2 - A ESTRATÉGIA DE SAÚDE DA FAMÍLIA E OS CONSELHOS LOCAIS DE SAÚDE Segundo MacWhinney (1997), o profissional de Saúde da Família deve, dentro do escopo do seu trabalho, se fundamentar nos seguintes princípios: a) 1º princípio: O profissional de saúde da família deve ser clinicamente hábil para: • centrar sua atenção no paciente; • estar em sintonia com o contexto local da realidade do paciente; • desenvolver parceria e comprometimento com o serviço e sua comunidade; • desenvolver seu conhecimento fundamentado em evidência científica; • identificar e analisar condições sociais e de saúde comuns na comunidade em que atua; • lidar com situações menos comuns, mas que O membro da equipe de Saúde da Família deve advogar a favor do seu usuário nas políticas públicas de saúde. impõem risco de vida; b) 2º princípio: O profissional de saúde da família é fonte de recursos para uma população definida. Assim, ele deve: • tratar sua população como uma população de risco; • avaliar as novas informações (de forma crítica) como relevantes para a sua prática; • manter registros adequados e os sistemas de informação; • fazer folha de rosto de identificação, genograma e promover a saúde; • manter-se atualizado em relação aos conhecimentos científicos e ser autodidata (prática reflexiva); • advogar a favor do seu usuário nas políticas públicas de saúde; • ser responsável com o sistema de saúde, quanto ao manejo de recursos e necessidades de referências; c) 3º princípio: A Saúde da Família é uma especialidade fundamentada na comunidade. Assim: • seus problemas são indiferenciados; • há uma frequência relativa dos problemas no exercício da prática; • há a necessidade do cuidado do paciente em diferentes contextos (casa, clínica, trabalho, hospitais); • faz parte de uma rede de serviços (especialistas e outros recursos); d) 4ºprincípio: A relação equipe-paciente é alvo central na saúde da família. Portanto, o profissional deve: • abandonar atitudes “autocentradas” e de “poder” com relação ao paciente; • se comprometer com o paciente em primeiro lugar; • trabalhar pela continuidade dos cuidados ao longo do tempo (vínculo); • ouvir o paciente e a família como ações fundamentais. Um dos pontos que desejamos reiterar aqui é o subprincípio que reza que o profissional de saúde da família deve ser “advogado do seu usuário perante as políticas públicas”. Esse princípio insere o profissional em um contexto de avanço na formação do capital social do Brasil. Por capital social se entende os ganhos sociais, quando a comunidade se envolve com os problemas e a política local, municipal ou como sociedade civil organizada. O capital social, portanto, é resultante da participação cidadã que compreende a votação nas urnas para fazer valer seus direitos, mas também a transcende, pois é necessário seguir de perto a atuação dos que se tornam representantes legítimos, mas cuja legitimação deve acontecer a cada dia e não somente na próxima eleição. A atuação dos profissionais da saúde da família foi também fortalecida pela Portaria 648/GM, de 28 de março de 2006, que aprova a “Política Nacional de Atenção Básica” e trata especialmente do processo que se refere ao trabalho das equipes de atenção básica, da qual destacamos (5 ATENÇÃO BÁSICA) - DO PROCESSO DE TRABALHO DAS EQUIPES DE alguns itens: São características do processo de trabalho das equipes de Atenção Básica: [...]; III - desenvolvimento de ações educativas que possam interferir no processo de saúde-doença da população e ampliar o controle social na defesa da qualidade de vida; [...]; VIII - participação das equipes no planejamento e na avaliação das ações; [...]; IX - desenvolvimento de ações intersetoriais, integrando projetos sociais e setores afins, voltados para a promoção da saúde; e [...]; X - apoio a estratégias de fortalecimento da gestão local e do controle social (BRASIL, 2006, grifo nosso). O que se destaca aqui como essencial na formação e manutenção do conselho local de saúde? O envolvimento ativo de toda a equipe de saúde da família como parte de sua própria missão e não como um “serviço” a mais e igualmente importante, o envolvimento da população local. Um estudo de caso apresentado por Trad e Esperidião (2009) discutiu os limites e possibilidades da incorporação da gestão participativa e da corresponsabilidade da equipe de saúde da família. O estudo mostrou que o processo de envolvimento da comunidade ainda é muito primário, incipiente, e que as equipes ainda não estão devidamente preparadas para incentivar essa participação. Mostrou, também, que ao invés do envolvimento, a comunidade prefere ter uma atitude de gratidão pelo serviço oferecido e não compreende a necessidade de participar da cogestão dele. Para compreender melhor a importância da participação cidadã local, Gohn (2004) apresenta quatro pontos importantes a respeito dela. Em primeiro lugar, uma sociedade democrática só é construída com a participação dos indivíduos e grupos sociais organizados; em segundo lugar, a mudança da sociedade deve ser realizada a partir do plano micro, pois é nesse plano que se dá o processo O envolvimento da comunidade e a compreensão desta de que ela é corresponsável são fundamentais no processo do controle social. de mudança e transformação na sociedade; em terceiro lugar, é no plano local que se concentram as energias e forças sociais da comunidade, que geram o capital social e as fontes para mudança e transformação social que são forças emancipatórias. Enfim, em quarto lugar, é no território local que se encontram as instituições importantes no cotidiano de vida da população, como as escolas e os postos de saúde, porém este poder local tem que ser organizado em função de objetivos que respeitem as culturas e diversidades locais e criem uma identidade sociocultural-política e também laços de pertencimento. Em síntese, destaca-se, que é fundamental que o cidadão não fique afastado do local de tomada de decisões a respeito da política pública de saúde que está sendo implantada em seu bairro ou sua comunidade local. Seu envolvimento, neste cenário, legitima a atuação da equipe de saúde local, diminui as distâncias entre as duas, amplia a atuação e a visão da equipe, melhora o processo de educação em saúde e, por consequência, melhora os indicadores sociais e de saúde.