TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO DESCRIÇÃO DO PERFIL DOS PACIENTES SUBMETIDOS À CIRURGIA BARIÁTRICA PROFILE DESCRIPTION OF PATIENTS SUBMITTED TO BARIATRIC SURGERY Marcelo Bettega1 André Luiz Benção1 Eduardo de Oliveira Ribas1 Gustavo Baggio Furiatti1 Alessandro Yugo Yoshiyasu1 César Augusto Broska Júnior1 Augusto De Folchini1 Paulo Afonso Nunes Nassif2 RESUMO A obesidade é uma doença crônica caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura corporal. Sua prevalência vem crescendo acentuadamente nos últimas décadas e os custos com suas complicações são muito altos. A cirurgia bariátrica é hoje uma realidade como técnica capaz de reverter os processos deletérios causados pela obesidade e sua aceitação vem crescendo entre os pacientes. Este trabalho teve como objetivo descrever as causas de indicação cirúrgica de pacientes que se submeteram à cirurgia bariátrica em um ano, no Hospital Universitário Evangélico de Curitiba. Para a construção do perfil do paciente submetido à intervenção cirúrgica, foram utilizados os dados relacionados à sexo do paciente, idade, índice de massa corporal e presença de comorbidades significativas. A principal causa de indicação cirúrgica foi a presença de comorbidades, a exemplo de esteatose hepática, hipertensão arterial sistêmica e diabetes mellitus. Palavras-chave: Obesidade. Cirurgia. Perfil. ABSTRACT Obesity is a chronic disease characterized by excessive body fat. Its prevalence has grown dramatically in recent decades and the costs of its complications are very high. Bariatric surgery is currently a reality as an alternative to revert deleterious processes induced by obesity. This study aimed to describe the causes of surgical indication of patients who were submitted to bariatric surgery in one year at the Evangelical University Hospital of Curitiba. To describe the profile of the bariatric surgery patient, data on sex, age, body mass index and significant comorbidities was utilized. The main cause of surgical indication was the presence of comorbidities such as hepatic esteathosis, systemic arterial hypertension and diabetes mellitus. Keywords: Obesity. Surgery. Profile. 1 Doutorando do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba. 2 Professor da disciplina de Metodologia Científica da Faculdade Evangélica do Paraná. Aprovado em: 05/12/2012 Autor para correspondência: Paulo Afonso Nunes Nassif Contato: [email protected] Revista Eletrônica da Faculdade Evangélica do Paraná, Curitiba, v.2, n.4, p.30-35, out./dez. 2012. 30 DESCRIÇÃO DO PERFIL DOS PACIENTES SUBMETIDOS À CIRURGIA BARIÁTRICA INTRODUÇÃO A obesidade é uma doença crônica caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura corporal. Sua prevalência vem crescendo acentuadamente nos últimas décadas e os custos com suas complicações são muito altos, pois incluem diabetes mellitus e suas complicações, doenças pulmonares, hipertensão arterial, dislipidemia, doenças vasculares cerebrais e alterações psiquiátricas, como depressão e baixa auto-estima.(1,2) A OMS classifica a obesidade baseando-se no Índice de Massa Corporal (IMC) e no risco de mortalidade associada.(1,2) Assim, considera-se obesidade quando o IMC encontra-se acima de 30kg/m². Quanto à gravidade, a OMS define obesidade grau I quando o IMC situa-se entre 30 e 34,9 kg/m², obesidade grau II quando IMC está entre 35 e 39,9kg/m² e, por fim, obesidade grau III quando o IMC ultrapassa 40kg/m².(2,3) Nos últimos anos, com o aperfeiçoamento das técnicas cirúrgicas, bem como maior curva de aprendizado exigida do cirurgião, principalmente pela ampla difusão e aceitação da videocirurgia, a cirurgia bariátrica vem despontando como primeira linha de tratamento de vários estados de obesidade, com muitos serviços de Obesidade e Cirurgia do Aparelho Digestivo de Hospitais de grandes centros a tendo incluído como opção real de tratamento a seus pacientes.