Journal homepage: www.arvore.org.br/seer MARKETING DO FUTURO OU FUTURO DO MARKETING? RESUMO Com o intuito de caracterizar o processo de transformação que a área de marketing vem passando na atualidade, e melhor entender as razões do destaque com que o executivo de marketing atua na empresa moderna, este artigo busca analisar as transformações que o conceito de marketing sofreu no decorrer do tempo e, com essa base, as transformações no papel do executivo de marketing dentro de uma organização. Para tanto, refaz-se o percurso histórico da atividade mercantil, base do conceito de marketing e do formato como se conhece atualmente. Em seguida, faz-se uma retrospectiva dos principais pressupostos assumidos nas diferentes etapas que consolidaram o marketing como prática administrativa. A partir de então, discorre-se sobre as tendências do marketing, seja como reflexos das mudanças socioeconômicas ocorridas no planeta, seja pela ascensão de novos temas e tecnologias que influenciam diretamente no pensamento de consumidores e do marketing, por consequência. Destaque para a ascensão das tecnologias sociais, especialmente a Web 2.0, bem como das questões relativas à Geração Y. Finalmente, faz alusão à evolução do papel do administrador de marketing nas organizações, e apresentam-se as principais orientações que os jovens administradores devem ter em mente com vias ao desenvolvimento de suas carreiras na área de marketing. PALAVRAS-CHAVES: Jovem Administrador; Tendências em Gestão; Marketing. Revista Brasileira de Administração Científica, Aquidabã, v.4, n.3, Set 2013. ISSN 2179‐684X EDIÇÃO ESPECIAL: A Administração que queremos: o futuro da Administração na visão do jovem profissional SECTION: Articles TOPIC: Marketing, Comunicação e Vendas DOI: 10.6008/ESS2179‐684X.2013.003.0003 Regina da Silva Ornellas Universidade de São Paulo, Brasil http://lattes.cnpq.br/9579445179400936 [email protected] WHAT IS THAT: THE MARKETING OF THE FUTURE OR THE FUTURE MARKETING? ABSTRACT In order to characterize the process of transformation which the marketing field is passing in current days, and for a best comprehension about the reasons of rising the role of marketing executives and their actuation into the modern enterprises, this paper aims to analyze the transformations occurred in the marketing conceptualization during the time and, in this base, the transformations of the role of marketing executives inside an organization. For this, the structure of the paper contains the historical trajectory of mercantile activity, base of the concept of marketing and its current configuration. It follows the retrospective of main assumptions predominant on the different ages which consolidate marketing as administrative practice. Since then, it discusses about the trends of marketing, as reflections of the social and economic changes occurred in the world, as by the ascension of new themes and technologies which had influence directly influenced the mindset of costumers and marketing itself, consequently. Highlights for the ascension of social technologies, especially Web 2.0, as well as issues related to Generation Y. Finally, it makes allusion to the evolution of the role of marketing managers into the organizations, and presents the main advices which the young management practitioners have to keep in mind for the development of their careers into the marketing field. KEYWORDS: Young Management Practitioners; Management Trends; Marketing. Received: 10/01/2013 Approved: 02/09/2013 Reviewed anonymously in the process of blind peer. Referencing this: ORNELLAS, R. S.. Marketing do futuro ou futuro do marketing?. Revista Brasileira de Administração Científica, Aquidabã, v.4, n.3, p.41‐58, 2013. DOI: http://dx.doi.org/10.6008/ESS2179‐ 684X.2013.003.0003 Revista Brasileira de Administração Científica (ISSN 2179‐684X) © 2013 Escola Superior de Sustentabilidade. All rights reserved. Rua Dr. José Rollemberg Leite, 120, Bairro Bugio, CEP 49050‐050, Aquidabã, Sergipe, Brasil WEB: www.arvore.org.br/seer – Contact: [email protected] – Phone: +055 (79) 9979‐8991 ORNELLAS, R. S. INTRODUÇÃO Atualmente, estamos vivendo uma fase de evolução econômica, em que a sobrevivência de uma empresa depende, em grau crescente, da sua capacidade de adaptação aos mercados consumidores. Nos países altamente industrializados, essa transição da economia da produção para a economia do consumo é um fato incontestável, mas ela também ocorre em países em desenvolvimento. O Brasil é um exemplo disso. Muitas empresas presentes em nosso país, que ainda há poucas décadas vendiam sem grande esforço o que conseguiam produzir, oferecendo sempre o que queriam vender, são hoje obrigadas a se dedicar intensamente a melhor compreender o que seus clientes desejam e a se adaptar a essas predileções. Independentemente da conjuntura e da crise, nota-se isso, sobretudo, nos setores altamente competitivos, como o do vestuário e do comércio varejista. “Não há nada permanente a não ser a mudança”, afirmava o filósofo Heráclito. Com base nesse pensamento, no futuro próximo, as empresas enfrentarão o enorme desafio de fazer marketing para jovens que não irão mais querer usar um controle remoto, mas comandos de voz. Não irão mais querer consultar na internet sobre produtos que veem na TV, mas irão querer que as TVs acompanhem seus olhos e percebam a intenção de compra, oferecendo mais informações, caso o usuário peça. No futuro, o Marketing mudará para sempre. Tudo deverá ser ligado a tudo. Tudo será “social”. Em 10 anos, as crianças de hoje estarão comprando e influenciando compras. Os nossos novos clientes vão querer conteúdo inteligente e personalizado, baseado em suas preferências e características sociais. Esses novos consumidores irão querer interagir com a publicidade, reconstruindo-a em tempo real enquanto ela acontece. Exigirão que tudo tenha informações adicionais, irão querer interferir em tudo, e vão exigir ser ouvidos. Quando estes novos consumidores estiverem no ápice da sua capacidade de consumo, eles poderão mudar o rumo de empresas