ANTICONVULSIVANTES Ambulatório de Neurologia Mariana Molina Junqueira – 4 ANO ANTES DE INICIAR O TRATAMENTO MEDICAMENTOSO DAS EPILEPSIAS É IMPORTANTE: 1. Diagnóstico. Uma razoável segurança diagnóstica, na maioria das vezes clinicamente definido. Ao redor de 20% de pacientes atendidos em clínicas especializadas em epilepsias têm um diagnóstico equivocado de epilepsia. 2. Investigação mínima etiológica através de detalhada anamnese, exame físico e neurológico além de exames de imagem (tomografia computadorizada ou ressonância magnética encefálica). · O objetivo da neuroimagem é identificar a doença de base, como tumor malformação do desenvolvimento cortical, doenças inflamatórias ou infecciosas, malformação vascular, lesão pós-traumática, doença cerebro-vascular e outras, além de fornecer informações prognósticas. O EEG pode confirmar o diagnóstico clínico (se anormal), ajudar na classificação das crises e das síndromes epilépticas e pode dar informações prognósticas. A especificidade do EEG é estimada em 96% e a sensibilitade ao redor de 40%, aumentando até 70% com a repetição e o sono. Quando se suspeita de doença sistêmica a investigação laboratorial se impõe. O TRATAMENTO MEDICAMENTOSO DAS EPILEPSIAS TEM COMO PRINCÍPIOS GERAIS: 1. De modo geral o tratamento é prolongado (meses a anos). 2. É recomendado o uso inicial de uma única droga antiepiléptica: monoterapia. 3. A medicação, de modo geral, deve ser titulada (aumentada) lentamente até atingir a dose eficaz ou surgirem efeitos adversos. Não está claramente definida a dose mínima (só há parâmetros aproximados). A dose máxima é aquela que o paciente toma sem apresentar efeitos colaterais "inaceitáveis". 4. Nunca deve ser retirada abruptamente a droga antiepiléptica (DAE), com raras exceções tais como reações idiossincráticas (alérgicas). 5. Todos os fármacos antiepilépticos podem causar efeitos adversos sistêmicos ou neurotóxicos. Este fato justifica a monitorização clínica e laboratorial do paciente pelo médico prescritor da medicação a intervalos variáveis. Considerar a possibilidade de efeitos teratogênicos. 6. Nos pacientes que não obtêm o controle satisfatório das crises rever o diagnóstico e a aderência ao tratamento. Observar que a dose máxima tolerada foi utilizada em monoterapia. 7. Esgotadas as monoterapias considerar a utilização de duas drogas (politerapia). 8. Eventualmente em determinadas condições (prevenção de crises agrupadas ou em períodos de maior susceptibilidade como o período perimenstrual) pode-se usar tratamento intermitente com benzodiazepínico ou acetazolamida (diurético que atua inibindo a enzima anidrase carbônica presente no túbulo proximal do nefro) Diminui a produção de líquor MECANISMO DE AÇÃO DAS DROGAS ANTIEPILÉPTICAS Potencialização da ação do GABA Inibição da função dos canais de sódio Inibição da função dos canais de cálcio Outros mecanismos: inibição da liberação de glutamato e bloqueio dos receptores de glutamato GABA (ÁC. GAMA-AMINOBUTÍRICO) • Mais importante neurotransmissor inibitório • Originado da descarboxilação do GLUTAMATO pela enzima Glutamatodescarboxilase RECEPTORES GABA Os receptores GABA são proteínas de membrana que possuem várias cadeias polipeptídicas. Ele é composto por 5 unidades. Para cada subunidade foram identificados uma grande variedade de variantes moleculares (vários subtipos de GABA). Sítios específicos de ligação. MECANISMOS DE AÇÃO DOS FÁRMACOS NO GABA 1. Potencialização da ativação do GABA-a: benzodiazepínicos (clonazepam) e barbitúricos (fenobarbital). Facilitam a abertura dos canais de cloreto mediados pelo GABA. 2. Aumento da liberação de GABA: gabapentina. Agonista dos receptores GABA, porém tem pouco efeito sobre os receptores ou transportadores, atuando numa unidade particular dos canais de cálcio controlados por voltagem. 