Sólon de Atenas

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Centro de Ensino Superior do Amapá
Disciplina: História do Direito
Professor: Helder Ferreira
O Direito na Grécia Antiga
Sólon, legislador ateniense
Impossível estudar História do Direito sem uma atenção especial à
Grécia. Berço cultural da humanidade, componente, juntamente com
Roma, da chamada História Clássica, ou Antiguidade Clássica, essa
prodigiosa nação faz refletir, até hoje, pelas idéias de seus pensadores, o
esplendor de uma época onde os conflitos eram gritantes, entre a
sabedoria revelada pelos filósofos, e as guerras intermináveis e
inexplicáveis.
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A civilização grega teve origem em Creta (século XX a.C), e esta
civilização produziu muitos filósofos, matemáticos e oradores, e
estudiosos da ciência como Hipócrates, que passou a enxergar as doenças
sob a óptica científica, e não mais sob o ângulo de crendices. Na
matemática destacou-se Tales de Mileto e Pitágoras. Na política,
Alexandre, o grande. Na oratória destacou-se Demóstenes, na filosofia
Platão e Aristóteles, além de terem se destacado na mitologia.
Além da grande produção cultural os gregos eram guerreiros, e
lutaram contra eles próprios, começando pela guerra de Tróia, eternizada
na obra de Homero, que publicou Ilíada e Odisséia, e a guerra do
Peloponeso.
Tradicionalmente, diz-se que os Gregos não foram “grandes
juristas” mas sim grandes filósofos e pensadores políticos. Foram os
primeiros a elaborar uma Ciência Política. Na verdade, os romanos até
utilizaram grande parte dos conhecimento dos gregos, porém os gregos
não doutrinizaram. Deram-nos conceito de democracia, de espaço
público, criaram a mediação e a arbitragem, criaram os “embriões” dos
advogados e também, criaram a idéia de Ministério Público.
Nunca houve leis aplicáveis a todos os Gregos. Importante para o
estudo do Direito Grego é o período que se inicia com o aparecimento da
pólis – meados do século VIII a.C.
Na pólis o cidadão tem a prerrogativa de expressar livremente o seu
pensamento no mesmo grau de igualdade com seus pares. Dois são os
princípios que regem a cidade-estado: igualdade de direitos perante a lei
e a liberdade de conduta (é claro que isso vale apenas para os cidadãos).
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Atenas é utilizada como paradigma não só pela maior abundância
de fontes, mas também porque foi nesta cidade onde a democracia mais
se desenvolveu.
Nas cidades-estado haveria uma ausência de um “poder superior”,
sendo que os conflitos deveriam ser resolvidos através de mecanismos
públicos (surgimento da ciência política).
Diferente de Roma, na Grécia não há uma classe de juristas, nem
um treinamento jurídico (escolas de juristas, ensino do direito como
técnica especial). Há escolas de retórica, dialética e filosofia
(argumentação dialética que vai ter uso forense ou semi-forense).
Os gregos tinham o costume de aprender de cor (recitando em
forma de poemas) textos jurídicos, como os poemas de Homero. As leis
de Sólon eram ensinadas como poemas. A literatura “jurídica” era fonte
de instrução e prazer. Presumia-se que o direito devia ser aprendido
vivenciando-o. As leis, então, deveriam fazer parte da educação do
cidadão. As discussões sobre justiça versavam sobre a justiça da cidade,
entre cidadãos e iguais. As leis menores não importavam para a discussão
pública.
Atenas: não havia carreira burocrática e, não existindo juristas
profissionais, a argumentação dita forense voltava-se para os leigos, como
num tribunal de júri.
Nos tribunais era preciso provar o direito (a lei, o costume) além dos
fatos.
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Não havia a execução judicial: o queixoso recebia o julgamento e se
encarregava de executá-lo, ou passava a uma fase de ação penal.
Discursos perante os tribunais: era moralmente indigno receber
dinheiro para a defesa. Na teoria, qualquer cidadão podia se apresentar
perante os tribunais, juízes e árbitros para defender seus interesses. Na
prática, cresceu a atividade dos redatores de peças “judiciais”. O
advogado como conhecemos hoje, ainda não existia.
