promotoria do consumidor e saúde

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE RONDÔNIA
PROMOTORIA DO CONSUMIDOR E SAÚDE
Excelentíssima Senhora Juíza de Direito da Vara da Infância e da Juventude
da Comarca de Porto Velho.
O Ministério Público do Estado de Rondônia, pelos
Promotores de Justiça infra-assinados, com atribuições na Defesa do
Consumidor e Saúde, Criança e Juventude, com fundamento nos arts. 129,
incisos II e III da Constituição Federal; art. 25, inciso IV da Lei Federal n.º
8.625/93; arts. 1º, inciso II, 3º, 5º, 11, 12, §2º e 21, todos da Lei Federal n.º
7.347/85; art. 82, inciso I da Lei Federal n.º 8.078/90; arts. 3º, 4º, II, VII, XI
da Lei Federal n.º9.961/00; arts. 1º, I e II, §1º e §2º da Lei Federal n.º9.656/98
e artigo 4º da Lei n. 8.069/90 (ECA), vem promover a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
com pedido de liminar antecipatória dos efeitos da tutela
“inaudita altera pars”
em face do
Estado de Rondônia que deverá ser citado na pessoa do
Procurador Geral do Estado que poderá ser encontrado na Procuradoria Geral
do Estado, sediada na Avenida dos Imigrantes n° 3.503, Bairro Costa e Silva,
nesta cidade, pelos motivos de fato e de direito a seguir descritos:
DOS FATOS
Conforme se constata no Procedimento de Investigação
Preliminar n. 2007001060007331 (anexo à presente ação), instaurado em
razão de representação da Presidente da Associação Rondoniense de Pais e
Pacientes com Fibrose Cística, Senhora Nildete Maria de Arruda Galão, existem
neste Estado três crianças em estado grave de saúde com suspeita de serem
portadores da doença fibrose cística. E, para a realização do diagnóstico,
necessitam realizar procedimento adequado, não realizado neste Estado.
De acordo com o Manual de Fibrose Cística
confeccionado pelo Dr. Paulo Kussef, médico chefe da Unidade de Fibrose
Cística do Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba no Estado do Paraná
(fls.23/55), a doença hereditária também conhecida por muscoviscidose causa
o mal funcionamento de certas glândulas do corpo, chamadas exócrinas:
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glândulas sudoríparas, de muco, lágrimas, saliva e sucos digestivos, que
produzem um muco muito espesso,
acarretando, principalmente, a
sintomatologia no sistema respiratório e digestivo. “O muco espesso entope os
ductos (canais) das glândulas, causando mal funcionamento”. Os
sintomas mais comuns são: tosse crônica, pneumonias freqüentes, suor
excessivo e muito salgado, desidratação sem causa aparente, obstrução
intestinal, dor abdominal, doença no fígado, dificuldade em ganhar peso e
altura, dentre outros.
Referida doença pode ser detectada através do “teste
do pezinho” em fase mais avançada (fase III). No entanto atualmente no país
existem apenas três unidades da federação que fornecem aos usuários o
referido serviço. Lamentavelmente o Estado de Rondônia não figura dentre
elas. Assim, não realizado o exame pelo teste do pezinho já nos primeiros dias
de vida, o profissional médico apenas possui condições de constatação da
fibrose cística após a observância da sintomatologia, pela realização de um
exame chamado teste do suor, utilizado pela técnica iontoferese por
pilocarpina, que é o emprego de um medicamento na pele da criança, que sob
a ação de eletrodos, provoca o suor, retirado para análise (verificar fotografia às
fls.62).
Das informações obtidas junto ao Departamento de
Triagem Neonatal do Ministério da Saúde (fls.12-verso;19/55) observou-se que
o teste do suor é um exame muito importante e necessita ser realizado segundo
determinados padrões técnicos, no entanto, apesar do Ministério da Saúde
ainda não haver publicado portaria normatizando o protocolo clínico do exame
(a Portaria n.263/01/SAS e anexos apenas exige o exame de dosagem de “Clem suor”, não especificando seu modo de execução – fls.14/17), a senhora
Tânia Carvalho, assessora técnica, declarou que “já foram traçadas algumas
diretrizes no último Congresso de Fibrose Cística” (fls.12 e 19).