3. Diminuição do metabolismo de GABA: valproato e vigabatrina. Atuam inibindo a enzima GABA transaminase, que é responsável pela inativação do GABA, potencializando sua ação. 4. Inibição do transportador de GABA (GAT – 1) e diminuição da captação neuronal de GABA: a tiagabina, inibe a captação do GABA, potencializando sua ação inibitória. INIBIÇÃO DA FUNÇÃO DOS CANAIS DE SÓDIO Antiepilépticos afetam a excitabilidade da membrana por ação sobre os canais de sódio dependentes de voltagem; Bloqueiam preferencialmente a excitação das células que estão disparando repetidamente e, quanto mais alta a frequência dos disparos, maior o bloqueio produzido, sem interferir nos disparos de baixa frequência do neurônios de estado normal; Os fármacos bloqueadores discriminam canais de sódio em seus estados de repouso, aberto e inativado (após despolarização de um neurônio); Os antiepilépticos ligam-se preferencialmente aos inativados, impedindo-os de retornar ao estado de repouso, reduzindo o número de canais funcionantes; Fenitoína, carbamazepina, valproato, Iamotriagina INIBIÇÃO DOS CANAIS DE CÁLCIO O aumento agudo do influxo de Ca+2 é importante para manutenção da hiperexcitabilidade reflexa que ocorre em processos convulsivos. Além disso, a observação que a ativação de canais de Ca+2 pode induzir alterações na expressão gênica sugere uma participação de maneira crônica na epilepsia. Na verdade, essas mudanças crônicas podem ser estruturais e/ou induzindo morte celular. São descritos seis subtipos de canais de Ca+2 dependentes de voltagem L, N, P, Q, R e T,19 onde pelo menos três desses subtipos (N-, P- e Q-) tem sido implicados no controle da liberação de neurotransmissores nas sinapses, como acetilcolina e serotonina, e ainda, o do tipo T tem papel importante nas descargas rítmicas das crises epilépticas generalizadas de ausência. bloqueio dos canais de Ca+2 pode produzir vários efeitos no funcionamento neuronal: (a) bloqueio dos canais tipo T (está associado ao tratamento das crises de ausência); (b) bloqueio dos canais tipo L (está associado ao controle de crises parciais); (c) o bloqueio de canais de Ca+2 pode prevenir a liberação de neurotransmissores excitatórios como o glutamato; (d) o bloqueio desses canais diminui a concentração dos íons Ca+2 no citoplasma neuronal, reduzindo a possibilidade de dano celular excitotóxico. A etossuximida bloqueia especificamente os canal do tipo T; A gabapentina atua sobre os canais de cálcio do tipo L; AS DAE DE PRIMEIRA LINHA, ISTO É, CONSIDERADAS NO INÍCIO DO TRATAMENTO, SÃO AS CONVENCIONAIS: Epilepsias de início parcial ou focal, com ou sem generalização secundária: carbamazepina, fenitoína, valproato de sódio e fenobarbital. Epilepsias de início generalizado: valproato de sódio, etossuximida (apenas eficaz em crises de ausências), carbamazepina, fenitoína e fenobarbital. Quando não se consegue o controle satisfatório das crises epilépticas com as DAE acima apontadas, em monoterapia, utiliza-se associação de duas DAE: politerapia. Por outro lado, aumenta-se o risco de efeitos adversos significativamente. BENZODIAZEPÍNICOS: a. Ligam-se à subunidade alfa do receptor de GABA, aumentando a atividade endógena deste neurotransmissor; b. É muito útil em crises epilépticas relacionadas ao álcool ou à crise de abstinência alcoólica; c. Diazepam: muito usado em "grande mal" (crise tônicoclônica), crises relacionadas ao etilismo; 5 mg EV/IM. Pode ser um pouco menos efetivo que o lorazepam na crises epilépticas fora do ambiente hospitalar; d. Lorazepam : menor meia vida que o diazepam: uso mais recomendado na abstinência alcoólica; 2 mg EV após crise epiléptica