• TEMAS GERAIS • membrana citoplasmática e destruição das organelas) ou apoptose (caracterizada por condensação da cromatina, fragmentação do DNA e bolhas de membrana com citoplasma condensado ). A perforina recebe este nome por sua capacidade de criar poros que perfuram a membrana celular da célula-alvo; é produzida exclusivamente por linfócitos citotóxicos (CD8) ou natural killer ativados. Os poros são formados pela agregação cálcio-dependente de móleculas de perforina que penetram na membrana celular. Por esses poros, que apresentam diâmetro interno de 5 a 20 nm e que funcionam como canais iônicos não seletivos de alta condutância, água e solutos de baixo peso rnolccular entram livremente nas células-alvo, resultando em sua morte por lise coloidosmótica. Esse mecanismo de ação da perforina é semelhante ao do complexo de ataque à membrana do sistema complemento. Os grânulos presentes nos linfócitos também contêm várias proteases distintas, mas relacionadas, que recebem o nome de granzimas. Até o momento, foram identificadas três granzimas diferentes no homem. A granzima A, com atividade semelhante à da tripsina e a granzima B (única com especificidade para o aminoácido ácido aspártico) são as melhor caracterizadas. Apesar de as granzimas por si só não serem citolíticas, parecem participar na indução de morte celular pelos linfócitos T A inibição da sua atividade enzirnática ou da expressão de seu gene reduzem a capacidade citolítica dos linfócitos T Granzimas A e B puras, na presença de perforina, induzem apoptose em células-alvo. Os dados experimentais disponíveis sugerem que as granzimas liberadas em conjunto com perforina são capazes de induzir apoptose nas células-alvo somente após entrarem na célula pelos poros formados pela perforina. Outra maneira utilizada pelo sistema imune para destruir a célula-alvo é a indução de apoptose desencadcada pela interação da proteína Fas presente na superficie da célulaalvo, com o Fas ligante, que se expressa na superfície de linfócitos T CD8 ativados. A via de indução de apoptose na célula-alvo pela ligação Fas/Fas ligante não tem seu mecanismo totalmente esclarecido. O objetivo maior em transplante é o desenvolvimento de tolerância imunológica e conseqüentemente a sobrevida do enxerto, mesmo após a retirada da irnunossupressão. Embora seja possível a indução de tolerância imunológica em modelos animais de transplante, por meio de várias manipulações do sistema imune, como a injeção intratímica, a indução de quimerismo , o uso de anticorpos monoclonais, etc., o mecanismo pelo qual ela ocorre não é bem compreendido. A terapêutica imunossupressora pode bloquear o sistema imunológico do receptor e impedir a indução de tolerância imunológica, que parece ser fenômeno ativo, e não simples ausência de resposta imune. Além disso, seu uso prolongado aumenta o risco de infecções, tumores, lesão renal, hipertensão, diabetes, hiperlipidemia, hirsutismo, facies cushingóide e necrose asséptica de cabeça de fêrnur. Porém, a grande maioria dos pacientes evolui para a perda do enxerto quando interrompe a medicação imunossupressora, Várias drogas novas e anticorpos ~rigidv;; contra moléculas acessórias que participam da interação entre linfócitos e células do enxerto estão sendo desenvolvidas e algumas delas já estão sendo testadas em transplantes de órgãos em humanos. Essas novas drogas parecem ter efeito mais seletivo nas células envolvidas no processo de rejeição, poupando células de outros órgãos e tecidos. O conhecimento dos mecanismos imunológicos da resposta ao transpl~te pode ser útil na monitoração dos eventos imunes intra-cnxerto, possibilitando o diagnóstico precoce de rejeição aguda, o melhor manuseio da terapêutica imunossupressora e a identificação de pacientes "tolerantes", dos quais poderia ser retirada a medicação irnunossupressora. Efeitos Metabólicos e Manuseio Clínico dos Corticosteróides Orsine Valente Álvaro Nagib Atallah o s glicocorticosteróides são agentes esteróides de ação antinflamatória e irnunossupressora, utilizados em inúmeras doenças. O glicocorticosteróide em seres humanos é o cortisol, usado como referência padrão. Os maiores níveis ocorrem durante o sono, antes de acordar, e os menores níveis à noite, antes do inicio do sono. O cortisol é secretado intermitentemente ao longo do dia, por períodos que duram somente poucos