A resposta nos tribunais era sempre sim ou não, culpado ou
inocente. Nos tribunais populares, as provas poderiam ser feitas por
escrito. Nos arbitrais, eram informais. Os juízes – eram leigos e membros
de uma assembléia – podiam testemunhar sobre os fatos e julgar pelo que
sabiam das coisas (não vinculavam-se às provas). Os depoimentos de
escravos deveriam ser precedidos de tortura (senão mentiriam).
Inexistia órgão público de acusação: qualquer um poderia
denunciar os crimes públicos (denúncia não era apenas a informação, mas
uma petição: era o início de um processo). Porém, se o denunciante não
obtivesse ao menos 1/5 dos votos do tribunal, pagava multa e não podia
abandonar a acusação no meio do processo. “O processo tornou-se uma
praga em Atenas, mas a liberdade de processar era inerente à
democracia.”
As penas eram em geral: castigos, multas, feridas, mutilações,
morte (cuja forma era de acordo com o delito cometido) e exílio.
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Primeiros Legisladores
Drácon
O primeiro legislador a redigir as leis em Atenas, em 621 a.C, foi
Drácon. É famoso até hoje pela severidade de suas leis, tanto que, mesmo
nos dias atuais, a palavra “draconiano” significa nos dicionários severo e
duro código de leis atribuído a Drácon.
As leis draconianas têm um importante papel na história do Direito,
mas não são o primeiro código de leis escrita, como havia sido proposto
antes. O primeiro código de leis escritas de que a humanidade tem
registro é o código de Ur-Nammu (cerca de 2040 a.c.). E uma de suas
características era a previsão de penas pecuniárias.
Afirmava, essencialmente, a supremacia dos poderes públicos.
Consagrava o direito de jurisdição do pai sobre o filho, mas suprimiu a
vingança particular. Para os crimes graves, aqueles submetidos ao
Areópago, as penas eram a morte ou o exílio. O código escrito por Drácon,
contudo, não era uma constituição pois não contemplava os problemas
econômicos e sociais. Estes, somente seriam resolvidos por Sólon de
Atenas.
Deve-se a Drácon o começo de um importante princípio do Direito
Penal: a diferença entre o homicídio involuntário, voluntário e legítima
defesa
Tanto o furto como o assassinato recebiam a mesma punição: a
morte. Essa severidade fez que o adjetivo draconiano (do francês
draconien) chegasse à posteridade como sinônimo de desumano,
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excessivamente rígido ou drástico. Um político de 4 a.C. gracejou que
Drácon não escreveu suas leis com tinta, mas com sangue.
Drácon era um revolucionário a frente da sua época. Era
considerado um "legislador" extremamente severo, prova disso foram as
publicações de leis severas e sanguinárias para cidade de Atenas.
Salienta-se,
que
apesar
da
agressividade
das
leis,
estas
proporcionavam a igualdade, afim de diminuir os privilégios concedidos
aos aristocratas, devido a inúmeros conflitos existentes , tanto de ordem
social como a estabilidade na política ateniense.
Passados alguns anos, os próprios atenienses consideraram o
código omissivo, por esta razão houve sua substituição por Sólon ,
mantendo apenas as leis referentes ao crime de homicidio (século VII a.c)
Diante disso, no ano de 621 a.c, os aristocratas concederam
poderes a Drácon para que este publicasse as leis draconianas,
considerado o primeiro código ateniense escrito. Contudo tal código não
era considerado uma Constituição, em razão da ausência de leis que
contemplasse os problemas econômicos e sociais, sendo que estes
somente seriam declinados por Sólon em Atenas.
Seu código nada mais era do que antigos costumes. Embora suas
leis tenham reconhecido uma existência legal aos cidadãos e indicado o
caminho da responsabilidade individual, ele não atingiu o problema
econômico-social, e consequentemente o problema político. Desta forma,
ao cabo de poucos anos, o Partido Popular voltou a exigir reformas.
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Sua primeira lei é essa: ”devemos honrar os deuses e os heróis e
oferecer-lhes sacrifícios anuais, sem nos afastar-mos dos ritos seguidos
pelos antepassados”.
Sólon
Poeta e estadista ateniense, nascido em 638 aC, Sólon é oriundo de
uma família nobre de Atenas. Era aristocrata de nascimento e comerciante
de profissão. Era como comerciante que Sólon pensava e foi assim que
legislou. O fato de seu pai ter esbanjado a sua fortuna em obras de
beneficiência e caridade, levou a que o jovem Sólon se dedicasse ao
comércio. Isto conduziu a que tivesse de fazer frequentes viagens, o que
veio a influenciar a sua formação e modo de ver o mundo.