Pesquisando sobre o assunto ficou constatado que o
teste do suor deve ser realizado de forma meticulosa para evitar resultados
falso-negativos ou falso-positivos, adotando-se a técnica adequada, qual seja,
aquela desenvolvida por Gibson e Cook em 1959. Nesse sentido:
“A única técnica aceita é a descrita por Gibson e Cooke
(iontoferese por pilocarpina). Outras técnicas não
devem ser aceitas como diagnóstico.”
Associação
Brasileira
de
Assistência
à
http://www.abram.org.br/novo/suor.htm (fls.20)
Fibrose
Cística.
“A técnica básica de coleta consiste na colocação de
uma substância chamada pilocarpina numa pequena
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região da pele, que vai estimular a sudorese. A coleta
do suor é feita colocando-se um papel filtro sobre a
região ou o tal do equipamento de coleta.”
Tânia Marine de Carvalho, assessora técnica do Ministério da Saúde,
fls.19.
Consultado a respeito, o médico Dr. Nilson Paniágua,
responsável técnico pela UTI Neonatal do Hospital Regina Pacis e colaborador
da Associação, relatou que o diagnóstico da fibrose cística é feito pela
iontoferese de transpiração estimulada pela pilocarpina, declarando ainda:
“O procedimento deve ser feito de forma meticulosa
para evitar resultados tanto falso-positivos quanto
falso-negativos. Tendo em vista a relevância do
diagnóstico da fibrose cística, ressaltamos que
desconhecemos a existência do exame de Iontoferese de
transpiração estimulada pela pilocarpina no Estado de
Rondônia.”(fls.61)
Investigando-se os fatos, constatou-se que o Estado de
Rondônia recusa-se a encaminhar as crianças para a realização do teste em
outro Estado sob alegação de que é o procedimento é exeqüível em Porto Velho
em laboratório credenciado pelo SUS (fl. 12), contudo, ao ser solicitada
informação a respeito da técnica utilizada para realização do exame “teste do
suor”, o Laboratório Ary Pinheiro informou que “a) a coleta deverá ser feita
por sudorese provocada naturalmente por exercício físico (andar durante
20 minutos) b) induzida por medicamentos, acompanhada de cuidados
médicos” , bem assim, o método é Colorimétrico (fl.64).
Segundo a Senhora Presidente da Associação
Rondoniense de Pais e Pacientes com Fibrose Cística, a entidade não mais
aceita que as crianças sejam submetidas ao procedimento adotado pelo
laboratório Ary Pinheiro, credenciado para realização do “teste do suor”, já que
tomaram conhecimento de que ali não se realiza a técnica da Iontoferese por
pilocarpina, mas sim, técnica de sudorese provocada naturalmente, relatando:
“(...) uma das crianças que realizou o exame, de dois
anos de idade, foi submetida a subir e descer escadas
várias vezes até começar a suar e ficar em um quarto
escuro e fechado – o que não é adequado e pode causar
traumas nas crianças (fls.03)
(...)
o exame realizado por este laboratório não obedece as
normas preconizadas pelo Ministério da Saúde, que as
crianças são “ensacadas” em plástico para suarem,
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que este não é o procedimento adequado para realizar
o exame, assim, os resultados podem possuir erros
fatais; os medicamentos que os médicos deverão
administrar nos pacientes por longo período de tempo
dependem desses resultados para a posologia que, se
for errada, pode causar a morte” (fls.03)
Ressaltou que a Associação possui convênio com
hospital infantil do Estado de Minas Gerais, onde os usuários são recebidos e
atendidos sem que necessitem realizar quaisquer pagamentos, sendo
necessário apenas o encaminhamento pela Secretaria de Estado da Saúde,
fornecendo as passagens aéreas para o deslocamento e diárias para
manutenção no local, já que o Estado de Rondônia não realiza o procedimento
tido como ideal.
