promotoria do consumidor e saúde - Centro de Apoio Operacional

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE RONDÔNIA
PROMOTORIA DO CONSUMIDOR E SAÚDE
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA _VARA CÍVEL
DA COMARCA DE PORTO VELHO - RO
O MINISTÉRIO PÚBLICO DE RONDÔNIA, pela
Promotora de Justiça que esta subscreve, com atribuição na Defesa do
Consumidor e Saúde, vem respeitosamente perante Vossa Excelência,
legitimada por força do disposto no art. 129, inciso III da Constituição Federal,
arts. 3º e 5º da Lei Federal n.º 7.347/85, art. 14, parágrafo 4º da Lei Federal
n.º 8.078/90, propor a presente:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
Com pedido de liminar
e com preceito cominatório de obrigação de não fazer (não realizar o
procedimento cirúrgico denominado gastroplastia – cirurgia bariátrica, em
desacordo com as normas estabelecidas pelo Ministério da Saúde e Conselho
Federal de Medicina), e de fazer (ressarcir as vítimas em razão dos prejuízos
causados pela não observância da lei), visando a tutela dos interesses difusos e
individuais homogêneos envolvidos, em face de ALEXANDRE BRITO DA
SILVA, médico, portador da cédula de identidade n.º 11.767.8573, registro no
CRM n.º 1593, podendo ser encontrado no Hospital da AMERON, Av. Calama,
n.º 2615, Bairro Liberdade, nesta capital, local em que trabalha e AMERON –
ASSISTÊNCIA MÉDICA E ODONTOLÓGICA DE RONDÔNIA LTDA, inscrita no
CGC sob n.º 84.638.345/001-65, tendo sua sede na Av. Calama, n.º 2615,
Bairro Liberdade, nesta capital, na pessoa de seus representantes legais, pelas
razões fáticas e de direito a seguir articuladas.
DOS FATOS
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Rua Jamary, nº 1555 – Bairro Olaria – CEP 78.903-037 – Porto Velho/RO (69) 3216-3700
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Através da reclamação da Sra. Maria Joelma de
Almeida Reski, bem como de outras reclamações oferecidas por diversas
pessoas, chegou ao conhecimento desta Promotoria de Justiça que o médico
Alexandre Britto da Silva realiza, através da AMERON, o procedimento
cirúrgico denominado gastroplastia, em total inobservância aos critérios
estabelecidos pelo Ministério da Saúde, Conselho Federal de Medicina e
Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica, os quais normatizam, dentre
outros, que a gastroplastia deverá ser realizada, excluindo-se os casos em que
o paciente apresente índice de massa corpórea – IMC - superior a 35kg/m2 e
sejam portadores de doença crônica associada (diabetes, hipertensão,
artroplastias, hérnia de disco ou apnéia de sono), cuja situação clínica é
agravada pela obesidade, somente após dois anos contínuos de comprovada
resistência aos tratamentos conservadores, bem como que o Hospital
possua equipe multidisciplinar, contendo clínico, nutricionista, psiquiatra ou
psicólogo, fisioterapeuta e auxiliares de enfermagem familiarizados com o
manejo dos pacientes portadores da obesidade mórbida. Ainda, segundo a
Resolução CFM n.º1.766/05 (documento em anexo) deverá haver
“compreensão, por parte do paciente e familiares, dos riscos e mudanças
de hábitos inerentes a uma cirurgia de grande porte e da necessidade de
acompanhamento pós-operatório com a equipe multidisciplinar por toda
a vida do paciente”.
Consoante o depoimento da Sra. Maria Joelma de
Almeida Reski (fls. 02/03 PA n.º 2006001060002008), a paciente procurou o
médico Alexandre Brito da Silva no mês de maio de 2004 para uma consulta
médica, pois estava com o índice IMC 52kg/m2, o que prejudicava o
desempenho de suas atividades cotidianas e causava uma série de outros
transtornos decorrentes do elevado grau de obesidade.
Acontece que na ocasião da consulta médica, a
paciente recebeu como proposta de tratamento pelo médico assistente, a
realização do procedimento de cirurgia bariátrica, sendo exigido apenas que
realizasse os exames pré-operatórios ao prazo de duas semanas, e buscasse
autorização junto ao IPAM (plano médico-hospitalar ao qual é segurada, que
por sua vez possui convênio com a AMERON).
