Sepse na Emergência Aluna: Ylle Souza Clínica Médica Oitavo Semestre Caso Clínico Paciente feminina, 17 anos, procura PS com queixa de febre alta, dor em baixo ventre e corrimento vaginal amarelado há 3 dias. HMA:Paciente chega ao serviço de emergência referindo amenorréia há 3 meses e há 5 dias havia se submetido à manipulação uterina com finalidade abortiva.Há 3 dias vem apresentando febre de 38, 5 °C, que só cessa com uso de antitérmico, associada a calafrios. A dor é do tipo cólica em hipogástrio e de forte intensidade. Refere corrimento vaginal amarelado e fétido.Fez uso de Paracetamol para febre. Nega alergia medicamentosa. Exame Físico: • Dados Vitais: – – – – Temp: 39° C FC 140 bpm FR 32 rpm PA 90x40 mmHg. • Paciente em péssimo estado geral, toxemiada, ictérica, descorada ++/IV confusa. • AR: Tórax simétrico com boa expansibilidade. MVBD, crépitos em base. • ACV: BRNF em 2T, ausência de sopros. • Abdome: RHA presentes, flácido, dor à palpação em baixo ventre, útero aumentado de tamanho e doloroso. • AGU: Ao toque:Presença de leucorréia amarelada e fétida. • Exames : – – – – – – – gasometria: pH 7,30 , pCO2 : 20 , pO2 :60 , Bic :12 Na: 140, K :5,0, Cl: 90 , ácido lático :20 mEq/l (nl até 1,5 ) TGO: 100, TGP: 80 BT: 6, BD :5 HMG-Hb :10, leuc: 7.000 (com desvio a esquerda), plaq :50.000 Uréia :150, Creatinina : 2,0, Na urinário:5 mEq/l R - X tórax: área cardíaca normal, congestão pulmonar • Evolução: Foram colhidas culturas vaginais, hemoculturas e introduzida antibioticoterapia. A paciente foi submetida à curetagem uterina, após piora da insuficiência respiratória, oligúria e hipotensão, sendo a paciente internada na UTI onde foi submetida à cateterização de artéria pulmonar que revelou: AD 4 mm Hg, PA 50x0 , PCP 6 mm Hg, FC: 150 bpm , DC: 9 l/min , RVS: 300 dinas , CAV O2 :1,5 mO2/100 ml – Feita reposição volêmica com 1.500 ml de solução cristalóide com melhora da PA para 100x30 mm Hg, e introduzida dopamina para manter-se PAM 90 mm Hg, sendo em seguida colocada em assistência ventilatória e PEEP. – Foi indicada histerectomia total. O útero apresentava-se muito amolecido, com vários abscessos no miométrio. Poucas horas após a cirurgia foi possível interromper o uso de drogas vasoativas. Houve melhora das funções cardio-circulatória e renal, diminuição da icterícia e normalização das plaquetas, sendo colocada em ventilação espontânea a partir do 5º PO. Recebeu alta no 15º PO. • SD: – Abortamento infectado – Choque séptico – Insuficiência Renal? Definições (Consenso de 1992) • Síndrome Resposta Inflamatória Sistêmica (SIRS) : é a resposta inflamatória generalizada em resposta a uma variedade de insultos clínicos graves. É reconhecida pela presença de dois ou mais sinais ou exames : – temperatura corporal > 38 C ou < 36 C – frequência cardíaca > 90 bpm – frequência respiratória > 20 ir/min ou PaCO2 < 32 mmHg – leucócitos > 12000 cels/mm3 ou < 4000 cels/mm3, ou > 10 % de formas imaturas (bastões) • Sepse: SIRS com etiologia infecciosa • Sepse Grave: Sepse com um ou mais sinais de disfunção orgânica, hipoperfusão ou hipotensão. • Choque Séptico: Sepse com hipotensão (Ta sistólica: <90 ou <40 da TAS do paciente) durante pelo menos 1 hora de reposição hídrica ou necessidade de vasopressores para manter a TA. * P(predisposing factors) I(infection) R(host response) O(organ dysfunction)-Consenso de 2001 Epidemiologia • Principal causa de morte nas UTI em todo o mundo • EUA: – 750 mil casos de sepse a cada ano – evolução para óbito em 215.000 casos • Brasil – Incidência é crescente – Altas taxas de mortalidades • • • • em torno de 50 % sem redução há 20 anos idade média = 61,7 anos 55% sexo masculino • População de