Untitled - Filosofia e Sociologia para ENEM e Vestibulares

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Prof. Anderson Pinho
FILOSOFIA MEDIEVAL
1. INTRODUÇÃO
A Idade Média abarca um período tão extenso
que é difícil caracterizá-la sem incorrer no risco da
simplificação. Afinal, são mil anos (de 416 a 1455), entre
a queda do Império Romano do Ocidente e a tomada
de Constantinopla pelos turcos.
A Alta Idade Média, período que se sucedeu à
queda do Império, é caracterizada por um estado de
desagregação da antiga ordem e pela divisão do Império
em diversos reinos bárbaros.
Mas, antes da queda, numa tentativa
desesperada de salvar o Império Romano, em 380 o
imperador Teodósio torna o cristianismo, que já era a
seita religiosa com o maior número de seguidores, a
religião oficial. Desse modo, estabelece-se a ligação
entre Estado e Igreja, pois esta legitima o poder do
Estado, atribuindo-lhe uma origem divina.
Não deu muito certo! O Império caiu, mas a
Igreja Católica (do grego καθολικος /katholikos =
universal) Apostólica, e agora, Romana, emergiu e se
tornou a maior instituição do mundo (até hoje). O
desejo de unidade de poder, de restauração da antiga
unidade perdida, se expressa na difusão do cristianismo
que representa, na Idade Média, o ideal de Estado
universal.
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Poderosa não apenas do ponto de vista
espiritual, mas também político, ninguém melhor do
que ela para dizer como Deus queria que a sociedade
(agora baseada nas relações de suserania e vassalagem
estabelecida entre o senhor feudal e os seus servos)
fosse organizada, legitimando assim, uma sociedade
hierarquizada, desigual e sem mobilidade social.
Definida pelo critério de sangue, quem nascia nobre
morria nobre, quem nascia servo, morria servo.
Nesse contexto, a Igreja exerce enorme
influência, na medida em que mantém o monopólio do
saber, pois são os monges os únicos letrados em um
mundo onde nem os servos nem os nobres sabem ler.
Desde a invasão dos bárbaros, a cultura grecolatina permanecera por muito tempo confinada aos
mosteiros, ressurgindo lentamente após o século VIII,
no período conhecido como renascimento carolíngio,
ocasião em que Carlos Magno mandou fundar inúmeras
escolas junto às igrejas e mosteiros.
Dessa forma, os intelectuais pertencem às
ordens religiosas e, consequentemente, as principais
questões filosóficas referem-se às relações entre fé e
razão, sendo que esta se encontra sempre subordinada
àquela.
Se a fé é o conhecimento mais elevado e o
critério mais adequado da verdade, a filosofia não é a
busca da verdade, pois esta já foi encontrada, mas a ela
cabe apenas o trabalho de demonstração racional dessa
verdade.
No entanto, não devemos considerar todo o
período medieval (sécs. V a XV, portanto mil anos)
como sendo de obscuridade. Em vários momentos, há
expressões diversas de produção cultural às vezes tão
heterogênea que se torna difícil reduzir o período àquilo
que se poderia chamar pensamento medieval.
Uma constante se faz notar no pano de fundo
desse pensamento: a tentativa de conciliar a razão e a fé.
A temática religiosa predomina a preocupação
apologética, isto é, na defesa da fé cristã e no trabalho
de conversão dos não-cristãos.
Nesse cenário de fragmentação, a Igreja surgia
como um elemento de união, crescendo no vácuo que
foi deixado pelo desaparecimento do império. Assim, a
religião surge lentamente como elemento agregador dos
inúmeros reinos bárbaros formados após sucessivas
invasões; seus chefes são pouco a pouco convertidos ao
cristianismo, e a Igreja se transforma em soberana
absoluta da vida espiritual do mundo ocidental.
Ponte entre o homem e Deus, ela teria a última
palavra (a única) sobre como deveria ser a vida de seu
rebanho e sobre o que era o bem e o mal, o certo e o
errado, o justo e o injusto. Seria, portanto, a dona da
mente e, por conseguinte, dos corpos das pessoas.
A máxima predominante é "Crer para
compreender, e compreender para crer". A filosofia,
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embora se distinguindo da teologia, é instrumento
desta, é serva da teologia.
De início os religiosos têm receios quanto à
produção dos gregos, por serem eles pagãos, mas com
as devidas interpretações e adaptações segundo a fé
cristã, o pensamento medieval é fertilizado inicialmente
pelo pensamento de Platão (nas obras da patrística,
sobretudo de Santo Agostinho) e depois pelo de
Aristóteles (no pensamento de Santo Tomás).
Apesar do risco de simplificação, divide-se a
Idade Média em duas tendências fundamentais: a
filosofia patrística e a escolástica.
4. A PATRÍSTICA (Séc. II ao VII)
Na decadência do Império Romano, surge a
partir do século II a filosofia dos Padres da Igreja,
conhecida também como patrística, isto é, dos
primeiros dirigentes espirituais e políticos do
cristianismo, após a morte dos apóstolos.
A patrística resultou do esforço para conciliar a
nova religião com o pensamento filosófico dos gregos
e romanos, pois somente assim seria possível combater
as heresias e justificar a fé para convencer os pagãos da
nova verdade e convertê-los a ela.
A filosofia patrística liga-se, portanto, à
evangelização e à defesa da religião cristã contra os
ataques teóricos e morais que recebia dos antigos.
A patrística introduziu ideias desconhecidas
para os filósofos greco-romanos: a ideia de criação do
mundo a partir do nada, de pecado original do homem,
de Deus como trindade una, de encarnação e morte de
Deus, de juízo final ou de fim dos tempos e ressurreição
dos mortos, etc.
Precisou também explicar como o mal pode
existir no mundo, uma vez que tudo foi criado por
Deus, que é pura perfeição e bondade.
Introduziu, sobretudo com Santo Agostinho, a
ideia de “homem interior”, isto é, da consciência moral
e do livre-arbítrio da vontade, pelo qual o homem, por
ser dotado de liberdade para escolher entre o bem e o
mal, é o responsável pela existência do mal no mundo.
Para impor as ideias cristãs, os padres da Igreja
católica as transformaram em verdades reveladas por
Deus (por meio da Bíblia e dos santos) que, por serem
decretos divinos, seriam dogmas, isto é, verdades
irrefutáveis e inquestionáveis.
Com isso, criou-se uma distinção entre verdades
reveladas ou da fé e verdades da razão ou humanas, ou
seja, entre verdades sobrenaturais e verdades naturais,
as primeiras introduzindo a noção de conhecimento
recebido por uma graça divina, superior ao simples
conhecimento racional. Dessa forma, o grande tema da
filosofia patrística é o da possibilidade ou
impossibilidade de conciliar a razão com a fé.
A esse respeito, havia três posições principais:
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1. os que julgavam fé e razão irreconciliáveis e a
fé superior à razão (diziam eles: “Creio porque
absurdo”);
2. os que julgavam fé e razão conciliáveis, mas
subordinavam a razão à fé (diziam: “Creio para
compreender”);
3. os que julgavam razão e fé irreconciliáveis,
mas afirmavam que cada uma delas tem seu campo
próprio de conhecimento e não devem se misturar (a
razão se refere a tudo o que concerne à vida temporal
dos homens no mundo; a fé, a tudo o que se refere à
salvação da alma e à vida eterna futura).
