parte 2 - Ministério do Meio Ambiente

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NORMAS E PROCEDIMENTOS DE BIOSSEGURANÇA DA CTNBio*
Vania Moda – Cirino, Instituto Agronômico do Paraná – IAPAR, Área de
Melhoramento e Genética, CP481, CEP86001-970 – Londrina – PR. e-mail:
[email protected]
Com o advento da biotecnologia moderna, permitindo introduzir no genoma de um
determinado organismo genes de organismos filogeneticamente distantes,
anteriormente impossíveis de serem incorporados através do processo natural de
hibridação sexual, levou a comunidade científica e a sociedade em geral a
questionarem as implicações do uso desta tecnologia, surgindo as preocupações
com biossegurança e bioética. A biossegurança é uma ciência voltada para o
controle e a minimização de riscos advindos da prática de diferentes tecnologias
em áreas confinadas ou quando aplicadas ao meio ambiente.
As primeiras preocupações com a biossegurança surgiram por volta de 1974,
onde cientistas da Academia Nacional de Ciências dos EUA, reuniram-se para
discutir os riscos potenciais advindos do uso da tecnologia do DNA recombinante
(Berg et al., 1974). Posteriormente em fevereiro de 1975, ocorreu a Conferência
de Asilomar, onde cientistas do mundo todo, reuniram-se com o objetivo de
revisar os progressos científicos obtidos e discutir medidas adequadas para conter
o risco potencial desta técnica (Berg et al., 1975). A primeira regulamentação
surgiu em 1976, com a criação de um manual pelo "National Institutes of Health” NIH, dos EUA, onde foram estabelecidas regras de segurança para o uso da
técnica de manipulação genética de organismos vivos (Norman, 1976).
Com a finalidade de prevenir os riscos potenciais á saúde humana, animal e ao
meio ambiente, há um consenso entre pesquisadores, ambientalistas e a
sociedade em geral, que é necessário regular de alguma forma as atividades,
inclusive
em
nível
de
contenção,
envolvendo os
organismos
geneticamente
_________________
*Palestra apresentada, no Curso de capacitação em Biossegurança de
Organismos Geneticamente modificados – OGMs, promovido pelo Ministério do
Meio Ambiente e o Conselho Técnico Catarinense de Biossegurança, no período
de 23 a 27 de agosto de 2004, em Florianópolis – SC.
modificados (OGMs), bem como os testes e a liberação comercial desses OGMs
no ambiente.
A biossegurança é regulada em vários países no mundo por um conjunto de leis,
procedimentos ou diretivas específicas. No Brasil, a legislação de biossegurança
é específica para a tecnologia do DNA ou RNA recombinante, estabelecendo os
requisitos para o manejo de OGMs para permitir o desenvolvimento sustentado da
biotecnologia moderna. A lei 8.974 de 5 de janeiro de 1995 o Decreto 1752 de 20
de dezembro de 1995 e a Medida Provisória 2.191-9 de 23 de agosto de 2001
estabelecem normas para o uso das técnicas
de engenharia genética na
construção,
comercialização,
cultivo,
manipulação,
transporte,
consumo,
liberação, e descarte de OGM, visando proteger a vida e a saúde do homem, dos
animais e das plantas bem como o
meio ambiente e conferem a Comissão
Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio a competência de propor normas e
regulamentos relativos as atividades que envolvam OGMs.
De acordo com a legislação de biossegurança em vigor, as atividades e projetos,
inclusive os de ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico e de
produção industrial, que envolvam OGMs, são vedadas às pessoas físicas, sendo
restritos ao âmbito de entidades públicas ou privadas, que são responsáveis pelo
cumprimento da Lei e de sua regulamentação, bem como pelos eventuais efeitos
ou conseqüências advindas de seu descumprimento. As atividades e projetos
podem
ser
desenvolvidos
em
instalações
próprias
ou
alhures,
responsabilidade técnica ou científica da entidade responsável.
sob
a
Todas as
entidades que desenvolvem atividades com OGMs deverão possuir um Certificado
de Qualidade em Biossegurança (CQB), o qual
atesta a idoneidade técnico
científica e de infra-estrutura para executar atividades relacionadas a OGMs com
segurança. Por outro lado as organizações financiadoras ou patrocinadoras de
atividades ou projetos envolvendo OGM, nacionais ou estrangeiras, deverão
certificar-se da idoneidade técnico científica dos entes financiados e deverão
exigir o CQB, sob pena de tornarem-se co-responsáveis pelos eventuais efeitos
advindos de seu descumprimento.
