamento e falta de limites. Apesar disso, ele se sentava com o intérprete em um lado da sala e, mesmo com suas crises de nervosismo, os colegas ouvintes o respeitavam, ofereciam ajuda e tinham um carinho muito grande com ele. Diante das observações feitas nesse período, foi constatado que a professora regente e de ensino religioso não dominavam a Libras o que dificultava ainda mais a comunicação entre eles. Portanto, foram presenciados diversos momentos em que elas, as professoras, tentavam estabelecer uma comunicação com o aluno surdo recorrendo sempre à ajuda do intérprete. Nas aulas presenciadas, pode-se notar que a professora regente tentava estabelecer uma rotina. Respeitando a lista de chamada, o ajudante do dia era apresentado à turma e durante o dia todo ajudava a professora nas atividades rotineiras. A professora, durante a semana, alternava a disposição das carteiras colocando os alunos em círculo, em dupla, ou em grupo. Diariamente, a professora regente estudava com seus alunos o alfabeto, números, nome da escola e nome próprio. As atividades estavam de acordo com o conhecimento da turma, porém foram presenciados poucos momentos em que faziam uso do livro didático ou atividades diferenciadas. 44 Foi importante observar em conversas formais com a professora regente que ela percebia que o aluno J.P. estava com o desenvolvimento aquém do esperado para sua faixa etária. Ele tinha dificuldades na grafia das letras e do nome e não desenvolvia com eficácia as atividades que eram propostas. Em alguns momentos não conseguia desenvolver a atividade sozinho, não tinha concentração nem demonstrava vontade de aprender, sendo sempre necessária a intervenção da professora ou até mesmo do intérprete. Na maioria das vezes em que eram propostas a ele atividades próprias de seu ciclo inicial de alfabetização, apresentava resistência em fazê-las. Infelizmente, o tempo máximo de concentração em qualquer atividade direcionada era de aproximadamente 10 minutos, fazendo com que a professora e o intérprete ficassem quase o tempo todo ao seu dispor para que ele não dispersasse. Em um dado momento chegou-se a conclusão de que professora e intérprete deveriam trabalhar em conjunto propondo atividades diferenciadas e lúdicas que estivessem ligadas a Libras para que assim o aluno pudesse aprender melhor essa língua a fim de que posteriormente fosse introduzida gradativamente a língua portuguesa. J.P. apresentava pré-disposição para a realização de atividades com jogos no computador e materiais lúdicos, mas isso demandava acompanhamento constante e sistemático, pois não tolerava frustração e se algo desse errado perdia o controle e passava a ter comportamento agitado. Conseguimos observar que J.P. em determinados momentos conseguia compreender as ordens que lhe eram dadas, mas nem sempre as executava. O fato é que o aluno está em fase de aprendizagem da Libras – Língua Brasileira de Sinais, em um processo de consolidação dos sinais. De acordo com relatos da mãe e da professora regente, o aluno, no início do ano letivo, mais especificamente nas duas primeiras semanas do mês de fevereiro, ainda sem a presença do intérprete, apresentava-se como um aluno bem quieto e desmotivado. A comunicação era muito restrita e manifestava poucas reações perante as situações ocorridas em sala de aula. Depois de certo tempo, com a presença diária do intérprete, o aluno começou a manifestar gradativamente reações de comunicação, tanto positivas como negativas. Na prática foi possível observar que a comunicação é um marco fundamental para que o desenvolvimento humano aconteça. Sua limitação torna difícil a expressão de desejos, expectativas, dúvidas e todos os tipos de sentimentos e experiências dos quais nossas vidas estão impregnadas. A dificuldade de comunicação, presente na criança surda em um meio ouvinte, torna mais difícil o desenvolvimento do pensamento e outras funções mentais 45 superiores. Daí o reconhecimento do papel que a língua de sinais tem na formação do pensamento e da cognição. J.P. está ficando atrasado no processo de alfabetização e letramento e crianças surdas que fazem uso precário da língua