Ganhou notoriedade pela sua intervenção quando da disputa que
opôs Atenas e Mégara pela posse da ilha de Salamina. Assim, e segundo
nos conta Plutarco, apesar da proibição imposta pelo governo ateniense
de que ninguém deveria propor a reconquista desta ilha, Sólon,
contornando esta proibição, proferiu uma elegia incitando o povo, a
retomar a luta e a tomar a ilha, o que efetivamente aconteceu.
Esta notoriedade vai contribuir para a sua nomeação pelo Areópago
para o cargo de arconte, em 594 aC. O Areópago era um conselho de
nobres que governava Atenas, e dentro deste conselho eram nomeados
arcontes, que eram magistrados que se ocupavam de áreas específicas da
governação.
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Enquanto arconte, foram-lhe atribuídos poderes de tirania, uma vez
que a sociedade ateniense vivia nesse tempo momentos conturbados,
nomeadamente a nível social, com grandes clivagens entre os mais ricos e
os mais pobres. No uso destes poderes, veio a promulgar as leis que hoje
são designadas com o seu nome, revogando as aprovadas por Drácon, que
também tinha sido ditador em Atenas. Pretendeu, assim, introduzir maior
justiça na sociedade ateniense, e diminuir as grandes diferenças sociais
que se verificavam.
Pode-se afirmar que as leis de Sólon correspondem a uma grande
revolução social. A eunomia – igualdade de todos perante a lei – está
presente em todos os artigos que ele escreveu.
A reforma de Sólon atingiu toda a estrutura do estado Ateniense no
que diz respeito à economia, sociedade e política.
Podemos, então, destacar as seguintes áreas:
Moralidade – determinou que não incorreria em pena quem apanhasse
um adúltero em flagrante e o matasse. A violação de uma mulher livre era
punida com uma multa de 100 dracmas.
Quem prostituísse mulher livre era multado em 20 dracmas; no
entanto, quem se dedicasse ostensivamente à prostituição nada sofria.
Era também proibido vender as filhas ou irmãs, salvo se estas já não
fossem virgens.
Estas disposições tinham como objetivo acabar com a prática de
pagamento de dívidas, por parte dos pobres, vendendo elementos da
familia ou entregando mulheres para práticas sexuais. Tem particular
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relevância, uma vez que nesta época quase todos os pobres tinham
dívidas para com os ricos.
Difamação e injúria – A lei determinava os locais onde esta prática
seria mais grave, nomeadamente templos, julgamentos oficiais, edifícios
públicos e festivais, por ser nesses locais que haveria o maior dano para a
pessoa.
Justiça – Sólon legislou no sentido de que qualquer pessoa, e não
apenas a vítima ou seus familiares, poderia fazer queixa e assim iniciar a
ação judicial. Institui ainda que qualquer pessoa só poderia sofrer uma
pena após um julgamento e uma condenação. Criou ainda a Heliéia, um
Supremo Tribunal onde as decisões eram tomadas por uma assembléia de
cidadãos.
Quando alguém fosse condenado a pagar uma quantia, e não o
fizesse voluntariamente, no prazo de três (3) dias, passava a estar
obrigado a efetuar pagamento de igual montante ao Estado. Visava acabar
com as dificuldades existentes na execução das penas.
Família – a partir das leis de Sólon, torna-se possível fazer
testamento e transmitir bens a pessoas que não fossem da família, desde
que não houvesse filhos. No entanto, eram proibidas as doações que
fossem feitas sob efeito de doença, drogas, prisão, coação ou instigação
de uma mulher.
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Quando o único descendente fosse uma mulher, esta não se
tornava proprietária dos bens, apenas tinha a posse temporária para deles
fazer entrega aos filhos, seus herdeiros, existentes ou a existir. Para
garantia disto, e de que os bens permaneciam na família, ela deveria
casar-se com um familiar, por regra um tio paterno, embora lhe fosse
permitida alguma escolha, sempre dentro do lado paterno da família.
