Desvendando o Escritório de Gerenciamento de Projetos Flavio Zisman O objetivo deste documento é tentar elucidar o que é um Escritório de Gerenciamento Projetos (EGP) e suas funções básicas. A literatura atual apresenta diversas definições para o Escritório de Gerenciamento de Projetos bem como diversas categorizações, além da variada nomenclatura adotada no mundo empresarial dificultando assim o entendimento daqueles que não estão diretamente ligados ao tema ou a temas relacionados. Para tentar elucidar as informações a respeito, este artigo inicia-se com uma abordagem histórica e em seguida trata da literatura referente as definições e conceitos relacionados ao EGP. 1. A Origem do Escritório de Gerenciamento de Projetos – EGP Escritórios de Gerenciamento de Projetos são departamentos em uma organização com o objetivo de realizar determinadas funções que podem abranger atividades desde o processo da concepção, monitoramento e controle de um projeto até suportar o processo de seleção de projetos através da análise de sua aderência à estratégia da organização. A origem do Escritório de Gerenciamento de Projetos não é bem definida e se perdeu no tempo, porém, alguns autores relacionam seu surgimento aos anos 1930, quando a US Air Corps desenvolveu um EGP para monitorar o desenvolvimento de aviões. Com base na pesquisa realizada, é possível estabelecer os principais marcos históricos conhecidos que estão relacionados ao surgimento do Escritório de Gerenciamento de Projetos: • Anos 30: US Air Corps desenvolvem o Escritório de Projeto – Project Office - para monitorar e desenvolver aviões; • Anos 40: com a segunda guerra mundial, o Escritório de Gerenciamento de Projetos passa a ser utilizado para o desenvolvimento de aviões bombardeiros como o B-29; • Início dos anos 50: surge o JPO – Joint Project Office para acompanhar o desenvolvimento do avião B-47; • 1954: com a guerra fria, tem início a corrida armamentista e o desenvolvimento de armas nucleares bem como mísseis balísticos e sistemas computadorizados de comando e controle. Esta complexa tecnologia alavanca uma demanda por novos processos para sistemas integrados de testes e operações bem como a necessidade de coordenar as fontes de financiamentos governamentais e privadas, o que leva em 1954 ao WSPO – Weapon System Project Office, através do qual a gestão de projetos virou norma. Estes Escritórios de Projetos ajudaram aos gerentes a centralizar o financiamento em pacotes de programas ao invés de controla-los através de componentes separados, melhorando sensivelmente a previsão orçamentária e, ao mesmo tempo, permitindo a identificação e o cancelamento do que era considerado na época, como projetos “fracos” ou não adequados, antes que valores significativos fossem comprometidos. O conceito de EGP (Escritório de Gerenciamento de Projetos) como é conhecido hoje ficou bem estabelecido ao final dos anos 1990. Em dois anos de estudo empírico para avaliar o estabelecimento de EGP´s, no ano de 2004, Dai & Wells ( Dai & Wells, 2004) verificaram que, das 234 respostas obtidas de uma amostra randômica, 113 tinham indicado a presença de um EGP ou um departamento similar. O aumento da taxa de surgimento ou adoção de EGP´s está diretamente associado ao aumento no número e na complexidade dos projetos no mundo dos negócios, o que levou a necessidade de centralizar as funções de gerenciamento de projetos e de acordo com Harold Kezner no prefácio do livro de Gerald Kendall e Steve Rollins (Kendall & Rollins, 2003), o mesmo considera o ano de 2003 como o marco inicial do EGP, pois embora já houvesse referencias anteriores a este ano, estas eram raras se comparadas com a intensidade com a qual o tema passou a ser abordado a partir deste ano. No início de 2001 ainda se debatia sobre a próxima geração de EGP´s, com uma tendência de mudança de foco do nível tático para o nível estratégico e relacionado a inovação. A grande diversidade de empresas que implantaram EGP´s, bem como as divergências quanto sua aplicabilidade refletem hoje a grande variedade de definições e funções atribuídas a esta área e este tema é abordado no capítulo a seguir. 