4.1 SANTO AGOSTINHO
O principal nome da
patrística é Santo Agostinho (354 430), bispo de Hipona, cidade do
norte da África. Viveu no final da
Antiguidade; logo depois Roma cai
nas mãos dos bárbaros, tendo
início o longo período da Idade
Média.
O primeiro grande doutor da igreja foi o cara
mais cachaceiro e raparigueiro que existia na cidade de
Tagaste, uma província romana no norte da África.
Depois de passar por uma grande crise existencial na
qual se perguntava pelo sentido da vida, Agostinho (354
– 430) se converteu ao cristianismo e passou a ser um
grande pregador. Essa crise está descrita em sua obra
autobiográfica As Confissões .
Não via como antagônicas fé e razão, mas
afirmava que para se compreender era necessário crer,
subordinando, portanto, a razão à fé. Apropriou-se de
muitos elementos da filosofia platônica para
fundamentar sua explicação da doutrina cristã. Ele
retoma a dicotomia platônica referente ao mundo
sensível e ao mundo das ideias e substitui esse último
pelas ideias divinas. Muitos autores afirmam que Santo
Agostinho cristianizou Platão.
Assim como Platão julgava o intelecto superior
à matéria, Santo Agostinho pregava a superioridade da
alma ante o corpo, e sendo a alma um presente de Deus,
devíamos nos voltar inteiramente à Ele.
O caminho até Cristo
Todas as fases de sua vida e os acontecimentos
a elas relacionados, em muitos aspectos, mostraram-se
decisivas para a formação espiritual e a evolução do
pensamento filosófico e teológico de Agostinho.
A primeira personalidade que incidiu
profundamente sobre a alma de Agostinho, sem dúvida,
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foi a de sua mãe, Mônica. Foi ela quem, com sua firme
fé e seu coerente testemunho cristão, lançou em certo
sentido as bases e construiu as premissas da futura
conversão do filho, sobre o qual, depois, exerceu
estímulo muito tenaz.
Mônica tinha cultura modesta, mas possuía a
força daquela fé que, na religião pregada por Cristo,
mostra aos humildes as verdades que oculta aos doutos
e sábios.
Assim, as verdades de Cristo vistas através da
forte fé de sua mãe constituíram o ponto de partida da
evolução de Agostinho, embora por diversos anos ele
não aceitasse a religião cristã católica e continuasse a
procurar sua identidade em outras partes.
O segundo encontro fundamental foi com a
obra Ortênsio, de Cicero, que converteu Agostinho à
filosofia quando estudava em Cartago. Nesse escrito,
Cicero defendia um conceito de filosofia entendida e
modo tipicamente helenístico, como sabedoria e arte de
viver que traz a felicidade.
O ardor despertado pelo Ortênsio, entretanto,
era atenuado pelo fato de que nele Agostinho não
encontrava o nome de Cristo.
Agostinho voltou-se então para a Bíblia, mas
não a entendeu. O estilo com o qual estava redigida, tão
diverso do estilo rico em refinamento da prosa
ciceroniana, e o modo antropológico com que parecia
falar de Deus, dificultaram sua compreensão,
constituindo bloqueio insuperável.
Aos dezenove anos (373), Agostinho abraçou o
maniqueísmo, que parecia oferecer-lhe ao mesmo
tempo urna doutrina de salvação em nível racional e um
espaço também para Cristo. O maniqueísmo, uma
religião herética fundada pelo persa Mani no século III,
implicava um vivo racionalismo; um marcado
materialismo; um dualismo radical na concepção do
bem e do mal, entendidos não apenas como princípios
morais, mas também como princípios ontológicos e
cósmicos.
Em seu dualismo extremo, os maniqueístas
chegavam até mesmo a não atribuir o pecado ao livrearbítrio do homem, mas sim ao princípio universal do
mal que atua também em nós.
Mani era oriental e, como tal, abria amplo
espaço para a fantasia e a imaginação. Assim, sua
doutrina revela-se mais próxima das teosofias do
Oriente do que da filosofia dos gregos.
O "racionalismo" dessa religião, considerada
mais tarde herética por Agostinho, estava na eliminação
da necessidade da fé, muito mais do que na explicação
de toda a realidade pela pura razão.
Agostinho, consequentemente, logo foi colhido
por muitas dúvidas. Um encontro com o bispo
maniqueu, Fausto, convenceu-o da insustentabilidade
da doutrina maniqueísta. Ele, que era considerado
como a maior autoridade da seita naquele momento,
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não conseguiu resolver nenhuma das dúvidas de
Agostinho, inclusive admitindo-o sinceramente.
Agostinho se afastava inteiramente do
maniqueísmo, sendo tentado a abraçar a filosofia da
Academia cética, segundo a qual o homem deve
duvidar de tudo, porque não pode ter conhecimento
certo de nada. Mas, outra vez, não se sentiu em
condições de seguir os céticos porque em seus escritos
não encontrava o nome de Cristo.
Entretanto, do maniqueísmo ainda guardava o
materialismo, que lhe parecia o único modo possível de
entender a realidade, e o dualismo, que lhe parecia
explicar os fortes conflitos entre bem e mal que sentia
em seu espirito.
Um encontro decisivo para Agostinho foi com
o bispo Ambrósio, com quem aprendeu o modo
correto de abordar a Bíblia.
O contato com os neoplatônicos revelou-lhe a
realidade do imaterial e a não realidade do mal; Plotino
e Porfirio, sugeriram-lhe finalmente a solução das
dificuldades ontológico-metafisicas em que se
encontrava envolvido.
Além da concepção do incorpóreo e da
demonstração de que o mal não é substância, mas
simples privação, Agostinho também encontrou nos
Platônicos muitos pontos comuns com as Escrituras,
mas, ainda outra vez, neles não encontrou um ponto
essencial, ou seja, que Cristo morreu para a remissão
dos pecados dos homens.
Agostinho não podia encontrar em nenhum dos
filósofos a verdade do Cristo crucificado para a
remissão dos pecados dos homens porque, segundo a
doutrina cristã, Deus quis mantê-la oculta aos sábios
para revela-la aos humildes, sendo, portanto, uma
verdade que, para ser adquirida, requer uma revolução
interior, não de razão, mas de fé. E Cristo crucificado é
precisamente o caminho para operar essa revolução
interior. É sobretudo com Paulo que Agostinho
aprende isso.
Filosofar na fé
Plotino mudou o modo de pensar de
Agostinho, oferecendo-lhe as novas categorias que
iriam romper os esquemas do seu materialismo e de sua
concepção maniqueísta da realidade substancial do mal.
Então, todo o universo e o homem apareceramlhe sob nova luz. Mas a conversão e a fé em Cristo e em
sua Igreja mudaram também o modo de viver de
Agostinho, abrindo-lhe novos horizontes para seu
próprio pensar.
A fé tornou-se substância de vida e pensamento
e, assim, tornou-se não só o horizonte de sua vida, mas
também de seu pensamento. E, estimulado e
comprovado pela fé, seu pensamento adquiriu nova
estatura e nova essência.