na abstinência etílica previne nova convulsão em 90% dos casos; e. Clonazepam: útil em crises mioclônicas e em ansiedade; f. Midazolam: efetivo em interromper crises epilépticas pode ser dado na cavidade oral como suspensão; g. Midazolam líquido oral pode ser tão efetivo em interromper convulsões quanto diazepam retal; FENITOÍNA: a. Uso: epilepsia parcial e crises tônico-clônicas generalizada; b. Efeitos colaterais: alterações cognitivas, hiperplasia gengival, hirsutismo, nistagmo, ataxia; c. Hipotensão é frequente após injeção intravenosa d. Overdose: ataxia, nistagmo vertical, indução de crises epilépticas, letargia - pode ocorrer se o paciente, já usuário crônico, recebe dose endovenosa; e. Para o melhor ajuste de dose, é recomendável a determinação dos níveis séricos; FOSFENITOÍNA: a. Metabólito da fenitoína que permite administração endovenosa ou intramuscular; b. Não causa hipotensão na infusão EV rápida; c. Para o melhor ajuste de dose, é recomendável a determinação dos níveis séricos; CARBAMAZEPINA: a. Uso: epilepsia parcial complexa, crises convulsivas generalizadas, segunda escolha na epilepsia mioclônica; b. Mecanismo: bloqueio dos canais de sódio voltagem-dependentes; c. Atualmente considerado de segunda linha na epilepsia parcial do adulto (após a lamotrigina) d. Efeitos colaterais: diplopia, alterações gastrointestinais, diminuição da contagem de leucócitos (em 5-10%), rash, alergia e. Efeitos colaterais graves: agranulocitose, plaquetopenia, anemia aplástica (1:20.000). f. Monitorização do hemograma semanalmente no início do tratamento e mensalmente a partir no 2o. mês, g. Metabolizado pelas enzimas hepáticas do grupo CYP3A4, pode reduzir a eficácia dos anticoncepcionais orais; h. Interações com: warfarina, estrogênios, teofilina, álcool, naproxeno; i. Monitorização do nível sérico também é recomendada; j. Risco de síndrome de Stevens-Johnson: maior que 3 a cada 10.000 pessoas da população caucasiana; maior que 30 a cada 10.000 de populações asiáticas, especialmente chineses, onde tem relação com o HLA-B*1502. OXCARBAZEPINA: a. Análogo da carbamazepina, pró-droga que requer metabolismo hepático; b. Aprovado pela FDA para uso oral na epilepsia parcial; c. Pode ser usado como monoterapia ou adjuvante em adultos; em crianças só se usa como terapia adjuvante; d. Mecanismo: bloqueio de canais de sódio voltagemdependentes; e. Monoterapia: tão eficaz quanto carbamazepina, valproato ou fenitoína em adultos; f. Efeitos colaterais: sonolência, tontura, náuseas e vômitos, rash - menos efeitos que a carbamazepina g. Nunca foi relatada toxicidade hepática ou hematológica. h. Reatividade cruzada nos alérgicos a carbamazepina: entre 20-30%; i. Dose inicial: 300 mg duas vezes ao dia; até o máximo de 1200-2400 mg por dia; VALPROATO: a. Ácido valpróico/valproato b. Divalproex é o agente preferido; c. Uso: todas os tipos de epilepsia; primeira linha na epilepsia generalizada não classificada do adulto; d. Efeitos colaterais: intolerância gastrointestinal, aumento do apetite e ganho de peso, fadiga, tremores, perda de cabelo (5-10%, reversível); e. Efeitos graves: hepatotoxicidade (interação com outras drogas) - é necessário monitorar função e enzimas hepáticas; f. Também causa hiperandrogenismo, síndrome dos ovários policísticos e oligomenorréia; g. Também usado na fase maníaca do distúrbio bipolar; h. Útil para profilaxia de enxaqueca; i. Monitorar níveis séricos otimiza o tratamento; ETOSSUXIMIDA: a. Uso restrito à antiga epilepsia do tipo "pequeno mal", crise generalizada de ausência. b. Efeitos colaterais: discrasias sanguíneas, ataxia, tontura, hepatite medicamentosa (monitorar hemograma e enzimas hepáticas) c. Dose: 500 mg VO por dia inicialmente; aumentar em 