risco: – Idosos – Imunosuprimidos – Portadores de doenças crônicas Fisiopatologia Fisiopatologia Aspectos da Fisiopatologia • Além da inflamação há um grau de imunossupressão que contribui para a evolução do quadro séptico. • A diminuição da disponibilidade de O2 ocorre por redução da TA ou do DC, por trombose difusa na microcirculação e redistribuição do fluxo sanguíneo tecidual. Manifestações Clínicas • Há diferenças individuais na apresentação e na velocidade com que ela se instala • Sinais e sintomas: – – – – – – – Febre Calafrios Fraqueza Hiperventilação- sinal precoce Desorientação e confusão – idosos Apreensão, ansiedade e agitação Sintomas específicos: • • • • Lesões cutâneas (petéquias ou púrpuras cutâneas: n. meningitidis) Tosse, dor no peito, dispnéia Dor abdominal, náuseas, vômitos, diarréia Disúria, dor pélvica ou em flanco, urgência miccional • Manifestações precoces (choque quente) e tardias (choque frio) Diagnóstico • Clínico • Não há testes específicos • Diagnóstico da Infecção:(Surviving Sepsis Campaign-2004) a. definir o foco infeccioso (pulmonar,abdominal, urinário,vascular) b. coletar culturas apropriadas (hemoculturas em até 1 hora) c. c. exames de imagem (preferencialmente à beira do leito – Rx, USG) Achados Laboratoriais • Leucocitose (com desvio para a esquerda) ou Leucopenia • Trombocitopenia • Hiperbilirrubinemia • Proteinúria • Elevação de ALT e AST • Gasometria arterial: hipoxemia • Hiperglicemia, raramente hipoglicemia • Declínio da Albumina • Lactato sérico > 2 mmol/L Mecanismos de Disfunção Orgânica • ACV e microcirculação – Hipotensão: ↑ permeabilidade capilar e ativação de vasodilatadores. – Na periferia (alterações no tono vascular) há prejuízo em direcionar o fluxo de acordo com a demanda metabólica adicionada à trombose na microcirculação gerando áreas hipoperfundidas e de shunt→ desequilíbrio entre oferta e necessidade de oxigênio →metabolismo anaeróbio →acidose lática • Anemia – – – – – Perdas Aumento na destruição das hemácias Sequestro na microcirculação Depressão medular Deficiências nutricionais • Pulmonar – Modificação na relação ventilação perfusão →edema intersticial • Hepático – Prejuízo do transporte hepatocelular canalicular →colestase • Renal – IRA devido à NTA (devido à hipotensão, vasoconstrição renal e lesão renal) • Neurológico – SNC e neuropatia periférica • Endócrino – Insuficiência adrenal • Substâncias resultantes do processo inflamatório que inibem a síntese de corticóides, libera ACTH e aumentam a resistência periférica ao corticóide – Hiperglicemia • Resitência periférica à insulina • Neoglicogênese (aumento de hormônios relacionados ao estresse:glucagon e cortisol) Complicações • Cardiopulmonares: Queda da PO2 arterial--SARA(desigualdade da ventilação/perfusão, aumento da permeabilidade dos capilares alveolares) – Hipotensão: má distribuição do fluxo e volume sanguíneo e hipovolemia(extravasamento capilar difuso) • Renais:Oligúria, Azotemia, Proteinúria e Cilindrúria. • Coagulação: Trombocitopenia-trombose microvascular. • Neurológicas: Fraqueza motora distal-persistência do choque séptico por semanas ou meses a polineuropatia impede o desmame do suporte ventilatório. Tratamento • O reconhecimento precoce e a terapia adequada e agressiva nas primeiras tem impacto significativo na sobrevida dos pacientes • As primeiras 6 horas –cuidado emergencial e as horas subsequentes – UTI Alicerces • Terapia precoce baseada em metas- Early Goal Directed • Ventilação mecânica protetora • Administração de antibióticos de amplo espectro • Corticóides e possivelmente proteína C ativada recombinante Rivers E et al, NEJM 2001 Ressuscitação Inicial • Deve ser realizada nas 