Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Parlamentares, No mês de maio comemoramos a luta das entidades de direitos humanos e cidadania contra o modelo manicomial como forma de tratamento dos pacientes portadores de sofrimento mental. Uma das mais longas discussões do Congresso brasileiro, que se estendeu por 11 longos anos, a Lei nº 10.216/01, de autoria do deputado Paulo Delgado (PTMG), busca resgatar a condição humana dos doentes mentais, cuja cidadania é rotineiramente negada nas instituições psiquiátricas. No dia 28 p. p. o Governo lançou a nova política de saúde mental baseada na atenção extra-hospitalar, que apresenta vantagens terapêuticas e já é adotado em vários países, a exemplo do Canadá, Itália, Inglaterra e Espanha. Dados do Ministério da Saúde informam que há atualmente no Brasil 55 mil leitos em hospitais psiquiátricos, dos quais se estima que um terço estejam ocupados por pacientes sem necessidade de tratamento em regime de internação. No entanto, parte desse contingente não tem possibilidade de reinserção social a médio prazo, ou por conta da precariedade econômica ou por já ter perdido os vínculos familiares. Projeto de lei encaminhado ao Congresso Nacional pelo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva institui um auxílio para reabilitação psicossocial, no valor de R$ 240,00 mensais. Trata-se do programa De Volta para Casa, cujo público alvo são os paciente que permaneceram internados em instalações psiquiátricas por no mínimo dois anos e que tenham indicação de alta hospitalar. O auxílio será pago diretamente ao paciente ou seu representante legal por um ano, com a possibilidade de renovação caso a reintegração à sociedade não tenha acontecido. Muito significativo e comovente foi a participação de Austregésilo Carrano Bueno na solenidade de lançamento do programa de ressocialização dos portadores de distúrbios mentais, pois ele encarna os sofrimentos dos pacientes das clínicas psiquiátricas. Quando adolescente, Carrano foi internado após seu pai descobrir que ele era usuário de drogas. Por mais de 3 anos, Carrano ficou internado em instituições que ele considera “chiqueiros psiquiátricos” e prisões: “são prisões duplas, a física e a química que nos tira a razão nos transformando em bestas humanas onde não sabemos mais quem somos e o que somos”. Sua experiência como interno psiquiátrico serviu de base ao livro “Canto dos Malditos”, onde denuncia os horrores de um tratamento equivocado em se tratando de consumo de drogas por jovens. O livro ganhou notoriedade ao ser transformado no filme “Bicho de Sete Cabeças”. O que causa estranheza é o fato de a vítima estar respondendo a processo pelas denúncias feitas e está impedido de publicar ou citar os nomes das instituições em que ficou internado. Desde maio do ano passado, seu livro teve as vendas suspensas por conta de uma decisão favorável á ação movida pela família do psiquiatra que se sentiu ofendida por trechos do livro. Num outro processo movido pelo Hospital Bem Retiro, Carrano está proibido de citar na mídia o nome da instituição e dos médicos que o trataram. Na carta intitulada “Perseguição Indecente”, Carrano desabafa: “condenam o escritor e ex-paciente psiquiátrico a ser condenado mais uma vez. Estou condenado a pagar sessenta mil reais aos meus torturadores, nunca tive tamanha quantia de dinheiro em minha vida, mas eles querem essa indenização estipulada pelo Tribunal de Justiça do Paraná, pois eles são intocáveis e isentos de dúvidas sobre qualquer de suas ações. Esta isenção patrocinada e comprada vergonhosamente e abertamente pelo poder econômico dessas famílias e de profissionais psiquiatras que se sentem ameaçados por esta verdade que o livro mostra. Mas o que mais dói é a omissão social que com este ato se tornam coniventes com essas ações de confinar, drogar e torturar pessoas. Pois sabemos que confinar, prender pessoas e drogá-los não é tratamento e sim tortura das mais cruéis e dignas de punições jurídicas, ou seja, cadeia.” A homenagem que lhe foi feita pelo Governo no lançamento do programa de atenção aos portadores de sofrimento mental, não livra Carrano dos processos, mas a adoção da nova política de saúde mental pode sim evitar que as barbaridades cometidas contra ele atinjam outras pessoas. Sala das Sessões, 4 de junho de 2003. Deputado DR. ROSINHA