A reclamante informou ainda que em nenhum
momento foi informada de que após a cirurgia deveria realizar
acompanhamento periódico com equipe multidisciplinar, ou que as
conseqüências da cirurgia poderiam levá-la a óbito, caso em tal
acompanhamento não obtivesse êxito. Relatou, inclusive, que ao receber a alta
hospitalar, indagou ao médico acerca da dieta que deveria seguir, recebendo
orientação de alimentação sem restrições, inclusive com ingestão de muita
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carne (o que, de plano denota a negligência do médico, uma vez que após o
procedimento cirúrgico em tela, o correto seria a ingestão de dieta líquida por
um período mínimo de quinze dias, consoante orientação da Sociedade
Brasileira de Cirurgia Bariátrica – fls. 05/14 do PA).
Dessa forma, assim como a paciente adentrou o
consultório do médico Alexandre Brito da Silva e rapidamente
(aproximadamente duas semanas) realizou a gastroplastia, em igual proporção
obteve alta hospitalar, e nesse contexto passou a sofrer uma série de
conseqüências inerentes ao despreparo físico e psicológico antes e depois da
mencionada cirurgia, conforme laudo da médica Nakuxe Mendes (fls. 04 do
PA), como desnutrição protéico-calórica, distúrbio hidro-eletrolítico, anemia
severa, necessidade de transfusão sanguínea, hipotireoidismo severo,
depressão, diarréia, pneumonia e cirrose hepática, restando claro a ocorrência
de negligência e imprudência médica ao realizar um procedimento cirúrgico
que requer tantos cuidados, mesmo antes como após sua concretização, e que
ocorreu de maneira precipitada, omissa, inconsiderada e sem qualquer cautela,
levando a paciente a seríssimas conseqüências, tendo inclusive que arcar com
o custeio de todo o tratamento posterior às complicações tardias decorrentes
da negligência médico-hospitalar.
Vale anotar, também, que no momento em que o
médico Alexandre Brito da Silva realizou a gastroplastia contratada pela
paciente, retirou também um órgão da mesma (vesícula), sem que a paciente
ou quaisquer familiares houvessem consentido para tanto. Ainda, a paciente
somente ficou sabendo do ocorrido quando no leito do hospital, após os efeitos
da anestesia, avistou o órgão, que se encontrava dentro de um frasco de vidro
e, indagando ao médico o que se tratava aquilo, o mesmo informou que havia
retirado, pois aquele órgão “não seria mais necessário”.
O caso da Sra. Maria Joelma de Almeida Reski é
apenas um exemplo de como vem ocorrendo a realização do procedimento
precipitado e sem cautela com que o médico Alexandre Brito da Silva vem
realizando gastroplastia no Estado, através da seguradora AMERON. Insta
consignar que, segundo informado oficialmente pelo próprio requerido Dr.
Alexandre (fls. 022 – PA), bem como por um colega de profissão, Dr. Adriano
Calçado (fls.062 - PA), que, apesar de jovem, o médico e sua equipe já
realizaram aproximadamente duzentas (200) cirurgias bariátricas.
Existem regras normatizadas pelo Ministério da Saúde
para realização de tal procedimento, recomendação da Sociedade Brasileira de
Cirurgia Bariátrica, bem como Resolução proposta pelo Conselho Federal de
Medicina (todos documentos se encontram em anexo), onde se estabelecem
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normas seguras para a realização da gastroplastia, que devem ser seguidas por
todos os hospitais e médicos atuantes na área, com a finalidade única de
preservar um direito fundamental garantido constitucionalmente: o direito a
vida, e que evidentemente está sendo desrespeitado e lesado pelo médico
Alexandre Brito da Silva e pela AMERON, que conhecedora da conduta do
médico e das regras que devem ser obedecidas, omite-se, permitindo que
situações como a da Sra. Maria Joelma aconteçam naquele nosocômio.
Prestando esclarecimentos a esta Promotoria de
Justiça, o médico requerido buscou eximir-se de toda a culpa, alegando
preliminarmente que o insucesso da cirurgia deveu-se ao não atendimento da
paciente às prescrições médicas, considerando por fim absurdas as declarações
postuladas em seu desfavor, por falta de qualquer amparo legal.
