A Lógica da Especulação Financeira Internacional Prof. José Luis Oreiro Departamento de Economia – UnB Pesquisador Nível I do CNPq. Referência da Aula Davidson, P. (1999). “Global Employment and Open Economy Macroeconomics”. Idéias Fundamentais Para que um país quebrar o quadro de uma economia mundial em semi-estagnação é necessário que se adote uma política monetária autônoma – livre de preocupações internacionais – e um programa de investimento direcionado para a obtenção de um nível ótimo de emprego. O crescimento da economia mundial pressupõe uma coordenação entre as políticas fiscal e monetária de todos os países no sentido de uma expansão fiscal e monetária feitas de forma simultânea. Apenas dessa forma, o crescimento pode ser acelerado sem desequilíbrios na conta de transações correntes. O livre-comércio por si só não irá criar empregos a nível global, sem um sistema monetário internacional que incentive os países a adotar políticas domésticas expansionistas; o livre-comércio torna-se um jogo de soma zero, onde cada país usa o comércio internacional como um expediente desesperado para manter o emprego doméstico. Movimentos de Capitais e Especulação Cambial Keynes: os grandes fluxos de capitais entre países podem criar sérios problemas de balanços de pagamentos a nações cujas contas de transações correntes estão em razoável estado de equilíbrio. No modelo clássico, no qual todos os agentes conhecem o futuro com certeza ou ao menos não cometem erros sistemáticos de previsão, a especulação pode ser justificada com base no argumento de que a mesma é estabilizadora. A especulação cambial é desestabilizadora. Friedman: os especuladores compram barato para vender caro; ao fazê-lo diminuem a diferença entre o preço corrente e o preço futuro, estabilizando o sistema. No mundo real, contudo, o futuro é incerto. Isso significa que os indivíduos não podem usar os dados históricos sobre os preços de mercado para estimar os preços futuros. Não existem âncoras confiáveis para o preço futuro dos ativos. As atividades especulativas podem não só aumentar a volatilidade dos preços futuros como também tem grandes custos em termos reais para a renda da comunidade. Movimentos ... Se os custos sociais dos mercados de câmbio não regulados excedem os benefícios sociais então torna-se necessário desenhar uma arquitetura financeira internacional que impeça as crises cambiais. Duas alternativas possíveis: Taxa Tobin: taxar os fluxos de capitais especulativos entre países de forma a desestimular a especulação com o câmbio. Proibição dos fluxos de capitais especulativos entre os países. Incerteza de Capital e Fluxos Especulativos Para que um ativo qualquer seja considerado como reserva de valor é necessário que o mesmo seja transacionado em mercados a vista ordenados e bem organizados. Como o preço a vista desses ativos pode mudar ao longo do tempo, então os “poupadores” devem contemplar a possibilidade de apreciação/depreciação do preço de mercado do ativo quando desejarem liquidar as suas posições. Seja Ps,to o preço a vista do ativo em to e Ps, t1 o preço a vista (esperado) em t1. Se (Ps,t1 – Ps,t0)>0 então espera-se um ganho de capital no futuro. Se (Ps,t1 – Ps,t0)<0 então espera-se uma perda de capital no futuro. Alem do ganho ou perda de capital esperado, um ativo proporciona um fluxo futuro de rendimentos advindos de sua posse ou uso (q) do qual se deduz o custo de carregamento (c). Por fim, existe o custo envolvido na compra e posterior revenda do ativo, ou seja, o custo de transação (Ts). Incerteza ... Se um compromisso não esperado “vencer” no futuro imediato, então o custo de transação relacionado a compra e revenda do ativo pode exceder largamente o rendimento líquido do mesmo (q-c) obtido pela retenção do ativo por um período curto e o ganho (ou perda) de capital será negligenciável. Nesse caso, uma atitude racional é manter uma parte da riqueza na forma de moeda para fazer frente a pagamentos inesperados no futuro. Fundamento da preferência pela liquidez. Iremos incluir a moeda estrangeira bem como ações e títulos denominados em moeda estrangeira na escolha de portfólio. Incerteza ... Se, para um ativo específico, o administrador do portfólio esperar (q-c) + (Ps, t1 – Ps, t0) – Ts > 0, então ele é um “touro”; ou seja, espera obter um ganho com a compra desse ativo. Se ele esperar (q-c) + (Ps, t1 – Ps, t0) – Ts < 0 para um ativo específico, então ele é um “urso”; ou seja, espera obter um ganho com a venda desse ativo. Para o administrador que carrega moeda doméstica temos que (q-c)=0, Ts=0, (Ps, t1 – Ps, t0) = 0. O Administrador de portfólio irá