multinacionais e causar problemas sérios a qualquer corporação simplesmente divulgando uma campanha nas redes sociais, ou seja, com apenas um clique. É compreensível que uma transição dessa natureza e intensidade seja acompanhada por repercussões internas na empresa, que forçam o administrador a alterar suas ações e atitudes. Também isso se verifica no Brasil de hoje: gradativamente o administrador está abandonando a improvisação a favor do planejamento e da ação estratégica. Ao mesmo tempo, os pesos relativos das posições-chave estão sendo reavaliados nas empresas, frequentemente a favor do executivo de marketing, diretor comercial, gerente de vendas ou qualquer que seja o título oficial dos que respondem pela área de venda nas empresas. Ao que parece, esse processo de transição provém de longa data, mas somente há poucas décadas está-se fazendo sentir com todo o seu poder, acumulado durante séculos. Com o intuito de caracterizar esse processo e para podermos melhor entender as razões do destaque com que o executivo de marketing atua na empresa moderna, analisaremos, neste artigo, as Revista Brasileira de Administração Científica v.4 ‐ n.3 Set 2013 P a g e | 42 Marketing do futuro ou futuro do marketing? transformações que o conceito de marketing sofreu no decorrer do tempo e, com essa base, analisaremos as transformações no papel do executivo de marketing dentro de uma organização. Os avanços recentes nas tecnologias de comunicação e novas demandas quanto à responsabilidade socioambiental das organizações, dentre outros fatores, vêm redefinido o papel de Marketing e esse assunto torna-se pertinente em virtude da variedade de desafios e oportunidades que são impostas aos gestores no futuro próximo. METODOLOGIA Este artigo faz parte da edição especial intitulada “A Administração que queremos: o futuro da Administração na visão do jovem profissional”, editada pela Revista Brasileira de Administração Científica, da Escola Superior de Sustentabilidade (ESS), com o patrocínio da Indra Sistemas. A proposta desta edição especial é promover uma reflexão sobre as principais tendências na administração contemporânea, feita por jovens pesquisadores e profissionais da Administração, e focando no papel do jovem administrador, sendo este egresso ou ainda em formação. Desta forma, este artigo, assim como os demais integrantes desta edição, foi desenvolvido essencialmente a partir de pesquisas bibliográficas e documentais (MARCONI; LAKATOS, 2009; MARTINS; THEÓPHILO, 2007). A partir da análise da literatura e dos dados relacionados ao tema deste artigo, bem como a partir da experiência acadêmica e profissional dos autores, foram realizadas as análises e reflexões com vias a identificar tendências e projetar cenários a respeito do futuro da Administração como prática profissional. DISCUSSÃO TEÓRICA A Existência do Marketing De acordo com Kotler & Keller (2006), “[...] fazer marketing significa satisfazer as necessidades e os desejos dos clientes”. Esse é o dever de qualquer negócio: a satisfação do cliente mediante o fornecimento de valor que, consequentemente, gerará lucro a empresa. Mas, em meio a competitividade existente em uma economia instável, é necessário que haja uma combinação de disciplina e flexibilidade, que possibilitem o desenvolvimento de estratégias e planos criativos a fim de uma produção constante de valor ao cliente. Embora o Marketing tenha sua existência reconhecida a partir dos anos 1900, é necessário ir um pouco além dessa data para compreender tanto o seu desenvolvimento como o contexto no qual ele surgiu. Foi em razão do desenvolvimento do comércio e de uma conjuntura econômica específica e propícia que o Marketing diferenciou-se como prática e área do conhecimento. Dessa forma, ele pode ser considerado tão velho quanto o comércio (AMBLER, 2004), que é uma das mais antigas atividades humanas e cuja história muitas vezes se confunde com a própria história R evista Brasileira de Administração Científica v.4 ‐ n.3 Set 2013 P á g i n a | 43 ORNELLAS, R. S. da humanidade. Ele teve seu início com a troca, que é considerada a primeira forma de mercar. Simões (1976) faz um breve traçado histórico do desenvolvimento do comércio desde a Antiguidade até o século XIX, mostrando que durante o seu desenvolvimento muitas civilizações se utilizaram dele, o que contribuiu significativamente para o seu progresso ao longo dos anos. Contudo, deve-se considerar que algumas dessas civilizações sobressaíram-se na arte de mercar, como foi o caso dos Fenícios, que fizeram do comércio a própria razão de ser de suas atividades. No período do Império Romano, o comércio desenvolveu-se beneficiado pelas ligações com a África e a Ásia e em razão do aprimoramento das técnicas e normas jurídicas e tributárias estabelecidas pelos jurisconsultos romanos. Com a invasão islâmica da Europa, no século VIII, as atividades comerciais foram prejudicadas, o que obrigou os europeus a recorrerem à agricultura. Surgiram dessa forma os latifúndios e a perda dos mercados externos. No século X, no cenário europeu, reapareceu uma classe de comerciantes profissionais constituída em grande parte por vagabundos, cavaleiros e ladrões, que colocavam à venda tudo o que as cidades possuíam. A partir do século XII surgiu uma nova camada social entre os habitantes dos burgos, que se dedicava ao artesanato: a classe média. No século XIII, conhecido como o período da “Escolástica”, São Tomás de Aquino e seus seguidores contribuíram para o estudo dos consumidores, pois desenvolveram o que provavelmente foi a primeira análise formal das motivações destes (AMBLER, 2004). No final do século XIV, a Inglaterra apresentava uma sociedade voltada para os mercados; a produção e os negócios, ainda de pequena monta, eram organizados pelos regulamentos das corporações. Os séculos XV e XVI foram marcados pela empresa capitalista, pela descoberta dos mercados do Oriente e das Américas, pela criação de processos de produção com os altos fornos, pela invenção, por Frei Luca Paccioli, da contabilidade de dupla-partida, pelo alargamento