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Nascia o filosofar-na-fé, nascia a "filosofia
cristã", amplamente preparada pelos Padres gregos, mas
que só iria chegar ao perfeito amadurecimento com
Agostinho.
A conversão, com a consequente conquista da
fé, foi, com efeito, o eixo em torno do qual passou a
girar todo o pensamento de Agostinho, e, portanto,
constitui o caminho de acesso para a sua compreensão.
Será que se trata de urna forma de fideísmo?
Não, Agostinho está bem distante do fideísmo, que não
deixa de ser urna forma de irracionalismo. A fé não
substitui nem elimina a inteligência; pelo contrário, a fé
estimula e promove a inteligência.
A fé é um modo de pensar assentindo; por isso,
sem pensamento não haveria fé. E analogamente, por
seu turno, a inteligência não elimina a fé, mas a fortalece
e, de certo modo, a clarifica. Em suma pode-se afirmar
que fé e razão são complementares.
Desse modo, nasce aquela posição que, mais
tarde, seria resumida nas formulas "credo ut intelligam" e
"intelligo ut credam", formulas que, de resto, o próprio
Agostinho antecipou na substância e em parte na
forma. A marca mais autentica do seu filosofar está na
concepção de que o homem olha para o que é
verdadeiro tanto com a fé como com a inteligência.
O homem concreto e sua interioridade
Para Agostinho, o verdadeiro grande problema
não é o do cosmo, mas o do homem. O verdadeiro mistério
não é o mundo, mas nós para nós mesmos.
Mas Agostinho não propõe o problema do
homem em abstrato, ou seja, o problema da essência do
homem em geral: o que ele propõe é o problema mais
concreto do eu, do homem como individuo irrepetível,
como pessoa, como individuo, poder-se-ia dizer com
terminologia posterior.
Nesse sentido, o problema de seu eu e o de sua
pessoa tornam-se significativos. Como pessoa, Agostinho
torna-se protagonista de sua filosofia; ao mesmo tempo
observante e observado. Uma comparação com o
filósofo grego a ele mais próximo pode nos mostrar a
grande novidade dessa atitude.
Embora pregue a necessidade de nos retirarmos
das coisas exteriores para o interior de nós mesmos, na
alma, para encontrar a verdade, Plotino fala da alma e
da interioridade do homem em abstrato, ou melhor, em
geral, despojando rigorosamente a alma de sua
individualidade e ignorando a questão concreta da
personalidade. Plotino não apenas nunca falou de si
mesmo em sua própria obra, mas também não queria
falar nem aos amigos.
Agostinho, ao contrário, fala continuamente de
si mesmo. E sua obra-prima são exatamente as
Confissões, nas quais não só fala amplamente dos seus
pais, de sua terra, das pessoas que lhe eram caras, mas
também põe a nu seu espírito em todos os seus mais
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recônditos cantos e em todas as tensões intimas de sua
"vontade".
Estamos aqui bem distantes do intelectualismo
grego, que só havia deixado um escasso espaço para a
"vontade".
Na verdade, Agostinho vale-se ainda também
de formulas gregas para definir o homem,
particularmente a formula de gênese socrática que se
tornou famosa com o Alcibíades de Platão, segundo a
qual o homem "É uma alma que se serve de um corpo".
Nele, porém, tanto o conceito de alma como o
de corpo assumem novo significado em virtude do
conceito de criação (de que falaremos adiante), do
dogma da "ressurreição e, sobretudo, do dogma da
encarnação de Cristo. O corpo torna-se algo bem mais
importante do que o "vão simulacro" de que os
platônicos falavam.
Mas a novidade está sobretudo no fato de que,
para Agostinho, o homem interior é imagem de Deus e da
Trindade. E a problemática da Trindade, centrada
precisamente nas três pessoas e em sua unidade
substancial e, portanto, na temática especifica da
pessoa, mudaria radicalmente a concepção do eu, que,
à medida que reflete as três pessoas da Trindade e sua
unidade, torna-se ele próprio pessoa. E Agostinho
encontra no homem toda uma série de tríades, que
refletem de vários modos a Trindade, tendo no vértice
a tríade ser, conhecer e amar, que espelha as três pessoas
da Trindade e sua estrutura uno-trina.
Assim, Deus se espelha na alma. E "alma" e
"Deus" são os pilares da "filosofia cristã" agostiniana.
Não é indagando o mundo, mas escavando a alma que
se encontra Deus.
A doutrina da iluminação divina
Para se compreender a doutrina agostiniana da
iluminação divina, é importante perceber que, para
Agostinho, existem dois tipos inteiramente diferentes
de conhecimento.
O primeiro, limitado aos sentidos e referente
aos objetos exteriores ou suas imagens, não é
necessário, nem imutável e nem eterno; o segundo,
encontrado na matemática e nos princípios
fundamentais da sabedoria, constitui a verdade.
Essa distinção permite que se indague: Será o
próprio homem a fonte dos conhecimentos perfeitos? Contra a
resposta afirmativa depõe o fato de ser o homem tão
mutável quanto as coisas dadas à percepção. Assim, só
haveria uma resposta possível: a aceitação de que
alguma coisa transcende a alma individual e dá
fundamento à verdade. Seria Deus.
Para explicar como é possível ao homem
receber de Deus o conhecimento das verdades eternas,
Agostinho elabora a doutrina da iluminação divina.
Trata-se de uma metáfora recebida de Platão, que na
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célebre alegoria da caverna mostra ser o conhecimento,
em última instância, o resultado do bem, considerado
como um sol que ilumina o mundo inteligível.
Agostinho louva os platônicos por ensinarem
que o princípio espiritual de todas as coisas é, ao mesmo
tempo, causa de sua própria existência, luz de seu
conhecimento e regra de sua vida.
Por conseguinte, todas as proposições que se
percebem como verdadeiras seriam tais porque
previamente iluminadas a extrair da alma sua própria
inteligibilidade e nada se poderia conhecer
intelectualmente que já não se possuísse antes, de modo
infuso.
Ao afirmar esse saber prévio, Agostinho
aproxima-se da doutrina platônica segundo a qual todo
conhecimento é reminiscência. Não obstante as
evidentes ligações entre os dois pensadores, Agostinho
afasta-se, porém, de Platão ao entender a percepção do
inteligível na alma não como descoberta de um
conteúdo passado, mas como irradiação divina no
presente.
Assim, nenhum conhecimento verdadeiro pode
ser introduzido na mente de um indivíduo vindo de
fora, por meio do ensino, da reflexão ou da observação
do mundo.
O saber sobre as formas dos seres e objetos,
sobre a matéria em geral, os conceitos geométricos e
matemáticos, as virtudes, as emoções encontram-se na
alma, porque ela se origina da substância divina. Os
conhecimentos de que temos consciência são os que já
encontramos em nossa alma, como que ativados em
nossa memória.
A alma não passaria por uma existência anterior,
na qual contempla as ideias, ao contrário, existiria uma
luz eterna da razão que procede de Deus e atuaria a todo
momento, possibilitando o conhecimento das verdades
eternas. Assim como os objetos exteriores só podem ser
vistos quando iluminados pela luz do Sol, também as
verdades da sabedoria precisariam ser iluminadas pela
luz divina para se tornarem inteligíveis.