2. As Definições do Escritório de Gerenciamento de Projetos Existem atualmente, diversas definições para o que se entende por um Escritório de Gerenciamento de Projetos. Estas definições conceituam o que um EGP deveria fazer e qual seria seu nível hierárquico na organização, porém, variam tanto no primeiro quanto no segundo quesito. Através da pesquisa realizada por Woods & Shelbourn (Wood & Shelbourn, 2012), se pode afirmar que o EGP é implantado utilizando nomenclaturas diferentes, podendo adotar o seu nome mais conhecido, o PMO ou mesmo ser chamado RMO – Result Management Office. O acrônimo EGP (do inglês PMO) é comumente utilizado em todos os tipos de indústrias, independentemente do posicionamento hierárquico de implantação, e desta forma, não fica claro o objetivo da organização com a criação desta área. Além disto, a abordagem pode variar de organização para organização e com isto, diversas definições e funções são atribuídas à área de PMO. Veja abaixo alguns exemplos segundo Wood e Shelbourn (Wood & Shelbourn, 2012): Figura 1 - Nomenclaturas para PMO (Wood & Shelbourn, 2012) Segundo o Project Management Institute (PMI), “um PMO é uma entidade ou estrutura organizacional com várias funções e responsabilidades relacionadas à centralização e coordenação das atividades de gestão de projetos em um determinado domínio. As responsabilidades podem variar de inicialmente prover funções de suporte aos Gerentes de Projetos até ser o responsável direto pela gestão dos projetos (PMI)”. Observa-se aqui que esta definição não inclui um terceiro tipo de EGP também descrito como EGP Estratégico. Segundo Dai & Wells ( Dai & Wells, 2004), um EGP é “uma entidade organizacional estabelecida para gerenciar um projeto específico ou uma série de projetos relacionados, usualmente liderados por um gerente de projetos ou gerente de programa”. Estes mesmos autores, também descrevem o EGP como: “uma entidade organizacional estabelecida para suportar os gerentes de projetos, times e outros níveis gerenciais em assuntos estratégicos e funcionais por toda a organização relacionados à implementação dos princípios de gerenciamento de projetos, práticas, ferramentas e técnicas (Dai & Wells, 2004)”. Rad e Raghavan1, citado por Loader (Loader, 2003), definem o EGP como uma entidade organizacional que provê foco institucional em gerenciamento de projetos. Esta entidade serve como centro de competência para o desenvolvimento das pessoas envolvidas em projetos e facilitar a integração das atividades de gerenciamento de projetos nas políticas e procedimentos por toda a Organização. Deve-se ainda considerar o Escritório de Gerenciamento de Projetos atuando no nível estratégico da organização, também conhecido como EPMO – Enterprise Project Management Office, cujo objetivo passa a englobar o processo de seleção e priorização dos projetos em toda a organização sendo que a principal diferença entre um EGP e um EPMO reside no fato deste último abranger toda a organização sendo responsável pela elaboração das políticas e das mudanças organizacionais enquanto que o primeiro tem autoridade somente como uma área da organização. De acordo com Kendall & Rollins (Kendall & Rollins, 2003), o EGP “é um centro de inteligência e coordenação que permite a conexão entre os objetivos estratégicos do negócio e os resultados práticos relacionados através da gestão do portfolio, programa e projetos” e podem ser classificados como: • Strategic Project Office: identificar, selecionar e priorizas os projetos de acordo com o planejamento estratégico da organização; • Program Management Office: definir as diretrizes, padrões e modelos para a aplicação das melhores práticas, ferramentas, técnicas e sistemas de gerenciamento de projetos; • Support Project Office: fornecer suporte para a aplicação das melhores práticas, ferramentas, técnicas e sistemas de gerenciamento de projetos; • Hybrid: uma combinação de duas ou três classes mencionadas acima. De acordo com