dos serviços postais, pelo aparecimento da Bolsa de Antuérpia e, com ela, dos mercados organizados. Ainda no século XVI foi desenvolvida a economia de mercado, caracterizada por comportamentos humanos no mercado, ou seja, tanto o comprador quanto o vendedor passaram a ser determinantes nas práticas econômicas e sociais (BARTELS, 1976). Os séculos XVII e XVIII, por sua vez, foram caracterizados pelo mercantilismo, nas suas mais diversas formas: fiduciária, comercialista, industrialista, bulionista e colonialista. Nos sistemas mercantilistas, a principal figura da atividade econômica era o comerciante, especialmente o exportador. A segunda metade do século XVIII ficou marcada pela Revolução Industrial, que se iniciou na Inglaterra em 1760 e se estendeu a outros países europeus a partir de 1830. A Revolução Industrial, um marco muito importante no desenvolvimento do comércio, compreendeu modificações no setor comercial e agrícola. Mas, acima de tudo, foi marcada pelas transformações sociais verificadas antes e durante a Revolução: essencialmente, a passagem da sociedade rural para a sociedade urbana e do trabalho artesanal e manufatureiro para o trabalho assalariado na organização fabril (CANEDO, 1998). Revista Brasileira de Administração Científica v.4 ‐ n.3 Set 2013 P a g e | 44 Marketing do futuro ou futuro do marketing? Com o advento da Revolução Industrial, “o importante era produzir; produzir com o menor custo possível, pois tudo o que fosse produzido era consumido” (ROCHA; CHRISTENSEN, 1999). De acordo com Tedlow (1996), foi também na Inglaterra e com o advento da Revolução Industrial que surgiu um problema para o gerenciamento dos negócios: a coordenação entre manufatura e Marketing (neste caso, referindo-se aos encarregados pelas vendas do que era manufaturado). Nessa época, os mercados locais eram pouco significativos e estavam a longa distância dos mercados externos. Assim, o foco voltou-se para os mercados nacionais, o que tornou necessário o desenvolvimento de novas práticas de distribuição (BARTELS, 1976). No início do século XIX, com base nas teorias de Malthus, Ricardo e Smith, foi lançada a premissa de mercado livre, que se autocontrolava, distanciava-se de interesses políticos e mantinha-se obediente a leis econômicas e próprias. A metade desse século foi nitidamente marcada pela produção. Embora se produzisse mais, a demanda cresceu e permaneceu superior, não necessitando de maiores requintes de vendas. De acordo com Bartels (1976), a extensão da dominância da economia foi maior do que os interesses sociais, o que evocou um Estado regulador que modificasse conceitos básicos de economia. Observando esse cenário, e todo o processo de desenvolvimento do comércio desde a Antiguidade, Ambler afirma: [...] O Marketing tem existido desde o início do comércio, sempre pensado, não era chamado desta forma. Mercadores não simplesmente compravam e vendiam; eles desenvolviam relacionamentos de longo prazo, o que agora seria chamado de equidade da marca. Eles podem não ter sido introspectivos sobre seus métodos de negócios, mas se eles não tivessem conhecimento de como satisfazer seus consumidores, enquanto faziam lucro para eles mesmos, o comércio não teria sobrevivido (AMBLER, 2004, p.3). Seguindo essa lógica, Las Casas (2001), Milagre (2001) e Sandhusen (2003) também defendem que o Marketing existe desde o início do comércio, embora ainda não recebesse esse nome e nem fosse considerado uma prática distinta de outras práticas comerciais. Uma Retrospectiva Histórica do Marketing Marketing é uma das disciplinas mais dinâmicas da gestão e, talvez, seja aquela que responda mais rapidamente às mudanças na sociedade, nas tecnologias e na economia. Nos últimos 100 anos, a disciplina se reinventou de forma impactante, no mínimo três vezes, passando de uma abordagem centrada em si mesma para uma abordagem voltada às necessidades dos consumidores. Na verdade, os conceitos de marketing evoluíram. A contínua adaptação dos conceitos a diferentes épocas da vida humana é o que o torna tão interessante. Inicialmente, o marketing era visto apenas como uma entre várias funções importantes de apoio à produção, ao lado dos recursos humanos e das finanças. Naquela época, não havia sido desenvolvida uma teoria geral de Marketing e as práticas de Marketing eram inseparáveis da Economia e da Administração clássica. As decisões de Marketing eram orientadas exclusivamente R evista Brasileira de Administração Científica v.4 ‐ n.3 Set 2013 P á g i n a | 45 ORNELLAS, R. S. para custos de produção e logística e muitas das questões atualmente associadas ao Marketing sequer existiam. A precificação, por exemplo, era baseada apenas no equilíbrio entre oferta e demanda (PINDYCK & RUBINFELD, 2010). Esse período foi chamado a Era dos Vendedores e pode-se argumentar que praticamente tudo o que era produzido se vendia. Os anos entre 1930 e 1960 foram marcados pelo aumento da concorrência. Nos primeiros anos, as ações de Marketing foram direcionadas exclusivamente para preços. Aos poucos, metodologias, teoremas e ferramentas referentes à Promoção, Publicidade e Branding foram sendo desenvolvidas, como forma de buscar diferenciação da concorrência. Desde que Neil Borden cunhou a famosa expressão “mix de marketing”, na década de 1950, e Jerome McCarthy apresentou os 4Ps, na década de 1960, os conceitos de marketing passaram por transformações significativas, adaptando-se às mudanças no meio (McCARTHY, 1960). Os 4Ps de McCarthy explicavam, de maneira concisa, as práticas genéricas da gestão do produto vigentes na época: desenvolver um Produto, determinar o Preço, realizar a Promoção e definir o Ponto de Distribuição. Com esses conceitos, nada mais era considerado necessário ao marketing: apenas orientações táticas. Com isso, as empresas começaram a dedicar mais recursos para entender os drivers de consumo e ao mesmo tempo, tratar das relações entre vendedores e compradores. Isso se deu de forma consecutiva ao surgimento das primeiras grandes teorias unificadas de Marketing, em especial os chamados