6 primeiras horas • Estabilização Ventilatória→Inserção de Cateter Venoso Central • Medida da Pressão Venosa Central(PVC) → 8-12 mmHg, mediante reposição com cristalóides (20-40 ml/kg /) ou colóides (15-30 ml/kg). • Medida da Pressão Arterial Média (PAM) →65-90 mmHg, por meio de vasopressores ou vasodilatadores. • Se Saturação Venosa Central (SvO2) for < 70 % : – com Htc <30: o paciente recebe Concentrado de Hemácias – Htc ≥ 30 : Inicia o uso de Dobutamina • Manutenção do débito urinário ≥ 0,5 ml/kg/h Ventilação Mecânica Protetora • Aproximadamente 50 % dos pacientes irão desenvolver SDRA ou lesão pulmonar aguda • Baixo Volume: 6ml/kg até 4ml/kg, visando manter a pressão de platô abaixo de 30 cm H2O. • SpO2 88-95% • Sedação com benzodiazepínicos em BI com acordar diário (benzodiazepínicos e opióides – associação • pode causar hipotensão) • Cabeceira elevada >30% ou 45 graus (prevenção de pneumonia) • Evitar o uso de bloqueadores neuromusculares Antibioticoterapia • Escolha do antibiótico: – – – – – • • • • Local da infecção Germes mais comuns envolvidos Condição clínica e imunológica do paciente Padrão de resistência na comunidade ou no hospital Protocolo + Consensos Via endovenosa Na primeira hora (após a cultura) Esquema empírico inicial amplo ( inadequada→pior prognóstico) Reavaliação do esquema em 48-72 horas , a partir de dados clínicos e microbiológicos • Monoterapia ou Terapia Combinada? • Controle do Foco (drenagem de locais com foco fechado, retirada de dispositivos vasculares, debridamento de tecido necrótico) Corticóide • Questionável • Intravenoso • Hidrocortisona: 200-300mg/dia, por 7 dias , divididas em 3-4 doses • Indicados em pacientes em choque séptico(manutenção da PA) • Deve ser retirado com o controle do choque Proteína C reativa • • • • • Reduz a mortalidade Indicação duvidosa = foco abdominal Boa indicação = foco pulmonar Deve se usar heparina profilática Contra-indicações: – sangramento ativo, neurotrauma ou neurocirurgia, cateter peridural, neoplasia intracraniana,plaquetopenia < 50.000/mm3 • Desvantagens: – Alto custo – Resultados não confiáveis Outros • Profilaxia – TVP – heparina SC 5.000 u 12/12 h ou enoxiparina SC 40 mg 24/24 h – Estresse gástrico – IBP ou ranitidina– (dieta zero, choque, HDA, coagulopatia) • Bicarbonato – somente se pH < 7,20 – evitar na acidose láctica – fazer solução diluída: 150 ml HCO3 + 850 ml SG 5% infusão 1-3 ml/kg/h – avaliar hemodiálise Prognóstico • 20-35% com sepse grave e 60 % dos com choque séptico morrem em 30 dias. • APACHE II: idade, estado clínico prévio, variáveis fisiológicas---estima o risco de morte por sepse grave Prevenção • Em países desenvolvidos a maioria das mortes é por infecção hospitalar---reduzir procedimentos invasivos, usos de cateteres, e proceder tratamento agressivo de infecções • Uso indiscriminado de antibióticos Resumo • Diagnostique rapidamente: sinais vitais,consciência, lactato, leucograma, hiperglicemia e plaquetometria • Faça antibióticos de largo espectro • Colete culturas apropriadas • Acesso venoso de bom calibre (PVC) • Reposição volêmica (guiar com diurese, FC, PA • e lactato – SvcO2) • Avalie Hb / Dobutamina / Vasopressores • Trabalhe ativamente para prevenir novas infecções Referências • SALES JUNIOR, João Andrade L. et al . Sepse Brasil: estudo epidemiológico da sepse em Unidades de Terapia Intensiva brasileiras. Rev. bras. ter. intensiva, São Paulo, v. 18, n. 1, Mar. 2006 . • Rivers E et al. Early Goal-Directed Therapy in the Treatment of Severe Sepsis and Septic Shock N Engl J Med 2001 345: 1368-1377 • Falcão L et al.Medicina Intensiva para a GraduaçãoUnifesp • Condutas em Urgência e Emergência para o Clínico Fim.