O exemplo de Gerson Osiris Lopes Filho O Dr. Palocci tem dois modelos de atuação de gente de área médica e de saúde na gestão econômica. E está numa encruzilhada. É melhor, para sua biografia e para a saúde e soberania do país, que siga o modelo do Gerson. Não o do futebol, que tentava levar vantagem em tudo, mas o do que pensava no bem do nosso país e do seu povo. As ciências médicas têm fornecido alguns profissionais a quem os encontros e desencontros da vida, traçados pelo destino, proporcionaram posição de relevo na área econômica do governo, ou como executivo titular do poder, caso do Dr. Palocci, ou dos personagens que desejo mencionar. Um deles foi ex-funcionário do ministério da Fazenda, punido por Ato Institucional. Era o médico Gerson Augusto da Silva, técnico de Economia e Finanças, que, graças às suas elaborações, pesquisas e criatividade, modernizou efetivamente o sistema tributário brasileiro, tornando-o um instrumento do desenvolvimento econômico. A ação renovadora do Dr. Gerson contrariou interesses dominantes incrustados na ditadura militar, tornando inóspita a sua permanência no Brasil. Foi então servir no quadro técnico da 1 Organização dos Estados Americanos – OEA. E lá chefiou a chamada Oficina de Finanças Públicas. E realizou, nas Américas, uma completa reformulação dos sistemas tributários dos países latinos de fala espanhola. Alguns países saíram de uma tributação típica do atraso da fase colonial, para adotar, nas suas leis disciplinatórias de tributos, uma atualização que os colocou em compasso com as técnicas impositivas consagradas como as mais modernas do século XX. Patrocinou uma tributação não-cumulativa, como o Brasil já havia iniciado com a adoção parcial, em 1958, no então imposto de consumo, antecessor do IPI. Propôs e foi aceita a disseminação do imposto sobre o valor agregado. Modernização introduzida pela França, em 1953, acolhida no Tratado de Roma, de 1957, e implantada pelos seis países membros do então Mercado Comum Europeu, em 1960. Os organismos internacionais, diga-se a bem da verdade – Fundo Monetário Internacional-FMI e Banco Mundial -, à época, não se entusiasmaram com essa nova técnica. Ficaram alheios à inovação. Vida que segue. Espraiam-se os campos de tutela internacional, principalmente o do FMI. Chegou-se às finanças públicas: receita, gestão, orçamento e gasto público. E criou-se o conceito artificial de “superávit primário”. Em verdade, um conjunto de recursos para se garantir o pagamento da dívida mobiliária do setor público. O IVA, que se pretende criar, centraliza a competência para discipliná-lo na União. Facilita ao FMI impor suas condicionalidades, eis que apenas a União participará da 2 negociação. Hoje, com o ICMS dos Estados e do Distrito Federal, a rendição ao FMI é mais complexa, pois envolve muitas partes, e interesses diversificados dos Estados. Lá no começo mencionei a contribuição das ciências médicas às finanças do país. Houve um boticário, Joaquim Murtinho, ministro da Fazenda no início do século XX, que renegociou a nossa dívida externa no exterior, aceitando humilhantemente as imposições dos banqueiros europeus. O Dr. Palocci tem esses dois modelos de atuação de gente de área médica e de saúde na gestão econômica. E está numa encruzilhada. É melhor, para sua biografia e para a saúde e soberania do país, que siga o modelo do Gerson. Não o do futebol, que tentava levar vantagem em tudo, mas o do que pensava no bem do nosso país e do seu povo. Osiris de Azevedo Lopes Filho, advogado, professor de Direito na Universidade de Brasília – UnB e Fundação Getúlio Vargas – FGV e exsecretário da Receita Federal. 3