Conceitos de Marketing. Temas como Psicologia, Estatística e Antropologia passaram a ser incorporados e, em paralelo a propaganda enquanto instrumento de promoção se popularizou à medida que o rádio e a TV foram adotados pelas massas. Naquele tempo, a indústria manufatureira era o centro da economia americana no pósguerra da década de 1950 e o setor continuou prosperando durante a década de 1960. Nesse ambiente era natural que o desenvolvimento fosse focado apenas na disciplina de gestão do produto. O Marketing moderno surgiu a partir de 1960 com a publicação de Miopia de Marketing por Theodore Levitt. Na década seguinte, Philip Kotler lança a primeira edição de Administração de Marketing, em que reuniu, revisou, testou e consolidou as bases daquilo que até hoje forma o cânone do Marketing. Nesse momento da história, a economia sofreu grande mudança causada pela estagflação, ou seja, a estagnação do consumo a qual ocasiona inflação, fenômeno que afetou a economia dos Estados Unidos e a economia ocidental como um todo e foi provocada pela crise do petróleo. Durante a década de 1980, a economia permaneceu incerta porque o crescimento econômico havia migrado, principalmente para os países em desenvolvimento na Ásia. Com isso, gerar demanda em uma época turbulenta, marcada pela incerteza era mais difícil, exigindo mais do que os 4Ps. Como consequência, a demanda era escassa; alguns produtos foram lançados para competir entre si, a fim de conquistar compradores. Os consumidores haviam se tornado compradores inteligentes. Na mente deles, muitos produtos eram vistos como commodities porque Revista Brasileira de Administração Científica v.4 ‐ n.3 Set 2013 P a g e | 46 Marketing do futuro ou futuro do marketing? não tinham um posicionamento distinto. As mudanças no meio forçaram os profissionais de marketing a refletir cada vez mais e criar conceitos melhores. Com esse cenário, foi inaugurado o rol de gurus de Marketing. No entanto, a natureza do modelo clássico de marketing continuou existindo. O Marketing moderno apenas acompanhou o desenvolvimento da gestão empresarial. Assim como as organizações buscaram se tornar mais participativas e democráticas com seus funcionários, o Marketing evoluiu de maneira a reconhecer e aceitar uma maior participação e envolvimento do consumidor (que passou a ser chamado de “rei”). Nessa época, termos como “identificar e satisfazer as necessidades dos consumidores” ganharam profundidade e destaque. Produtos e serviços não eram lançados sem a exploração das intenções de compra do público-alvo, onde as características distintas do produto ou serviço deveriam ser estabelecidas. A ideia de que, para uma empresa obter sucesso em sua trajetória, é item obrigatório ter conhecimento do seu mercado e estruturar que parte desse mercado será tida como alvo da empresa passou a ser encarada como prioritária, pois se identificou que isso poderia ser de benefício, principalmente para que a mensagem seja transmitida de forma correta aos consumidores corretos (CHURCHILL, 2000, p. 26). As ideias de aftermarketing e Marketing one-to-one, associadas ao surgimento de Customer Relationship Management ou CRM, trouxeram novas perspectivas para a gestão de Marketing em geral e relacionamento com consumidores em particular. Ao mesmo tempo, a sociedade passou a exigir das organizações uma determinada postura sócio-ético-ambiental que trouxe um arcabouço de novas considerações a respeito do papel do Marketing. A partir desse ano foi notado foco não só para o conceito, mas também a aplicações de práticas relacionadas a emoções humanas e com isso foram introduzidos conceitos como Marketing Emocional, Marketing Experimental e Valor da Marca e assim foi idealizado que para gerar demanda, não bastava apenas atingir a mente do cliente com o clássico modelo de posicionamento. Era necessário também atingir o coração do cliente. Figura 1: A evolução dos conceitos de Marketing. Fonte: Kotler & Setiawan (2010). R evista Brasileira de Administração Científica v.4 ‐ n.3 Set 2013 P á g i n a | 47 ORNELLAS, R. S. Isso também é fruto das gerações atuais que vivem no mundo do consumo. Para os estudiosos das gerações, existem cinco gerações convivendo neste início do século XXI: Geração dos Veteranos: que nasceram antes da segunda guerra mundial; Geração dos Baby Boomers: que nasceram após a segunda Guerra; Geração X: que nasceram na época das crises financeiras; Geração Y: nascidos na fase de expansão digital; Geração Z (dos zapeadores): que estão crescendo com a crise da sustentabilidade do mundo. Atualmente, uma boa parcela dos consumidores é constituída pelas Gerações Y e Z, que possuem preferências e hábitos de consumos diferentes das gerações anteriormente vislumbradas pelos profissionais de marketing. A empresa Bridge Research conduziu um estudo a partir de entrevistas com pessoas com idade entre 18 e 30 anos (nascidos entre as décadas de 1980 e 1990 = geração Y) nas cidades brasileiras de São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre, das quais 48% homens e 52% mulheres das classes A, B e C. O objetivo foi identificar padrões de consumo, visões de mundo e comportamentos desse grupo. Nesse estudo foram identificadas as seguintes características: Padrão de Consumo: consumo é realizado de forma liberal, mas com uma medida de conservadorismo no aspecto social. São exigentes e atraídos por produtos diferentes, com símbolos que os liguem a comunidades. Não buscam status no consumo de marcas, mas encaram a afeição como uma forma de expressar um comportamento coletivo. Comportamento: impulsividade, individualidade e necessidade de valorização são duas características presentes na geração. Devido à influência no crescimento ser direta da Internet, esses consumidores gostam de realizar tarefas com velocidade, possuem perfil multitarefa e utilizam a internet como principal ferramenta de acesso a informação. Visão de Mundo: Não buscam independência e por isso não se incomodam de deixar a casa dos pais com mais idade. Sempre que possível, postergam compromissos e responsabilidades. Têm