Verifique-se que o próprio médico, em sua defesa,
declarou: “em todas as consultas cobrei o acompanhamento com o
nutricionista, porém a paciente sempre informava que não podia pagar e
que o convênio não cobria” (fls. 21/23 do PA). Assim, resta claro que o
médico e a seguradora AMERON não possuem, em seu quadro clínico, os
profissionais multidisciplinares exigidos para o fiel cumprimento das
determinações legais que regem a categoria, e que também proporcionam a
garantia aos pacientes-consumidores, maior segurança na prestação dos
serviços médico-hospitalares.
Nos autos é incontestável a prática da conduta
negligente e imprudente do médico e da seguradora, quanto à prática de
conduta em desacordo com as normas estabelecidas pelo Ministério da Saúde,
na Portaria n.º 196, de 29/02/00, publicada no DOU n.º 43-E em 31/03/00,
seção I, bem como na Resolução n.º 1.766/05, publicada no DOU em
11/07/05, do Conselho Federal de Medicina, onde se exige do Hospital a
existência de equipe multidisciplinar para acompanhamento dos pacientes que
realizam gastroplastia, contendo, inclusive, nutricionista.
Ora, em sua defesa, o médico declarou que nas
consultas sempre questionava da paciente se estava fazendo acompanhamento
com outros profissionais, sendo que a mesma lhe informava que o convênio
não cobria as despesas com nutricionista (fls.21-PA), e a mesma não possuía
condições financeiras para arcar com tais despesas. Como então pode o médico
informar que realiza, na AMERON, o procedimento dentro dos padrões exigidos
por lei?
O procedimento de gastroplastia realizado pelo médico
Alexandre Brito da Silva em seus pacientes é denominado técnica de
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Duodenal Switch ou Scorpinaro, técnica esta permitida pelo Conselho
Federal de Medicina, onde mais da metade do estômago é retirada, sendo feito
um desvio no intestino, que provoca uma má absorção dos alimentos, fazendo
com que o paciente emagreça mais rapidamente. No entanto, os pacientes
devem ser devidamente informados dos riscos do pós-operatório, do
acompanhamento obrigatório com profissionais de diversas áreas da saúde,
mas, acima de tudo, deveria ser realizado todo um trabalho anterior ao
procedimento cirúrgico, o que de fato não acontece na AMERON.
Para que seja realizada a gastroplastia, o paciente deve
percorrer diversas etapas de tratamentos médicos. Ainda, procedimento
somente pode ser realizado após dois anos de tratamentos infrutíferos para
obesidade com medicamentos, e o paciente deve possuir a doença (obesidade
mórbida) há pelo menos cinco anos.
Como exemplo de observância do disposto na
legislação que regulamenta a cirurgia bariátrica, encontram-se em anexo
documentos do Hospital de Base Ary Pinheiro, contendo informações acerca do
Programa de Cirurgia Bariátrica que os pacientes e profissionais envolvidos
devem obrigatoriamente seguir (anote-se que uma etapa não concluída impede
o paciente de prosseguir para as demais); da UNIMED, negando a autorização
da cirurgia a uma paciente que não preenchia os requisitos exigidos pela lei;
bem como informações obtidas da Casa de Saúde São José, no Estado do Rio
de Janeiro, contendo inclusive fotos das reuniões realizadas para a
conscientização dos pacientes, acerca do tratamento que deverá ser realizado a
vida inteira, das complicações inerentes a um acompanhamento insatisfatório
da cirurgia, e de seus riscos.
Observa-se, com isso, que o médico Alexandre Brito da
Silva e a AMERON não realizam o procedimento de maneira a garantir aos
pacientes a segurança e o conforto de um processo cauteloso, ordenado e
consciente. Os pacientes procuram o médico, que verifica a existência da
obesidade mórbida, e em seguida sugere ao paciente a realização da
gastroplastia, após a apresentação de exames rotineiros pré-operatórios, sendo
logo em seguida realizado o procedimento, sem qualquer acompanhamento de
equipe multidisciplinar, pois tal equipe sequer existe no convênio com a
seguradora AMERON.
É exatamente nesse ponto, na possibilidade de
ocorrência de um dano maior a outros consumidores e pacientes que utilizam
ou venham a utilizar o serviço negligente e imprudente atualmente fornecido
pelos requeridos, que até o presente momento, por não estarem agindo de
acordo com a legislação pertinente, apenas estão auferindo lucros e vantagens
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em virtude da conduta ilícita, em detrimento dos interesses comuns dos
profissionais da medicina e também dos pacientes, que se objetiva a tutela dos
direitos difusos e individuais homogêneos aqui pleiteados.