250 mg a cada 4-7 dias até o máximo de 1,5 g por dia; d. Aumenta os níveis séricos de valproato, fenobarbital e fenitoína; e. Monitorar níveis séricos! GABAPENTINA: a. Eficaz em epilepsia parcial ou secundariamente generalizada, em monoterapia ou adjuvância; b. Reduz a incidência de crises secundariamente generalizadas; c. Bem tolerada em comparação aos outros agentes considerar como primeira linha em idosos; d. Mecanismo: Inibe canais de sódio e transporte de aminoácidos no sistema nervoso central; e. Interações: não altera concentração plasmática de outras drogas; f. Muito usado para dor crônica neuropática, como a neuralgia pós-herpética; g. Mais seguro que outros agentes: efeitos colaterais de longo prazo não são significativos; h. Efeitos colaterais: geralmente leves - sonolência, tontura, ataxia, fadiga, nistagmo e náuseas. PREGABALINA: a. Análogo estrutural do GABA e da gabapentina; altera a função do canal de cálcio; b. Aprovado para uso em epilepsia, neuralgia pós-herpética e dor neuropática periférica do diabetes mellitus; c. Dose inicial: 150 mg por dia, dividido em 2 ou 3 doses - aumentar até o máximo de 300 mg por dia na dor neuropática ou 600 mg por dia na epilepsia; d. Efeitos adversos dose-dependentes: tontura, sonolência, visão borrada, ganho de peso, edema periférico; e. Associada à euforia; LAMOTRIGINA: a. Uso: epilepsia parcial do adulto; b. Mecanismo de ação: Bloqueio de canais de sódio voltagem dependentes; c. Metabolismo por glucorunização: não induz enzimas do citocromo P450 e tem poucas interações medicamentosas; d. Valproato inibe o metabolismo da lamotrigina e lamotrigina diminui os níveis séricos de valproato; e. Muito bem tolerado quando usada em mono ou politerapia; f. Primeira escolha em epilepsia de início geriátrico; g. Clinicamente mais eficaz que carbamazepina, topiramato e gabapentina na epilepsia parcial; h. Não é tão eficaz como a carbamazepina em convulsões generalizadas e complexas; i. A maioria dos pacientes começa o tratameto com a dose de 50 mg VO por dia, mantida por duas semanas, e, então, aumentada para 300-500 mg por dia; j. Em idosos, iniciar com 25 mg por dia por 2 semanas, quando se passa a administrar duas vezes por dia, com lento incremento de dose; TOPIRAMATO: a. Mecanismo de ação: bloqueia canais de sódio, atenua resposta ao cainato e aumenta o efeito GABAérgico; b. Aprovado para terapia adjuvante em adultos com epilepsia parcial; c. Efeitos colaterais: alentecimento mental, fadiga, sonolência, mas geralmente é bem tolerado; d. Nefrolitíase foi documentada em 1,5% dos pacientes. e. Efeitos teratogênciso em animais (como quase todos os outros anticonvulsivantes); f. Pode aumentar os níveis séricos de fenitoína em até 25%; outros agentes podem diminuir sua concentração sérica; g. Dose: 200-400 mg VO por dia, como terapia adjuvante FENOBARBITAL: a. Barbitúrico clássico, com boa atividade anticonvulsivante em dose sub-hipnótica; b. Mecanismo de ação: liga-se à subunidade beta do receptor GABA, levando ao aumento da potência da atividade GABAérgica endógena. c. GABA é um neurotransmissor que induz à entrada de Cl- na célula, causando inibição da atividade neuronal; d. Eficaz em epilepsia tonico-clônica e parcial; e. Efeitos colaterais: e.1: Sonolência, sedação, depressão, mudança de personalidade, distúrbios de comportamento; e.2: o efeito sedativo tende a reduzir com o uso crônico; e.3: Rash escalatiniforme ou morbiliforme em 1-2% dos pacientes; e.4: Encefalopatia e hiperamonemia podem acontecer em adultos REFERÊNCIAS: Liga Brasileira de Epilepsia Rang Dale O papel dos canais iônicos nas epilepsias e considerações sobre as drogas antiepilépticas – uma breve revisão (http://www.scielo.br/pdf/jecn/v13n4/a05v13n4.pdf)