portuguesa na versão escrita e desconhecem a língua portuguesa falada têm mais dificuldade em compreenderem e negociarem os significados que estão inseridos no contexto cultural do qual participam. Essa situação precisa ser mudada e as dificuldades como as já aqui apresentadas, precisam ser superadas. Felizmente o aluno J.P., nas últimas semanas do mês de março, começou a apresentar uma considerável melhora. Os laços estabelecidos entre ele, o professor e o intérprete foram se tornando cada dia mais significativos. Já apresentava um interesse maior pelas atividades em Libras e já fazia uso de alguns sinais essenciais na comunicação com os ouvintes como, por exemplo: DESCULPA, OBRIGADO, NÃO PODE, CASA, ÁGUA, CACHORRO, BRINCAR, RECREIO, COMER, PAPAI, MAMÃE, GATO, BANHEIRO, TRISTE, BRAVO, RAIVA, ALEGRE e etc. Todos os sinais aprendidos foram ensinados e feitos de uma forma contextualizada. Os demais alunos estão apresentando um grande interesse em aprender a Libras e sempre que precisam se comunicar recorrem ao intérprete para saber o sinal certo para usar naquela situação. Apesar de J.P. ter uma grande dificuldade em olhar nos olhos de seu interlocutor ao fazer os sinais, acredita-se ser esse um período de adaptação e socialização. Como a Libras antes era raramente utilizada por ele e seus familiares, haverá de se ter um tempo para adquiri-la e utilizá-la com competência, mas já houve um considerável desenvolvimento na sua comunicação e interação com o ambiente escolar. Não foi promovida nenhuma adaptação curricular por parte da professora regente. Antes de trabalhar as atividades diárias em sala de aula, a professora e o intérprete analisavam se o aluno J.P. teria condições de fazê-la, caso contrário, enquanto a professora trabalhava com os alunos ouvintes as atividades, o intérprete oferecia ao aluno surdo atividades em Libras que abordavam conteúdos próximos aos que estavam sendo trabalhados naquela aula. Utilizavam-se recursos visuais tais como vídeos, slides em Power Point, imagens, fotografias e recortes. Essas atividades visavam ensinar ao aluno sinais em Libras que são indispensáveis para se estabelecer uma comunicação e, posteriormente, aquisição de conhecimentos formais. Enquanto isso as crianças ouvintes ocupavam o tempo todo da professora regente. Nas aulas de ensino religioso que aconteciam uma vez por semana, com duração de 50 minutos, a situação não era muito diferente. A professora na maioria das vezes contava uma história que trazia um ensinamento moral e em seguida pedia que os alunos ilustrassem a 46 história. J.P. na maioria das vezes não entendia o que estava acontecendo naquele momento, porém sentava-se na roda com os demais alunos e vez ou outra, quando a história vinha acompanhada do livro, voltava seu olhar para as imagens que ele trazia. Quando a professora solicitava a ilustração da história nem sempre seus desenhos correspondiam ao conteúdo dela. Chegou-se à conclusão que era desnecessário que a história e/ou os conteúdos escolares fossem todos traduzidos em Libras, uma vez que o aluno ainda desconhecia a maioria dos parâmetros dessa língua bem como os sinais que a constituem. Depois de acompanhar o aluno J.P. em sala de aula, foi possível questionar ainda mais sobre as implicações que a inclusão traz no contexto escolar. No começo, quando o aluno surdo conseguia, com ajuda do intérprete, concluir alguma atividade oferecida, ele se levantava e apresentava suas atividades e desenhos para as professoras que utilizavam apenas um aceno de cabeça ou levantavam o polegar direito, confirmando o cumprimento da tarefa. Com o passar do tempo, o interesse em se comunicarem com J.P. foi aumentando e sempre que aconteciam situações semelhantes perguntavam ao intérprete o sinal certo a ser usado naquele momento, mas as práticas usadas pelas professoras eram muito teóricas e pouco contextualizadas. A maioria das atividades era incompreensível para ele. Com o intuito de aumentar e estimular a comunicação entre o aluno surdo e a comunidade escolar, o intérprete passou a ministrar oficinas diárias de Libras antes do início das atividades escolares. A Libras era