Diante do impasse, as crianças: Diogo Guimarães da
Silva, de 6 meses de idade (fls.05/06), Yago Soares Barbosa Evangelista, de 5
anos (fls.07/09), Igor Pansini Carneiro, de 1 ano e sete meses (fls.10), estão
aguardando providências da Secretaria de Estado da Saúde para realização do
exame no Estado de Minas Gerais há aproximadamente três meses, não
obstante a declaração de urgência, conforme se pode constatar nos laudos
médicos acostados às fls.58/60.
Ressalte-se que a necessidade de realização do exame
em outra unidade da federação se deve exclusivamente à intenção de se evitar
o risco de exposição desnecessária das crianças no laboratório credenciado ao
Estado. Primeiro porque a forma como a sudorese é provocada, além de ser
deprimente, expõe as crianças a traumas psicológicos em razão do método
artesanal e, segundo porque há risco do resultado acusar falsos positivos ou
negativos, fato este que pode levar os pacientes a óbito diante da não realização
de tratamento adequado para a doença.
Assim, enquanto o Estado de Rondônia não possuir
um laboratório que utilize método adequado para a realização do teste do suor,
como medida de prevenção a possíveis danos que podem ser causados à saúde
e vida dos pacientes, todas as crianças que necessitem ser submetidas ao
exame mencionado devem ser encaminhadas pela Secretaria de Estado da
Saúde para o programa de Tratamento Fora de Domicílio – TFD -, devendo o
Estado apenas fornecer as passagens para o deslocamento, já que a Associação
possui convênio firmado com hospital especializado.
DO DIREITO
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A Constituição Federal confere ao Ministério Público a
tarefa institucional de zelar pelo efetivo respeito dos poderes públicos e dos
serviços de relevância pública aos direitos por ela assegurados (art. 129, inciso
II). Isso significa que é dever impostergável do Ministério Público a defesa do
povo.
Por sua vez o art. 196 da Constituição Federal dispõe
que “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas
sociais e econômicas que visem à redução de riscos de doenças e outros agravos,
e o acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção,
proteção e recuperação”.
O art. 197 do texto constitucional determina
expressamente que as ações e serviços de saúde são de relevância pública
e o 198, inciso II garante o atendimento integral, na esteira do que dispõe o
art. 194 inciso I, também da Carta Magna, de universalidade do atendimento
público de saúde.
Também o art. 2º, §1º da Lei Federal n.º 8.080/90 (Lei
Orgânica da Saúde), que estrutura o Sistema Único de Saúde:
“O dever do Estado em garantir a saúde consiste na
formulação e execução de políticas econômicas e sociais que
visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e
no estabelecimento de condições que assegurem acesso
universal e igualitário às ações e aos serviços para a
sua promoção, proteção e recuperação.”
Seu art. 7º estabelece como diretriz:
“I – universalidade de acesso aos serviços de saúde em
todos os níveis de assistência;
II – integralidade de assistência, entendida como um
conjunto articulado e contínuo das ações e serviços
preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para
cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema;
(...)
IV – igualdade de assistência à saúde, sem preconceitos ou
privilégios de qualquer espécie”
Por sua vez, o artigo 227 da Constituição Federal
(artigo 227, caput) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (artigo 4º)
preconizam:
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“É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e
do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a
efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária”.
Como é sabido, a doutrina da proteção integral, base
jurídica da Declaração Universal e da Convenção Internacional dos direitos da
criança, foi adotada pela Constituição Federal (art. 227) e pelo Estatuto da
Criança e do Adolescente. Esta proteção integral assegura que todos são
sujeitos de direitos, independentemente de sua condição social.
Deste modo, a realização artesanal do procedimento
denominado de “teste do suor” no Estado de Rondônia, em desacordo com os
padrões técnicos aceitos na área da saúde, fere os direitos fundamentais da
pessoa humana, além de provocar riscos à saúde e até mesmo à vida de todos
que a ele devem se submeter.
Não deve ser esquecido que o dever de prestação dos
serviços de saúde pertence primariamente ao poder público, porquanto o art.
