A duvida e a busca da verdade

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TEORIA DO CONHECIMENTO - CETICISMO
A dúvida e a busca da verdade
Se alguém lhe perguntasse "O que você conhece?", você poderia pensar em uma porção de coisas, a maioria delas
adquiridas em sua experiência cotidiana. Mas se a pessoa insistisse e perguntasse "Algo do que você sabe é realmente
verdade? Apostaria sua vida nisso?", essas questões complicariam um bocado as coisas.
Eu, por exemplo, poderia dizer que tenho certeza que sou filho dos meus pais, mas talvez eu tivesse sido adotado ou
trocado na maternidade e estar enganado a esse respeito. Poderia ainda estar enganado sobre uma série de outras
coisas que até então julgava certas. E se reparar direito, tudo o que eu tenho são crenças, algumas até muito
razoáveis, mas nada de que eu possa dizer que é uma verdade irrefutável. Percebo, então, que me falta um
parâmetro para examinar as minhas crenças e verificar quais são realmente certas e quais são falsas.
Condições universais de validade
Durante a história da filosofia, vários foram os filósofos que tentaram estabelecer as condições para que algo
fosse tomado como absolutamente verdadeiro, isto é, uma verdade que independesse de fatores circunstanciais
e que fosse algo que não fosse verdadeiro para mim ou para um grupo de pessoas, mas para todos os seres
racionais.
Você deve estar cansado de ver por aí grupos de pessoas com crenças estranhas, que dizem que eles estão
certos e todos os outros enganados. Nesse caso, como decidir quem está certo? Votando? Mas se a maioria
estiver errada e o pequeno grupo estiver certo, nunca conheceremos a verdade porque eles sempre perderão
nas votações. É preciso que se trate de uma verdade universal, isto é, válida para todos, tanto para a maioria
quanto para as minorias. Portanto, o que os filósofos investigam são as condições universais de validade,
aquelas condições que independem das opiniões particulares que eu ou você possamos ter.
Ceticismo
Na investigação sobre as condições de validade do nosso conhecimento um grupo de filósofos merece
destaque: os céticos. O termo cético vem da palavra grega skepsis, que significa "exame". Atualmente,
dizemos que uma pessoa cética é alguém que não acredita em nada, mas não é bem assim. Um filósofo cético
é aquele que coloca suas crenças e as dos outros sob exame, a fim de verificar se elas são realmente dignas de
crédito ou não.
Pirro de Elis (360-275 a.C.) é considerado o fundador do ceticismo. Segundo ele, não podemos ter posições
definitivas sobre determinado assunto, pois mesmo pessoas muito sábias podem ter posições absolutamente
opostas sobre um mesmo tema e ótimos argumentos para fundamentar suas posições. Nesse caso, Pirro nos
aconselha a suspensão do juízo e a mantermos nossa mente tranqüila (ataraxia). Ao invés de enfrentarmos o
desgaste de acalorados debates que não produzirão certeza alguma, devemos manter silêncio (apraxia) e
preservar uma atitude de suspeita diante de qualquer tipo de dogmatismo.
Depois de Pirro, muitos outros filósofos tornaram o ceticismo uma das mais importantes correntes filosóficas
até os dias de hoje. Atualmente, alguns céticos defendem o probabilismo ou falibilismo, ou seja, na
impossibilidade de encontrarmos verdades absolutas, seja pelas limitações de nossos sentidos e intelecto, seja
pela complexidade da realidade, devemos tratar nossas crenças sempre como provisórias, como quem anda em
gelo fino.
Desse modo, um cético nunca seria pego de surpresa se algo que todos acreditavam ser verdade se revelasse
falso no futuro. Por outro lado, reconhecer que as verdades são provisórias não significa uma completa inação.
Sabemos que os remédios são falhos, mas são a única coisa que temos para combater as doenças.
Isso também vale para o campo da ética. O filósofo Montaigne propunha que vivêssemos em harmonia com os
costumes de nosso povo ou cultura, pois embora eles sejam falhos, são tão falhos quanto os de qualquer outro
povo, não havendo razão para preferir este a aquele.
Despertar do sono dogmático
Conta a lenda que Pirro morreu enquanto dava aula de olhos vendados. Um aluno o teria alertado quanto ao precipício
à sua frente. Cético, Pirro desconfiou do aluno e caiu. Essa lenda, obviamente, pretende mostrar os perigos de se
duvidar de tudo. Mas será que um cético autêntico não duvidaria também de suas próprias dúvidas?
Odiado por alguns, o cético é como a abelha que aferroa o boi do conhecimento, retirando-o da mesmice das idéias
prontas e acabadas, nos provocando, por meio da dúvida, a investigar a fundo os pressupostos de nossas crenças; ou,
como diria Kant, o cético é aquele que nos desperta do nosso sono dogmático para lembrar-nos que pensar não é um
fim, mas uma atividade.
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