Wood & Shelbourn (Wood & Shelbourn, 2012), os Escritórios de Projeto podem ser classificados como: • Project Office: controlar e monitorar o cronograma e o orçamento de projetos; 1 Rad, P.F.; Raghavan, A. Establishing an Organizational PMO. AACE International Transactions, Washington, DC, USA, 2000. • EGP nível departamental: integrar projetos em um ou mais portifólios de projetos através da realização das funções já descritas no Project Office; • EGP Estratégico: além de realizar as funções descritas acima, busca facilitar o processo de tomada de decisão pelos executivos da organização quanto à priorização de projetos e seu alinhamento com a estratégia da organização. Segundo Loader (Loader, 2003), os Escritórios de Projetos podem ser classificados como: • Monitoring PMO: foco em reportar a situação do projeto provendo informações sobre o progresso, custos e tendências de desempenho de forma a nortear as decisões das áreas de negócio. Não possui envolvimento direto nas decisões de projeto realizando apenas recomendações; • Supporting PMO: além de realizar o monitoramento dos projetos, este EGP desenvolve as competências de gerenciamento de projetos na Organização. Pode apoiar os esforços das equipes de projetos através de serviços e consultoria, incluindo a formação, o desenvolvimento de processos de projetos e métodos. • Controlling PMO: este tipo de EGP tem participação significativa no processo de gerenciamento de projetos e tomada de decisão. É muitas vezes conhecido como EPMO – Enterprise PMO ou EGP Estratégico, e normalmente é um modelo de característica permanente e consolidado que concentra todo o gerenciamento de projetos dentro de uma empresa. Este modelo implica em gestão direta dos projetos onde quer que ocorram dentro da empresa. Em alguns casos, todos os gerentes de projetos estão alocados na estrutura do EGP e são atribuídos aos projetos conforme necessário. Quando um Escritório de Gerenciamento de Projetos é estabelecido, a organização pode desenvolver uma abordagem consistente à prática de implantação de projetos e quando este é definido de forma a atender a toda a organização, passa também a exercer um importante papel de integração através das fronteiras funcionais da organização. 3. As funções do Escritório de Gerenciamento de Projetos As principais atividades realizadas por um Escritório de Gerenciamento de Projetos podem ser resumidas em: • Apoiar o planejamento estratégico no nível da alta gestão das organizações, realizar a gestão do portfolio e programas incluindo as atividades de planejamento, controle, monitoramento e a elaboração de relatórios; • Desenvolver e zelar pela metodologia, ferramentas, técnicas, processos, procedimentos e documentos utilizados na prática gerenciamento de projetos da organização; • Prover capacitação, orientação, padronização e aplicação das melhores práticas relacionadas ao gerenciamento de projetos. De acordo com o guia PMBOK, (PMI), algumas das características fundamentais de um EGP incluem, mas não estão limitadas a: • Compartilhar e coordenar recursos em todos os projetos administrados pelo PMO; • Identificar e desenvolver a metodologia, melhores práticas e padrões para gerenciamento de projetos; • Definir e gerenciar as políticas, procedimentos, modelos e outros documentos compartilhados relacionados a projetos; • Centralizar a gestão de riscos de todos os projetos administrados pelo EGP; • Gerenciar a comunicação de todos os projetos administrados pelo EGP; • Atuar como órgão consultivo (mentor) para os gerentes de projetos; • Centralizar a gestão de todos os cronogramas e orçamentos normalmente no nível da organização; Segundo Hill (Hill, 2004), existem vinte funções para o EGP que estão agrupadas em cinco categorias diferentes: • Gestão da Prática: fornecer uma abordagem comum e um quadro de referencia para a condução das atividades de gerenciamento de projetos na organização; • Gestão de Infraestrutura: facilitar a criação de um ambiente profissional para o gerenciamento de projetos. Ajuda na definição da estrutura do