6º do CDC prescreve: “são direitos básicos do consumidor (...); X – a adequada e
eficaz prestação dos serviços públicos em geral”.
Tratando-se de serviço essencial, resta incontroverso
que a prestação desse serviço deve ser adequada, o que significa dizer que o
Estado deve adotar todas as medidas necessárias para garanti-lo.
Afetado acentuadamente o serviço público para
diagnóstico da fibrose cística, prejudicada está, irremediavelmente, toda a
população infantil, já que o exame é realizado somente nas crianças, uma vez
que a doença é possível ser detectada nos primeiros meses de vida. Assim,
adequação do serviço público é requisito essencial ao serviço público relevante,
de forma a não prejudicar o direito da comunidade usuária do serviço em
questão e de toda a coletividade em geral.
contínua
dever de
qualquer
qualquer
A população é titular do interesse difuso à prestação
e adequada dos serviços públicos essenciais, tendo os prestadores o
executá-los. Não podem estes, por comodismo, indiferença ou sob
pretexto, simplesmente deixarem comprometidas, paralisadas ou de
forma, reduzidas as atividades inerentes ao mesmo.
Analisando fato relacionado à saúde, o Tribunal de
Justiça do Rio Grande do Sul já se manifestou acerca do tema:
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EMENTA: AGRAVO INTERNO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO
CIVIL PÚBLICA CONTRA O ESTADO DO RIO GRANDE DO
SUL.
LEGITIMIDADE
DO
MINISTÉRIO
PÚBLICO.
INTERNAÇÃO EM UNIDADE DE TRATAMENTO INTENSIVO.
MENOR PORTADOR DE DERRAME PLEURAL. -Tem
legitimidade o Ministério Público para propor ação civil
pública em defesa de interesses individuais de menor.
Atribuição prevista no artigo 201, V, da Lei nº 8.069/90. -A
garantia de saúde pública é dever do Estado,
especialmente por ligar-se ao maior de todos os direitos,
que é o direito à vida, e também ao princípio da
dignidade humana, vetor do Estado brasileiro (artigo 1º,
da CF). Exegese do artigo 196, da CF de 1988 e da Lei
Estadual nº 9.908/93. -Recurso não provido. Agravo Nº
70011810736, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Leila Vani Pandolfo Machado,
Julgado em 16/06/2005 (grifo nosso).
Observa-se, outrossim, a necessidade do pagamento de
ajuda de custo (diárias) para a manutenção das crianças e acompanhantes
pois se tratam de pessoas com poucos recursos financeiros, sendo que a
mencionada ajuda será de extrema relevância à subsistência em local distante
de seus lares.
Dispõe a Portaria SAS/055 de 1999, que trata da
rotina do Tratamento fora de Domicílio no Sistema Único de Saúde – SUS - ,
que são permitidas despesas pelo TFD relativamente a transporte e diárias
para alimentação e pernoite para paciente e acompanhante, devendo ser
autorizadas
de
acordo
com
a
disponibilidade
orçamentária
do
município/estado.
A respeito assim tem se pronunciado o Eg. Tribunal de
Justiça de Rondônia:
Mandado de segurança. Saúde. Tratamento fora do
domicílio. Ajuda de Custo. Portaria 055/SAS. Alimentação e
estadia do paciente e acompanhante. Dever do Estado.
O direito à saúde é um direito fundamental garantido na
Constituição, sendo dever do Estado prover as condições
indispensáveis ao seu pleno exercício.
O paciente encaminhado pelo ente público para tratamento
fora de seu domicílio, bem como seu acompanhante, se for
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necessário, têm direito a receber daquele ajuda de custo
para suprir suas despesas diárias com estadia e
alimentação, conforme previsto na portaria que disciplina a
matéria.1
A par de tudo o que já foi dito, deve-se volver os olhos
para um direito fundamental lesado, que é o dos usuários que necessitam
realizar o “teste do suor” para investigação da fibrose cística, sumariamente
violentado, sendo certo que tal situação é insustentável, como bem prevê a Lei
Federal n.º 8.080/90, n.°8.069/90 e diretrizes terapêuticas existentes nas
outras unidades federativas.
