O BRINCAR: UMA ESTRATÉGIA DE ENFRETAMENTO NA HOSPITALIZAÇÃO INFANTIL Juliana Aparecida dos Santos; Maria Stela dos Anjos; Noeme Rodrigues Barbosa; Sergio Fontana. RESUMO Este artigo apresenta o contexto da criança hospitalizada e as repercussões na vida social do paciente, quem sofre agressões físicas e emocionais constantemente devido aos tratamentos evasivos e dolorosos, podendo causar feridas no mundo mágico da criança. Analisando a importância do brincar no hospital, esta pesquisa avaliou as estratégias de enfrentamento da hospitalização. Tendo em vista que a brincadeira é a linguagem das crianças, através dela se pode aprender a interação social, trabalhar a atenção, seqüências, habilidades, solucionar problemas, explorar sentimentos, desenvolver causa e efeito, estimular a criatividade e inclusive enfrentar os percalços da hospitalização. Palavras chave: Criança, o brincar, hospitalização 1. INTRODUÇÃO Quando a família descobre o diagnostico de uma doença crônica em um dos seus membros, principalmente quando se trata de uma criança é momento de extrema fragilidade para todos, principalmente para o pequeno paciente. A hospitalização afasta a criança de sua vida cotidiana, do ambiente familiar e promove um confronto com a dor, à limitação física e a passividade, aflorando sentimentos de culpa e medo da morte. Há uma ruptura na vida de todos da família, ou seja, ocorre uma mudança na rotina, a criança então se depara com um mundo novo “o hospital”. A realidade hospitalar será nova para ele, e, portanto, desconhecida. Desde o setor pediátrico, a própria enfermaria, o seu leito, as roupas, a comida, os horários que devem ser seguidos, até as pessoas à sua volta. A criança deve deixar de lado sua família (ou parte dela), seus brinquedos, o meio social em que vivia e passa a viver em um ambiente estressor, hostil que desperta medo, insegurança e angustia. Para lidar com essa situação, o brincar surge então, como uma possibilidade de alterar o dia-a-dia da internação dessas crianças, uma vez que alem de ser utilizado para fins terapêuticos, desperta fantasias e possui alto potencial recreativo. Muitos autores vêm apontando a importância do brincar durante o adoecimento e a internação hospitalar. Eles destacam o brincar como um fim terapêutico capaz de promover não só a continuidade do desenvolvimento infantil, como também a possibilidade de, através dele, a criança melhor elaborar esse momento especifico em que vive (Mitre, 2000). O brincar tem funcionado como estratégia de enfrentamento, pois, através dele, têm-se a oportunidade de compreender a dinâmica e os conflitos internos do paciente (criança) diante da doença e resgatar a auto-estima e observar o comportamento verbal e não-verbal. Não é apenas através da fala que a criança pode construir narrativas. A função da comunicação já está estabelecida na criança mesmo antes do domínio da linguagem formal e de sua expressão lingüística. A importância do brincar na situação hospitalar ganhou relevância social principalmente a partir do trabalho do médico Patch Adams (1999), nos EUA, cuja historia pessoal foi popularizada através de um filme chamado “Patch Adams: o amor é contagioso”. Já a inclusão da brincadeira, visando o relaxamento da criança para administração de quimioterapia, foi sugerida por Löhr (1998) em seu trabalho sobre a intervenção psicológica em crianças com câncer em tratamento em dois hospitais de Curitiba, PR Segundo Bruner (2002) apud Kushimoto (2002) a brincadeira desenvolve a descoberta de regras e aquisição de linguagem. A criança brinca quando repete a brincadeira no contato interativo com os adultos e outros, e assim acaba por descobrir regras. Ela não só repete quando brinca como também altera a seqüência ou acrescenta novos elementos. A brincadeira nada mais é do que um processo de relação da criança com o objeto, o brinquedo ou outras crianças e adultos. Nesse sentido o brincar acaba como um processo cultural. Segundo Vygotsky (1984), o brinquedo não é simbolização, mas sim atividade da criança. Isso porque o símbolo é um signo e no brinquedo a criança opera com significados desligados dos objetos aos quais estão habitualmente ligados. Mesmo sem considerar o brinquedo como um aspecto predominante da infância, Vygotsky ressalta a importância dessa atividade para o desenvolvimento mostrando que ela cria uma zona de desenvolvimento proximal. Ao brincar, a criança