DO DIREITO
A) Da Legitimidade ad causam do Ministério Público
Entre as funções institucionais do Ministério Público,
também se insere a de zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos
serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição
Federal, promovendo as medidas necessárias a sua garantia (Constituição
Federal, art. 129, II), portanto, legitimado a ajuizar Ação Civil Pública para
pleitear a defesa dos interesses difusos e coletivos (art. 129, III, CF) e, também,
na defesa de outros interesses individuais (art. 129, IX, CF).
Assim se expressa Nelson Nery Júnior, acerca do tema:
“O Ministério Público é parte legítima para ajuizar
ACP, não apenas na defesa dos interesses difusos
e coletivos, mas de outros direitos individuais. A
CF, em seu art.129, XI, autoriza a lei
infraconstitucional a cometer outras atribuições
ao MP, desde que compatíveis com sua função
institucional de atuar no interesse público,
defendendo os direitos sociais e os individuais
indisponíveis (CF, art. 127, caput).”
Na esteira desse dispositivo constitucional, o art. 42,
IV, “a” da Lei Complementar Estadual n.º 093, de 03/11/93 assim dispõe:
“Art. 43 – Incumbe ao Ministério Público, além de
outras atribuições previstas em lei:
(...)
IV – Promover o inquérito civil e a ação civil
pública, na forma da lei:
a) para a proteção, prevenção e reparação dos
danos causados ao meio ambiente, ao consumidor,
aos bens de direitos de valor artístico, histórico,
turístico e paisagístico e a outros interesses
difusos, coletivos e individuais, indisponíveis e
homogêneos”.
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Ademais, a Lei Federal n.º 7.347/85 atribui
legitimidade ao Ministério Público para o ajuizamento de ação civil pública
para a prevenção ou reparação dos danos causados a comunidade usuária dos
serviços de relevância pública, em decorrência da violação de interesses
difusos, coletivos e individuais homogêneos (arts. 1º, 3º, 5º e 21).
Por derradeiro, a Lei n.º 8.078/90 (Código de Defesa do
Consumidor) concede ao Ministério Público legitimidade para a defesa coletiva
dos interesses e direitos difusos e individuais homogêneos do consumidor (art.
82, I ) e no art. 91 prescreve que “os legitimados de que trata o art. 82, poderão
propor, em nome próprio ou no interesse das vítimas ou seus sucessores, ação
civil coletiva de responsabilidade pelos danos individualmente sofridos, na forma
dos artigos seguintes”.
O texto constitucional e legislação ordinária
normatizam, portanto, a função institucional do Ministério Público, sendo o
parquet parte legítima para promover ação civil pública na defesa de interesses
difusos e coletivos (legitimação ordinária). Isso significa que é dever
impostergável do Ministério Público a defesa do povo, cabendo-lhe exigir a fiel
prestação dos serviços relevantes e essenciais.
Nestes termos, a presente ação civil pública colima
assegurar e defender direitos difusos e individuais homogêneos dos
consumidores que utilizaram ou irão utilizar-se do serviço de cirurgia
bariátrica fornecido pelos requeridos.
O art. 196 da CF dispõe que “a saúde é direito de
todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos, e
ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção,
proteção e recuperação”.
O art. 197 do texto constitucional determina
expressamente que as ações e serviços de saúde são de relevância pública.
A respeito da obrigação da prestação de serviços de
relevância pública, o art. 22 da Lei n.º 8.080/90 (Código de Defesa do
Consumidor) assim dispõe:
“Art. 22 – Os órgãos públicos, por si ou suas
empresas, concessionárias, permissionárias ou
sob qualquer outra forma de empreendimento, são
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obrigados
a
fornecer
serviços
adequados,
eficientes, seguros e, quanto aos essenciais,
contínuos.
Parágrafo único – nos casos de descumprimento,
total ou parcial, das obrigações referidas neste
artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a
cumpri-las e a reparar os danos causados, na
forma prescrita deste Código.”
No tocante à responsabilidade pelo fato do produto ou
serviço, o art. 14 do CDC assim define:
“Art. 14 – O fornecedor de serviços responde,
independentemente da existência de culpa, pela
reparação dos danos causados aos consumidores
por defeitos relativos à prestação dos serviços,
bem como por informações insuficientes ou
inadequadas sobre sua fruição e riscos.
Parágrafo 1º O serviço é defeituoso quando não
fornece a segurança que o consumidor dele pode
esperar,
levando-se
em
consideração
as
circunstâncias relevantes, dentre as quais:
I – o modo de seu fornecimento”.