DA NATUREZA DOS INTERESSES TUTELADOS
Pelo que se depreende do exposto, a presente demanda
busca a defesa dos interesses e direitos difusos dos cidadãos usuários dos
serviços de saúde pública relativos ao teste do suor, existentes no Estado de
Rondônia.
Iniludível que se está diante de interesses difusos
diante dos fatos narrados, segundo a definição do art. 81, parágrafo único,
inciso I do Código de Defesa do Consumidor, in verbis:
“Art. 81 (...)
Parágrafo único (...)
I – Interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para
efeitos desse código, os transindividuais, de natureza
indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e
ligadas por circunstância de fato.”
A respeito do tema, tem-se o escorreito magistério de
Marcelo Pimentel, verbis:
“A legitimação do direito individual coletivo pressupõe a
não-ofensa a qualquer outro direito individual ou coletivo
1
Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia 200.000.2005.008343-0 Mandado de Segurança
Impetrante : Ministério Público do Estado de Rondônia Impetrado : Secretário de Saúde do
Estado de Rondônia Relator : Desembargador Renato Mimessi
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previsto em lei, por isso, a doutrina criou a categoria dos
interesses difusos, que são exatamente os interesses que se
caracterizam pela conflitualidade social, isto é, interesses
coletivos em oposição uns com os outros, de tal sorte que se
tornam geradores de conflito na própria sociedade. Ora, a
greve pode muitas vezes envolver interesses difusos, porque
a paralisação interessa a um grande grupo de
trabalhadores, ao mesmo tempo em que pode chegar a um
ponto (o prolongamento da greve ou a prática decorrente
dela) em que afete interesses maiores de toda a sociedade.
Sábio, mesmo, seria o constituinte ou a lei previsse uma
intervenção da autoridade pública (o Poder Judiciário ou o
próprio Legislativo) nestes casos de grave conflitualidade de
interesses sociais, quando evidente a prevalência do
interesse público na cessação da greve”. (Abuso do direito
de greve, Revista Ltr., vol. 54, n.º 12, dezembro de 1990, p.
1.441)
Realmente se constata de pronto o interesse e direito
de todas as crianças o acesso à prestação adequada e eficaz do serviço público.
O interesse é indivisível porque diz respeito a todos
aqueles que, ligados por circunstâncias de fato, utilizam ou estão expostos a
utilizarem o serviço declaradamente inadequado, ante a falta de condições
dignas para sua realização e obtenção de resultados eficazes.
Sobre direitos difusos Ada Pellegrini Grinover leciona:
“O objeto dos direitos difusos (no sentido amplo, que
também engloba os coletivos) é sempre um bem coletivo
insuscetível de divisão, sendo que a satisfação de um
interessado implica, necessariamente, a satisfação de
todos, ao mesmo tempo em que a lesão de um indica a
lesão de toda a coletividade” (A problemática dos
interesses difusos, in A Tutela dos Interesses Difusos,
Ed. Mx Limonad, 1984, p. 31).
DA LEGITIMIDADE AD CAUSAM DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Entre as funções institucionais do Ministério Público,
também se insere a de zelar pelo efetivo respeito dos direitos dos
consumidores, tidos como de relevância pública dentre os direitos assegurados
na Constituição Federal e no Código de Proteção e Defesa do Consumidor,
promovendo as medidas necessárias a sua garantia (Constituição Federal, art.
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129, II), portanto, legitimado a ajuizar Ação Civil Pública para pleitear a defesa
dos interesses difusos e coletivos (art. 129, III, CF) e, também, na defesa de
outros interesses individuais (art. 129, IX, CF).
Na esteira desse dispositivo constitucional, o art. 201, V,
dispõe que compete ao Ministério Público promover o inquérito civil público e a
ação civil pública para a proteção dos interesses individuais, difusos ou
coletivos relativos à infância e à adolescência, inclusive os definidos no artigo
220, § 3º, inciso II, da Constituição Federal.