(3,4,5) São candidatos ao tratamento cirúrgico pacientes com o IMC maior que 40 kg/m2 ou com IMC superior a 35 kg/m2 associado a comorbidade tais como apnéia do sono, diabetes mellitus tipo 2, hipertensão arterial, dislipidemias e dificuldades de locomoção, entre outras de difícil manejo clínico. A seleção de pacientes requer um mínimo de cinco anos de evolução da obesidade com fracasso dos métodos convencionais de tratamento realizados por profissionais qualificados.(1) Diante da importância da cirurgia bariátrica no enfrentamento de uma das doenças mais prevalentes no século 21, o objetivo do presente estudo foi descrever as causas de indicação cirúrgica dos pacientes submetidos á cirurgia bariátrica no Hospital Universitário Evangélico de Curitiba. MÉTODOS Foi realizada pesquisa descritiva quantitativa retrospectiva através da coleta de dados dos prontuários dos pacientes submetidos à cirurgia bariátrica no Hospital Universitário Evangélico de Curitiba durante o período de um ano. Cada prontuário deveria conter dados referentes ao sexo do paciente, seu peso em quilogramas, idade, altura em metros, assim como claramente apontar a presença ou ausência das seguintes comorbidades: hipertensão arterial sistêmica, dislipidemia, diabetes mellitus, esteatose hepática, apnéia do sono, distúrbios osteomusculares relacionados ao excesso de peso, colelitíase e hipotireoidismo. Tais condições foram escolhidas para a construção do perfil do paciente submetido à cirurgia bariátrica por estarem intimamente relacionadas à obesidade e suas repercussões metabólicas, e pelo potencial de apresentarem resolução completa ou parcial após a realização do ato cirúrgico. As informações contidas em cada prontuário foram coletadas no arquivo de prontuários médicos do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba, mediante aprovação prévia pelo Comitê de Ética da respectiva Instituição. Os dados coletados foram analisados estatisticamente, utilizandose testes de frequência simples para as variáveis, que foram apresentadas em estatística descritiva. Revista Eletrônica da Faculdade Evangélica do Paraná, Curitiba, v.2, n.4, p.30-35, out./dez. 2012. 31 DESCRIÇÃO DO PERFIL DOS PACIENTES SUBMETIDOS À CIRURGIA BARIÁTRICA RESULTADOS No ano de 2007, foram realizadas 43 cirurgias bariátricas em 43 pacientes. Apenas 29 prontuarios continham informações com a exatidão necessária para a elaboração da pesquisa. Desses 29 pacientes, 72% (21 pacientes) eram do sexo feminino e 28% (8 pacientes) eram do sexo masculino. A faixa etária dos pacientes variou entre 17 e os 57 anos, a maioria situada entre 27 e 36 anos. Vinte e dois pacientes (75%) possuíam IMC inferior a 40. Dos sete pacientes com IMC acima de 40, seis eram mulheres. Como a maioria dos pacientes não possuía indicação direta de cirurgia pelo IMC, podemos concluir que a maior indicação cirúrgica neste Hospital foi a associação de IMC acima de 35 com comorbidades significativas. Para elucidar quais seriam tais comorbidades, foi confeccionado o gráfico 1, que evidencia as comorbidades apresentadas pelos pacientes. Estenose hepática foi a comorbidade mais prevalente, enquanto apnéia do Sono e dislipidemia foram as que apresentaram menos incidência. Oito pacientes desta amostra não apresentaram nenhuma comorbidade, sendo que sete apresentaram indicação cirúrgica pelo valor do IMC e o motivo de indicação cirúrgica de um paciente não foi esclarecido. O gráfico 2 mostra que a comorbidade mais presente nos obesos (IMC<40) foi a Esteatose Hepática enquanto para os obesos mórbidos (IMC>40) as comorbidades não apresentaram uma prevalência significativa entre si. DISCUSSÂO É sabido que a obesidade correlaciona-se com diabetes mellitus tipo 2, colelitíase, coronariopatias, hipertensão arterial, acidente vascular encefálico, dislipidemia, esteatose hepática, apnéia do sono, doenças osteomusculares, gota, além de estar potencialmente implicada emalguns tipos de câncer com mama, pulmão, endométrio, e desordens psicológicas como ingestão alimentar compulsiva e depressão.