A iluminação divina, contudo, não dispensa o
homem de ter um intelecto próprio; ao contrário, supõe
sua existência. Deus não substitui o intelecto quando o
homem pensa o verdadeiro; a iluminação teria apenas a
função de tornar o intelecto capaz de pensar
corretamente em virtude de uma ordem natural
estabelecida por Deus.
Essa ordem é a que existe entre as coisas do
mundo e as realidades inteligíveis correspondentes,
denominadas por Agostinho com diferentes palavras:
ideia, forma, espécie, razão ou regra.
A teoria agostiniana estabelece, assim, que todo
conhecimento verdadeiro é o resultado de um processo
de iluminação divina, que possibilita ao homem
contemplar as ideias, arquétipos eternos de toda a
realidade.
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Aquilo que ignoramos também está na alma, e
simplesmente precisa ser desperto pela memória por
meio da pesquisa em nosso mundo interior. Santo
Agostinho afirmava ainda que as maiores verdades são
atingidas quando a alma é conduzida por Jesus Cristo,
o mestre interior que faz o homem enxergar claramente
aquilo que ele já sabia, sem ter consciência de que sabia,
e que o leva à redenção divina.
Nesse tipo de conhecimento a própria luz
divina não é vista, mas serve apenas para iluminar as
ideias. Um outro tipo seria aquele no qual o homem
contempla a luz divina, olhando o próprio sol: a
experiência mística.
Deus
Alcançando a Verdade, o homem também
alcança Deus, ou estará Ele ainda acima da Verdade?
Agostinho entende "Verdade" em muitos significados.
Quando a entende em seu significado mais forte, ou
seja, como Verdade suprema, ela coincide com Deus.
Por conseguinte, a demonstração da
existência da certeza e da Verdade coincide com a
demonstração da existência de Deus.
Como os estudiosos já observaram há tempo,
todas as provas que Agostinho fornece da existência de
Deus reduzem-se, em última análise, ao esquema das
argumentações acima expostas. Primeiro passa-se da
exterioridade das coisas à interioridade do espirito
humano, depois da Verdade que está presente no
espirito ao Princípio de toda verdade, que é
precisamente Deus.
Agostinho não demonstra Deus como, por
exemplo, o demonstra Aristóteles, ou seja, com
intenções puramente intelectuais e a fim de explicar o
cosmo, mas sim para "fruir a Deus", e, portanto, para
amá-lo, para preencher o vazio do seu espírito, para pôr
fim à inquietude do seu coração, para ser feliz.
Ser, Verdade, Bem (e Amor) são os atributos
essenciais de Deus para Agostinho. Ele se exprime com
clareza, unindo a ontologia grega com a revelação
bíblica. Os gregos tinham dito que Deus é o ser
supremo (a substância primeira), na Bíblia Deus diz de
si mesmo: "Eu sou o que sou". Justamente enquanto ser
supremo, Deus, criando as coisas, participa com eles o
ser, mas não o Ser sumo como ele é, e sim um ser com
diferentes graus em escala hierárquica.
Apesar de todas estas noções, permanece claro
para Agostinho que é impossível para o homem uma
definição da natureza de Deus e que, em certo sentido,
é mais fácil saber aquilo que ele não é do que aquilo que
ele é. No entanto, Deus é todo o positivo que se
encontra na criação, sem os limites que nela existem.
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A Trindade
Todavia, este Deus, que é "Aquele que é", para
Agostinho é essencialmente Trindade. A esse tema ele
dedica um de seus livros mais profundos, que, sob
vários aspectos, se impôs como sua obra-prima
doutrinaria.
Devemos salientar três núcleos particularmente
importantes dessa obra.
a) O conceito básico sobre o qual ele alicerça
sua interpretação é a identidade substancial das três Pessoas.
Os gregos, precisa Agostinho, para exprimir
conceitualmente a Trindade falaram de "uma essência,
e três substâncias"; os latinos, porém, falam de "uma
essência ou substância, e três Pessoas", porque, para os
latinos, essência e substância são considerados sinônimos.
Todavia, mesmo com essa diferença
terminológica, uns e outros pretenderam dizer a mesma
coisa. Isto implica que Pai, Filho e Espirito Santo
tenham justamente uma substancial igualdade e não
sejam hierarquicamente distinguíveis. Deus, portanto,
em sentido absoluto, é tanto o Pai, como o Filho e como o
Espirito Santo, eles são inseparáveis no Ser e operam
inseparavelmente.
Portanto, não havendo diferença ontológica e
hierárquica nem diferença de funções, a igualdade
absoluta das três Pessoas implica que a Trindade seja "o
único verdadeiro Deus".
b) Agostinho realiza a distinção entre as Pessoas
com base no conceito de relação. Isto significa que, para
Agostinho, cada uma das três Pessoas é distinta das
outras, mas não ontologicamente diversa. O Pai tem o
Filho mas não é o Filho, e o Filho tem o Pai, mas não é
o Pai; e o mesmo se diga do Espirito Santo.
Tais atributos, portanto, não pertencem à
dimensão do ser e da substância, e sim, justamente, da
relação. Mas nem por isso se reduzem ao nível de meros
acidentes. Os acidentes são atributos mutáveis, enquanto
o tipo de relação que distingue as três Pessoas da
Trindade não é mutável e se coloca na dimensão da
eternidade.
c) Um terceiro ponto fundamental da doutrina
trinitária agostiniana consiste nas analogias triádicas que
ele descobre no criado, as quais, de simples vestigios da
Trindade nas coisas e no homem exterior, tornam-se,
na alma humana, verdadeira imagem da própria
Trindade, como já vimos.
Entre as muitas analogias, recordemos duas.
Todas as coisas criadas apresentam unidade, forma e
ordem, tanto as coisas corpóreas como as almas
incorpóreas. Ora, assim como das obras remontamos
ao Criador, que é Deus uno e trino, podemos considerar
essas três características como vestígios de si deixados
pela Trindade em sua obra.
Analogamente, em um nível mais alto, a mente
humana é imagem da Trindade, porque também é unae-trina, no sentido que é mente e, como tal, conhece-se a
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si mesma e ama-se a si mesma. Portanto, a "mente", o
seu "conhecimento" e o "amor" são três coisas e ao
mesmo tempo não são mais que uma, e, quando são
perfeitas, coincidem.
Na investigação das analogias trinitárias do
espirito humano está uma das maiores novidades de
Agostinho em relação a esse tema.
Conhecimento do homem e conhecimento de
Deus Uno-Trino iluminam-se mutuamente, quase que
como em um espelho, de modo admirável, realizando
perfeitamente o projeto do filosofar agostiniano,
conhecer Deus e a própria alma, Deus através da alma,
a alma através de Deus.
A criação
O problema metafisico que mais preocupara os
antigos era o da derivação do múltiplo a partir do Uno.
Por que e como os múltiplos derivaram do Uno (ou de
algumas realidades originarias)? Por que e como, do Ser
que não pode não-ser, nasceu também o devir, que
implica a passagem de ser a não-ser e vice-versa?