ensinada de forma sistemática. Começou ensinando o alfabeto manual, números, sinais de identificação da família, cores, dentre muitos outros sinais essenciais dentro do contexto social e escolar. Um ambiente linguístico em Libras começou a estabelecer-se. Concluindo, foi observado que o trabalho dos professores em sala de aula está sempre voltado para a aquisição da leitura e da escrita para alunos ouvintes. Todas as propostas pedagógicas são voltadas para eles. Percebe-se pouca preocupação em relação à aprendizagem da leitura e da escrita por crianças surdas. Na escola todos se sentiam despreparados para lidar com a realidade que J.P. apresenta. Apesar de a referida escola ser considerada como uma escola inclusiva, faltam adaptações curriculares e materiais pedagógicos próprios para atrair a atenção de crianças deficientes auditivas. Não se pode deixar de levar em consideração que essa é a primeira experiência do pesquisador com surdos em fase de alfabetização e que todo o trabalho que está sendo desenvolvido está em fase experimental. Toda a comunidade escolar tem ciência dessas questões e em conjunto estão tentando buscar alternativas para sanar essas dificuldades e implicações. 47 7 ANÁLISE DOS QUESTIONÁRIOS APLICADOS Para a obtenção de dados ainda mais precisos foram utilizadas entrevistas semiestruturadas (APÊNDICES A e B) para enriquecer ainda mais os achados desta pesquisa. Além da professora regente e a professora de ensino religioso, cujas aulas foram observadas, foi solicitado que a diretora e a pedagoga respondessem outro questionário devidamente adaptado, visando à obtenção de maiores informações sobre como se dá o processo de alfabetização e letramento da criança surda nessa escola e seu relacionamento com a comunidade escolar. O QUAD. 1 a seguir descreve as características dos sujeitos entrevistados: QUADRO 1 - Características DESCRIÇÃO DOS SUJEITOS FORMAÇÃO TEMPO DE SERVIÇO NO MAGISTÉRIO SITUAÇÃO FUNCIONAL Tempo que trabalha na escola PROFESSORA REGENTE Pedagogia 07 anos Efetivada 2 anos PROFESSORA DE ENSINO RELIGIOSO LP – Pós-graduada em Ciências da Religião 12 anos Efetivada 7 anos Efetivada 3 meses Diretora 28 anos PEDAGOGA Psicopedagoga DIRETORA Ciências 25 anos no Magistério. Como Pedagoga 20 anos. 30 anos no Magistério. Como Pedagoga 13 anos. Fonte: dados coletados pelo autor. Através da análise dos dados que emergiram das entrevistas constatou-se que grande parte das entrevistadas concorda com a inclusão de alunos surdos nas escolas de ensino comum alegando que essa inclusão é importante, pois dá oportunidade aos surdos de vivenciarem situações que acontecem somente em âmbito escolar. A diretora da escola ressalta que “A escola regular vai contribuir muito para vida e educação do aluno surdo e proporcionar a ele condições de prosseguir e ter uma vida bem próxima da normal”. Porém, a professora de ensino religioso apresenta uma ideia diferente das demais não concordando com a inclusão dos deficientes auditivos. De acordo com ela “é difícil para mim a linguagem de sinais”. Com isso, podemos perceber que não se sente 48 capacitada para lidar com alunos deficientes auditivos, porém o fato de não saber a linguagem de sinais não justifica a não concordância com a inclusão. A capacitação e aprendizagem dessa linguagem podem ser buscadas em conjunto e as barreiras da comunicação podem ser quebradas. A maioria das entrevistadas alegou já ter trabalhado com alunos com algum tipo de deficiência, dentre elas deficiência visual, paralisia cerebral e transtornos diversos. J.P. é o segundo aluno com surdez que a escola atendia. No ano passado havia uma criança surda matriculada no terceiro ano do ensino fundamental que frequentou a escola somente até o início do segundo trimestre do ano. A família mudou-se de estado e com isso a escola não teve mais contato com alunos com deficiência auditiva. Ela era acompanhada por uma intérprete que teve de ser dispensada com a saída da aluna. Para a professora regente da classe e também para a professora de ensino religioso, essa era a primeira experiência com alunos surdos ou qualquer outro tipo de deficiência. A pedagoga alega já