(6,7,8) O manejo de tal condição inicia-se pelo tratamento clínico, que inclui anorexígenos ou disabsortivos, além de tratamentos psicológico, fisioterápico, dietético e exercícios físico, com resultados satisfatórios nos casos em que existe a adesão do paciente ao tratamento, predominantemente, quando há sobrepeso e obesidade grau I.(9) Contudo, mais de 90% das pessoas que se esforçam para perder peso recuperam-no após a suspensão do tratamento, e a taxa de insucesso aumenta de acordo com o peso inicial.(9) A cirurgia bariátrica, portanto, é hoje em dia o tratamento mais efetivo para a obesidade grau III e visa preencher uma necessidade terapêutica para controle desta epidemia global, sendo que até o momento, dos pacientes submetidos a esta cirurgia, apenas 1% voltam a ganhar peso.(6,10) Cabe lembrar que o paciente obeso candidato à cirurgia bariátrica é submetido a avaliação multidisciplinar, incluindo nutricionista, enfermeira especializada, psicólogo ou psiquiatra, cardiologista, pneumologista, endocrinologista e anestesiologista.(11,12) Tal avaliação, embora extensa, é fundamental para a detecção de estados mórbidos coexistentes que muitas vezes não são de conhecimento do paciente, orientação de exames complementares e consultas especializadas.(4) Como vimos no presente estudo, o paciente bariátrico apresenta diversas comorbidades que exigem detecção e acompanhamento afim de não indicar cirurgia em paciente com risco cirúrgico proibitivo ou que apresente comorbidades que exijam compensação antes do ato cirúrgico, como é o caso do diabetes mellitus e da hipertensão. Tal avaliação também é importante no campo psicológico/psiquiátrico, pois o paciente obeso muitas vezes carrega estigmas sociais e não raro pode ser vítimas de preconceito e baixa auto-estima.(7) Por isso, a avaliação psicológica/psiquiátrica do paciente é de fundamental importância para a correta indicação cirúrgica e para posterior sucesso do procedimento, uma vez que uma das Revista Eletrônica da Faculdade Evangélica do Paraná, Curitiba, v.2, n.4, p.30-35, out./dez. 2012. 32 DESCRIÇÃO DO PERFIL DOS PACIENTES SUBMETIDOS À CIRURGIA BARIÁTRICA condições para indicar o procedimento é a motivação pré-operatória em seguir as recomendações cirúrgicas e clínicas para perder peso atestada por profissional capacitado.(6,7) A importância da saúde mental ao se realizar o procedimento também esbarra na questão estética, pois, como era mais comum antigamente, muitos pacientes buscam a correção cirúrgica por ser um “atalho” para a perda de peso e não compreendem a dimensão do ato cirúrgico em si e de suas repercussões metabólicas, e portanto devem ser esclarecidos que a cirurgia não é uma maneira de escapar aos hábitos saudáveis, e sim de reforçá-los.(6) O acompanhamento multidisciplinar periódico, no pós-operatório da cirurgia bariátrica tem um impacto significante na perda de peso, com acompanhamento clínico do paciente e apoio psicológico.