minutos. Entre os pulsos de secreção, o córtex adrcnal pode não secreta r cortisol por minutos a horas. A maior parte do cortisol (75%) é transportada no sangue por globulina ligadora do cortisol (CBG); 15% é ligado à albumina e os restantes 10% são cortisol livre. Algumas situações, como gravidez, uso de pílula anticoncepcional ou tratamento com estrógcno estimulam a produção de CBG pelo fígado, resultando em altas concentrações plasrnáticas de ·cortisol sem hipercortisolisrno funcional. O cortisol é rnetabolizado no figado, sendo que apenas 1% é excretado na urina na forma ativa. Pela introdução de grupo metila, hidroxila ou flúor (F) na posição 9 alfa da cortisona podem-se sintetizar corticosteróides com diferentes potências antinflamatórias e retentoras de sódio. Devido ao grande uso do corticosteróide, foi conveniente produzir compostos com grande potência antinflamatória e menor atividade mineralocorticosteróidc. De utilidade prática é saber as doses equivalentes e a potência dos principais corticosteróides (Tabela 1). Principais Efeitos do Corticosteróide Metabolismo dos carboidratos: Os corticosteróides produzem tendência à hiperglicemia, principalmente devido ao aumento da gliconeogênese hepática e do antagonismo periférico à ação da insulina, resultando em diminuição da captação de glicose no músculo e tecido gorduroso. Os glicocorticostcróidcs podem induzir o aparecimento de diabetes, considerado moderado, estável, usualmente sem cetose, relacionado com a dose e a duração da administração. O diabetes, na maioria das vezes, é reversível com a parada da administração do corticosteróide, embora os indivíduos com predisposição genética possam permanecer diabéticos. Metabolismo protéico: O corticosteróide produz redução da massa muscular por inibição da síntese protéica e aumento do catabolirmo protéico com balanço nitrogenado negativo. Metabolismo lipídico: Terapêutica com altas doses de corticosteróides leva a resistência periférica à insulina, hiperinsulinernia e aumentada síntese de VLDL A redução da liberação do ACTH provoca aumento no colesterol total, aumento no LDL-c e diminuição do HDL-e O ACTH pode agir aumentando a atividade do receptor do LDL-c. Efeitos no crescimento: Crianças que recebem excesso de corticosteróide exibem atraso no crescimento, por efeito 1521 f 522 .: • ATUALIZAÇÃO TERAPtUTICA • MANUAL PRÁTICO DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO • direto no esqueleto, diminuição da absorção de cálcio no intestino e efeito antianabólico e catabólico nas proteínas dos tecidos periféricos. Além disso, os corticosteróides interferem com a secreção de GH e podem antagonizar diretamente algumas de suas ações periféricas. Efeito no Na, K e metabolismo da água: Os corticosteróidcs promovem aumento da reabsorção de Na' e excreção de TABELA 1 - Potência relativa Atividade Glicocorticosteróide Hidrocortisona Prednisona Dcxarnetasona Metilprednisona 1 4 30 5 Osteoporose: Perda óssea ocorre em até 50% dos pacientes recebendo terapia crônica por cor ticostcróidcs. A perda óssea inicial ocorre primariamente, no osso trabccular (vértebra, quadril e parte distal do rádio), mas o osso cortical é também comprometido com o uso crônico. A perda de osso trabecular pode ser tão alta quanto 12% no primeiro ano, e de 3% nos anos subseqüentes. Doses tão baixas quanto 5 mg por dia podem ser deletérias ao osso. Osteonecrose: A osteonccrosc (necrose avascular ou isquêmica) na maioria das vezes afeta o osso subcondral da cabeça do fêrnur, embora possa acometer também joelhos e ombros. É problema que ocorre principalmente em pacientes com LES, em que muitas vezes se faz uso de altas doses de corticostcróidcs, por tempo prolongado. A osteonecrose precoce é pouco visualizada nos raios X simples, mas pode ser detectada por ressonância magnética. Infecção e resposta imune: Dose de prcdnisona maior que 20 mg/dia pode aumentar o risco de infecções. Isso se relaciona, pelo menos parcialmente, à inibição da migração de granulócitos e monócitos ao foco inflamatório. Entretanto, o maior efeito dos corticosteróides pode ser inibição da síntese de quase todas as citocinas conhecidas. Infecções por organismos atípicos ou oportunistas são até 40 vezes mais freqüentes em pacientes tomando corticosteróide, em comparação com os que não tomam. Alterações oculares: O uso de corticosteróide sistêmico