Assim, tratando-se de serviço de relevância pública,
resta incontroverso que a prestação deve ser adequada, eficiente e segura; o
que de fato não vem ocorrendo na prestação de serviços pelos requeridos,
estando evidente a existência dos três pressupostos exigidos para a
caracterização do aperfeiçoamento da responsabilidade: a existência de defeito
na prestação do serviço, o evento danoso, e a relação de causalidade entre o
defeito do serviço e o dano.
Com referência à responsabilidade do médico, o art.
14, em seu parágrafo 4º / CDC dispõe que:
“A responsabilidade pessoal dos profissionais
liberais será apurada mediante a verificação de
culpa.”
Nessa esteira, depreende-se que em razão da natureza
intuitu personae do contrato celebrado entre o médico e a paciente, a
ocorrência de culpa, nas modalidades de negligência e imprudência restaram
perfeitamente delineadas na presente, quando demonstrada a ocorrência da
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prestação de serviços em desacordo com as normas técnicas atinentes à
matéria, os prejuízos causados a Sra. Maria Joelma, bem como a ocorrência de
danos que outros consumidores porventura tenham sofrido, ou mesmo, que
venham a sofrer.
Por ser a Medicina uma profissão a serviço da saúde
humana e da coletividade, está revestida de normas éticas que devem ser
seguidas pelos profissionais, no exercício de suas funções, com o máximo de
zelo e o melhor de sua capacidade, pois assim dispõe o Código de Ética Médica
(Resolução CFM n.º 1246/88, publicada no DOU em 26/01/88):
“Art. 2º - O alvo de toda a atenção do médico é a
saúde do ser humano, em benefício da qual deverá
agir com o máximo de zelo e o melhor de sua
capacidade profissional.
Art. 29 – É vedado ao médico praticar
atos profissionais danosos ao paciente, que possam
ser caracterizados como imperícia, imprudência ou
negligência.”
Todo médico deve ter por objetivo guardar absoluto
respeito à vida, atuando sempre em benefício do paciente, considerando-se,
dessa forma, inadmissível a conduta praticada pelo requerido, quando da
inobervância às normas estabelecidas para a realização do procedimento
cirúrgico, mais parece preocupar-se com a aferição de lucros e vantagens
pecuniárias, colocando em detrimento o bem estar de seus pacientes, que
movidos pela boa-fé contratam seus serviços.
“Há um salutar princípio jurídico geral que,
objetivando resguardar os interesses, os direitos e
as obrigações do homem no seio da sociedade,
estabelece a todo indivíduo mentalmente sadio é
capaz a obrigação de responder por prejuízos
cometidos a outrem, por meio de dolo ou da
atuação negligente, imprudente e imperita,
obrigação
esta
que
será
calculada,
sob
perspectiva civilista, exclusivamente sobre a
extensão do dano e não pelo grau de culpa, seja
ela grave, seja leve” (CROCE, Delton e Júnior in
“Erro Médico”, 1ª Edição, Ed. Oliveira Mendes, São
Paulo, 1997).
É notório, portanto, que o serviço de gastroplastia
atualmente prestado pelos requeridos não observa os requisitos exigidos à sua
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consecução, pois provada a sua incúria que comprometeu a vida da Sra. Maria
Joelma, assim como poderá vir a causar danos maiores também a outros
pacientes, não sendo concebível que tal prática continue a ocorrer, sendo a
população a titular do interesse difuso à prestação do serviço eficiente e
seguro, tendo os prestadores o dever de executa-los na forma exata como
prescreve a lei.
Com referência à seguradora AMERON, notória a
responsabilidade solidária, quando, ao ceder suas instalações para a realização
das cirurgias bariátricas, concede confiança de atendimento em hospital
respeitável, agindo com aparência de responsabilidade pelo tratamento ali
ministrado. Vejamos o entendimento do STJ:
CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. PRESTAÇÃO DE
SERVIÇOS MÉDICOS. Quem se compromete a
prestar
assistência
médica
por
meio
de
profissionais que indica, é responsável pelos
serviços que estes prestam. Recurso Especial não
conhecido. (STJ – Ac. REsp. 138059/MG – 3ª T.