(6) No Serviço no qual os pacientes do presente estudo foram submetidos à cirurgia bariátrica, é necessário passar por todas as avaliações citadas acima, para aumentar a chance de sucesso do procedimento em si e também do acompanhamento a longo prazo. Quanto ao perfil dos pacientes, no presente estudo, surpreendeu-nos o fato de que 72,4% das pacientes eram do sexo feminino. Estudo nacional conduzido por Garrido Junior descreveu o percentual de 59% para as mulheres, o que reforça a tendência nacional de indicar cirurgia bariatrica em maior frequência para pacientes do sexo feminino.(3) Quanto à idade, a maioria dos pacientes (37,9%) estava na faixa etária entre 27 e 36 anos, o que esteve de acordo com trabalhos realizados em outros centros, pois a média de idade na qual os pacientes costumam realizar a operação situa-se em 37 anos.(3,4) Segundo Ilias et al., 6% dos pacientes operados tem mais de 60 anos e 0,6% tem menos de 18 anos.(5) Em seu trabalho, descreveu que entre 1981 e 2001 foram operados apenas 33 adolescentes, todos por obesidade mórbida refratária ao tratamento clínico, reforçando o fato de que a maioria dos pacientes operados é adulto jovem e já se submeteu a diversos tratamentos clínicos antes de se decidir pela cirurgia. A maior parte das pessoas submetidas à cirurgia possuía IMC abaixo de 40 (75,8%). Na literatura essa média de IMC é de 60%.(3,4) Isso indica que muitos pacientes foram operados devido à comorbidades associadas, sendo a esteatose hepática a mais frequente no presente estudo. De acordo com Garrido Junior, a dispnéia aos esforços esta presente em 65% dos casos e, em sua coorte, tal comorbidade foi a mais frequente.(3) Oliveira Filho et al. afirmam que em pacientes obesos mórbidos, 50% eram hipertensos, sendo a comorbidade mais frequente encontrada em tal estudo.(4) No mesmo trabalho, é descrito que 12,5% do total de pacientes possuía esteatose hepática, contrastando com nossos achados.(4) No presente estudo, 51,7% dos pacientes possuía apenas uma comorbidade. De acordo com Garrido Junior, 38% dos pacientes possuíam ao menos duas comorbidades.(3) Tal discrepância pode ser explicada pelo relativo baixo IMC de nossos pacientes, pois estudos revelam que pacientes obesos mórbidos possuem mais comorbidades do que os obesos não mórbidos.(4) Nossos pacientes não possuíam, em sua maioria, IMC acima de 40, o que caracterizaria-os como obesos mórbidos, portanto, é compreensível que com um valor menor de IMC houvesse menos comorbidades. Também vale destacar o fato de que no serviço do Hospital avaliado a indicação cirúrgica é mais precoce e precisa, pois os pacientes não chegavam ao patamar da obesidade mórbida e desenvolvimento de múltiplas comorbidades. Dos 29 prontuários consultados, 8 (27,5%) não apresentaram comorbidades, apesar do fato de as comorbidades terem sido a principal causa de indicação cirúrgica, e apresentaram indicação apenas pelo IMC. CONCLUSÂO O perfil do paciente submetido à cirurgia bariátrica no Hospital Universitário Evangélico de Curitiba é de, em sua maioria, mulheres com IMC superior a 35 associado à comorbidades, principalmente esteatose hepática. Revista Eletrônica da Faculdade Evangélica do Paraná, Curitiba, v.2, n.4, p.30-35, out./dez. 2012. 33 DESCRIÇÃO DO PERFIL DOS PACIENTES SUBMETIDOS À CIRURGIA BARIÁTRICA REFERÊNCIAS 1. Segal A, Fandino J. Bariatric surgery indications and contraindications. Rev. Bras. Psiquiatr. 2002;24:68-72. 2. Fandino J, Benchimol AK, Coutinho WF, Apolinário JC. Bariatric surgery: clinical, surgical and psychiatric aspects. Rev. psiquiatr. Rio Gd. Sul. 2004;26(1):47-51. 3. Garrido Junior AB. Cirurgia em obesos mórbidos: experiência pessoal. Arq. Bras. Endocrinol. Metab. 2000;44(1):106-13. 4. Oliveira Filho GR, Nicolodi THC, Garcia JHS, Nicolodi MA, Goldschmidt R, Dal Mago AJ. 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Fonte: Arquivo de Prontuários Médicos – HUEC Revista Eletrônica da Faculdade Evangélica do Paraná, Curitiba, v.2, n.4, p.30-35, out./dez. 2012. 35