Direitos e garantias individuais

Propaganda
Teoria geral dos direitos
fundamentais
Direitos e garantias individuais
Esdras Boccato
Mestre em Direito do Estado – USP
Procurador da Fazenda Nacional
1. Fontes
1.1. Liberdade dos antigos
Historicamente, observa-se que os primeiros direitos
assegurados aos indivíduos são o de participação na
vida política da comunidade. Nas cidades gregas da
Antiguidade, ao cidadão é dada a prerrogativa de decidir questões da vida pública (ex.: decidir pela guerra
ou paz, votar leis, celebrar tratados com estrangeiros,
etc.). Trata-se da chamada liberdade dos antigos,
conforme expressão de Benjamin Constant.
1. Fontes
1.1. Liberdade dos antigos
Porém, “... todas as ações privadas estão sujeitas a
severa vigilância. Nada é concedido à independência
individual, nem mesmo no que se refere à religião. A
faculdade de escolher seu culto, faculdade que
consideramos como um de nossos mais preciosos
direitos, teria parecido um crime e um sacrilégio para
os antigos. Nas coisas que nos parecem mais
insignificantes, a autoridade do corpo social interpunha-se e restringia a vontade dos indivíduos” (1).
1. Fontes
1.2. Antiguidade e cristianismo
Apesar das restrições da liberdade privada ao indivíduo
na Antiguidade, é nela que surgem as primeiras noções
de que existem direitos inerentes à natureza humana e
que devem ser respeitados. Na obra clássica Antígona,
de Sófocles, há o relato do embate entre a lei humana
(proibição de funeral a desertores) editada pelo rei
Creonte, e a lei divida (direito de ser enterrado conforme os ritos sagrados), invocada por Antígona em favor
de seu irmão Polinices, morto em luta pelo trono.
1. Fontes
1.2. Antiguidade e cristianismo
Contudo, é com o cristianismo primitivo que a noção de
que o homem tem dignidade começa a ganhar força. A
concepção de que “o homem é criado à imagem e semelhança de Deus e a ideia de que Deus assumiu a
condição humana para redimi-la imprimem à natureza
humana alto valor intrínseco” (2). Por isso que, no séc.
XIII, Tomas de Aquino, em Suma teológica, defenderá
a ideia de que existe uma lei natural, gravada na natureza humana que o homem descobre pela razão.
1. Fontes
1.3. Escola do direito natural e jusnaturalismo
do século XVIII
Já no século XVII, observa-se o surgimento da escola de
direito natural a pregar a existência de direitos que decorrem da natureza humana. Surgida com Hugo Grócio, tem
a concepção de que os direitos naturais não são instituídos, mas apenas declarados a partir da razão humana.
Desenvolvido ao longo dos séculos XVII e XVIII, a teoria
jusnaturalista ganha impulso com o contratualismo de
John Locke e Jean-Jacques Rousseau.
1. Fontes
1.3. Escola do direito natural e jusnaturalismo
do século XVIII
Na concepção jusnaturalista, existem direitos naturais ao
ser humano que são aferíveis pela razão, que são eternos, absolutos e válidos para todos os homens, e que
servem de fundamento para o direito legislado (positivado). Ao Estado, surgido mediante pacto social, compete a
conservação destes direitos naturais, sem a qual perde
sua razão de existir, conforme os contratualistas.
2. Origens históricas
2.1. Revoluções liberais do século XVIII
Historicamente, são nas revoluções liberais do séc. XVIII
em que se observa o efetivo surgimento da noção de que
há direitos inerentes à natureza humana cujo respeito se
impõe ao Estado, limitando sua atuação. Influenciadas
pelos ideais do liberalismo econômico e político, foram
resultados da crise institucional vivida entre o modelo de
monarquia absolutista e a pujança econômica da classe
burguesa, até então oprimida politicamente com os privilégios assegurados à nobreza e clero.
2. Origens históricas
2.1. Revoluções liberais do século XVIII
Contextualmente, “as invenções, em particular da máquina a vapor, haviam estimulado o crescimento econômico
apesar das resistências a ele opostas pelo conformismo
das corporações esclerosadas e pela ingerência estatal.
