o educador filósofo: de como saviani e moran demonstram

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O EDUCADOR FILÓSOFO: DE COMO SAVIANI E MORAN
DEMONSTRAM QUE A FILOSOFIA É A LIGAÇÃO NECESSÁRIA
ENTRE AS DIVERSAS DISCIPLINAS, HUMANIZANDO E SENDO
PONTE ENTRE O DENTRO E O FORA, ENTRE O SINGULAR E O
COMPLEXO
GOULART*, Nelson – PUCPR
[email protected]
Resumo
O presente texto busca analisar as possíveis complementariedades entre o pensamento de
Dermeval Saviani e Edgar Morin que mostram a necessidade do educador também ser
filósofo e não meramente ter abordagens filosóficas dos conteúdos, além de sempre levar em
consideração os contextos e a complexidade das relações. Defendem a humanização de todas
as disciplinas como forma de evitar e prevenir os problemas que afetam o agir dos indivíduos
na sociedade. A defesa da tese é a de que o educador deve ser antes de qualquer ato um
filósofo, solidifica a idéia de um currículo que incorpore a disciplina de Filosofia aos
programas de ensino, avança na justificação de uma pedagogia filosófica em todas as outras
matérias e continua na defesa de que a Filosofia contribui decisivamente para que alcancemos
o principal objetivo de educar que é ajudar a existir em plenitude. Dermeval Saviani e Edgar
Morin propõem uma reforma no modo de pensar. Pretendem estabelecer um novo jeito de
organizar o conhecimento, alterando a educação de maneira profunda. Da mesma forma,
afirmam que há uma inadequação entre os saberes compartimentados da escola com o mundo,
tornando invisível o contexto, o global, o multidimensional, o complexo.
Palavras-chave: Educador; Filosofia; Morin; Saviani; Humanização.
Introdução
Todos os homens são racionais e, portanto, filósofos. Tratamos aqui de uma
racionalidade emancipatória, de uma consciência de si e do contexto em que se está inserido.
Buscamos demonstrar que a filosofia está no professor e no aluno e desabrocha pela
necessidade mesma do existir.
Através da leitura dos textos dos filósofos postula-se uma maneira filosófica de ser e
de agir do professor considerando a inter-relação de conteúdos e reconhecendo a
impossibilidade de conceber uma educação descontextualizada. De tal modo, “que não somos
filósofos sem a consciência da nossa historicidade. A própria concepção do mundo responde a
*
Publicitário, graduando do quarto período de Licenciatura em Filosofia –PUCPR.
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determinados problemas colocados pela realidade, que são bem determinados e ‘originais’ em
sua atualidade” (GRAMSCI, 1989, p. 13). Para alcançar este objetivo ousamos fazer uma
correlação entre obras Educação: Do Senso Comum à Consciência Filosófica de Dermeval
Saviani e Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro e Edgar Morin.
Desta correlação surge fundamentos para a tese de que a Filosofia é a ponte que une e
dá sentido aos diversos saberes e, portanto, “ferramenta” imprescindível ao professor na sua
tarefa de ajudar o aluno a existir e existir em plenitude.
Entretanto, sabemos que a análise de apenas 2 livros parece demasiado presunçosa.
Mesmo o livro estando inserido em uma contextualidade ampla e muitas vezes “intocável”,
aqui se trata de um pequeno recorte do tema que se pretende estudar, sem a presunção de
esgotá-lo, cientes de que muitas leituras são possíveis dentro de um mesmo texto.
Não existe livro, ou texto, que dê conta da leitura da realidade. Esta realidade está
representada pela leitura de mundo do autor e pela “conversa” estabelecida entre autor e
leitor, cada um com sua visão, respaldado em suas experiências pessoais e sociais, numa
sincronia dialética.
Assim, já de pronto, e com muito cuidado, nos despimos do primeiro obstáculo
sistemático, por assim dizer, para esta abordagem. Todavia, esperamos compensar este
empecílio com o esforço perene em dar conta da substância. Esforço este bastante grande, na
medida em que conhecemos nossas limitações acerca do tema.
Diálogo com Saviani
Dermeval Saviani, em seu livro Educação: Do Senso Comum à Consciência
Filosófica busca explicitar o sentido e a tarefa da filosofia na educação. Saviani defende a tese
de que a Filosofia da Educação é uma reflexão radical, rigorosa e de conjunto sobre os
problemas que a realidade educacional apresenta (SAVIANI, 2000, p.20).
Para alcançar o sentido e a definição estabelece, limpa e dá precisão aos conceitos
empregados para sua formação, partindo para a busca da origem do filosofar.
Defende Saviani que a origem do filosofar desabrocha do encontro entre o homem que
segue em sua existência natural e algo que interrompe este curso, alterando as condições e sua
seqüência esperada.
Neste contexto o homem vê-se “obrigado” a examinar e descobrir o que é este “algo”,
já que se tornou um problema para a continuação de sua existência. Saviani destaca que estes
problemas são as sementes fundadoras da reflexão e depois objeto mesmo da filosofia. Assim,
depara-se o autor com outro termo que precisa ser melhor explicitado, recebendo significação
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própria a saber: problema.
