DIREITO ECONÔMICO Alessandra de Azevedo Domingues EVOLUÇÃO HISTÓRICA • Entre os séculos XVI e XVIII deu-se a transição do sistema feudal para a economia orientada para o mercado (mercantilismo), deixando terreno propício ao desenvolvimento do capitalismo, à concentração de riquezas e à generalização do trabalho assalariado. Neste estágio, propugnava-se pela não interferência do Estado, priorizando a maior liberdade possível ao indivíduo, seja no exercício pleno do direito de propriedade, seja no tocante à livre iniciativa e à autoregulamentação de seus interesses, direito e deveres por intermédio do instrumento contratual, rejeitandose, assim, qualquer interferência estatal no âmbito da vida privada. Cabia ao Estado apenas manter a ordem e garantir a justiça na sociedade. EVOLUÇÃO HISTÓRICA • Nesse período surgiram duas escolas econômicas, uma refutando a outra, como nos ensina Jeanne D´arc Anne Marie Lucie Blanchet. A primeira delas era a Fisiocracia, fundada por François Quesnay, a qual defendia a existência de uma ordem natural que regulamentava os fenômenos econômicos e que, portanto, negava o mercantilismo intervencionista. A segunda escola surgira na segunda metade do século XVIII e era representada por Adam Smith e David Ricardo e, apesar de refutar a escola Fisiocrata, por não reconhecer a ordem natural, compartilhava da idéia de negativa do intervencionismo estatal. Essa escola, denominada Liberal Clássica, fundava-se em 4 (quatro) grandes princípios: liberdade de empresa, propriedade privada, liberdade de contrato, liberdade de indústria e de comércio, e liberdade de câmbio. Exaltava-se a liberdade de agir dos indivíduos e a livre concorrência, deixando ao próprio mercado a busca pelo equilíbrio. EVOLUÇÃO HISTÓRICA • Ocorre que esse sistema liberal levou à concentração do poder e do capital, e à luta de classes, ocasionando problemas sociais que foram agravados pela Primeira Guerra Mundial. Os impactos dessa guerra na economia impulsionaram a criação de leis que garantissem e preservassem a dignidade da pessoa humana, além de corrigir o regime antes que o sistema de produção capitalista entrasse em colapso. • As conjunturas sócio-econômicas proporcionaram a justificativa para o intervencionismo. O ideal social do desenvolvimento impôs ao Estado a tarefa de proporcionar o Bem-Estar Social e o desenvolvimento social e econômico, autorizando-o, por conseqüência, a intervir na economia, com o intuito de corrigir os desequilíbrios gerados pelo liberalismo. EVOLUÇÃO HISTÓRICA • O Estado abandona a passividade e passa a interferir no processo econômico, com o objetivo de organizar e de dirigir o mercado, preservando o ideal de livre concorrência, exercendo o controle sobre o exercício do poder decorrente da propriedade e definindo políticas econômicas. O Estado capitalista lança mão de seus instrumentos para ordenar a economia e o intervencionismo se transforma em um novo atributo do capitalismo. • A mão invisível do Estado, referida por Adam Smith, é substituída pela mão visível e a sociedade eleva à categoria de ideais sociais, ao lado da ordem, da segurança e da paz, da justiça social e do desenvolvimento, todos ideais que o Estado deve perseguir e proteger. • Ele passa a ser responsável por criar programas e investir em áreas como saneamento, energia elétrica e desenvolvimento de setores e de regiões que se encontrem ao desalento, seja por meio da utilização dos fundos públicos, seja se associando a capital privado, nacional ou estrangeiro. • O Estado, então, além de dirigir a economia, passa a exercer, também, o papel de ente econômico, mas sempre traduzindo os interesses sociais e buscando realizá-los. DISCIPLINA JURÍDICA DA ATIVIDADE ECONÔMICA • O Direito é, por excelência, o instrumento de organização social, um sistema de normas destinadas a regular os diversos interesses presentes na sociedade, harmonizando interesses individuais e sociais ou coletivos, com o fim de preservar as condições necessárias