senso de liberdade e investir seus ganhos em autorrealização. Preocupação com o meio ambiente e com causas sociais são características de destaque da geração. Mediante a análise realizada, é possível identificar que atualmente o marketing está situado em uma nova era. Essa nova Era do Marketing surge com a Internet e a convergência e se acentua com a popularização das redes sociais e com a redefinição do papel das organizações em um “novo mundo”. Ao mesmo tempo, à medida que as cadeias de produção vão sendo ajustadas para modelos do tipo “pull selling”, diversas atividades de Marketing vão sendo redefinidas, em especial Design, Promoção, Precificação e Distribuição. O Futuro do Marketing Na medida em que o mundo gira em direção à próxima geração, tanto os cidadãos quanto as empresas ficam imaginando o que os espera. O motivo da preocupação não é apenas o fato de haver mudanças, mas sua velocidade acelerada. As empresas nem sempre percebem que seus mercados estão sempre mudando. A estratégia vitoriosa do ano anterior pode ser hoje o caminho Revista Brasileira de Administração Científica v.4 ‐ n.3 Set 2013 P a g e | 48 Marketing do futuro ou futuro do marketing? mais certo para o fracasso. O atual panorama econômico está sendo moldado por duas forças poderosas – tecnologia e globalização. Considerando que o ritmo de mudanças se acelera, as empresas não podem mais confiar em suas antigas práticas de negócios para manter a prosperidade. Mas novas técnicas devem ser formuladas para que continuem a atrair esse consumidor que está cada vez mais “antenado”, exigente e atraído a empresas que se identifiquem com seu estilo independente e ao mesmo tempo mais responsável tanto pessoal como socialmente. A seguir foram identificadas algumas ferramentas já consagradas pelo marketing, mas que devido às mudanças nos hábitos dos consumidores, deverão sofrer evolução na sua condução. Com o crescimento expressivo das redes e mídias sociais, o mundo inteiro está repensando sobre a forma de fazer marketing. Comunicação, Propaganda e Relacionamento Até então, uma das formas que era eficaz para o relacionamento com o cliente era o chamando Customer Relationship Management ou CRM, que se refere ao gerenciamento cuidadoso de informações sobre cada cliente a fim de maximizar a fidelidade dele. Isso era feito por “cada ponto de contato”, ou seja, qualquer ocasião em que o cliente tivesse em contato com a empresa ou seus produtos (KOTLER e KELLER, 2006). Mediante ele, a empresa poderia oferecer serviços ou atendimentos customizados, baseados nos seus produtos. Hoje, com o avanço da Internet, a aplicação do CRM deve ser aprimorada, pois a Internet redefiniu o papel da comunicação em massa. Pela primeira vez os consumidores estão aptos a se comunicar e relacionar uns com os outros e com suas marcas prediletas. Kotler, em sua obra Marketing 3.0 (2010), nos alerta que as forças sociais estão definindo o novo marketing, centrado no ser humano, através da era da Participação e do Marketing Colaborativo. No campo da propaganda, consumidores estão cada vez menos receptivos aos formatos tradicionais de propaganda e por isso, audiências e canais se fragmentam em meios desconexos (TV a Cabo, WebTv, Redes Sociais, Sites e etc.). Consumidores estão em busca de interação e engajamento e querem ser corresponsáveis pela criação de conteúdo e sentido para marcas e produtos. Canais de Distribuição O papel do Canal de Distribuição que era encarado como responsável pela intermediação do fabricante ao consumidor e pelo acréscimo de valor ao produto perante o comprador (Kotler, 2006) está sendo questionado, tanto por consumidores quanto por fabricantes, à medida que organizações passam a ter acesso direto aos consumidores via e-Commerce e outras modalidades de transações remotas. Qual será o papel dos intermediários no futuro? De que R evista Brasileira de Administração Científica v.4 ‐ n.3 Set 2013 P á g i n a | 49 ORNELLAS, R. S. outras maneiras, além de aproximar fabricantes e consumidores, os intermediários poderão adicionar valor? Como justificar a adição ao preço pelo canal de distribuição? Sustentabilidade Em suma, Hart e Milstein definem sustentabilidade global como: Um conceito complexo, multidimensional, que não pode ser equacionado por meio de uma única ação corporativa. A criação de valor sustentável requer que as empresas levem em conta cada um dos quatro conjuntos abrangentes de motivadores. Primeiro, as empresas podem criar valor reduzindo o nível de consumo de matéria-prima e de poluição associado com a rápida industrialização. Segundo, as empresas podem criar valor ao operar com níveis mais amplos de transparência e responsabilidade, uma vez que são impulsionadas pela sociedade civil. Terceiro, as empresas podem criar valor por meio do desenvolvimento de novas e revolucionárias tecnologias que tenham o potencial para reduzir as pegadas do homem sobre o planeta. Finalmente, as empresas podem criar valor ao atender às necessidades daqueles localizados no extremo inferior da pirâmide de renda do mundo, e isso de uma forma que facilite a criação e distribuição de renda inclusiva (HART; MILSTEIN, 2004, p. 69-70). Os objetivos de Marketing de uma organização podem muitas vezes ir de encontro aos objetivos da sociedade e um dos grandes desafios de Marketing é incorporar de forma rentável a Sustentabilidade em toda sua proposta ao sistema de satisfação das necessidades dos consumidores. Como equilibrar o discurso de socialmente responsável com a utilização de recursos naturais, poluição ou a transferência de empregos para o exterior? Além de facilitar a comunicação, de que outras formas o Marketing pode auxiliar por uma postura mais socialmente responsável das empresas? Convergência entre Marketing e Produtos Em marketing, produto é tudo que pode ser oferecido a um mercado, para aquisição ou consumo. Sob a óptica do marketing, um produto é tudo que é capaz de satisfazer uma necessidade e o marketing utiliza ferramentas para que o consumidor compreenda a necessidade que o produto tem o poder de