Ao tentar resolver esses problemas, nenhum
dos antigos filósofos chegou ao conceito de criação,
que, como sabemos, é de origem bíblica.
Os Platônicos foram os filósofos que chegaram
às posições menos distantes do criacionismo.
Entretanto, mesmo assim, ainda permaneceu
significativa a distância entre suas posições e o
criacionismo bíblico.
No Timeu, Platão havia introduzido a figura do
demiurgo. Entretanto, embora sendo racional, livre e
motivada pela causa do bem, a atividade do demiurgo é
gravemente limitada, tanto acima como abaixo dele.
Acima do demiurgo está o mundo das Ideias, que o
transcende e no qual ele se inspira como em um
modelo; abaixo, ao contrário, está a chora ou matéria
informe, também eterna como as Ideias e como o
próprio demiurgo.
A obra do demiurgo, portanto, é obra de
fabricação e não de criação, porque pressupõe como
preexistente e independente aquilo de que se vale para
construir o mundo.
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Plotino, no entanto, deduziu as Ideias e a
própria matéria do Uno, muito engenhosamente, do
modo como vimos. Todavia, seu impulso o levou aos
limites de um verdadeiro acosmismo e, oportunamente
reformadas, suas categorias poderiam servir para
interpretar a dialética da trindade, mas não para
interpretar a criação do mundo.
A solução criacionista, que, para Agostinho, é
ao mesmo tempo verdade de fé e de razão, revela-se de
uma clareza exemplar. A criação das coisas se dá do nada
(ex nihilo), ou seja, não da substância de Deus nem de algo
que preexistia.
Com efeito, explica Agostinho, que uma
realidade pode derivar de outra de três modos:
a) por geração, caso em que deriva da própria
substância do gerador como o filho deriva do pai,
constituindo algo de idêntico ao gerador;
b) por fabricação, caso em que a coisa que é
fabricada deriva de algo preexistente fora do fabricante
(de uma matéria), como ocorre com todas as coisas que
o homem produz;
C) por criação a partir do nada absoluto, ou seja, não
da própria substância nem de uma substância externa.
O homem sabe "gerar" (os filhos) e sabe
"produzir" (os artefatos), mas não sabe "criar", porque é
um ser finito. Deus "gera" de sua própria substância o
Filho, que, como tal, é idêntico ao Pai, ao passo que
"cria" o cosmo do nada. Portanto, há diferença enorme
entre "criação" e "geração”, porque, diferentemente da
primeira, esta última pressupõe o vir (a ser) por outorga
de ser por parte do criador para "aquilo que
absolutamente não existia". E tal ação é "dom divino"
gratuito, devido a livre vontade e à bondade de Deus,
além de sua infinita potência.
A doutrina das Ideias e as razões seminais
As Ideias têm um papel essencial na criação.
Mas, de paradigmas absolutos fora e acima da mente do
demiurgo, como eram em Platão, elas se transformam,
como já dissemos, em "pensamentos de Deus" ou
também como "Verbo de Deus".
Agostinho declara a teoria das Ideias como um
pilar absolutamente fundamental e irrenunciável,
porque está intrinsecamente vinculada à doutrina da
criação.
Deus, com efeito, criou o mundo conforme a
razão e, portanto, criou cada coisa conforme um
modelo que ele próprio produziu como seu
pensamento, e as Ideias são justamente estes
pensamentos-modelo de Deus, e como tais são a
verdadeira realidade, ou seja, eternas e imutáveis, e por
participação delas existem todas as coisas.
Mas Agostinho utiliza, para explicar a criação,
além da teoria das Ideias, também a teoria das "razões
seminais", criada pelos Estóicos e posteriormente
retomada e reelaborada em bases metafisicas por
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Plotino. A criação do mundo ocorre de modo
simultâneo. Mas Deus não cria a totalidade das coisas
possíveis como já concretizadas, ele insere no criado as
"sementes" ou "germes" de todas as coisas possíveis, as
quais, posteriormente, ao longo do tempo,
desenvolvem-se pouco a pouco, de vários modos e com
o concurso de várias circunstâncias.
Em suma, juntamente com a matéria, Deus criou
virtualmente todas as possibilidades de sua concretização,
infundindo nela, precisamente, as raízes seminais de cada coisa.
A evolução do mundo ao longo do tempo outra coisa
não é do que a concretização e a realização de tais
"razões seminais" e, portanto, um prolongamento da
ação criadora de Deus.
O tempo
"O que fazia Deus antes de criar o céu e a
terra?". Essa foi a pergunta que levou Agostinho a uma
análise do tempo e o conduziu a soluções geniais, que
se tornaram muito famosas.
Antes de Deus criar o céu e a terra não havia
tempo e, portanto, como já indicamos, não se pode falar
de um "antes" anterior à criação do tempo. O tempo é
criação de Deus e, por isso, a pergunta proposta não
tem sentido, pois põe para Deus uma categoria que vale
só para a criatura, cometendo-se assim um erro
estrutural.
"Tempo" e "eternidade" são duas dimensões
incomensuráveis; muitos dos erros cometidos pelos
homens, quando falam de Deus, como na pergunta
proposta acima, nascem da aplicação indevida do
conceito de tempo ao eterno, que é coisa totalmente
diferente de tempo.
Mas o que é o tempo?
O tempo implica passado, presente e futuro.
Mas o passado não é mais e o futuro não é ainda. E o
presente, "se existisse sempre e não transcorresse no
passado, não seria mais tempo, mas eternidade". Na
realidade, o ser do presente é um contínuo deixar de ser,
um tender continuamente ao não-ser.
Agostinho destaca que, na realidade, o tempo
existe no espirito do homem, porque é no espirito do homem
que se mantêm presentes tanto o passado como o
presente e o futuro. Mais propriamente, deveríamos
dizer que "os tempos são três: o presente do passado, o
presente do presente e o presente do futuro. E, de
qualquer forma, é em nosso espírito que se encontram
esses três tempos, que não são vistos em outra parte: o
presente do passado, vale dizer, a memória; o presente do
presente, isto é, a intuição; o presente do futuro, ou seja,
a espera".
Assim, embora tendo urna ligação com o
movimento, o tempo não está no movimento e nas
coisas em movimento, mas sim na alma. Mais
precisamente, conforme se revela estruturalmente
ligado à memória, à intuição e à espera, o tempo pertence à
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alma, sendo predominantemente "uma extensão da
alma", precisamente urna extensão entre "memoria",
"intuição" e "espera".
O problema do mal
Ao problema da criação está ligado o grande
problema do mal, para o qual Agostinho conseguiu
apresentar urna explicação que constituiu ponto de
referência durante séculos e ainda guarda a sua validade
Se tudo provém de Deus, que é Bem, de onde provém
o mal?
Depois de ter sido vítima da explicação dualista
maniqueísta, como vimos, Agostinho encontrou em
Plotino a chave para resolver a questão: o mal não é um
ser, mas deficiência e privação de ser.
Mas Agostinho aprofunda ainda mais a questão.
O problema do mal pode ser examinado em três planos:
a) Do ponto de vista metafísico-ontológico,
não existe mal no cosmo, mas apenas graus inferiores de
ser em relação a Deus, que dependem da finitude da coisa
criada e dos diferentes níveis dessa finitude.