Ademais, a Lei Federal nº 7.347/85 atribui
legitimidade ao Ministério Público para o ajuizamento de ação civil pública
para a prevenção ou reparação dos danos causados aos consumidores, em
decorrência da violação de interesses difusos, coletivos e individuais
homogêneos (arts. 1º, 3º, 5º e 21).
Por derradeiro, a Lei n.º 8.078/90 (Código de Defesa do
Consumidor) concede ao Ministério Público legitimidade para a defesa coletiva
dos interesses e direitos difusos e individuais homogêneos do consumidor (art.
82, I ) e no art. 91 prescreve que “os legitimados de que trata o art. 82, poderão
propor, em nome próprio ou no interesse das vítimas ou seus sucessores, ação
civil coletiva de responsabilidade pelos danos individualmente sofridos, na forma
dos artigos seguintes”.
O texto constitucional e legislação ordinária
normatizam, portanto, a função institucional do Ministério Público, sendo o
parquet parte legítima para promover ação civil pública na defesa de interesses
coletivos e individuais homogêneos (legitimação ordinária). Isso significa que é
dever impostergável do Ministério Público a defesa do povo, cabendo-lhe exigir
a fiel prestação dos serviços relevantes e essenciais.
Nestes termos, a presente ação civil pública colima
assegurar e defender os direitos difusos da classe de usuários dos serviços de
saúde oferecidos pelo Estado de Rondônia.
DO CABIMENTO E NECESSIDADE DE CONCESSÃO, POR MEIO DE
LIMINAR, DA ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA PRETENDIDA
Verifica-se que estão presentes os pressupostos
exigidos pelo artigo 273 do Código de Processo Civil para a concessão da tutela
antecipada, quais sejam: prova inequívoca do direito reclamado e
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verossimilhança da alegação, sendo que há claro e fundado receio de dano
irreparável ou de difícil reparação ao direito subjetivo dos infantes que
necessitam do diagnóstico para tratamento da doença conhecida por Fibrose
Cística.
A antecipação da tutela se impõe, desde já, porque o
provimento da pretensão, ao final, poderá ser inócuo para prevenir a
perpetuidade do dano, especialmente às crianças Diogo Guimarães da Silva,
de 6 meses de idade (fls.05/06), Yago Soares Barbosa Evangelista, de 5 anos
(fls.07/09), Igor Pansini Carneiro, de 1 ano e sete meses (fls.10), para os quais
a necessidade de realização do teste do suor é imprescindível para a
investigação da fibrose cística e possível início de tratamento médico (laudos
médicos acostados às fls.58/60), sendo relevante o fundamento da lide, à vista
da presença dos indissociáveis requisitos do fumus boni iuris e do periculum in
mora, nos termos do
art. 12 da Lei Federal n.º 7.347/85, ou
subsidiariamente antecipando a tutela pretendida nos termos do art. 273, §1º
do CPC, face à presença dos requisitos de seus incisos I e II.
Presentes a aparência do direito e o perigo da demora,
pois conforme já foi exaustivamente ressaltado, o serviço de saúde reclamado
precisa ser realizado com a mais alta urgência, posto que incorrem em risco de
vida as crianças supracitadas ou outras ainda não identificadas.
O perigo da demora também está suficientemente
ressaltado nesta petição inicial, justificado o receio de ineficácia do provimento
final, razão pela qual é preciso que seja concedida liminarmente a tutela
pleiteada.
O direito dos consumidores à saúde se consubstancia
em um direito público subjetivo, exigindo do Estado atuação positiva para sua
eficácia e garantia. Por isto resta evidente que a demora na decisão acarretará
prejuízos irreparáveis ao bem aqui tutelado, qual seja, a saúde e vida das
pessoas, sendo medida de extrema urgência que reste estabelecido em medida
judicial a garantia dos serviços adequados, eficientes e eficazes aos usuários,
como forma de se precaver da ocorrência de possíveis imposições ou restrições
da seguradora na autorização do procedimento no decorrer da demanda.