Primeiramente ressalta-se que problema não é compreendido como complexidade,
puro questionamento, mistério, obstáculo, simples dificuldade ou pura dúvida. Na busca pelo
significado da palavra é proposto que problema é “uma questão cuja resposta se desconhece e
se necessita conhecer” (SAVIANI, 2000, p.14).
Desafiado pelos problemas de sua realidade o homem necessita tomar atitudes de
enfrentamento e o faz com o que tem de melhor: - a reflexão. A Filosofia é antes de tudo
atitude.
Refletir, para o autor, “...é o ato de retomar, reconsiderar os dados disponíveis, revisar,
vasculhar numa busca constante de significado.... E isto é filosofar” (SAVIANI, 2000, p.16).
Nesta perspectiva, filosofar é uma reflexão sobre os problemas que a realidade
apresenta e aos quais necessitamos dar uma resposta.
Esta reflexão de que fala Saviani não é uma reflexão qualquer. Para ser adjetivada de
filosófica é preciso que satisfaça uma série de exigências que o autor resume em três: radical,
rigorosa e de conjunto.
-Radical porque deve investigar profundamente a “coisa” analisada, em seus
fundamentos.
-Rigorosa na utilização de métodos passíveis de revisões concisas evitando a
contaminação por “doxa” ou generalizações apressadas.
-De conjunto, pois a contextualização é imprescindível para examinar o todo. Toma-se
as partes e delas para o todo e vice-versa, na busca de inter-relações causais que delimitem o
problema, encontrando aqui o primeiro passo para sua solução.
Enfatizando sempre que esta relação é dialética, e por tal motivo ela prima pela
consideração em conjunto. Em linhas gerais,
A radicalidade é essencial à atitude filosófica do mesmo modo que a visão de
conjunto. Ambas se relacionam dialeticamente por virtude da íntima conexão que
mantém com o mesmo movimento metodológico, cuja criticidade garante
simultaneamente radicalidade, a universalidade e a unidade da reflexão filosófica
(SAVIANI, 2000, p. 17-18).
Esta relação dialética entre reflexão e problema, deve manter-se equilibrada sob pena
de, em não se procedendo assim, se chegar a um subjetivismo manipulador da realidade, com
a valorização demasiada da primeira ou uma “coisificação” no caso da supremacia da
segunda.
Estendendo, a função da Filosofia na ação do educador é o enfrentamento dos
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problemas pela reflexão radical, rigorosa e de conjunto. Desta maneira pode contribuir com as
diversas ciências envolvidas nas disciplinas pedagógicas, tudo sempre precedido de
avaliações criteriosas e contextualizadas.
O mestre Saviani escatologicamente disseca as palavras e lhes dá significado preciso.
Usa de método científico para abordar a questão do emprego da Filosofia. Utiliza técnicas
científicas para justificar a existência de uma necessária Filosofia na Educação. Neste sentido,
Saviani garante que o educador tem que, necessariamente e antes de qualquer atividade
proposta, ter uma visão filosófica, resumindo o educador competente, primeiramente é um
filósofo.
A busca constante de significado, necessidade inalienável do homem, opõe
permanentemente - sujeito e objeto - criando problemas que tentamos solucionar por
necessidade ou inclinação. Isso nos inquieta e desperta para o “fora” em comparação com o
“dentro”.
Saviani reconhece que esta paixão deve estar no aluno e no professor, na casa, na
escola e no trabalho. Como inalienável que é, torna-se combustível para o agir. Agir sobre os
problemas, resolvê-los. Agir que deve ser reflexivo, ético e cuidadoso, mas fundamental na
formação educacional, pois é o fim de todo saber. Indispensável, pois intrínseco, inerente
mesmo ao homem, que somente ao agir existe.
A defesa da tese de que o educador deva ser antes de qualquer ato um filósofo,
solidifica a idéia de um currículo que incorpore a disciplina de Filosofia aos programas de
ensino, avança na justificação de uma pedagogia filosófica em todas as outras matérias e
continua na defesa de que a Filosofia contribui decisivamente para que alcancemos o principal
objetivo de educar que é ajudar a existir em plenitude.
Diálogo com Morin
Chegamos, com Saviani, ao objetivo de educar que é ajudar a existir em plenitude,
porém só se existe em algum lugar, em um contexto múltiplo e complexo. Devemos
considerar certamente isso, assim trazemos Edgar Morin e seu livro “Sete Saberes necessários
à Educação do Futuro” para completar esta visão da Filosofia na educação.
Trata Morin nesta obra da impossibilidade de conceber sujeitos e objetos fora de seus
contextos. Ao contextualizá-los, cria-se uma multidimensionalidade, de entendimento
necessária, sob pena, de não o fazendo, incorrermos em conclusões imperfeitas, e ações
erradas e desastrosas.