ter orientado o trabalho com alunos surdos antes, contudo suas experiências e vivências ainda não foram compartilhadas com o intérprete nem a comunidade escolar. Diante dessas constatações enfatiza-se a importância de um compartilhar de experiências por todas as pessoas envolvidas no processo educacional da criança surda para que assim haja um melhor entendimento das questões que norteiam a inclusão de alunos deficientes em escolas de ensino comum. Aqueles que desconhecem essas implicações precisam ser amparados pelas pessoas experientes e juntos buscarem capacitação e formação continuada. Nenhuma das entrevistadas tem pós-graduação em Educação Especial. Acredita-se que o professor que tem alunos com algum tipo de deficiência precisa ter formação especifica, pois as estratégias e métodos de ensino devem ser diferentes. De uma forma geral, a questão da comunicação foi apontada como a principal dificultadora no processo educacional do aluno com surdez. Todas as entrevistadas foram unânimes ao admitir a dificuldade em comunicar-se com o aluno surdo e até mesmo adaptar o currículo com atividades apropriadas e direcionadas. “Não tenho habilidade com as mãos para usar os sinais”. (PROFESSORA DE ENSINO RELIGIOSO). Ao questioná-las sobre essa questão da comunicação, todas acreditam que a presença do intérprete é imprescindível para que a interação com o aluno aconteça de fato. Concordam que a presença do intérprete trouxe avanços significativos para a aprendizagem do aluno surdo. De acordo com elas, o aluno surdo tornou-se mais participativo, está se desenvolvendo 49 gradativamente com a presença desse profissional. Os demais alunos estão despertando cada dia mais o interesse por essa língua. A interação do aluno surdo nos espaços escolares é de suma importância para que a aprendizagem aconteça. Nesse caso, constata-se que a comunidade escolar está ciente dessa importância e consideram boa a relação do aluno surdo com a escola de uma forma geral. De acordo com a professora regente, todos estão aprendendo nesse processo. Todavia, em relação à interação, a diretora pontua que “Estão engatinhando ... precisa acontecer um envolvimento maior de todos e compreensão para inteirar melhor com o aluno”. Todas definiram corretamente o que é alfabetização e letramento e entenderam que a Língua Portuguesa não deve ser ensinada somente como segunda língua no processo educacional de crianças surdas, mas que é também de suma importância. A Libras deverá ser a primeira a ser introduzida gradativamente para que através dela o surdo possa ter acesso aos conhecimentos. Foi possível observar que o trabalho educacional com crianças surdas é um desafio constante. O fato de elas não conseguirem acompanhar o processo de aprendizagem da turma está relacionado às dificuldades com a língua portuguesa nas modalidades oral e escrita. As entrevistadas não possuem uma visão clara de como a criança surda pensa sobre a língua portuguesa nem como ela a adquire. A professora regente declara que pelo fato de a criança não ouvir, ela não acompanha a turma nem aprende como os ouvintes. E a professora de ensino religioso diz: “Ele está em fase de adaptação”. Sendo assim, seria importante proporcionar experiências que tenham algum valor e que favoreçam a comunicação. Verificou-se que a escola possui pouco ou quase nenhum material específico para alunos surdos. Somente a presença do intérprete não significa que a inclusão está acontecendo. Falta apoio por parte das políticas públicas e conscientização da comunidade escolar em buscar apoio especializado. Os instrumentos de avaliação precisam ser diferenciados. Nem todas as entrevistadas tinham consciência disso. Até mesmo dentro da própria escola existem contradições como as seguintes declarações referentes aos instrumentos de avaliação: “Não tenho conhecimento. Não presenciei a prática ainda”. (DIRETORA DA ESCOLA). “Sim. Caso necessite de um apoio maior, um material que ele desenvolva melhor, procuramos fornecer”. (PEDAGOGA DA ESCOLA). É preciso organizar o tempo escolar para dar atenção a todos os alunos. As professoras alegam que esse tempo é mínimo e procuram sempre