está acima das possibilidades da própria idade, imitando os mais velhos nos seus comportamentos. No estudo do brincar, observa-se o comportamento das crianças, no que diz respeito às atividades físicas e mentais envolvidas, as características de sociabilidade que o jogo propicia as atitudes, as mudanças de atitudes, as reações e emoções que envolvem os jogadores e os objetos utilizados. Ao analisarmos os comportamentos do brincar surgem diferentes perspectivas,afetivas, cognitivas,sociais, culturais, lingüísticas etc. 1.1 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA Snadden e Brown (1992) apud Cláudia Maria Teixeira Goulart, Tânia Mara Sperb, "os profissionais da área da saúde necessitam conhecer os efeitos da doença, tecnologia e medicação, não somente em termos clínicos, mas também sobre a vida de seus pacientes" (p. 1357). Para isso, deve-se voltar o olhar para as crenças, os medos, as atitudes e o entendimento que estes pacientes têm a respeito de sua doença. Segundo Oliveira (1993) apud Cláudia Maria Teixeira Goulart, Tânia Mara Sperb, "há uma dicotomia profunda entre o que a criança percebe como enfermidade, hospitalização e cuidado e o que a Medicina oferece como saúde, ato médico e tratamento" (p. 329). Desta forma, o impacto psicológico e a significação que a criança e sua família irão construir a partir de um imperativo, como por exemplo, doença sem cura, é um ponto a ser discutido. Para Bruner (1990/1997) apud Cláudia Maria Teixeira Goulart, Tânia Mara Sperb, as pessoas organizam sua experiência e seu conhecimento sobre o mundo a partir de um sistema de crenças que é a "psicologia popular". O seu princípio organizador, no entanto, não é conceitual, mas narrativo. Justifica desta forma, o estudo das narrativas, uma vez que estas são construídas para dar sentido à experiência e organizá-la. A narrativa será criada sempre que algo "não for como deveria ser" (p. 44) na vida de um indivíduo e que este precise resignificar sua experiência. É no encontro entre os estados percebidos do mundo e os desejos da pessoa que surge a dramaticidade nas narrativas. Uma característica crucial da narrativa é que ela procura estabelecer ligações entre o excepcional e o comum. Tal fato nos leva a considerar a hipótese de que as crianças que se encontram frente à situação de uma doença crônica possam utilizar-se de narrativas para tentar explicar o que acontece com elas. Para Walter Benjamin (1984) apud Regina Lúcia Sucupira Pedroza (2005), o jogo também é visto como uma atividade muito antiga. O brincar significa sempre libertação. Ao brincar as crianças criam para si o pequeno mundo próprio. Frente a uma realidade ameaçadora, sem perspectivas de solução, liberta-se dos horrores do mundo através do jogo. O jogo, a brincadeira, por mais bem elaborados que possam ser não trazem por si só o lúdico, mas são as próprias crianças, durante a brincadeira, que transformam o momento em um momento lúdico, de fantasia e realidades criadas por elas. Acredita-se, erroneamente, que o conteúdo imaginário do brinquedo determina a brincadeira da criança, quando, na verdade, acontece o contrário. Segundo Freud apud Brougeré, “o brinquedo das crianças é regido pelos seus desejos, ou mais rigorosamente, por aquele desejo que tanto coadjuva para sua educação: o desejo de ser adulto”. Freud (1920) e autores psicanalíticos como Winnicott (1975) e Dolto (1999) apud Regina Lúcia Sucupira Pedroza (2005), contribuem para o entendimento da importância da brincadeira no desenvolvimento da criança. Winnicott, a partir dos seus estudos na clínica infantil, defende a tese de que é necessário se estudar o brincar como um fenômeno que ocorre tanto com a criança como com o adulto nas suas formas diferenciadas. A brincadeira é universal e é própria da saúde, facilita o crescimento, desenvolve o potencial criativo e conduz aos relacionamentos grupais. Nesse sentido, o autor entende o brincar como algo que, por si só, é uma terapia com possibilidade autocurativa. Quando as crianças sentem que os outros estão livres e também podem brincar, elas se sentem confiantes para fazê-lo. Quando a criança não é capaz de brincar, há algo errado, fazendo-se necessário trazê-la para o seu estado natural em que ela possa brincar. 1.2 OBJETIVO O objetivo desse artigo é analisar a importância do brincar para criança hospitalizada e como essa atividade é essencial para o desenvolvimento físico, emocional e social da criança. 