Defende uma reforma no modo de pensar. Pretende estabelecer um novo jeito de
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organizar o conhecimento, alterando a educação de maneira profunda. Afirma que há uma
inadequação entre os saberes compartimentados da escola com o mundo, tornando invisível o
contexto, o global, o multidimensional, o complexo.
O contexto torna mais claro o conhecimento abstrato, portanto deve merecer mais
atenção, mais reflexão.
A contextualização valida o conhecimento. O global articula os diversos contextos
atuais e passados, construindo um todo que se move constantemente, do qual fazemos parte.
“É impossível conhecer o todo sem conhecer as partes, tampouco conhecer as partes sem
conhecer o todo” (PASCAL, Apud MORIN, 2001, p. 41).
O multidimensional está presente em tudo. Do homem, por exemplo, pode-se falar de
sua dimensão biológica, psíquica, social, afetiva, racional. Já a sociedade comporta dimensão
histórica, econômica, sociológica etc. O conhecimento para ser assertivo deve levar em
consideração estas dimensões e relacioná-las em retroação e em ato.
O complexo, “o que foi tecido junto” é, para efeito cognitivo, inseparável. “A
complexidade é a união entre a unidade e a multiplicidade” (MORIN, 2001, p. 41).
Assim a educação deve ser holística e promover a “inteligência geral” buscando
sempre uma concepção global que fundamente o pensar e o agir.
Esta inteligência geral é uma inclinação natural da mente humana que é curiosa por
princípio e necessidade, em tudo busca resposta, em tudo vê a atração irresistível da busca de
significado.
A educação do futuro deve superar os conflitos da razão consigo mesma (antinomias)
desconstituindo a racionalidade tecnicista (conhecimento especializado) e elevando a
inteligência geral, posto que esta propicia relação construtiva entre as humanidades e as
ciências e aquela as separa, causando uma consentida diminuição da responsabilidade com
conseqüente enfraquecimento da solidariedade e dos vínculos com o outro e por extensão com
a polis.“a economia, por exemplo, é a ciência social mais matematicamente avançada e, ao
mesmo tempo, a mais humanamente atrasada” (MORIN, 2001, p. 44).
Reduzindo o complexo ao simples, excluindo tudo aquilo que não seja mensurável
como faz com as emoções por exemplo, o conhecimento especializado “elimina o humano do
humano” (MORIN, 2001, p. 44) e esculpe uma educação que se debruça sobre partes cada
vez menores e específicas do todo, que passa a ser inatingível pela incapacidade gerada pela
atrofia da inclinação natural de que já falamos, com conseqüências desastrosas, como temos
presenciado na desertificação do planeta, na “coisificação” do outro, no hedonismo que
egocêntrico e egoísta, fundamenta o eu absoluto em detrimento do vizinho.
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Fala Morin da falsa racionalidade que tecnocrática suprime o humano para identificarse e até submeter-se às “Inteligências Artificiais” e às máquinas onde elas “habitam”. Ao
invés de beneficiar-se é dominado por elas.
Esta pseudo-racionalidade que dominou o século XX impediu a visão de futuro e
alijou, deste ver, as possibilidades de solucionar os problemas que surgiram.
Não se trata, diz o filósofo, de negar os saberes, mas de conjugá-los formando um todo
mais compreensível que permita o humano se manifestar em sua totalidade.
Morin, com bastante clareza, propõe uma reforma paradigmática, que nos parece
necessária e urgente. Todavia, a de se ter o cuidado de, ao contextualizar, globalizar,
multidimensionalizar e enfrentar a complexidade, não perdermos o ímpeto de agir, pois diante
de tantas premissas talvez não cheguemos à conclusão alguma, o que geraria uma inação
perigosa. Existem os limites do próprio raciocínio que devem ser respeitados sob pena de
perda de nexo causal, que por mais que múltiplo, é necessário.
Finalmente juntando as duas visões, que como vimos são complementares, temos que
educar para existir plenamente deve contemplar a visão do todo, de sua complexidade,
relacionando os diversos sem se perder nos infinitos caminhos possíveis. Isso só se dará
através de uma visão humana da técnica. De uma conciliação entre potencialidades racionais e
ética do todo. Conciliação possível através, entre outras coisas, do uso da filosofia no
processo de educar.
Também nos parece claro que o atual modo de educar não mais dá conta do básico das
necessidades humanas que é se relacionar. O engenheiro aprende a técnica mais avançada, usa
as máquinas mais incríveis mais não sabe conversar com o pedreiro, com o mestre de obras.
Viver na cidade é mais do que se sabe, é o que se sente. Educar é preparar para a convivência,
para o bem comum. Necessitamos sim de uma Filosofia da Educação, mas ainda mais da
Filosofia na Educação.
REFERÊNCIAS
GRAMSCI, Antonio. Concepção Dialética da História. 8. ed. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1989.
MORIN, Edgar. Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro. 4. ed. São Paulo:
Cortez, 2001.
SAVIANI, Dermeval. Educação: do Senso Comum à Consciência Filosófica. 13. ed.
Campinas: Autores Associados, 2000.
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