levar atividades as quais todos conseguem realizar juntos. Com o aluno surdo utilizam em sala de aula jogos pedagógicos e 50 alfabeto móvel conduzido pelo intérprete e não pelo professor regente. A escola, de acordo com a diretora, recebe materiais enviados pelo MEC – Ministério da Educação e Cultura. Mas, pude perceber que são poucos os materiais destinados aos deficientes auditivos. A criança surda é inteligente como qualquer outra, porém não possui uma língua compartilhada que a possibilite acessar de forma natural os conteúdos acadêmicos. A maioria não tem um desenvolvimento linguístico igual ao de outras crianças da sua idade, porque tiveram acesso tardio a sua língua natural e não foram expostas de forma adequada à língua oral. Sua aprendizagem será pautada no visual-gestual. A utilização da Libras, as imagens, cores, expressões, gestos e mímicas farão com que ela participe ativamente da vida escolar e da sociedade. Infelizmente, a Libras só é enfatizada quando há alguém surdo na escola. Para que a inclusão aconteça de fato, é necessário que todos aprendam Libras, não apenas o intérprete e a criança surda. Não se pode deixar que a escola delegue a responsabilidade da aprendizagem da criança somente ao intérprete. O professor regente, principalmente, precisa buscar especializações para entender melhor a temática da educação de surdos. O intérprete será um viabilizador da comunicação e juntamente com a comunidade escolar deve buscar soluções para superar as barreiras da inclusão. A Libras para o surdo é como a fala para os ouvintes e faz-se necessário que essa língua seja respeitada, que seja considerada particularidade do sujeito surdo e que haja estímulo, respeito e participação maior da sociedade em adquirir essa língua. 51 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao final deste estudo, diante de tudo que foi pesquisado e observado na prática de alfabetização e letramento de crianças surdas, construiu-se um novo olhar sobre a surdez. Esse olhar implica que a criança surda deve ter o seu diferencial linguístico reconhecido, além das peculiaridades que envolvem esse sujeito. Conforme Skliar (2012) existe uma diferença crucial entre entender a surdez como uma deficiência e entendê-la como uma diferença. Sendo assim é imprescindível o papel dos educadores e da família diante da formação da identidade e da autonomia da criança surda. De acordo com o apresentado neste estudo, se a criança surda não tiver uma orientação consistente desde a mais tenra idade, seu desenvolvimento pode ser seriamente comprometido. Sabe-se que houve certo avanço no que diz respeito à educação de surdos ao longo dos tempos, porém há muito que fazer ainda para que os surdos recebam uma educação de qualidade. É preciso enxergar além de suas deficiências e limitações para trabalharmos de uma forma mais concreta e significativa, respeitando seu ritmo de aprendizagem. (...) Diante do fato das crianças surdas virem para a escola sem uma língua adquirida, a escola precisa estar atenta a programas que garantam o acesso à língua de sinais brasileira mediante a interação social e cultural com pessoas surdas. O processo educacional ocorre mediante interação lingüística e deve ocorrer, portanto, na língua de sinais brasileira. Se a criança chega na escola sem linguagem, é fundamental que o trabalho seja direcionado para a retomada do processo de aquisição da linguagem através de uma língua visual-espacial. Digo que a aquisição da linguagem é essencial, pois através dela, mediante as relações sociais, se constituirá os modos de ser e de agir, ou seja, a constituição do sujeito. (QUADROS, 2003, p. 99). Os dados aqui apresentados apontam para uma realidade na qual professores, demais membros da escola e a rede de ensino em si têm pouca ou nenhuma experiência com alfabetização e letramento de crianças surdas. Sendo assim, é necessário que políticas públicas sejam elaboradas com a finalidade de oferecer a esses educadores um aperfeiçoamento em sua área de atuação para propiciar um ensino de qualidade voltado para crianças surdas na perspectiva do bilinguismo. Cabe ainda ressaltar que, assim como a criança analisada neste estudo, boa parte dos surdos brasileiros tem acesso tardio à língua brasileira de sinais o que compromete ainda mais o seu desenvolvimento social, cognitivo e afetivo. 