A legislação prevê que toda entidade que
utilizar técnicas de engenharia genética deverá criar uma Comissão Interna de
Biossegurança (CIBio), além de indicar um técnico principal responsável para
cada projeto específico. É de competência da CIBio, inspecionar e garantir o
funcionamento das instalações sob sua responsabilidade, dentro das normas de
biossegurança, definidas pela CTNBio. Todos os procedimentos necessários para
obtenção do CQB e instalação e funcionamento das CIBios, encontram-se na
Instrução Normativa (IN) No1 da CTNBio , publicada no DOU No 174 de 6 de
setembro de 1996.
A legislação em vigor proíbe algumas atividades relacionadas a OGM,
constituindo crime a sua inobservância, como por exemplo, a manipulação
genética de células germinais humanas, a intervenção em material genético
humano in vivo, exceto para o tratamento de defeitos genéticos, respeitando os
princípios éticos e com aprovação da CTNBio e a liberação e o descarte no meio
ambiente de OGM em desacordo com as normas estabelecidas pela CTNBio. As
infrações também estão previstas, sendo incumbência da CTNBio definir os
valores de multas a partir de 16.110,80 UFIR, a serem aplicadas pelos órgãos de
fiscalização competentes.
De acordo com a legislação, compete a CTNBio, dentre outras atribuições, a
implementação de normas e regulamentos relativos as atividades e
projetos
envolvendo OGMs. Desde a sua instalação em junho de 1996 até a presente
data a CTNBio elaborou 20 Instruções Normativas, dispondo sobre normas para
importação de OGMs e seus derivados destinados a pesquisa, normas para
transporte, normas para trabalho em contenção com vegetais, microrganismos e
animais, normas para avaliação da segurança alimentar de plantas geneticamente
modificadas e de suas partes e normas para liberação planejada de OGM no
meio ambiente.
Os procedimentos estabelecidos pela CTNBio, para a liberação planejada no meio
ambiente, ou para liberação comercial de plantas geneticamente modificadas
encontram-se nas Instruções Normativas Nº 3 de 13 de novembro de 1996 . De
acordo com os procedimentos para a análise de risco estabelecidos pela CTNBio,
cabe ao solicitante o ônus de demonstrar a biossegurança do OGM, fornecendo
todos os dados para a avaliação de risco. A proposta de liberação planejada no
meio ambiente, elaborada pelo Pesquisador Principal, deve conter uma avaliação
de risco efetuada de maneira transparente e cientificamente confiável, baseada
em informações ou evidências científicas disponíveis, que permitam determinar e
avaliar os possíveis efeitos adversos do OGM na saúde humana, animal e no
meio ambiente.
A avaliação de risco deve ser efetuada caso a caso, sendo que as informações
exigidas podem variar de acordo com o OGM em questão, o uso previsto, local de
liberação, etc;
Vários fatores devem ser considerados na avaliação do impacto que poderá
ocorrer com a liberação de plantas transgênicas no ambiente. É necessário obter
informações sobre o gene o organismo doador, a espécie receptora desse gene e
o local onde será efetuada a liberação. Com referência ao gene é necessário
saber qual a sua função no organismo doador; natureza do organismo doador
(patogênico ou não patogênico); efeito do transgene na planta geneticamente
modificada; número de cópias inseridas, nível de expressão, estabilidade da
expressão; toxicidade da proteína expressa pelo gene introduzido ou metabólitos
de sua ação; risco teórico de mutagênese pela inserção do gene, com alteração
da expressão habitual de outros genes, ativação de genes silenciosos ou pouco
expressos provocando a biossíntese de metabólitos tóxicos; potencial alergênico
da proteína expressa, termoestabilidade, digestibilidade no meio gástrico ou
intestinal, análise bioquímica de taxas de glicolização e análise de seqüências de
aminoácidos da nova proteína, comparada com a de alergênicos convencionais
(Eady et al., 1995; Harding & Harris, 1997; Taylor, 1997; Lehrer et al., 1996).