1.3 JUSTIFICATIVA A literatura tem trazido trabalhos que discutem a importância do brincar para o desenvolvimento sensório-motor e intelectual das crianças, assim como sua importância no processo de socialização no desenvolvimento e aperfeiçoamento da criatividade e autoconsciência. O reconhecimento da importância do brincar também se encontra registrado no Estatuto da Criança e do Adolescente que no artigo 16 traz: “O direito à liberdade compreende: (...) IV- brincar, praticar esportes e divertir-se” (BRASIL, 1991). Nosso trabalho baseou-se em relacionar o quanto esse brincar tem um importante valor terapêutico, influenciando no restabelecimento físico e emocional, e o quanto pode tornar o processo de hospitalização menos traumatizante e mais alegre, fornecendo melhores condições para a recuperação, pois ao brincar a criança libera sua capacidade de criar e reinventar o mundo. 2. METODOLOGIA O levantamento de dados desse trabalho foi baseado em pesquisas de vários artigos e reportagens que abordam o tema relacionado à criança internada que se ambienta melhor em um hospital através das brincadeiras. Sendo feito uma revisão dos artigos publicados que tinham relação com o assunto pesquisado.. 2.1 DESCRIÇÃO DO MÉTODO Foram utilizados como instrumentos de pesquisa: - Texto e artigos relacionados com o assunto abordado pelo grupo. 3. APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS Quando uma criança é hospitalizada, não traz consigo apenas um corpo doente. Ela traz também as experiências que já vivenciou o convívio com a família, amigos, escola e as atividades cotidianas como, por exemplo, o brincar. Constatamos a grande versatilidade e criatividade das crianças na transformação de instrumentos hospitalares em brinquedos. Esta dualidade entre o real e o imaginário possibilita às crianças converterem experiências que deveriam suportar passivamente em desempenho ativo, com isso elas podem controlar imaginariamente o novo ambiente. Embora aparentemente insignificante esta atividade de brincar é um momento privilegiado para a elaboração de ansiedades decorrentes do desconforto e estranheza frente à hospitalização. Outra questão importante em nossa opinião, é que as crianças submetidas a hospitalizações freqüentes e repetidas recebem estímulos que outras provavelmente não receberão se não vivenciarem este processo. Aquela que convive com a doença crônica e freqüenta o ambiente hospitalar e entra em contato, por exemplo, com outras formas de alimentação, equipamentos que estão ao seu redor, intervenção em seu próprio corpo, dor, enfim procedimentos e sensações que enriquecem suas experiências, mesmo que nem todas sejam alegres e tranqüilas, mas são estímulos que contribuirão para seu processo de crescimento e desenvolvimento. 4. CONCLUSÃO O brincar pode ser analisado assim, como um meio para compreender melhor os aspectos psíquicos vivenciados na hospitalização de crianças, e como esta atividade ajuda no enfrentamento desta vivência. De modo geral, o brincar constitui-se de fato em um recurso viável e adequado para o enfrentamento da hospitalização e pode ser mais utilizado quando a criança encontra apoio nas ações institucionais que viabilizam e disponibilizam recursos humanos e materiais para este fim. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADAMS, P.: Patch Adams: o amor é contagioso. (F. Colasanti, Trad.). Rio de Janeiro: Sextante. (Trabalho original publicado em 1945, 1999). BRUNER, J. (1987). Life as narrative. Social research, 54, 11-32. BRUNER, J. (1997). Atos de significação (S. Costa, Trad.). Porto Alegre: Artes Médicas. FRIEDMANN, Adriana, Brincar, crescer e aprender: o resgate do jogo infantil. Ed. Moreira. São Paulo, 1998. GOULART Cláudia Maria Teixeira & SPERB Tânia Mara, Histórias de criança: as narrativas de crianças asmáticas no brincar OLIVEIRA, R. C. & GUIMARÃES, R. M. M. (1979). Assistência de Enfermagem no atendimento as necessidade de recreação da criança no Centro de Tratamento de Queimados - "C. T. Q.". Enfermagem Atual, 1 (6), 9-12 SNADDEN, D. & BROWN, J. B. (1992). The experience of asthma. Social Science and Medicine, 34, 1351-1361. PEDROZA, Regina Lúcia Sucupira, Aprendizagem e subjetividade: uma construção a partir do brincar Rev. Dep. Psicol. UFF v.17 n.2 Niterói jul./dez. 2005 BENJAMIN, W. Reflexões: a criança, o brinquedo, a educação. São Paulo: Summus, 1984.