poderá aumentar a pressão intra-ocular e a formação de catarata, especialmente em idosos. Os pacientes que fazem uso de altas doses e por tempo prolongado devem ter a pressão ocular monitorada, principalmente os que tiverem história familiar de glaucoma. Corticosteróide inalatório: Seu uso traz menos efeitos colaterais e reduz as hospitalizações por asma. Nos adultos, os efeitos são limitados a problemas tópicos, como disfonia, que pode ocorrer em até 50% dos pacientes, e candidíase oral, que aparece em menus cio que 5% dos pacientes. Efeito do corticosteróide no eixo hipotálamopituitária-adrenal (HPA): A duração da inibição do eixo HPA depende da preparação do esteróide usado, da dose administrada, do tempo de ingestão e se o corticosteróide é dado em uma ou mais doses diárias. Há correlação direta entre a potência antinflamatória e o grau da inibição produzida pelo K' pelo rim. Altas doses por tempo prolongado podem produzir alcalosc metabólica hipocalêmica. Os glicocorticosteróides aumentam a depuração de água livre devido a efeito direto no túbulo renal e a aumento na taxa de filtração glomerular. Os corticosteróides podem também inibir a secreção de hormônio antidiurético, não se sabe se diretamente ou por mecanismo indireto. dos principais esteróides Atividade Mineralocorticosteróide Equivalência 1 0,7 2 0,5 20 5 0,75 4 (mg%) estcróidc. O poder de inibição do eixo HPA segue a seqüência: dexametasona>prednisona>hidrocortisona. A administração de doses terapêuticas de glicocorticosteróides leva à inibição do eixo HPA em uma semana. A dose supressora do ACTH maior do que a quantidade de secreção diária normal de cortisol (30 mg/ dia), que é equivalente a 7,5 mg de prcdnisona. Se essa dose de corticosteróide é dada VO ou IV, a supressão do·ACTH dura somente algumas horas, porque o cortisol é rapidamente metabolizado. Se, no entanto, a mesma dose é dada por via intra-articular e ocorrer liberação lenta do horrnónio, a supressão pode durar muitos dias. A supressão do eixo HPA é maior quando, além da dose da manhã, o paciente fez uso de uma dose à noite, que exerce ação supr essora do ACTH. Com doses menores do que 7,5 mg de prednisona/ dia a grande maioria dos pacientes mantém o eixo HPA responsivo. A maioria dos pacientes que tenham recebido glicocorticosteróide por menos de três semanas recupera o eixo em sete a dez dias. Tratamento por longo período: Antes de iniciar tratamento com corticosteróide devemos afastar a presença de diabetes, hipertensão arterial, doença cardíaca, tuberculose pulmonar, que podem piorar com seu uso. É dificil antecipar a dose correta de corticosteróide. No entanto, a dose de início deve ser a menor dose que poderia produzir melhora, aumentada gradualmente, se necessário. Retirada da terapêutica corticosteróide: Quando se reduzem abruptamente ou se retiram totalmente os corticosteróides em pacientes que o estão usando há muitos meses ou anos, as seguintes situações podem acontecer: 1. Evidência bioquímica de supressão do eixo HPA, com sintomas de insuficiência supra-renal 2. Recorrência da doença que motivou o uso dos corticosteróides 3. Sintomas de dependência tanto física quanto psicológica, com eixo HPA normal e provas laboratoriais não mostrando recorrência da doença de base 4. Evidência bioquímica de supressão do eixo HPA sem sintomas e sem recorrência da doença. Há duas complicações que requerem imediata parada da terapia esteróide, sem diminuição progressiva: 1. Psicose induzida por corticosteróide, irresponsiva a medicamentos antipsicóticos 1523 • TEMAS GERAIS • 2. Alteração da córnea induzida pelo herpes vírus, o qual pode rapidamente levar à perfuração da córnea e possivelmente cegueira permanente. Após a retirada da terapêutica corticosreróide em pacientes que usaram a droga por muitos meses ou anos, o tempo de restauração do eixo hipotálamo-pituitária-adrenal pode ser dividido em cinco estágios: 1. No primeiro mês os níveis de ACTH e cortisol estão diminuídos em relação aos valores normais 2. No segundo mês o ACTH retoma ao normal, mas o cortisol permanece baixo; 3. Do segundo ao quanto mês o nível de ACTH se torna supranormal, em esforço para aumentar o cortisol, que ainda permanece baixo 4. Do quinto ao nono mês após a retirada do corticosteróidc, o cortisol normaliza, nus os níveis de ACTH permanecem elevados em diversos pacientes 5. Após