A razão deste procedimento reside no fato de as mulheres, como as
crianças, não serem independentes, estando sujeitas a um senhor, ou
“kyrios”. Até ao casamento, este seria o pai, passando depois a ser o
marido, que recebia a mulher entregue pelo pai, ou do irmão ou avô do
lado paterno, caso o pai já não fosse vivo.
Vai ainda ser permitida a adoção, desde que um homem não
possuísse filhos, e apenas poderia adotar quem tivesse um irmão, isto
para não prejudicar a família de origem. Estes tinham os mesmos direitos
que um filho natural, mas perdendo, ao mesmo tempo, os direitos dentro
da família de origem.
Economia – A lei conhecida como “seisachtheia” vai proibir
empréstimos em que a garantia é a própria pessoa do devedor, que
poderia desse modo ser conduzido à escravidão; concede uma anistia para
os devedores insolventes, com perdão das dívidas e libertação de quem se
encontrava escravizado.
Aprova uma lei que permite a hipoteca da terra, o que antes era
proibido.
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Vai obrigar os pais a ensinarem uma profissão aos filhos, sem o que
estes não teriam de os sustentar na velhice. Proíbe a exportação de
produtos agrícolas, e harmoniza os pesos e medidas utilizados.
Vai permitir que se conceda a cidadania a quem, sendo estrangeiro,
tenha sido exilado perpetuamente da sua pátria, ou se pretenda fixar em
Atenas para exercer uma profissão. Pretende, com isto, estimular a vinda
de quem possa contribuir para a economia ateniense.
É ainda promulgada uma lei que determina um limite para a
aquisição de terra. Esta medida visava acalmar a grande tensão social
existente em Atenas, causada pela percepção de uma grande
desigualdade na distribuição de riqueza.
Foram ainda aprovadas leis que limitavam os gastos em bodas e
funerais, tendo em vista a redução de gastos em tempos de crise, bem
como não dar ares a maiores convulsões sociais motivadas pela
suntuosidade deste tipo de eventos.
Sem dúvida, a legislação de Sólon preparou Atenas para ser uma
potência econômico-comercial. Em todos os sentidos ele indicava um
incentivo ao desenvolvimento comercial e industrial que fariam de Atenas
a principal e mais poderosa Cidade-Estado da região.
Sociedade– Sólon vai legislar no sentido de reconhecer aos cidadãos
o direito de constituírem livremente associações, desde que as suas
normas internas de funcionamento não fossem contra as leis gerais.
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Para minimizar os efeitos da crise política, Sólon concedeu anistia
geral, estando perdoado de crimes políticos todos que tivesem cometido
um. Neste mesmo sentido ele suavizou a legislação draconiana, buscando
apaziguar os ânimos exaltados da cidade.
Política - Introduziu reformas na organização política de Atenas.
Assim, e para limitar o poder do Aerópago, cria o Conselho dos 400, bem
como a Ekklesia, assembléia de cidadãos atenienses. Dividiu a sociedade
em 4 classes, de classificação censitária, a saber: pentacosiomedimni,
hippeis, zeugitai e thetes. Esta divisão determinava quem podia ser
nomeado para cargos públicos, administrativos ou militares.
Aprova ainda uma lei que pune quem, em caso de conflito, interno
ou externo, permaneça indiferente ou neutro. Era obrigatório a escolha
por um dos lados em contenda. Esta medida tem como fundamento o fato
de perante uma maioria da população apática e desinteressada, é fácil
para um pequeno grupo organizado a tomada do poder.
Após o exercício de funções como arconte, e depois de ter
implementado tantas leis inovadoras, Sólon abandonou Atenas, e por um
período de 10 anos percorreu vários países do Mediterrâneo, com a
esperança de que os atenienses continuassem a aplicar as suas reformas.
No entanto, cerca de quatro (4) anos depois da sua partida, e na
sequência de novos tumultos sociais, o poder foi tomado por Pisístrato,
que se tornou ditador.
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No seu regresso, Sólon opôs-se politicamente a Pisistrato, sem no entanto
deixar de acusar os atenienses de covardia por terem permitido tal
tomada de poder.
Referência bibliográfica:
PEDROSA. Ronaldo Leite. Direito em História. LumenJuris/Editora
CASTRO. Flávia Lages de. História do Direito Geral e Brasil. 6ª Ed.
LumenJuris/Editora
BAGNOLI. Vicente. História do Direito.Ed. CampusJurídico
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