comprar todos os ativos para os quais a “taxa própria de juros” seja positiva e vender todos os ativos para os quais a mesma seja negativa. Para facilitar a exposição iremos considerar que os ganhos ou perdas esperados de capital de cada ativo em termos da moeda no qual o mesmo é denominado está incluído no termo (q-c). Sendo assim, o termo (Ps, t1 – Ps, t0) pode ser reservado para os efeitos das mudanças esperadas na taxa de câmbio à vista. Se ativos financeiros similares denominados em diferentes moedas forem substitutos perfeitos entre si então os termos (q-c) para todos esses ativos serão iguais e os fluxos especulativos de capitais entre países só poderão ocorrer como resultado de mudanças nas expectativas sobre o valor futuro da taxa de câmbio. Incerteza ... Uma vez que um fluxo significativo de capitais tenha ocorrido isso pode encorajar outros administradores de fundos a mudar as suas expectativas (dando origem ao assim chamado efeito manada) até que: As reservas estrangeiras do país que está sofrendo a saída de capitais acabem, O país que está sofrendo a perda de reservas internacionais aumente a sua taxa de juros (ou seja, o termo q-c) numa magnitude suficiente para compensar o ganho potencial de capital (Ps, t1 – Ps, t0) com a saída de capitais do mesmo. O Banco Central intervenha no mercado de câmbio para mudar as expectativas a respeito de (Ps, t1 – Ps, t0) . Alguma forma de taxação seja adicionada para aumentar o valor de Ts e compensar os ganhos esperados com o câmbio. Alguma forma de proibição dos fluxos internacionais de capital é introduzida. A Taxa Tobin A taxa Tobin é uma forma de introduzir uma taxação com o objetivo de desestimular os fluxos de capitais entre países. A taxa Tobin pode desestimular apenas pequenos movimentos especulativos, mas tem impacto significativo sobre o comércio internacional. Seja x a alíquota da Taxa Tobin. Para que um especulador fique indiferente entre tirar ou não dinheiro do país é necessário que: (q-c) + (Ps,t1 – Ps,to) – x (Ps,t1 – Ps,to) – Ts = 0 Por simplicidade: (q-c) = Ts (Ps,t1 – Ps,to) – x (Ps,t1 – Ps,to) = 0 Divindindo-se tudo por Ps,t0, temos: (Ps,t1)/(Ps,t0) = (1+x)/(1-x) Se x = 0.005 (0.5%) temos que: (Ps,t1)/(Ps,t0) = 1.10 Ou seja, uma taxa de 0.5% cobrada sobre cada transação cambial pode desestimular a especulação se o preço futuro esperado exceder o preço corrente em 1,1%. Muito pouco para deter qualquer movimento especulativo. Por exemplo, o peso mexicano se desvalorizou em quase 60% no inverno de 1994-1995. Nesse caso seria necessária uma taxa Tobin de 23% para interromper o ataque especulativo. A Taxa Tobin Por fim, existe uma regra de bolso segundo a qual existem cinco operações de hedge cambial para cada transação comercial. Isso significa que uma taxa de 0.5% sobre as transações com o câmbio aumentam os preços internacionais de bens e serviços em 2.5%. Forte desestímulo ao comércio internacional. A taxa Tobin, portanto, não só não impede os grandes movimentos especulativos nos mercados de câmbio como ainda aumenta os custos do comércio internacional. A Idade de Ouro do Desenvolvimento Econômico O período de 1950-1973, que compreende os anos de vigência do acordo de Bretton Woods, foi o período de maior crescimento econômico na história do capitalismo. A taxa anual de crescimento da renda per-capita dos países em desenvolvimento foi de 3,3%, quase o triplo do obtido pelos países industrializados durante a Revolução Industrial. Os países da OCDE tiveram um crescimento ainda maior de 4,9% da renda per-capita. A performance macroeconômica no período 1973-1990 foi desapontadora. O crescimento econômico dos países desenvolvidos caiu 50% (para 2,5% a.a em média) e esses países passaram a conviver com desemprego elevado e episódios recorrentes de inflação. A performance dos países menos desenvolvidos foi ainda pior pois eles experimentaram uma retração do PIB de 0,1% a.a. em média nesse período. As lições que deveríamos ter aprendido O sistema de taxas fixas de câmbio está associado a um performance global melhor do que o sistema de taxas flutuantes. A performance macroeconômica do pós-segunda guerra mundial até 1973 foi espetacular. A era de Bretton Woods chegou ao fim após vários anos nos quais os Estados Unidos passaram a ter déficit comercial e os países superavitários usando seus créditos para aumentar as suas reservas em ouro. As lições ... “Unfortunatelly, the Bretton Woods system had no mechanism for automatically encouraging emerging trade surplus (creditors) nations to step into the civilizing adjusting role the U.S had been playing since 1947” (Davidson, 1999, p. 25)