J. Bras. Nefrol. 1997; 19(3): 285-286 285 Comentário Editorial Efeitos adicionais do tratamento antihipertensivo: uma necessidade Principalmente nas duas últimas décadas, o tratamento da hipertensão arterial leve a moderada passou por inúmeras modificações. Cerca de 10 a 20% da população adulta é portadora desta doença e uma terapêutica consensual e única é impossível de ser aplicada a todos os pacientes. Além disso, o desafio da normalização dos níveis tensionais deixou de ser uma missão difícil, para se tornar um evento factível na imensa maioria dos indivíduos hipertensos com boa adesão ao tratamento. Hoje existem disponíveis um grande número de fármacos, de eficácia comparável, que podem ser utilizados em monoterapia ou em associação. No entanto, atualmente, se procura mais do que tão somente a normalização da pressão arterial. É desejável que efeitos benéficos adicionais possam ser oferecidos ao paciente hipertenso. Assim, os inibidores da enzima de conversão da angiotensina (ECA) têm sido associados com reversão de hipertrofia ventricular esquerda e cárdio-proteção, 1,2 prevenção ou reversão de alterações estruturais vasculares, 3 proteção renal, 4 além de permitirem comodidade posológica, 5 sem interferir com os perfis glicídico e lipídico. Os inibidores da ECA, a partir da segunda geração, não possuem o grupamento sulfidrila em sua estrutura molecular, o que possibilita ação prolongada e, portanto, dose única diária. 5 Adicionalmente, esse grupo de drogas é bem tolerado, com efeitos colaterais infreqüentes e pouco intensos, favorecendo assim a boa adesão dos pacientes ao tratamento. 6 Neste trabalho de J.L. Santello e cols., 7 os autores utilizaram Lisinopril, por período prolongado, em monoterapia, para tratamento de hipertensos leves a moderados. Sua eficácia pode ser comprovada através da MAPA, recurso cada vez mais utilizado em ensaios clínicos de boa qualidade, que possibilitou demonstrar ainda a inexistência de taquifilaxia ou escape. Neste estudo multicêntrico nacional puderam ainda os autores comprovar a excelente tolerabilidade à droga, que não interferiu com os parâmetros metabólicos e bioquímicos aferidos após cinco meses de terapêutica efetiva. No entanto, não puderam confirmar a 286 J. Bras. Nefrol. 1997; 19(3): 285-286 esperada reversão da hipertrofia ventricular esquerda nos pacientes que a apresentavam no primeiro exame (19%), embora tenha ocorrido redução não significante da massa ventricular. O efeito colateral mais freqüente foi tosse seca em 5% dos pacientes, que foram excluídos. Certamente, cada vez mais, médicos e pacientes exigirão dos pesquisadores e da indústria farmacêutica a perseguição de uma droga anti-hipertensiva “ideal” que traga múltiplos benefícios, custo razoável e efeitos adversos desprezíveis. Cibele Isaac Saad Rodrigues Profa. Associada da Disciplina de Nefrologia Departamento de Medicina-CCMB-PUCSP Referências 1. Cleland JG, Poole-Wilson PA. ACE inhibitors for heart failure: a question of dose. Br Heart J. 1994; 72(3): S106-110 2. McMurray J. ACE inhibitors after myocardial infarction. Lancet. 1994; 344: 475-476 3. Schiffrin EL, Deng LY, Larochelle P. Effects of a beta blocker or a converting enzyme inhibitor on resistance arteries in essential hypertension. Hypertension. 1994; 23: 83-91 4. Navis G, de Zeeuw D, de Jong PE. ACE-inhibitors: panacea for progressive renal disease? Lancet. 1997; 349: 1852-1953 5. Ikram H, White HD. Long-versus short-acting angiotensin-converting enzyme inhibitors. J Am Coll Cardiol. 1990; 15: 250-251 6. Juncos LI. Patients compliance and angiotensin converting enzyme inhibitors in hypertension. J Cardiovasc Pharmacol. 1990; 15(3): S22-S25 7. Santello JL, Amodeo C, Chaves Jr. H, Spritzer N, Spritzer TS, Franco RJS, Mion Jr. D. Avaliação da eficácia anti-hipertensiva e tolerabilidade de monoterapia com Lisinopril em hipertensos leves e moderados. J Bras Nefrol. 1997; 19(3): 249-255