Rel. Min. Ari Pargendler, j. 13/03/01 unânime)
Também assim decidem os demais Tribunais:
“A jurisprudência tem reconhecido que o médico
que integra o quadro clínico de um hospital e a
pessoa física ou jurídica que mantém o
estabelecimento de saúde são respectivamente
prepostos e preponente, independente de vínculo
empregatício.” (TJSP – 8ª C. – Ap. – Rel. Aldo
Magalhães – j. 22/05/96 – RT 731/243)
“A responsabilidade deriva do fato de que os
médicos estavam prestando serviços naquelas
dependências,
nas
quais,
inclusive,
houve
internação. Se a autora usufruiu de seus cômodos,
laboratórios e médicos que lhe foram colocados a
disposição, caracterizada está a efetiva prestação
de serviços, abrangida pelo Código de Defesa do
Consumidor, donde resulta a correta aplicação do
art. 14 da referida Lei, legitimando o hospital a
responder os termos da presente ação.” (TA PR –
AC 137458500 – Ponta Grassa – 7ª Vara Cível – Rel.
Juiz Miguel Pessoa – DJPR 19/05/00 – Ementa
Parcial)
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B) Da Natureza dos Interesses Tutelados
Pelo que se depreende do exposto, a presente demanda
busca a defesa de interesses e direitos difusos e individuais homogêneos dos
consumidores usuários do serviço de saúde – gastroplastia – fornecido pelos
requeridos.
Iniludível que se está diante de interesses difusos
perante os fatos narrados, segundo a definição do art. 81, parágrafo único,
inciso I do Código de Defesa do Consumidor, in verbis:
“Art. 81 –
(...)
Parágrafo único –
(...)
I – Interesses ou direitos difusos, assim entendidos,
para efeitos deste Código, os transindividuais, de
natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas
determinadas e ligadas por circunstâncias de fato”.
A respeito do tema, tem-se o escorreito magistério de
Hugo Nigro Mazzilli, verbis:
“Os interesses difusos compreendem um grupo
menos determinável de pessoas, entre as quais
inexiste um vínculo jurídico ou fático preciso. São
como um feixe ou conjunto de interesses
individuais, de objeto indivisível, compartilhados
por pessoas indetermináveis, que se encontram
unidas por circunstâncias de fato conexas. Assim,
por exemplo, a pretensão ao meio ambiente
hígido,
posto
compartilhada
por
número
indeterminável de pessoas, não pode ser
quantificada ou dividida entre os membros da
coletividade; também o produto da eventual
indenização obtida em razão da degradação
ambiental não pode ser repartido entre os
integrantes do grupo lesado, não apenas porque
cada
um
dos
lesados
não
pode
ser
individualmente determinado, mas porque o
próprio interesse em si é indivisível. Destarte,
estão incluídos no grupo lesado não só os atuais
moradores da região atingida, como também os
futuros moradores do local; não só as pessoas que
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ali vivem atualmente, mas até mesmo as gerações
futuras, que, não raro, também suportarão os
efeitos da degradação ambiental. Em si mesmo, o
próprio interesse em jogo é indivisível.
Já os interesses individuais homogêneos são
aqueles de grupo, categoria ou classe de pessoas
determinadas ou determináveis, que compartilhem
prejuízos
divisíveis,
de
origem
comum,
normalmente oriundos das mesmas circunstâncias
de fato” (MAZZILLI, Hugro Nigro in A Defesa dos
Interesses Difusos em Juízo. 18ª edição, Ed.
Saraiva, 2005)
O interesse é indivisível porque diz respeito a todos
aqueles que, ligados por circunstâncias exclusivamente fáticas, ficaram
expostos e sofrem danos ante a conduta negligente e imprudente dos
requeridos.
A propósito da sobredita indivisibilidade, José Carlos
Barbosa Moreira preleciona: “um bem (latíssimo senso) indivisível, no sentido
insusceptível de divisão (mesmo ideal) em quotas atribuíveis individualmente a
cada um dos interessados. Estes se põem numa espécie de comunhão tipificada
pelo fato de que a satisfação de todos, assim como a lesão a um só, constitui,
ipso facto, lesão da inteira coletividade” (in “Legitimação para a Defesa dos
Interesses Difusos no Direito Brasileiro, Revista AJURIS/RS, n.º 32/82).