suprir (KOTLER, 2006). No futuro, a influência do Marketing sobre os produtos e serviços deverá ser cada vez maior. Sua capacidade de identificar necessidades levará ao desenvolvimento de produtos e serviços que tornarão a vida das pessoas melhores e mais fáceis. Produtos devem ser tão bons que as pessoas não terão alternativa senão falar sobre eles. Dessa maneira, o marketing se tornará parte do produto. Afinal de contas, consumidores não separam a experiência de Marketing da experiência de uso. Exemplo desta tendência é o Nike+, parceria entre Nike e Apple, que utiliza aplicações nos dispositivos portáteis (como o iPod) para auxiliar corredores profissionais e amadores no acompanhamento da performance no esporte. Cada vez mais, clientes escolhem empresas e produtos que satisfaçam suas necessidades mais profundas, e quando falamos nisso, nos referimos ao fato de que somos seres humanos, temos sentimentos, desejos e necessidades singular. Os consumidores deixaram de ser apenas Revista Brasileira de Administração Científica v.4 ‐ n.3 Set 2013 P a g e | 50 Marketing do futuro ou futuro do marketing? números que visa no fim das contas somente o lucro e passamos a ser ativos, formadores de opinião e com poderes, nunca vistos antes na história do marketing. De acordo com Kotler (2010), passamos por 2 eras no marketing até chegar na realidade que vivemos hoje (Quadro 1): Marketing 1.0, que se tratava de uma era com esforços baseados em Produtos; Marketing 2.0, uma era já cultivando frutos das mudanças, mas que ainda era baseada nos anseios do consumidor. E chegamos no Marketing 3.0, baseado no ser humano, cujas necessidades e esperanças jamais podem ser ignoradas, dessa forma se torna cada vez mais importante que empresas aprendam a ouvir os consumidores e se relacionar com eles através das diversas plataformas tecnológicas disponíveis no mercado. Isso não está limitado a Redes Sociais, mas sim ao fato de que as coisas mudam e as empresas devem acompanhar essa mudança. Quadro 1: Características do Marketing em suas versões 1.0, 2.0 e 3.0. Marketing 1.0 Centrado no Produto Revolução Industrial Compradores de massa, com necessidades físicas Marketing 2.0 Voltado para o Consumidor Satisfazer e Reter os consumidores Tecnologia da Informação Consumidor Inteligente, dotado de coração e mente Marketing 3.0 Voltado para os Valores Fazer do mundo um lugar melhor Nova onda de Tecnologia Ser humano pleno, com coração, mente e espírito Desenvolvimento de produtos Diferenciação Valores Especificação do produto Posicionamento da empresa e do produto Funcional Funcional e Emocional Transação do tipo um-para-um Relacionamento um-para-um Missão, Visão, Valores da empresa Funcional, Emocional e Espiritual Colaboração um-paramuitos Objetivo Vender Produtos Forças Propulsoras Como as empresas veem o mercado Conceitos de marketing da empresa Diretrizes de marketing da empresa Proposição de valor Interação com consumidores Fonte: Kotler & Setiawan (2010). Adicionar Valor e Sentido através de Conteúdo Vimos que o consumidor através das décadas se tornou um ser exigente e ao mesmo tempo capacitado para distinguir entre uma gama de produtos, qual ele irá consumir. Por isso, a capacidade de produtos e serviços proverem informações e conteúdo sobre sua utilização é cada vez mais um fator diferenciador nos momentos de verdade. Como o Marketing, juntamente com P&D, pode auxiliar nesse processo? Como transpor as limitações de formato, meio e espaço das embalagens tradicionais e garantir acesso a conteúdos multimídias, relevantes, colaborativos? Como as marcas e o sentido que carregam definirão quem representam? Inteligência de Marketing A Pesquisa de Mercado é uma poderosa ferramenta, ao qual não é utilizada ainda em sua totalidade ou mesmo não é utilizada. Os produtos mais revolucionários da década poderiam nunca ter sido desenvolvidos a partir de pesquisas de mercado ou grupos de foco. Isso não quer dizer R evista Brasileira de Administração Científica v.4 ‐ n.3 Set 2013 P á g i n a | 51 ORNELLAS, R. S. que a opinião do consumidor não esteja sendo considerada como importante, mas sim que muitas organizações ainda não estão preparadas para usar a valiosa informação trafegada nas redes sociais, por exemplo, para transformá-la em inteligência e assim se certificar de que um insight é realmente uma tendência emergente. Com isso, questiona-se: De onde, de que maneira, com quem, e a que custo o Marketing será capaz de adquirir conhecimentos sobre as necessidades de consumo? Como identificar, criar e adaptar necessidades que ainda não existem? Como organizar todo o buzz criado em redes sociais e transformá-lo em insights valiosos? O Administrador de Marketing nas Organizações A atividade do administrador de marketing consiste em modificar as atitudes e comportamentos dos consumidores, de forma a que sejam favoráveis aos objetivos da organização. Tal só é possível dentro de certos limites devido às diferentes características individuais do consumidor. Os responsáveis pelo marketing das organizações devem esforçar-se para ver os consumidores como eles são, de fato, e não como gostariam que fossem. Michael Porter, por meio da criação da ferramenta chamada ‘cadeia de valor’, identificou que é necessário ter um planejamento de atividades estratégicas, onde a empresa tenha por base o desempenho dos seus concorrentes para que possa desenvolver suas próprias táticas. Esse planejamento de táticas ou estratégias é chamado de plano de marketing e é utilizado como instrumento principal para direcionamento e coordenação dos esforços de marketing. Nele estão contidas as táticas, que envolvem produto, promoção, comercialização, preço, canais de venda e etc. (KOTLER; KELLER, 2006). Baseado no contexto abordado anteriormente, de que no decorrer das décadas, as preferências e hábitos de consumo sofreram alteração, cabe ao administrador de marketing atual usar, inserida em sua estratégia: a criatividade. O conhecimento pode ser utilizado como base da criatividade. A criatividade não é uma capacidade que aflora naturalmente. Cada