Mas, mesmo aquilo que, numa consideração
superficial, parece um "defeito" (e, portanto, poderia
parecer um mal), na realidade, na ótica do universo visto
em seu conjunto, desaparece. De fato, os graus
inferiores do ser e as coisas finitas, mesmo as mais
ínfimas, revelam-se momentos articulados de um
grande conjunto harmônico. Quando, por exemplo,
julgamos que a existência de certos animais nocivos seja
um "mal", na realidade nós estamos medindo com o
metro da nossa utilidade e da nossa vantagem
contingente e, portanto, numa ótica errada.
Medida com o metro do todo, cada coisa,
mesmo aquela aparentemente mais insignificante, tem
seu sentido e sua razão de ser e, portanto, constitui algo
positivo.
b) Já o mal moral é o pecado. E o pecado
depende da má vontade. E a má vontade depende de que?
A resposta de Agostinho é bastante engenhosa.
A má vontade não tem uma "causa eficiente",
mas, muito mais, uma "causa deficiente". Por sua
natureza, a vontade deveria tender ao Bem supremo.
Mas, como existem muitos bens criados e finitos, a
vontade pode tender a eles e, subvertendo a ordem
hierárquica, pode preferir a criatura a Deus, preferindo
os bens inferiores aos bens superiores. Sendo assim, o
mal deriva do fato de que não há um único Bem, mas muitos
bens, consistindo, precisamente, em urna escolha
incorreta entre esses bens.
O mal moral, portanto, é urna aversão a Deus e
uma escolha de um ser inferior ao invés do ser supremo.
O fato de ter recebido de Deus uma vontade livre é um
grande bem. O mal é o mau uso desse grande bem, que
se dá do modo que vimos.
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Por isso, Agostinho pode dizer: "O bem que
está em mim é obra tua, é teu dom; o mal em mim é
meu pecado".
C) O mal físico, como as doenças, os
sofrimentos, os tormentos do espirito e a morte, tem
significado bem preciso para quem filosofa na fé: é a
consequência do pecado original, ou seja, é uma consequência
do mal moral. Na história da salvação, porém, também
ele tem um significado positivo.
A vontade, liberdade e a graça
A atormentada vida interior de santo Agostinho
e sua formação espiritual, realizada inteiramente na
cultura latina, que dava à voluntas um relevo
desconhecido para os gregos, permitiram-lhe entender
a mensagem bíblica precisamente em sentido
"voluntarista", fora dos esquemas intelectualistas do
mundo grego. De resto, Agostinho foi o primeiro
escritor a nos apresentar os conflitos da vontade em termos
precisos.
A liberdade é própria da vontade e não da razão,
no sentido em que a entendiam os gregos. E assim se
resolve o antigo paradoxo socrático de que é impossível
conhecer o bem e fazer o mal.
A razão pode conhecer o bem e a vontade pode
rejeita-lo, porque, embora pertencendo ao espirito
humano, a vontade é uma faculdade diferente da razão, tendo
urna autonomia própria em relação à razão, embora seja
a ela ligada. A razão conhece e a vontade escolhe,
podendo escolher até o irracional, ou seja, aquilo que
não está em conformidade com a reta razão. E desse
modo se explica a possibilidade da aversão a Deus e a
escolha de um ser inferior ao invés do ser supremo.
O pecado original foi um pecado de soberba,
sendo o primeiro desvio da vontade. O arbítrio da
vontade é verdadeiramente livre, em sentido pleno, quando não
faz o mal. Esta é, precisamente, a sua condição natural:
assim ele foi dado ao homem originalmente. Mas,
depois do pecado original, a verdade se corrompeu e se
enfraqueceu, tornando-se necessitada da graça divina.
Consequentemente, o homem não pode ser
"autárquico" em sua vida moral, ele necessita de tal
ajuda divina. Portanto, quando o homem procura viver
retamente valendo-se unicamente de suas próprias forças, sem
ajuda da graça divina libertadora, então ele é vencido
pelo pecado; liberta-se do mal com o poder de crer na
graça que o salva, e com a livre escolha dessa graça.
As duas cidades
Contemporâneo do declínio do Império
Romano, Agostinho respondeu à acusação de que fora
o cristianismo o culpado pela queda, e pôs a culpa no
paganismo. Sua resposta veio na obra Cidade de Deus ,
onde, segundo ele, há a cidade espiritual de Deus e a
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cidade material dos homens. Elas não coexistem
separadamente, mas no plano de nossa existência a
depender de nossa vontade de viver uma vida de
pecado na cidade terrena dos homens, ou se voltar para
deus e viver em sua graça como um de seus servos.
O mal é amor a si mesmo (soberba), o bem é
amor a Deus. Isso vale tanto para o homem como
individuo quanto para o homem que vive em
comunidade com os outros.
O conjunto dos homens que vivem para Deus
constitui a Cidade celeste. Escreve Agostinho:
"Dois amores diversos geram as duas cidades: o
amor a si mesmo, levado até o desprezo por Deus,
gerou a Cidade terrena. O amor a Deus, levado até o
desprezo por si, gerou a Cidade celeste. Aquela gloriase de si mesma, esta de Deus. Aquela procura a gloria
dos homens, esta tem por máxima glória a Deus".
E ainda:
"A Cidade terrena é a cidade daqueles que
vivem segundo o homem; a divina é a daqueles que
vivem segundo Deus".
As duas Cidades têm um correspondente no
céu, mais precisamente nas fileiras dos anjos rebeldes e
dos que permaneceram fiéis a Deus. Na terra, essa
correspondência revelou-se em Caim e Abel; as duas
personagens bíblicas assumem assim o valor de
símbolos das duas Cidades.
Nesta terra, o cidadão da Cidade terrena parece
ser o dominador, enquanto o cidadão da Cidade celeste
é peregrino. Mas o primeiro está destinado a eterna
danação, enquanto o segundo está destinado eterna
salvação.
Ou seja, todos têm uma dimensão terrena que
se refere à sua história natural, à moral, às necessidades
materiais e que diz respeito a tudo que é perecível e
temporal. Outra dimensão é a celeste, que corresponde
à comunidade dos cristãos, inspirada no amor a Deus e
que vive da fé.
A história se concluirá com o Dia do Senhor,
que será como que o oitavo dia consagrado com a
ressurreição de Cristo e no qual se realizará, em sentido
global, o repouso eterno.
Assim, a história adquire um sentido totalmente
desconhecido para os gregos, pois ela tem um princípio,
com a criação, e um termo, com o fim do mundo, ou
seja, com o juízo final e com a ressurreição. E tem três
momentos essenciais, que marcam o seu decurso: o
pecado original com suas consequências, a espera da
vinda do Salvador e a encarnação e paixão do Filho de
Deus, com a constituição de sua Igreja.
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que marca toda a Idade Média e significa o confronto
entre o poder do Estado e o da Igreja, considerando a
superioridade do poder espiritual sobre o temporal.
Percebam que a boa vida não é mais aquela
voltada para o desenvolvimento da racionalidade
humana dentro de uma comunidade política, cujo Bem
era encontrado por meio da razão e ensinado por meio
de um processo educacional virtuoso, como teorizaram
os gregos.