projeto e busca garantir o envolvimento necessário dos “stakeholders” para suportar um projeto de sucesso. Administra e fornece os equipamentos necessários para o cumprimento do projeto; • Integração de Recursos: gerenciar as competências, a disponibilidade e o desempenho dos recursos do projeto; • Suporte Técnico: prover consultoria e suporte aos gerentes e aos times de projetos; • Alinhamento com o Negócio: introduzir a perspectiva das áreas de negócio no ambiente do projeto; Para consolidar as funções do Escritório de Gerenciamento de Projetos, pode se utilizar o quadro abaixo elaborado por Hobbs & Aubry (2007) 2 e citado por (Hurt & Thomas, 2009): Hobbs, B;Aubry,M. A multiphase reseach program investigating project management offices (PMO’s): The results of phase 1. Project Management Journal, 74-86. 2 Figura 2 – Quadro Funções do PMO - de Hobbs & Audry (2007), citado por (Hurt & Thomas, 2009) Para finalizar a questão das funções do EGP, incluiremos a análise temporal de Kezner (Kerzner, 2003). Segundo este autor, a competência relacionada à gestão de projetos representa uma importante propriedade intelectual para a empresa, portanto, deve ser gerenciada com sabedoria. Kezner consolidou as funções e benefícios do Escritório de Gerenciamento Projetos por alguns anos e segue abaixo a tabela com as principais informações referentes a esta evolução: 1990 – 2000 2001 - Presente Realizar mais trabalho em menos tempo, com Padronização das operações; menos recursos e sem sacrificar a qualidade; Decisões corporativas e não mais realizadas Aumento na rentabilidade; Melhor controle das alterações de escopo; Operações mais eficientes e efetivas; Melhor relacionamento com clientes; em silos; Melhor capacidade de planejamento; Rápido acesso a informação de alta qualidade; Eliminação e redução dos silos existentes na organização; Melhor identificação dos riscos e solução dos Operações mais eficientes e eficazes; problemas; Um aumento na qualidade; Menor a necessidade de reestruturações; Menos reuniões que tomam o tempo valioso Redução nas lutas pelo poder; dos executivos; Melhoria no processo de tomada de decisão Priorização do trabalho de forma mais realista; da empresa; Desenvolvimento de futuros gerentes gerais. Um aumento na competitividade no negócio Figura 3 – Evolução das responsabilidades do Escritório de Gerenciamento de Projetos (Kerzner, 2003) 4. Considerações Finais De acordo com a literatura consultada, pode-se concluir que existem diversas definições e funções, embora semelhantes, atribuídas ao Escritório de Gerenciamento de Projetos, bem como uma enorme variação na nomenclatura adotada para áreas e departamentos que realizam parte ou todas as funções do mesmo. Para aqueles que gostariam de implantar um EGP em suas organizações, não se deve buscar o mais certo ou mais errado e sim a definição, as funções e o posicionamento hierárquico que mais se adequam a cultura da organização em questão. 5. Referências Dai, C. X., & Wells, W. (2004). An exploration of project management office features and their relationship to project performance. International Journal of Project Management, 523-531. Hill, G. M. (2004). The Complete Project Management Office Handbook. Auerbach Publications. Hurt, M., & Thomas, J. L. (2009). Building Value Through Susteinable Project Management Offices. Project Management Journal vol. 40 Nº 1, 55-72. Kendall, G., & Rollins, S. (2003). Advanced Project Portfolio Management and the PMO - Multiplying ROI and Warp Speed. J. Ross Publishing, Inc. Kerzner, H. (2003). Strategic Planning for a Project Office. Project management Journal, 13-25. Loader, R. J. (December de 2003). Lessons Learned from Establishing Project Management Offices in a Corporate Environment. Journal of the Australian Institute of Project Management, pp. 13-17. Vol 23. PMI. (s.d.). Project Management Body of Knwoledge (fourth edition). Wood, M. A., & Shelbourn, D. M. (2012). THE PROJECT MANAGEMENT OFFICE: ORIGINS, DEFINITION AND NOMENCLATURE. Project Management – People, Places, Projects… A New Frontier.