para a existência do homem em sociedade. • A economia, por seu turno, nada mais é que uma parcela do fenômeno social, um aspecto da sociedade, sobre o qual o Direito também de debruça. Só que em relação à ordem econômica, o Direito passa a exercer a tarefa de integração social em todos os setores econômicos, na busca da realização não apenas dos ideais de ordem, segurança e paz, mas de justiça social e desenvolvimento, interagindo, dialeticamente, com a realidade econômica. DISCIPLINA JURÍDICA DA ATIVIDADE ECONÔMICA • Antigamente, em especial nos séculos XVIII e XIX, o Direito era considerado e criado a partir de situações consolidadas e estáticas. Não se concebia, pelo Direito, a adoção de uma visão dinâmica da realidade. Subsistia o ideal de que as normas codificadas deveriam se sujeitar a mínimas modificações, muitas introduzidas pelo trabalho de interpretação. • Porém, a evolução dos tempos passou a impor uma necessária correção, induzindo à compreensão de que o Direito, tal qual a realidade social, está em contínua evolução, devendo, por conseqüência ser dinamizado o Direito como instrumento de edificação da vida social. • Da intervenção do Estado originou-se a disciplina jurídica da economia, posto que o Estado passou a dirigir, administrar, organizar o mercado, impondo técnicas de direção que interferem nos valores fundamentais do capitalismo, quais sejam: direito de propriedade dos bens de produção e liberdade econômica. Dessa forma, tanto a liberdade econômica quanto a propriedade privada passam a sofrer controles estatais. DISCIPLINA JURÍDICA DA ATIVIDADE ECONÔMICA • O Direito passa de estrutura (para a harmonização de interesses individuais e sociais) à função (ferramenta para a realização de determinados fins). • O sistema capitalista tem seus alicerces nas relações entre o homem e os meios de produção, razão pela qual consagra como valores a propriedade privada dos bens de produção e a liberdade econômica, reconhecendo, ainda, o lucro como motor da atividade econômica. Também pressupõe a preservação do mercado, porque é nele que ocorre e que se dá a coordenação de todo o processo econômico. • O Estado, então, passa a desempenhar a função de corrigir as distorções trazidas pelo liberalismo econômico, visando a preservação do mercado e dos valores da propriedade privada dos bens de produção, da liberdade contratual e da iniciativa econômica que no mercado se operam. Modesto Carvalhosa entende que o intervencionismo do Estado é fruto do neoliberalismo, no momento em que se impõe ao Estado a obrigação de impedir os abusos do poder econômico, restabelecendo a liberdade contratual e a iniciativa econômica aos padrões propostos pelo liberalismo. Apud in GRAU, Eros Roberto. Elementos do Direito Econômico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981. p. 61 INTERVENCIONISMO • Os juristas não são unânimes quanto aos meios pelos quais o intervencionismo se processa. Citamos cinco meios elencados pela doutrina: legislação, administração direta ou indireta, coordenação, poder de polícia e planejamento. • Eros Grau não aceita a inclusão do planejamento entre as modalidades de intervenção, pois para ele o planejamento apenas qualifica a ação intervencionista do setor público em relação aos processos econômicos e sociais futuros. O poder de polícia, a seu turno, seria a imposição pela Administração de uma obrigação de não fazer ao particular. Para o E. Min. as modalidades de intervencionismo deveriam ser qualificadas da seguinte forma: “a) intervenção (ou ação) por absorção ou participação: que ocorre quando a organização estatal assume – parcialmente ou não – ou participa do capital de unidade econômica que detém o controle patrimonial dos meios de produção e troca; b) intervenção (ou ação) por direção: que ocorre quando a organização estatal passa a exercer pressão sobre a economia, estabelecendo mecanismos e normas de comportamento compulsório para os sujeitos da atividade econômica; c) intervenção (ou ação) por indução: que ocorre quando a organização estatal passa a manipular o instrumental de intervenção em consonância e na conformidade das leis que regem o funcionamento do mercado.” GRAU, Eros Roberto. Elementos do Direito Econômico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981. p. 65 DIREITO ECONÔMICO • Por meio do Direito Econômicoa política econômica (que traduz uma ciência aplicada), inspirada em uma ideologia reconhecida constitucionalmente, se realiza através de institutos jurídicos. Importa ao Direito Econômico o regramento do exercício de determinadas atividades, do comportamento dos agentes econômicos no mercado, comportamento esse que deve atender aos interesses sociais. De certo que ele concilia interesses, dirige e condiciona comportamentos, mas não só. Muitas vezes condiciona e determina, também, fatos econômicos, não obstante a norma jurídica surgir de fatos, inclusive de fatos econômicos. DIREITO ECONÔMICO • Eros Grau, então, conceitua o Direito Econômico como: “(...) sistema normativo voltado à ordenação do processo econômico, mediante a regulação, sob o ponto de vista macrojurídico, da atividade econômica, de sorte a definir uma disciplina destina à efetivação da política econômica estatal. O seu objeto, face o Direito Positivo nacional, é a regulação do processo econômico, através da atuação do Estado nele e sobre ele, desde uma visão macroeconômica, tendo em vista a realização dos objetivos de sua política, sob a inspiração dos ideais de justiça social e desenvolvimento, em condições de mercado administrado.” GRAU, Eros Roberto. Elementos do Direito Econômico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981. p. 31 • Geraldo de Camargo Vidigal, por sua vez, entende o Direito Econômico a partir de seus objetos e explica: “Substancialmente, distribuem-se as preocupações do Direito Econômico por três áreas: a. ordenamento jurídico das situações de mercado que tendem a relações de dominação; b. tutela jurídica dos sujeitos passivos das relações de dominação; c. disciplina jurídica orientadora das atitudes, propensões e expectativas que comandam, nos mercados, o comportamento das macro-variáveis econômicas. VIDIGAL, Geraldo de Camargo. Objeto do Direito Econômico. _______: São Paulo, 1976. p. 52 e 53 Eros Grau critica a divisão estabelecida por Vidigal na conceituação do Direito Econômico em direito de planejamento, direito à organização de mercados e direito administrativo econômico. DIREITO E ECONOMIA • Os principais institutos de contato entre Direito e Economia são: propriedade privada dos bens de produção, especialmente porque ela é entendida como a propriedade em regime de empresa, e o contrato, instituto no qual repousam a liberdade econômica e a livre iniciativa, e que as expressões normativas do Direito Econômico representam instrumentação de uma política econômica (ciência aplicada) que, via de regra, gravitam em torno desses institutos; ademais, o Estado também faz uso desses institutos para intervir na economia. • A melhor forma de definir a relação entre Direito e Economia não é simplesmente por causa e efeito, ou por forma e conteúdo, mas por interação e por integração DIREITO E ECONOMIA • O Direito, segundo essa moderna concepção, seja atuando sob o enfoque macrojurídico – como se dá no Direito Econômico -, seja exercendo-se sob uma perspectiva microjurídica, passa a ser encarado como um instrumento a auxiliar a Economia na realização do valor econômico da eficiência, sem, no entanto, se esquecer dos ideais sóciojurídicos de ordem, de certeza, de segurança, de justiça social, de paz e de desenvolvimento. Vidigal alerta que desenvolvimento e bem-estar social são objetivos finais do Direito Econômico e que para o alcance desses fins últimos, o Direito Econômico vale-se de normas que disciplinam diferentes objetos-meio, como objetos comportamentais, como decisões de consumir, de poupar, de investir, e de objetos instrumentais, como a moeda e o crédito.