Agora, o conhecimento do bem não dependia
mais de uma instrução racional, mas apenas da vontade
individual de cada um, por meio do livre-arbítrio, de
viver uma vida voltada para Deus. E a compreensão de
como vivê-la é obra da graça divina que ilumina o
coração de quem estiver aberto para isso.
Mas quem dizia o que era ter uma vida voltada
para Deus? E ainda, quais pessoas viviam dessa
maneira? A Igreja. Aí meu amigo, deu no que deu.
Leitura complementar
O saber e a iluminação divina
Nosso saber consta de coisas que vemos e
coisas em que acreditamos; das primeiras, somos
testemunhas diretas, das segundas, temos o testemunho
idôneo de outros que nos fazem crer porque, por meio
de palavras e escritos, nos oferecem sinais dessas coisas
que não vemos. Podemos com razão dizer que há saber
quando cremos em algo com certeza e dizemos que
vemos com a mente essas coisas nas quais cremos,
ainda que não estejam presentes aos nossos órgãos dos
sentidos [...] Realmente, a fé se vê com a mente [...] Por
isso o apóstolo Pedro diz: “Aquele em quem agora crês,
não o vês”; e disse o Senhor: “Bem-aventurados os que
não viram e creram”. [...] Terás, assim, reconhecido a
diferença entre ver com os olhos do corpo e com os
olhos da mente [...] Crer se realiza com a mente e se vê
com a mente e as coisas em que com essa fé cremos
distam do olhar de nossos olhos. Por isso vejo a minha
fé, mas não posso ver a tua, assim como tu vês a tua fé
e não podes ver a minha, pois ninguém sabe o que se
passa no espírito que está em cada homem até que
venha o Senhor e ilumine os segredos das trevas e
manifeste os pensamentos do coração para que cada um
possa ver não somente os seus, mas também os alheios.
SANTO AGOSTINHO. Carta a Paulina. In: FERNÁNDEZ,
Clemente (Org.). Los filósofos medievales. Selección de textos.
Madrid: Editorial Católica, 1979.p. 493-494. Texto traduzido.
Para Santo Agostinho, a relação entre as duas
dimensões é de ligação e não de oposição, mas a
repercussão do seu pensamento, à revelia do autor,
desemboca na doutrina chamada agostinismo político,
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QUESTÕES
1. (UEM 2008) A Patrística foi a Filosofia Cristã dos
primeiros séculos de nossa era. Consistia na elaboração
doutrinal das crenças religiosas do cristianismo e na sua
defesa contra os ataques dos pagãos e contra as
heresias. Dado o encontro entre a nova religião e o
pensamento filosófico greco-romano, o grande tema da
Filosofia Patrística foi o da possibilidade ou
impossibilidade de conciliar fé e razão. Santo
Agostinho, expoente dessa filosofia, sobre a relação fé
e razão, defendia a tese que se pode resumir nesta frase:
“Credo ut intelligam” (Creio para entender).
A esse respeito, assinale o que for correto.
01) Santo Agostinho retoma a célebre teoria platônica
das Idéias à luz do cristianismo e formula a teoria da
iluminação segundo a qual o homem recebe de Deus o
conhecimento das verdades eternas: à semelhança do
sol, Deus ilumina a razão e torna possível o pensar
correto.
02) De acordo com Santo Agostinho, a razão é superior
e precede a fé; pois, se o homem, ser racional, for
incapaz de entender os ensinamentos religiosos, não
poderá acreditar neles.
04) Segundo Santo Agostinho, a fé não conflita com a
razão, esta última seria auxiliar da fé e estaria a ela
subordinada.
08) Para Santo Agostinho, fé e razão são inconciliáveis,
pois os mistérios da fé são insondáveis e manifestam-se
como uma loucura para a razão humana.
16) A fé, para Santo Agostinho, não oprime a razão,
mas, ao contrário, abre-lhe os olhos que a falta de fé
mantinha fechados. A partir dos princípios da fé, a
razão, por suas próprias forças, deduzirá conseqüências
e tentará resolver os problemas que Deus deixou para
nossas livres discussões.
2. (UEM 2009) A patrística surge no séc. II d.c. e
estende-se por todo o período medieval conhecido
como alta Idade Média. É considerada a filosofia dos
Padres da Igreja. Entre seus objetivos encontramos a
conversão dos pagãos, o combate às heresias e a
consolidação da doutrina cristã.
Sobre a patrística, assinale o que for correto.
01) A patrística deixa de ser predominante como
doutrina do cristianismo quando, a partir do séc. IX,
surge uma nova corrente filosófica denominada
escolástica, que atinge o apogeu no séc XIII.
02) Fundador da patrística, o apóstolo São Paulo
escreveu o livro Confissões, razão pela qual é considerado
o primeiro filósofo cristão.
04) Vários pensadores da patrística, entre eles Santo
Agostinho, tomam ideias da filosofia clássica grega,
particularmente de Platão, que são adaptadas às
necessidades das verdades expressas pela teologia cristã.
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08) A aliança que a patrística estabelece entre fé e razão
caracteriza-se por um predomínio da fé sobre a razão;
em Santo Agostinho, a razão é auxiliar da fé e a ela
subordinada.
16) A leitura dos filósofos árabes, entre eles Averróis,
ajudou Santo Agostinho a compreender os princípios
da filosofia de Aristóteles, sem a qual Santo Agostinho
não poderia construir seu próprio sistema filosófico.
3. (UEM 2010) A Filosofia patrística, representada
principalmente por Santo Agostinho, inicia no séc. I
d.C. e termina no séc. VIII d.C., quando teve início a
Filosofia medieval.
Com base na afirmação acima, assinale o que for
correto.
01) Um dos motivos pelo qual Santo Agostinho escreve
A cidade de Deus foi para eximir o cristianismo, depois
da tomada de Roma por Alarico, das acusações de ser a
causa da decadência do Império Romano.
02) A patrística introduziu, no pensamento filosófico,
ideias desconhecidas pelos filósofos greco-romanos,
como a ideia de criação do mundo a partir do nada, a
escatologia do fim dos tempos e a ressurreição dos
mortos.
04) A patrística é um esforço para conciliar o
cristianismo com o pensamento filosófico dos gregos e
romanos, pois acreditava que somente com tal
conciliação seria possível a conversão dos pagãos.
08) Um dos principais temas da Filosofia patrística é o
da possibilidade ou impossibilidade de conciliar razão e
fé. Santo Agostinho considerava que a razão e a fé são
conciliáveis, mas subordinava a razão à fé.
16) A Filosofia medieval conserva e discute problemas
da patrística e acrescenta outros, como o problema dos
universais. A partir do séc. XII, a Filosofia medieval
passa a ser chamada de escolástica.
4. (UFU 2014) Segundo Chauí (2000),
[...] na Idade Média o pensamento estava subordinado
ao princípio da autoridade, isto é, uma ideia é
considerada verdadeira se for baseada nos argumentos
de uma autoridade reconhecida [...]
CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2000, p. 45.