52 Sabe-se que hoje em dia a inclusão está se tornando uma temática polêmica. Ao mesmo tempo em que a legislação dá o direito da pessoa com necessidades especiais estarem inclusas nas redes regulares de ensino, na prática, ainda existem muitos entraves. No caso específico deste estudo, o surdo encontra-se matriculado e frequente na rede comum de ensino. Porém, nota-se que o sistema de ensino não está preparado para recebê-lo. A escola em si foi preparada para receber alunos ouvintes e toda sua estrutura e didática está voltada para acolher esses sujeitos. Para que as crianças surdas possam concorrer de igual para igual é necessário fazer valer a legislação e oferecer um atendimento educacional especializado de boa qualidade, buscando mudanças no sistema educacional e na formação de professores. Este trabalho pode revelar o quanto a comunicação com a criança surda torna-se restrita e difícil até mesmo para quem a acompanha diariamente em sala de aula, que é o caso do intérprete. Então, para que uma educação de qualidade seja oferecida a esse público, é preciso que as práticas de alfabetização e letramento sejam revistas e elaboradas de forma a possibilitar à criança surda uma interação de forma significativa com os mais variados gêneros textuais. O professor precisa utilizar-se de metodologias diferenciadas. Acredita-se também que, além de estarem inseridas nas redes comuns de ensino, deveria ser oferecido um atendimento educacional especializado, com adultos surdos, para ensinar ou pelo menos estimular essas crianças a adquirirem a linguagem de sinais fora do horário escolar e depois a língua majoritária, no caso a língua portuguesa, na sala de aula. Diante dos fatos aqui levantados, salienta-se que não cabe culpar os professores, intérpretes e comunidade escolar pelo fracasso do aluno surdo. O sistema de ensino deveria rever as suas políticas e trabalhar mais para que a inclusão de alunos surdos aconteça de forma consistente. O que compete é encarar a surdez para que se possa emergir na construção de um novo tempo. Enfim, esta pesquisa é apenas o início de uma longa caminhada que busca a ampliação das discussões a respeito da aprendizagem do aluno surdo. Todos são capazes de aprender. A inclusão exige mudança de atitude da escola, que deve perceber que todos os alunos são diferentes entre si e preparar-se para dar atenção pedagógica diferenciada de acordo com suas necessidades educacionais. Trata-se de mudança de enfoque no conceito de educação, pois não só a família e o aluno com deficiência ou com condutas típicas se esforçam para adaptarse à escola, mas essa também se transforma de modo a facilitar e tornar possível o ensino para todos. 53 REFERÊNCIAS AZEVEDO, Carlos A. Moreira; AZEVEDO, Ana Gonçalves. Metodologia Científica: contributos práticos para a elaboração de trabalhos acadêmicos. Ed. C. Azevedo, 2000. BAGGIO, M. A.; CASA NOVA, M. G. Libras. In: BAGGIO, M. A.; CASA NOVA, M. G. (Org). LIBRAS. Rio Grande do Sul: ULBRA, 2011. BARBIER, R. A pesquisa-ação. Brasília: Liber Livro, 2002. BOTELHO, Paula. Linguagem e letramento na educação dos surdos: ideologias e práticas pedagógicas. Belo Horizonte: Autêntica, 2002. BRASIL. Constituição (1988). 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Campinas, SP: Autores Associados, 2005. 56 APÊNDICE A – Entrevista com professores Nome:........................................................................................................................................... Formação:.................................................................................................................................... Tempo de serviço no magistério:............................................................................................... Situação funcional: ..................................................................................................................... Tempo que trabalha na escola:.................................................................................................. 