O progresso fazia pelo esforço dos indivíduos, apesar
dos grupos e do Estado... A revolução individualista era
imprescindível para a consolidação e o aceleramento do
progresso econômico” (3).
2. Origens históricas
2.1. Revoluções liberais do século XVIII
As reivindicações das revoluções liberais tiveram como
propósito impor limitações ao poder do Estado e evitar o
arbítrio dos governantes. Por isso, os direitos tidos como
inerentes à pessoa humana na concepção oitocentista
são essencialmente “liberdades, ou seja, poderes de agir,
ou não agir, independentemente da ingerência do Estado” (4). São as chamadas liberdades públicas, também
conhecidas como “liberdades dos modernos” (Constant).
2. Origens históricas
2.2. Declarações de Direitos
Um dos resultados das revoluções liberais foi a edição de
Declarações de Direitos, cujo propósito era evidenciar,
com clareza e precisão, os direitos naturais a serem conservados pelo Estado. Considerando que o objetivo das
revoluções do séc. XVIII foi o de acabar com a opressão
vivida pela burguesia, as primeiras Declarações de Direitos limitaram-se a consagrar as liberdades públicas como
meio de resistência e de limitação ao poder do Estado.
Ao Estado caberia abster-se.
2. Origens históricas
2.2. Declarações de Direitos
A Declaração Universal dos Direitos do Homem e do
Cidadão de 1789 foi o principal documento a proclamar
os direitos “naturais, inalienáveis e sagrados do homem”
com caráter universal. Em 16 artigos, são consagradas
as liberdades dos indivíduos, em especial a liberdade,
igualdade, propriedade e legalidade. Com teor marcadamente liberal, a Declaração reconhece as chamadas “liberdades públicas”, apesar de nela não se prever nem a
liberdade de reunião, nem a de associação.
2. Origens históricas
2.4. Evolução do perfil dos direitos fundamentais
As reivindicações do séculos XVIII e XIX tiveram como
alvo acabar com a opressão política a que a burguesia
era submetida. Por causa disto, os direitos fundamentais
pleiteados à época limitaram-se a consagrar as liberdades públicas como meio de resistência e de limitação ao
poder do Estado. Neste ideal, ao Estado caberia absterse, intervindo na vida privada o mínimo necessário.
2. Origens históricas
2.4. Evolução do perfil dos direitos fundamentais
Contudo, já em meados do século XIX, com a formação
da classe operária, observou-se que a opressão a ela
imposta vinha também do modelo capitalista. Pouca importância havia em se assegurar liberdades a todos se a
maioria não detinha condições materiais de exercê-las.
“De que adianta a liberdade de imprensa para todos
aqueles que não têm os meios para fundar, imprimir e
distribuir um jornal? – perguntavam esses críticos” (5).
2. Origens históricas
2.4. Evolução do perfil dos direitos fundamentais
Além disto, as concepções acerca da relação entre
indivíduos e Estado começam a sofrer mudanças. Enquanto nos meios burgueses “o que se pedia era liberdade de ação contra o Estado, ou apesar do Estado; nos
meios proletários, o que se almeja era proteção e amparo
por parte do Estado. Enquanto para a mentalidade predominante nas classes ricas o Estado era o inimigo, embora
um inimigo às vezes útil, para o proletariado era ele talvez a última esperança” (5).
2. Origens históricas
2.4. Evolução do perfil dos direitos fundamentais
Por isso, principalmente no início do sec. XX, surgem as
primeiras Constituições a disciplinar essa nova tipologia
de direitos fundamentais, originárias das necessidades
humanas oriundas da penúria vivida pelos operários. Conhecidos como direitos sociais e econômicos, constituem-se em direitos sujeitos a prestações positivas proporcionadas pelo Estado em favor dos indivíduos, característica que os diferenciam sobremaneira das liberdades
públicas (direitos individuais).
2. Origens históricas
2.5. Formação dos direitos fundamentais
É por ser perceptível a evolução do perfil dos direitos
fundamentais que afirma JOSÉ AFONSO DA SILVA que “...
não há propriamen-te uma inspiração das declarações de
direitos. Houve reivindicações e lutas para conquistar os
direitos nelas consubstanciados. E quando as condições
materiais da sociedade propiciaram, elas surgiram, conjugando-se, pois, condições objetivas e subjetivas para sua
formação” (6). Neste diapasão se insere também a afirmação de HANNA ARENDT sobre os direitos fundamentais:
“não são um dado, e sim um construído”.