Nesse mesmo sentido podemos citar lição de Ada
Pellegrine Grinover, segundo a qual “o objeto dos interesses difusos (no sentido
amplo, que também engloba os coletivos), é sempre um bem coletivo insusceptível
de divisão, sendo que a satisfação de um interessado implica, necessariamente,
a satisfação de todos, ao mesmo tempo em que a lesão de um indica a lesão de
toda a coletividade”(“A Problemática dos Interesses Difusos”, in “A Tutela dos
Interesses Difusos”, ed.Max Limonad, 1984, p.31).
DOS PEDIDOS
A) Do Pedido de Concessão de Tutela Antecipada
Diante do exposto, o Ministério Público de Rondônia
requer a Vossa Excelência a concessão de liminar inaudita altera pars, com
expedição de mandado, para impor que:
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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE RONDÔNIA
PROMOTORIA DO CONSUMIDOR E SAÚDE
1.O médico e a seguradora requeridos se abstenham
de realizar o procedimento cirúrgico gastroplastia em desacordo com os
critérios mínimos exigidos por lei (documentos em anexo);
2. Fixação de multa no valor de R$ 50.000,00 para
cada cirurgia bariátrica realizada em desacordo com o procedimento padrão,
montante este suficiente para que os requeridos se sintam desestimulados a
descumprir qualquer uma das determinações deste juízo, ou a cumpri-las fora
do prazo determinado, devendo, neste último caso, o valor da multa ser
aplicado diariamente até o efetivo cumprimento da obrigação, tudo nos termos
do art. 11 da Lei n.º 7.347/85 e do parágrafo 4º do art. 84 da Lei n.º 8.078/90,
sem prejuízo da responsabilização do recalcitrante pela prática do crime de
desobediência;
3. Requer ainda que Vossa Excelência determine a
publicação, via Diário Oficial, da r. decisão concessiva da medida liminar, a fim
de que chegue ao conhecimento de todos o teor da decisão a ser proferida.
B) Dos pedidos de tutela definitiva
Outrossim, requer o órgão ministerial que seja julgada
procedente a presente demanda, tornando definitivas as liminares concedidas.
Requer ainda que os requeridos, em virtude da
conduta negligente e imprudente com que vinham realizando as cirurgias
bariátricas, sejam condenados genericamente a cumprir, solidariamente, a
obrigação de fazer, consistente em ressarcirem integralmente cada uma das
vítimas lesadas, quer seja por danos morais, quer seja por danos materiais ou
estéticos.
Por fim, requer a inversão do ônus da prova, nos
termos do art. 6º, inciso VIII do CDC, bem como que os demandados sejam
condenados ao pagamento das custas e honorários advocatícios.
C) Requerimentos Finais
Requer, finalmente, o autor:
1. A citação dos requeridos, sob a autorização do art.
172, parágrafo 2º do CPC, nos endereços mencionados no preâmbulo, para
que, querendo, contestem a presente demanda, sob pena de confissão quanto
às matérias de fato e sob os efeitos da revelia;
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PROMOTORIA DO CONSUMIDOR E SAÚDE
2. A dispensa do pagamento de custas, emolumentos e
outros encargos, à vista do disposto no art. 18 da Lei n.º 7.347/85 e 87 da Lei
n.º 8.078/90;
3. A publicação de edital no órgão oficial, a fim de que
os interessados, querendo, possam intervir no processo como litisconsortes,
sem prejuízo de ampla divulgação pelos meios de comunicação social por parte
deste Órgão de Defesa do Consumidor, tudo com previsão no art. 94 da Lei n.º
8.078/90.
4. A juntada do inquérito civil n.º 2006001060002008,
instaurado e concluído pelo Ministério Público Estadual, como prova
documental em desfavor dos requeridos;
5. A intimação pessoal do autor, na pessoa de seu
agente subscritor, mediante a entrega e vista dos autos na sede da 7ª
Promotoria do Consumidor e Saúde, situada à Rua Jamary, n.º 1555, Bairro
Pedrinhas, dado o disposto no art. 236, parágrafo 2º do CPC e na Lei
Complementar Estadual do Ministério Público.
Protesta o autor provar o alegado pelos meios de prova
em direito permitidos, bem como oitiva de testemunhas, cujo rol, se necessário,
será oferecido oportunamente.
Embora esta ação seja de natureza economicamente
inestimável, dá-se à causa, meramente para efeitos legais, o valor de R$
1.000,00 (um mil reais).
Termos em que
Pede deferimento.
Porto Velho, 05 de julho de 2006.
Priscila Matzenbacher Tibes Schmidt
Promotora de Justiça – Curadora da Saúde
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