pessoa possui um determinado conhecimento, o qual permite que a criatividade também seja diferenciada, e então é muito interessante que as organizações saibam quem são seus colaboradores, que ideias podem ser estudadas mais profundamente e como desenvolver condições para que os estudos e pesquisas necessários sejam realizados antes de demonstrar uma ideia. No campo da criatividade, temos os dois extremos: (a) algumas pessoas acham que podem retirar ideias do nada, e como resultado obtém o nada, pois não pensam nas variáveis envolvidas, sua fundamentação é baseada em nada e tem a ilusão de que as outras pessoas devem aceitar suas ideias; (b) existem pessoas que têm uma ideia, colocam-na em um pedaço de papel, pesquisam o assunto, comentam com amigos e colegas, inserem novas variáveis, fazem um planejamento com base em fatos e dados, onde exista a demonstração do interesse de um público-alvo e da viabilidade do projeto. Revista Brasileira de Administração Científica v.4 ‐ n.3 Set 2013 P a g e | 52 Marketing do futuro ou futuro do marketing? Em qual dos tipos de pessoas é presenciado a aplicabilidade do conhecimento? No segundo tipo, pois ela teve seu conhecimento respeitado (pelo planejamento que realizou), além de aprender muito ao buscar informações sobre um assunto quando a pessoa interage com as demais e compartilha um projeto que, se bem estudado, acabará realizado. Então a criatividade passa a ter um valor diferenciado, um projeto bem elaborado e estudado traz observações que apontam melhorias e mudanças que podem ser aplicadas, construindo um cenário mais próximo do real e que não desperdiça tempo. A tomada de decisão sobre um projeto é um processo que exige conhecimento e ao se estudar um mercado há a possibilidade de encontrar uma oportunidade, disponibilizar seus produtos ou serviços, criar uma rede de distribuição melhor e mais eficiente e eficaz. Todas as decisões devem, ou deveriam, ser tomadas com base em dados concretos, pois existem certos riscos que não podem ser corridos pelas empresas, entrar em um mercado sem o conhecer é um risco muito grande e não traz bons resultados. As organizações sempre podem buscar referências em suas pesquisas, que apontam a direção à qual o mercado se dirige, mas ainda assim é possível encontrar uma oportunidade que as demais empresas não tenham visto, mas que traz riscos e seu estudo é fundamental. Decidir não é arriscar-se em um caminho desconhecido, mas procurar um terreno já conhecido, aprofundar os estudos sobre o terreno e tomar uma decisão com base nas informações obtidas, pois desta forma a organização consegue avaliar tudo o que é necessário para estar presente em um novo mercado ou trazendo um novo produto. As melhores decisões são aquelas que são tomadas com base em conhecimento, agregando novas possibilidades e abrindo os olhos das organizações para as inúmeras possibilidades existentes. Os Desafios do Jovem Administrador de Marketing Com base nos estudos realizados inicialmente, identificando as principais tendências dos hábitos dos consumidores, foram identificados alguns desafios que podem se transformar em “regras de ouro” para o jovem administrador de marketing que atua em um século em transformação, como o atual: Evitar a miopia de marketing Em 1960, Theodore Levitt, professor de Harvard, escreveu o artigo que se tornou um clássico da literatura de gestão, no qual sublinhou os perigos do marketing de vistas curtas. Esta miopia consiste na atitude de concentração nos produtos da empresa, sem atender aos mercados e à concorrência. Levitt ilustrou esta postura com o exemplo das companhias de estradas-de-ferro estadunidenses, bastante poderosas no início deste século, mas que hoje agonizam no segmento de transportes de passageiros. Elas não compreenderam que a grande ameaça estava no R evista Brasileira de Administração Científica v.4 ‐ n.3 Set 2013 P á g i n a | 53 ORNELLAS, R. S. desenvolvimento das autoestradas e dos transportes aéreos. Faltou-lhes olhar para além do produto, um erro comum a muitas empresas. Para o administrador de marketing, um produto é um meio e não um fim. Há outros critérios fundamentais para dar resposta às expectativas dos consumidores como o preço, a imagem ou a distribuição (LEVITT, 1960). Manter-se próximo dos clientes A ciência do marketing apoia-se no estudo dos consumidores. Nos últimos 20 anos, conseguiram-se progressos consideráveis neste domínio, principalmente através da leitura dos códigos de barras nas caixas registadoras dos grandes espaços de distribuição, dos estudos de audiência nos meios de comunicação, na pesquisa dos hábitos e atitudes dos consumidores e distribuidores. Todas estes meios geram informações de grande utilidade, mas têm os seus limites. Os estudos de mercado auxiliam as decisões de marketing, mas não dizem o que deve ser feito. O marketing é uma disciplina voltada para a ação, e não para o domínio dos estudos. Duas posições extremas devem ser evitadas: não estudar o mercado e confiar apenas na nossa intuição (o chamado feeling) ou experiência; ou explorar indefinidamente os estudos e praticar um marketing de gabinete. É necessário ir ao encontro dos consumidores, distribuidores e técnicos, ou seja, estar próximo do mercado, intelectual e fisicamente. Infelizmente, são poucos os responsáveis de marketing que abandonam regularmente o seu local de trabalho para acompanhar os vendedores, ou para observar, no local de compra, a natureza e o comportamento do seu consumidor. Basear as decisões em fatos e não em opiniões Os iniciados do marketing tendem a basear a sua opinião nos estudos de mercado. Os mais experientes preferem selecionar os fatos que reforçam as suas anteriores convicções. As decisões devem ser baseadas em fatos, não em opiniões. Por vezes, a lógica pode ser ultrapassada pelos fatos de marketing. Por outro lado, é perigoso extrapolar a causa de um êxito de um produto para um novo mercado, sem tomar a precaução de realizar estudos sobre esse mercado inexplorado. Um dos exemplos desse erro típico foi a Eurodisney (hoje Disneyland