2. Origens históricas
2.6. Gerações de direitos fundamentais
A evolução histórica dos direitos fundamentais é também
abordada pela perspectiva das chamadas “gerações de
direitos fundamentais”. Criada pelo jurista francês Karel
Vasak (1979), trata-se de uma tradicional classificação
dos direitos fundamentais em 3 gerações, inicialmente:
(1ª) direitos e liberdades individuais; (2ª) direitos sociais e econômicos; (3ª) direitos de solidariedade, titularizados por uma coletividade difusa (ex.: direito ao meio
ambiente equilibrado, direito à conservação do patrimônio histórico, etc.).
2. Origens históricas
2.6. Gerações de direitos fundamentais
Contudo, “falar em sucessão de gerações não significa
dizer que os direitos previstos num momento tenham sido
suplantados por aqueles surgidos em instante seguinte”
(7). O que há é a interação destes direitos fundamentais.
Até porque “no concernente à estrutura, há direitos que,
embora reconhecidos num momento histórico posterior,
têm a que é típica de direitos de outra geração” (8). Por
isto alguns preferem a expressão “dimensões de direitos
fundamentais”.
2. Origens históricas
2.6. Gerações de direitos fundamentais
3ª geração
2ª geração
1ª geração
3. Conceito
3.1. Essência dos direitos fundamentais
A noção básica de direitos fundamentais é a de que são
direitos indispensáveis a garantir a dignidade da pessoa
humana. Podem ser definidos como “conjunto mínimo de
direitos necessários para assegurar uma vida do ser
humano baseada na liberdade, igualdade e na dignidade”
(9). Essencialmente, são direitos sem os quais não há
como promover vida digna ao ser humano. Por isto, este
é o critério para a identificação dos direitos fundamentais
implícitos na Constituição Federal de 1988 (art. 5º, § 2º).
3. Conceito
3.1. Essência dos direitos fundamentais
O art. 5º, § 2º da CF/88, ao estabelecer que “os direitos e
garantias expressos nesta Constituição não excluem
outros decorrentes do regime e dos princípios por ela
adotados, ou dos tratados internacionais em que a
República Federativa do Brasil seja parte”, evidencia que
existe um critério material para a identificação de direitos
fundamentais. Até porque, sem um critério substancial,
tornar-se-ia impossível identificar um direito fundamental
implícito.
3. Conceito
3.1. Essência dos direitos fundamentais
Há quem defenda que somente os direitos materialmente
fundamentais são protegidos pela proibição de abolição
prevista no art. 60, § 4º, inciso IV, CF/88: “... deve-se
considerar que as cláusulas pétreas não alcançam senão
direitos fundamentais materiais. Seria uma fraude que
protegessem direitos comuns com a inabolibilidade” (10).
Outros autores defendem que “esses direitos e garantias
individuais protegidas são os enumerados no art. 5º da
Constituição e em outros dispositivos da Carta” (11).
3. Conceito
3.1. Essência dos direitos fundamentais
O Supremo Tribunal Federal (STF) proclamou na ADI 939
que o princípio da anterioridade tributária (art. 150, inciso
III, “b”, CF/88) é garantia individual do contribuinte e, por
isto, protegido pelas cláusulas pétreas. Do mesmo modo,
na ADI 3685 considerou que o princípio da anterioridade
eleitoral (art. 16, CF/88) é garantia individual do eleitor
oponível à alterações constitucionais, porque decorrente
do direito fundamental da segurança jurídica e do devido
processo legal. São direitos fundamentais implícitos.
3. Conceito
3.2. Aplicabilidade dos direitos fundamentais
O art. 5º, § 1º da CF/88 prevê que “as normas definidoras
dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”. Influenciado pelo art. 18.1 da CRP, foi editado com
a louvável intenção de evitar que a previsão de direitos
fundamentais seja letra morta, tanto que não se limita a
disciplinar apenas dos direitos individuais. Porém, para
que assim seja, os direitos fundamentais hão de entrar
previstos em normas jurídicas com densidade normativa
suficiente para serem aplicadas imediatamente.