nove meses, o cortisol e o ACTH normalizaram-se. Velocidade de retirada corticosteróide: Não há estudos controlados para determinar a melhor maneira de reduzir os corticosteróides. Redução abrupta ou retirada rápida pode ser realizada quando o uso, mesmo em doses altas, foi por alguns dias. Quando o paciente faz uso de prcdnisona na dose de 40 a 60 mg por duas a quatro semanas, pode-se reduzir a 15 mg em quatro a cinco dias e o restante em uma semana. Nos pacientes que usam a medicação por vários meses, o objetivo da diminuição progressiva é prevenir a rccorrência da doença de base e os sintomas provenientes da deficiência de cortisol, devida à persistência da supressão do eixo HPA. Geralmente objetivamos diminuição de 10 a 20% por vez, de acordo com a resposta individual de cada paciente. Temos utilizado o seguinte esquema de redução dos corticosteróides: 10 mg cada uma ou duas semanas, quando a dose inicial for maior que 60 mg/ dia de prednisona ou equivalente; 5 mg cada uma ou duas semanas quando a dose de prednisona estiver entre 20 e 60 mg/dia; 2,5 mg cada uma a duas semanas quando a dose de prednisona estiver entre 10 e 19 mg/dia; 1 mg cada uma a duas semanas quando a dose de prednisona estiver entre 5 e 9 rngy'dia 0,5 mg cada uma ou duas semanas quando a dose de prcdnisona for abaixo de 5 mgy'dia. Efeitos da Retirada Corticosteróide Perda de peso: Devida à diminuição do apetite e do tecido gorduroso. Frcqücntcmcntc o paciente fica com aparência envelhecida e/ou imagina estar sofrendo de outra doença. Paniculite: Dor e nódulos pruriginosos têm sido descritos após retirada corticosteróide, usualmente em pacientes tomando altas doses e por longo tempo. Os nódulos desapare.cern espontaneamente em poucos dias. Conjuntivite: Alguns pacientes sem evidência prévia de doença ocular podem desenvolver conjuntivite transitória bilateral com a retirada corticosteróide, principalmente quando rápida. O quadro evolui para a cura sem tratamento. Pseudo-reumatismo esteróide: A síndrorne consiste de anorexia, náuseas, letargia, dor articular e dor e fraqueza muscular. O cortisol plasmático é usualmente normal. A síndrome está provavelmente relacionada à dependência dos tecidos a altas doses de corticosteróide. Os sintomas desaparecem em poucos dias mas, se persistirem, podem ser aliviados por aumento da dose do corticosteróide e posterior retirada gradual. Pulsoterapia Em algumas situações clínicas de doenças auto-imunes, como LES ou rejeição a transplantes que não respondem a doses imunossupressoras clássicas e que estão evoluindo com perda da função renal, ou em casos de anemia hemolítica auto-imune que, apesar da imunossupressão, evoluem com grave anemia, deve-se avaliar a possibilidade de pulsoterapia. O corticosteróide usado é a metilprcdnisona na dose de 1 g I\'/dia diluída em 100 mL de soro glicosado por período de um a cinco dias, dependendo da doença de base e da resposta apresentada pelo paciente. Procedimentos que diminuem efeitos colaterais pacientes recebendo glicocortieosteróides sistêmicos tempo prolongado e em altas doses em por 1. Afaste a presença de diabetes e hipertensão arterial antes do início da terapia e a cada consulta médica 2. Faça exame oftalmológico anualmente para afastar possibilidade de glaucoma e catarata 3. Evite repouso prolongado para não acelerar a fraqueza muscular e a perda óssea 4. Mais de três a seis meses de tratamento recomendam medidas preventivas, com reposição de cálcio e vitamina D. Pacientes que já sofreram fratura osteoporótica se beneficiam com o uso de bisfosfonatos 5. Evite obesidade, com dieta adequada 6. Trate hipocalernia, quando ocorrer 7. Tome o corticosteróide com as refeições e use ranitidina 8. Trate qualquer infecção agressivavente 9. Em pacientes que necessitam de tratamento com corticosteróide a longo prazo, o uso de deflazocort pode ser opção terapêutica. Tem-se evidenciado menor incidência de reações adversas ósseas e do metabolismo dos carboidratos. A equivalência é 7,5 mg de deflazacort para 5 mg da prednisona IO.Para minimizar a supressão do eixo HPA, se possível proceda da seguinte maneira: a) Use as menores doses possíveis para bloquear a doença de base b) Use somente a dose da manhã, evitando a dose noturna, que exerce maior atividade supressora do eixo HPA c) Use dose única em dias alternados d) Evite uso de dexametasona.