2 – Você já trabalhou antes com alunos com algum tipo de deficiência? 3 – Já trabalhou com alunos surdos? 4 – Você concorda com a inclusão de alunos surdos nas escolas de ensino comum? Justifique. 5 – Você percebeu algum avanço com relação à aprendizagem/participação do aluno surdo em suas aulas devido à presença do intérprete de LIBRAS? Quais? 6 – Como é a interação/relação do aluno surdo com os colegas ouvintes dentro e fora da sala de aula? 7 – Quais as principais dificuldades que o aluno surdo apresenta em relação aos conteúdos ministrados em sua disciplina? 8 – Você sabe como a criança surda pensa e entende a linguagem oral e escrita? 9 – Você acha que seu aluno surdo acompanha a classe, tem um desempenho satisfatório em comparação com o restante da turma? Justifique. 10 – Como você consegue organizar o tempo escolar para dar atenção aos seus alunos ouvintes e o surdo? 11 – Como você se comunica com seu aluno surdo? 12 – Fale um pouco das dificuldades implicadas no trabalho educacional com crianças surdas. 13 – Utiliza algum material didático específico/adaptado com seu aluno surdo? Quais? 14 – Em sua opinião como o surdo aprende a ler e escrever? 15 – Fale um pouco sobre a inclusão em sua escola. 16 – Você fez algum curso específico para trabalhar com alunos surdos? 17 – Em sua opinião o que é Alfabetização e Letramento? 18 – Você acha que o processo de avaliação das crianças surdas deve ser o mesmo utilizado com crianças ouvintes? Por quê? 57 APÊNDICE B - Entrevista com a Pedagoga e Diretora 1- Identificação: Nome:........................................................................................................................................... Formação:.................................................................................................................................... Tempo de serviço no magistério:............................................................................................... Tempo de serviço como Pedagoga:........................................................................................... Tempo de serviço na escola:....................................................................................................... Situação funcional: ..................................................................................................................... 2 – Você já atuou antes, orientando o trabalho com alunos com deficiência ou os apoiando? Durante quanto tempo? Qual ou quais tipos de deficiência? 3 – Já apoiou e orientou o trabalho com alunos surdos antes? 4 – Você concorda com a inclusão de alunos surdos nas escolas de ensino comum? Justifique. 5- Você consegue comunicar com os alunos surdos? Utiliza a LIBRAS ou outro tipo de comunicação? 6 – Você percebeu algum avanço com relação à aprendizagem/participação do aluno surdo em sua escola com a presença do intérprete de LIBRAS? Quais? 7 – Como é a interação/relação do aluno surdo nos espaços escolares e com os funcionários e colegas? 8 – Você tem conhecimento das principais dificuldades que o aluno surdo apresenta em relação aos conteúdos ministrados na escola? 9 – Você compreende como o aluno surdo percebe a língua oral e escrita? 10- O aluno surdo da sua escola acompanha o aprendizado da turma, tem um desenvolvimento compatível com ela ou com seus pares etários? Justifique. 11 – Você já participou de algum curso de capacitação ou estudos sobre as dificuldades implicadas no trabalho educacional com crianças surdas? 12 – A escola dispõe de algum material ou recurso didático específico/adaptado para o trabalho com eles, oferece apoio educacional especializado no contraturno ou possui aula de LIBRAS e ensino de Português como segunda língua como prevê a legislação?Explique. 13 – Os instrumentos de avaliação dos alunos surdos são os mesmos utilizados com crianças ouvintes? Justifique. 58 14- O aluno surdo passa pelas mesmas fases da leitura e da escrita por qual passam as crianças ouvintes? 15 – Fale um pouco sobre a inclusão, de uma forma geral, na sua escola. 17 – Dê a sua definição de alfabetização e letramento.