Em relação à espécie a ser liberada os questionamentos variam de acordo com
cada transgenes inserido, e incluem questões referentes aos danos potenciais
que podem acarretar ao meio ambiente e a biodiversidade se ocorrer escapes, e
incluem questões relacionadas ao grau de domesticação da cultura transgenica;
possibilidade de cruzamentos da planta transgênica com espécies relacionadas e
plantas invasoras, probabilidade de dispersão através do pólen; possibilidade de
produção de plantas mais persistentes ou mais invasoras; grau de confinamento e
escala de liberação (Wrubel, et al 1992; Dale, 1993; Scheffler, et al., 1993; Dale,
et al., 1993; Dale, 1994; MacPart|an & Dale, 1994; Gliddon,1994, Snow &
Palma, 1997 ,Staniland et al., 2000, Dale et al., 2002, Daniell, 2002, Conner et
al., 2003).
Quanto ao local da liberação, informações referentes a dimensão da área e a
localização exata da liberação, abrangendo detalhes referentes a direção dos
ventos, lençol freático, cursos d'água, áreas de proteção ambiental, centros de
diversidade genética da espécie a ser liberada, proximidade de centros
populacionais, centro de atividade agrícola, rodovias, etc, são fundamentais para
a avaliação de risco.
Um importante procedimento na avaliação de risco é determinar a
probabilidade e as possíveis conseqüências da introdução do transgenes via
hibridação sexual em plantas da mesma espécie ou espécies correlacionadas. A
oportunidade para a transferência de genes depende principalmente de dois
fatores: O grau de compatibilidade entre a espécie doadora e a espécie receptora,
e a distância física entre ambas, assumindo obviamente que a espécie doadora e
receptora produzem descendentes férteis e florescem simultaneamente e que os
agentes polinizadores estão presentes. Estudos visando determinar a distância de
isolamento físico para produção de sementes com alta pureza genética, em
variedades de espécies economicamente importantes, foram realizados, sendo
que os mesmos podem ser utilizados como base para prevenir a introgressão de
transgenes em variedades cultivadas em área adjacentes e ou espécies
relacionadas. Neste sentido a CTNBio decidiu, conforme o comunicado No 100
publicado no DOU de 11 de fevereiro de 2000, que para o isolamento e a
bordadura
das
liberações
planejadas
no
meio
ambiente
de
vegetais
geneticamente modificados, os requerentes deverão obedecer, além das normas
previstas nas Instruções Normativas Nos 03, 10 e 16 da CTNBio, o disposto na
Portaria nº 306, de 21 de novembro de 1982, do Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento – MAPA, que versa sobre as "Normas para Produção
de Sementes Genéticas e Básicas". A CTNBio esclarece ainda que a obediência
às normas supracitadas não exime qualquer requerente de observar as
legislações específicas dos órgãos fiscalizadores competentes e ainda adotar
normas adicionais de biossegurança a serem determinadas caso a caso.
Em decorrência da complexidade dos ecossistemas, possivelmente nem todos os
riscos associados à liberação de novos organismos podem ser identificados,
muito menos considerados. Portanto é necessário um sistema de monitoramento
para
avaliar
os
riscos
subseqüentes
às
liberações
comerciais.
Riscos
desconhecidos podem surgir com o aumento da freqüência e da dimensão da
área de liberação. Experimentos de campo em áreas limitadas nem sempre
representam a realidade das áreas de cultivo comercial. As interações ecológicas
incluem muitos efeitos em cascata o que são particularmente difíceis de serem
testados e avaliados em áreas de pequenas dimensões e em curto período de
tempo A variabilidade de ambientes e de cultivares complicam ainda mais a tarefa
de avaliação de risco. Em setembro de 1998 através do Comunicado N. 54
publicado no DOU de primeiro de outubro de 1998, a CTNBio publicou o parecer
técnico conclusivo referente a biossegurança da soja geneticamente modificada
tolerante ao herbicida glifosate, determinando o monitoramento dos plantios
comerciais por um período de cinco anos, com o objetivo de proceder estudos
comparados das espécies de plantas, insetos e microrganismos presentes nas
lavouras. Este monitoramento permitiria obter informações inéditas tanto sob o
ponto de vista teórico como prático no âmbito da biossegurança como também de
aspectos agronômicos da nova tecnologia.
Todas as normas e procedimentos de biossegurança elaboradas pela CTNBio
visam assegurar o avanço da biotecnologia e proteger a saúde humana, animal,
vegetal e o meio ambiente. Essas normatizações podem ser encontradas no
seguinte endereço eletrônico: http://www.ctnbio.gov.br
Literatura Citada
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