Paris) que sofreu dificuldades pela importação de um conceito de parque de diversões americano para um novo mercado, com consumidores com características diferentes (os europeus gastam menos dinheiro, procuram hotéis de categoria inferior e as estadas são mais curtas). Manter o espírito crítico, de síntese e de antecipação. Por vezes, as informações prestadas pelos estudos de mercado são superabundantes, apresentam lacunas, ou são contraditórias. É preciso filtrar os fatos mais importantes. Logo, o Revista Brasileira de Administração Científica v.4 ‐ n.3 Set 2013 P a g e | 54 Marketing do futuro ou futuro do marketing? marketing é muitas vezes um exercício de síntese. Por outro lado, os dados objetivos inventariados pelos estudos são observações sobre a evolução passada dos mercados, e nunca do futuro e não se pode afirmar que dados do passado serão, com certeza, repetidos no futuro. O êxito de um inquérito resulta, muitas vezes, da formulação da pergunta e do método empregado. O mesmo é válido para o marketing. Isso não necessariamente leva a conclusão de que todos os métodos não são confiáveis, mas que seus resultados não podem por si só alicerçar uma tomada de decisão, mas que a exploração dos dados deve ser precedida de uma análise crítica do método de recolha de informação. Vigiar a concorrência A maioria dos mercados está saturada e as empresas se batem por quotas de mercado. Em consequência, o marketing de fidelização torna-se mais importante do que o marketing de conquista. Mais difícil do que atrair clientes é mantê-los. O desafio principal não é deixá-los satisfeitos; vários concorrentes podem fazer isso. O desafio é “conquistar clientes fiéis” (KOTLER, 2006, p. 153). Desde o início do ciclo de vida de um produto é fundamental impedir que os clientes partam para a concorrência em busca do melhor preço, qualidade do produto e do serviço, ou seduzidos pela imagem de marca. Por isso, deve se apostar na vigilância constante da concorrência, posicionando corretamente as marcas nesses mercados saturados. Todos os estudos mostram que os consumidores são cada vez menos fiéis às marcas. Ousar, com riscos calculados As técnicas de marketing, por muito sofisticadas que sejam, não conseguem suprimir todas as incertezas. O marketing é feito de inovações e, portanto, de riscos. Inovar é tentar oferecer uma mais-valia para o cliente. Segmentar um mercado é decidir especializar-se junto de uma categoria específica de consumidores. Posicionar uma marca é definir um território próprio entre os concorrentes. Comunicar é destacar certos traços distintivos de uma marca, de um produto ou de um serviço. Para se diferenciar num universo extremamente concorrencial é preciso ser audacioso, avaliando, simultaneamente, os riscos já que o investimento financeiro (em P&D, produção, comercialização e comunicação) é, em regra, considerável e a taxa de insucesso elevada. A atitude de marketing deve ser realizada de uma audácia calculada. Cada administrador de marketing deve ser dotado de uma preocupação contabilística, ponderando o risco para o retorno esperado e talvez para isso um diferencial seria ter conhecimento de Finanças, pois dessa forma estaria apto para defender seus interesses em meio a cortes de custos. R evista Brasileira de Administração Científica v.4 ‐ n.3 Set 2013 P á g i n a | 55 ORNELLAS, R. S. Ser constante As empresas cometem um erro gigantesco quando fazem alterações permanentes às políticas de produto de preço, de distribuição e de comunicação. Caso contrário, corre-se o risco de perturbar os distribuidores e consumidores. Os grandes êxitos de marketing baseiam-se neste princípio. Por outro lado, constância não significa imobilidade. É preciso saber adaptar-se às mutações do mercado, ou mesmo antecipá-las, preservando ao mesmo tempo a personalidade das marcas. CONSIDERAÇÕES FINAIS Nessa nova era, o marketing será uma consonância dos três conceitos: identidade, integridade e imagem. Marketing significa definir com clareza sua identidade e fortalecê-la com integridade autêntica para construir uma imagem forte. O marketing 3.0, vivenciado nos dias atuais, é o marketing do significado à missão, à visão e aos valores da organização. Ao definir o marketing dessa forma, o intuito é elevá-lo ainda mais em sua posição, tornando-o um jogador importante no desenvolvimento do futuro estratégico de uma organização. O marketing não deve mais ser considerado apenas como sinônimo de vendas ou ferramenta para gerar demanda, mas a principal esperança de uma organização, a fim de recuperar a confiança do consumidor. Com isso, o administrador do futuro precisa estar munido do conhecimento de várias áreas, a fim de justificar suas ações perante um consumidor altamente preparado, que vivencia um mundo globalizado, que se renova a cada minuto. O administrador de marketing necessitará administrar uma gama de conhecimento que se renova a cada dia com o avanço da internet e das mídias sociais e lembrar de que não somente ele se atualiza, mas também o seu consumidor. Esse conhecimento deve ser baseado simultaneamente em todas as áreas do conhecimento, ou seja, o conhecimento de um administrador de marketing deverá ir muito além de desenvolver boas campanhas, mas deverá descobrir nas entrelinhas o que realmente o seu consumidor deseja hoje, o que desejará amanhã e o que ele falou e fala de você – organização e de seus concorrentes – nos meios em que se comunica. Isso será uma das principais ferramentas no mundo moderno. O administrador de marketing será reconhecido não como meramente um instrumento para a organização – mas como um estrategista que analisa o passado vivenciando o que o futuro nos reserva. REFERÊNCIAS AMBLER, T.. The new dominant logic of marketing: views of the elephant. London: Centre for Marketing of London Business School, 2004. SIMÕES, R.. Marketing básico. São Paulo: Saraiva, 1976. Revista Brasileira de Administração Científica v.4 ‐ n.3 Set 2013 P a g e | 56 Marketing do futuro ou futuro do marketing? ANDERSON, J. V.. 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