DOS PEDIDOS
Em face de tudo quanto foi exposto, o Ministério
Público requer:
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1. Seja concedida a antecipação de tutela “inaudita
altera pars”, compelindo o Estado de Rondônia, pelo Senhor Secretário de
Estado da Saúde a:
a) encaminhar para Tratamento Fora do Domicílio (Hospital Universitário da
Universidade Federal de Minas Gerais: Núcleo de Atendimento à Neonatologira
e fibrose Cística da UFMG – NUPAT - Estado de Minas Gerais ) os pacientes
Yago Soares Barbosa Evangelista, Igor Pansini Carneiro e Diogo Guimarães da
Silva, para realização do teste do suor (iontoferese por pilocarpina), com o
pagamento das respectivas diárias; providenciar o traslado dos usuários e
acompanhantes do Município de Cacoal para Porto Velho em veículos
adequados em razão do frágil estado de saúde das crianças;
b) enquanto não existir no Estado de Rondônia, clínica, pessoal técnico
especializado, materiais e equipamentos próprios para a realização do teste do
suor pela técnica da iontoferese por pilocarpina, encaminhar para TFD no
Estado de Minas Gerais (ou outro Estado que possua as condições adequadas,
de preferência indicado pela respectiva Associação) todas as crianças que
venham a necessitar da realização do exame, sob pena de imposição de multa
diária;
2. Ao final, a procedência do pedido, condenando os
requeridos, além do pagamento de custas e demais despesas processuais, à
obrigação de fazer, ou seja, fornecer meios para que todas as crianças e seus
acompanhantes sejam encaminhados para a localidade onde seja realizado o
teste do suor da maneira como preconizada e relatada nesta petição;
3. Cominar no atraso de descumprimento da atividade
devida postulada, o pagamento de multa diária pelo Senhor Secretário de
Estado da Saúde, para cuja estimativa, ante a natureza e importância do
direito em foco, sugere o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) como forma de
inibir a requerida a não descumprir a determinação judicial, quantia esta
sujeita a correção monetária pelos índices oficiais, desde a distribuição da
inicial até o efetivo adimplemento, destinada a recolhimento ao Fundo Estadual
de Saúde.
5. Seja determinada a citação do requerido, na pessoa
de seu representante legal ou substituto legal, utilizando-se da faculdade
conferida pelo art. 172, §2º do CPC, a fim de que, advertida da sujeição aos
efeitos da revelia, consoante o disposto no art. 285, última parte, do CPC e, se
desejarem, apresentarem resposta ao pedido formulado, no prazo de 15 dias.
Requer mais:
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Rua Jamary, nº 1555 – Bairro Olaria – CEP 78.903-037 – Porto Velho/RO (69) 3216-3700
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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE RONDÔNIA
PROMOTORIA DO CONSUMIDOR E SAÚDE
1. A produção de todas as provas admitidas em Direito,
notadamente documentos, oitiva de testemunhas, laudos, realização de
perícias, vistorias e inspeções judiciais, inclusive a inversão do ônus da prova,
demonstrada a verossimilhança da alegação e hipossuficiência do consumidor
(art.6º, inciso VIII do CDC);
2. A dispensa do pagamento de custas, emolumentos e
outros encargos, desde logo, à vista do disposto no art. 18 da Lei Federal n.º
7.347/85 e no art. 87 do Código de Defesa do Consumidor;
3. A realização de suas intimações dos atos e termos
processuais, na forma do art. 236, §2º do CPC, na Rua Jamary, n.º 1555,
Bairro Pedrinhas, nesta capital e rua Almirante Barroso 1403, bairro Nossa
Senhora das Graças, Porto Velho.
Embora seja a rigor inestimável, dá-se à causa,
simplesmente em atenção ao disposto no art. 258 do CPC, o valor de
R$1.000,00.
Porto Velho, 28 de maio de 2007.
Emília Oiye
Promotora de Justiça
Marcelo Lima de Oliveira
Promotor de Justiça
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Rua Jamary, nº 1555 – Bairro Olaria – CEP 78.903-037 – Porto Velho/RO (69) 3216-3700
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