3. Conceito
3.2. Aplicabilidade dos direitos fundamentais
Quanto a isto, “por regra, as normas que consubstanciam
os direitos fundamentais democráticos e individuais são
de eficácia contida e aplicabilidade imediata” (12). Já “as
normas que dispõe sobre direitos fundamentais de índole
social, usualmente, têm a sua plena eficácia condicionada a um complementação pelo legislador” (13). Porém há
direitos individuais que necessitam de concretização
legislativa para que sejam aplicados, como são o direito
de acesso ao Judiciário (art. 5º, XXXV), ao Juri (XXXVIII).
3. Conceito
3.2. Aplicabilidade dos direitos fundamentais
Além dos direitos fundamentais que necessitam de que
haja lei para serem implementados, há direitos que não
são auto-executáveis por estarem previstos em normas
constitucionais incompletas. Até porque “pretender que
uma norma incompleta seja aplicada é desejar uma
impossibilidade, ou forçar a natureza que, rejeitada, volta
a galope” (14). Exemplo: mandado de injunção (art. 5º,
LXXI).
3. Conceito
3.3. Características dos direitos fundamentais
 inalienabilidade: porque são direitos intransferíveis e
inegociáveis já que não aferíveis economicamente;
 imprescritibilidade: porque são sempre exercíveis e
não se extinguem pelo não-uso;
 irrenunciabilidade: porque não podem ser renunciados por seus detentores (art. 11, Código Civil);
 historicidade: porque são oriundos de longa evolução
histórica, até porque “nascem, modificam-se e desaparecem” (15).
3. Conceito
3.3. Características dos direitos fundamentais
 universalidade: porque são direitos inerentes à natureza humana independentemente de sexo, raça, nacionalidade, religião, convicção filosófica, etc.;
 progressividade: porque não podem sofrer retrocesso
ou terem seu âmbito de proteção reduzido (proibição
do retrocesso ou efeito cliquet);
 limitabilidade (relatividade): porque “não se reconhece a presença de direitos absolutos, mesmo de estatura de direitos fundamentais” (16)
3. Conceito
3.4. Limitações dos direitos fundamentais
A relatividade dos direitos fundamentais advém da noção
de que estes “não podem ser utilizados como um verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas,
tampouco como argumento para afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de total consagração ao desrespeito a um
verdadeiro Estado de Direito”. Assim, “encontram seus
limites nos demais direitos igualmente consagrados pela
Carta Magna” (17).
3. Conceito
3.4. Limitações dos direitos fundamentais
A ideia de que os direitos fundamentais não são ilimitados
já estava presente na Declaração Universal dos Direitos
do Homem e do Cidadão (1789), ao dispor em seu art. 4º:
“A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique o próximo: assim, o exercício dos direitos naturais
de cada homem não tem por limites senão aqueles que
asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos
mesmos direitos. Esses limites apenas poder ser determinados pela lei”.
3. Conceito
3.4. Limitações dos direitos fundamentais
Existem direitos fundamentais previstos no art. 5º, CF/88,
em cujas normas constitucionais já consta a possibilidade
de sofrerem restrições mediante lei. Geralmente, utilizase a expressão “nos termos da lei” para indicar que a lei
poderá limitar o exercício destes direitos. Exemplos disto
são o sigilo telefônico (inciso XII), a liberdade de locomoção no território brasileiro (inciso XV), a liberdade do exercício de profissão (inciso XIII), etc.
3. Conceito
3.4. Limitações dos direitos fundamentais
Às vezes, a norma constitucional de direito fundamental
contém apenas a previsão de que as restrições sejam instituídas por lei (reserva legal simples). Às vezes, contém
condições especiais para que a restrição por lei seja estabelecida (reserva lega qualificada), como ocorre no caso
das limitações ao sigilo telefônico (inciso XII). Entretanto,
admite-se que direitos fundamentais tenham seu exercício
limitado por lei mesmo quando a Constituição não prevê
expressamente nenhuma reserva legal.
3. Conceito
3.4. Limitações dos direitos fundamentais
A conformação legislativa de direitos fundamentais cujas
normas constitucionais não prevejam limites deve ser feita
com o objetivo de promover outro direito fundamental, sob
pena de ser impor restrições abusivas. Assim, é possível
a edição de lei para compor potenciais colisões de direitos
fundamentais. Exemplo disto é o art. 41, inciso XV, Lei nº.
7.210/84 (Lei de Execução Penal) que impõe restrições
ao sigilo de correspondência do preso, apesar de o art.
5º, inciso XII, não prever nenhuma limitação.
3. Conceito
3.4. Limitações dos direitos fundamentais
As restrições legais impostas aos direitos fundamentais
devem observar o princípio da proporcionalidade. É
subdivido em três elementos: adequação, necessidade, e
proporcionalidade em sentido estrito. Adequado é “o meio
com cuja realização de um objetivo é fomentado”. Necessário é o meio em que o objetivo é promovido com a mesma intensidade e com a menor restrição ao direito fundamental atingido. Proporcional em sentido estrito é o meio
que tem peso suficiente para justificar a restrição no
direito fundamental atingido (18).
3. Conceito
3.5. Princípio da proporcionalidade aplicado
ADEQUAÇÃO
a restrição é capaz de produzir o resultado esperado?
NECESSIDADE
a restrição imposta é a mais eficaz e a que causa menos ônus
ao direito fundamental?
PROPORCIONALIDADE EM SENTIDO ESTRITO
o direito fundamental promovido tem peso suficiente para
justificar a restrição do outro direito fundamental?
4. Natureza
4.1. Direitos fundamentais individuais
A primeira geração de direitos fundamentais são aqueles
oriundo das revoluções liberais do século XVIII, por terem
sido os primeiros direitos a serem positivados, inclusive,
nas Constituições dos países. São considerados direitos
fundamentais individuais porque objetivam fixar a esfera
de autonomia privada de cada indivíduo, na qual o Estado não pode ingerir. Por isso são chamados liberdades
públicas.
4. Natureza
4.1. Direitos fundamentais individuais
Os direitos fundamentais individuais caracterizam-se por
conterem prestações negativas (obrigações de non facere) dirigidas sobretudo ao Estado, motivo pelo qual são
considerados direitos de defesa, assim entendidos como aqueles que “caracterizam-se por impor ao Estado
um dever de abstenção, um dever de não-interferência,
de não intromissão no espaço autodeterminado do indivíduo” (19).
5. Regime constitucional
5.1. Direitos individuais na CF/88
Divergindo da tendência das Constituições anteriores, a
CF/88 prevê os direitos e garantias fundamentais já no
Título II, antes de estabelecer a estrutura do Estado de
disciplinar seu funcionamento. “Quis com isso marcar a
preeminência que lhes reconhece” (20). Entretanto, não
há hierarquia entre normas constitucionais editadas originalmente na CF/88.
5. Regime constitucional
5.1. Direitos individuais na CF/88
A previsão dos direitos individuais é inaugurada no caput
do art. 5º: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção
de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos seguintes termos”.
5. Regime constitucional
5.2. Titularidade dos direitos individuais
A literalidade do caput do art. 5º indica que a República
Federativa do Brasil apenas assegura direitos individuais
aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País, excluindo os estrangeiros não-residentes (turistas, etc.). No
entanto, “expressão residentes no Brasil deve ser interpretada no sentido de que a Carta Federal só pode assegurar a validade e o gozo dos direitos fundamentais
dentro do território brasileiro, não excluindo, pois, o estrangeiro em trânsito pelo território nacional” (21).
5. Regime constitucional
5.2. Titularidade dos direitos individuais
Além disto, doutrina e jurisprudência brasileiras admitem
que as pessoas jurídicas também são titulares dos direitos
fundamentais suscetíveis, por sua natureza, de lhes serem
exercidos. Assim, admite-se que direitos como igualdade,
propriedade, sigilo, inviolabilidade de domicílio, honra, etc.
possam ser invocados por pessoas jurídicas. Além disto,
tem sido admitida a invocação de direitos fundamentais de
índole procedimental por pessoas jurídicas de direito público (próprio Estado), inclusive (22).
5. Regime constitucional
5.3. Sujeição passiva dos direitos fundamentais
A historicidade dos direitos fundamentais demonstra que
as normas constitucionais que os preveem tem no Estado
o destinatário preferencial, uma vez que surgiram a partir
das reivindicações feitas perante o Poder Público, então
considerado o principal violador das liberdades individuais.
No entanto, mesmo quanto aos direitos individuais, notase que não só o Estado é obrigado a respeitá-los, mas
também é obrigado a fazer com que sejam respeitados
pelos demais indivíduos.
5. Regime constitucional
5.4. Eficácia horizontal dos direitos fundamentais
Além disto, a jurisprudência do STF reconhece que alguns
direitos fundamentais aplicam-se diretamente às relações
privadas. No RE 158.215/RS, firmou-se entendimento de
que direitos fundamentais de índole procedimental devem
ser observados pelos particulares (ex.: direito ao contraditório e à ampla defesa). No RE 161.243, entendeu-se que
o princípio da igualdade obriga que empresas não façam
distinção de empregados por conta de nacionalidade.
Notas de rodapé
 (1) CONSTANT, Benjamin, Da liberdade dos antigos comparada a dos Modernos, Revista Filosofia Política nº. 2, 1985.
 (2) BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, MENDES, Gilmar Ferreira, Curso de direito constitucional, 6ª ed., São Paulo, Saraiva, 2011,
p. 154.
 (3) FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, Curso de direito constitucional, 39ª ed., São Paulo, Saraiva, 2013, p. 322.
 (4) FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, Direitos humanos fundamentais, 14ª ed., São Paulo, Saraiva, 2012, p. 41.
 (5) FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, Curso de direito constitucional, ..., p. 324.
 (6) SILVA, José Afonso, Curso de direito constitucional positivado, 25ª ed., São Paulo, Saraiva, 2005, p. 173.
 (7) BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, MENDES, Gilmar Ferreira, Curso de direito constitucional, 6ª ed., São Paulo, Saraiva, 2011,
p. 156.
 (8) FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, Direitos humanos fundamentais,..., p. 24.
 (9) CARVALHO, André Ramos, Teoria geral dos direitos humanos na ordem internacional, 3ª ed., São Paulo, Saraiva, 2013, p.
32.
 (9) SILVA, José Afonso, Curso de direito constitucional positivado, 25ª ed., São Paulo, Saraiva, 2005, p. 159.
 (10) FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, Direitos humanos fundamentais,..., p. 131.
 (11) BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, MENDES, Gilmar Ferreira, Curso de direito constitucional, 6ª ed., São Paulo, Saraiva, p.
145.
 (12) SILVA, José Afonso, Curso de direito constitucional positivado, 25ª ed., São Paulo, Saraiva, 2005, p. 180.
 (13) BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, MENDES, Gilmar Ferreira, Curso de direito constitucional, 6ª ed., São Paulo, Saraiva,
2011, p. 175.
 (14) FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, Direitos humanos fundamentais,..., p. 126.
 (15) SILVA, José Afonso, Curso de direito constitucional positivado, 25ª ed., São Paulo, Saraiva, 2005, p. 181.
 (16) STF, 2ª Turma, HC 93250, Relatora Ministra Ellen Gracie, DJ 26/06/2008.
 (17) MORAIS, Alexandre, Direito constitucional, 30ª ed., São Paulo, Atlas, 2014, p. 30.
 (18) SILVA, Luís Virgílio Afonso da, O proporcional e o razoável, Revista dos Tribunais nº. 798.
 (19) BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, MENDES, Gilmar Ferreira, Curso de direito constitucional, 6ª ed., São Paulo, Saraiva,
2011, p. 178.
 (20) FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, Direitos humanos fundamentais,..., p. 121.
 (21) MORAIS, Alexandre, Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional, 9ª ed., São Paulo, Atlas, 2013, p. 102.
 (22) BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, MENDES, Gilmar Ferreira, Curso de direito constitucional, 6ª ed., São Paulo, Saraiva,
2011, p. 196.
Download