Sobre a filosofia da Idade Média é INCORRETO
afirmar que
A) A filosofia se tornou serva do cristianismo e, com
isso, rejeitou a filosofia pagã, Platão e Aristóteles.
B) O tema principal de que se ocupou a filosofia na
Idade Média foi o das relações entre a razão e a fé.
C) Para essa filosofia, a fé na revelação proporciona o
conhecimento mais elevado, superior àquele da razão.
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D) A doutrina da iluminação divina explica como a
filosofia pagã provém das mesmas fontes das verdades
cristãs.
5. (UFU 2012) Na medida em que o Cristianismo se
consolidava, a partir do século II, vários pensadores,
convertidos à nova fé e, aproveitando-se de elementos
da filosofia greco-romana que eles conheciam bem,
começaram a elaborar textos sobre a fé e a revelação
cristãs, tentando uma síntese com elementos da
filosofia grega ou utilizando-se de técnicas e conceitos
da filosofia grega para melhor expor as verdades
reveladas do Cristianismo. Esses pensadores ficaram
conhecidos como os Padres da Igreja, dos quais o mais
importante a escrever na língua latina foi santo
Agostinho.
COTRIM, Gilberto. Fundamentos de Filosofia: Ser, Saber e Fazer. São Paulo:
Saraiva, 1996, p. 128. (Adaptado)
Esse primeiro período da filosofia medieval, que durou
do século II ao século X, ficou conhecido como
A) Escolástica.
B) Epicurismo
C) Neoplatonismo.
D) Antiguidade tardia.
E) Patrística.
6. (UFU 2010) A filosofia de Agostinho (354 – 430) é
estreitamente devedora do platonismo cristão milanês:
foi nas traduções de Mário Vitorino que leu os textos
de Plotino e de Porfírio, cujo espiritualismo devia
aproximá-lo do cristianismo. Ouvindo sermões de
Ambrósio, influenciados por Plotino, que Agostinho
venceu suas últimas resistências (de tornar-se cristão).
PEPIN, Jean. Santo Agostinho e a patrística ocidental. In: CHÂTELET, François
(org.) A Filosofia medieval. Rio de Janeiro Zahar Editores: 1983, p. 77.
Apesar de ter sido influenciado pela filosofia de Platão,
por meio dos escritos de Plotino, o pensamento de
Agostinho apresenta muitas diferenças se comparado
ao pensamento de Platão.
Assinale a alternativa que apresenta, corretamente, uma
dessas diferenças.
A) Para Agostinho, é possível ao ser humano obter o
conhecimento verdadeiro, enquanto, para Platão, a
verdade a respeito do mundo é inacessível ao ser
humano.
B) Para Platão, a verdadeira realidade encontra-se no
mundo das Ideias, enquanto para Agostinho não existe
nenhuma realidade além do mundo natural em que
vivemos.
C) Para Agostinho, a alma é imortal, enquanto para
Platão a alma não é imortal, já que é apenas a forma do
corpo.
D) Para Platão, o conhecimento é, na verdade,
reminiscência, a alma reconhece as Ideias que ela
contemplou antes de nascer; Agostinho diz que o
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conhecimento é resultado da Iluminação divina, a
centelha de Deus que existe em cada um.
7. (UFU 2011) Segundo o texto abaixo, de Agostinho
de Hipona (354-430 d. C.), Deus cria todas as coisas a
partir de modelos imutáveis e eternos, que são as ideias
divinas. Essas ideias ou razões seminais, como também
são chamadas, não existem em um mundo à parte,
independentes de Deus, mas residem na própria mente
do Criador, [...] a mesma sabedoria divina, por quem
foram criadas todas as coisas, conhecia aquelas
primeiras, divinas, imutáveis e eternas razões de todas
as coisas, antes de serem criadas [...]. Sobre o Gênese,
V
Considerando as informações acima, é correto afirmar
que se pode perceber:
A) que Agostinho modifica certas ideias do cristianismo
a fim de que este seja concordante com a filosofia de
Platão, que ele considerava a verdadeira.
B) uma crítica radical à filosofia platônica, pois esta é
contraditória com a fé cristã.
C) a influência da filosofia platônica sobre Agostinho,
mas esta é modificada a fim de concordar com a
doutrina cristã.
D) uma crítica violenta de Agostinho contra a filosofia
em geral.
8. (UFU 2011) A filosofia grega se expandiu para além
das fronteiras do mundo helênico e influenciou outros
povos e culturas. Com o cristianismo não foi diferente
e, aos poucos, a filosofia foi absorvida. Conforme
Chalita, um dos motivos dessa absorção foi: [...] a
necessidade de organizar os ensinamentos cristãos, de
reunir os fatos e conceitos do cristianismo sob a forma
de uma doutrina e elaborar uma teologia rigorosa.
(CHALITA, G. Vivendo a Filosofia. São Paulo: Ática, 2006, p.
94.)
Uma das características da patrística é a busca
da conciliação entre a fé e a filosofia, e Agostinho de
Hipona, ou Santo Agostinho (354 d.C. – 430 d.C.),
influenciado pelo neoplatonismo, tornou-se uma
referência para a filosofia cristã. Em relação ao
desenvolvimento das ciências naturais, porém, o
pensamento de Agostinho não deu grande impulso uma
vez que sua filosofia – tal como a do mestre Platão –
não adotava os fenômenos naturais como objeto de
reflexão.
Com base nos textos acima e em seus
conhecimentos sobre a obra de Agostinho de Hipona,
assinale a alternativa INCORRETA.
A) Agostinho de Hipona criou a doutrina da iluminação
divina baseado na teoria da reminiscência de Platão,
conciliando de modo original a fé cristã e o pensamento
filosófico.
11
Prof. Anderson Pinho
B) A observação, a experimentação e a aplicação dos
princípios da geometria sobre os fenômenos naturais
foi uma das principais características da filosofia de
Santo Agostinho.
C) Conforme Agostinho de Hipona, a filosofia grega é
um instrumento útil para a fé cristã.
D) As verdades eternas e imutáveis, que têm sua sede
em Deus, só podem ser alcançadas pela iluminação
divina.
9. Para Santo Agostinho, o homem chega a verdade:
A) Apenas pela fé em Deus,
B) Pelo método alegórico aplicado à interpretação da
Bíblia,
C) Pela iluminação divina,
D) Pela recordação da alma que estava junto a Deus,
E) Pelos sentidos e pelo intelecto.
10. "Assim até as coisas materiais emitem um juízo
sobre as suas formas, comparando-as àquela Forma da
eterna Verdade e que intuímos com o olhar de nossa
mente."
(Sto. Agostinho, A Trindade, Livro IX,Capítulo 6. São Paulo,
Paulus, 1994. p. 299)
Esta frase de Sto. Agostinho refere-se à
A) teologia mística de Agostinho, que se funda na
experiência imediata da alma humana com Deus;
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alcançada na transcendência da existência terrena para
a vida eterna.
B) A teoria da Iluminação, tal como sugere o nome, está
fundamentada na luz de Deus, luz interior dada ao
homem interior na busca da verdade das coisas que não
são conhecidas pelos sentidos; esta luz é Cristo, que
ensina e habita no homem interior.
C) Agostinho foi contemporâneo da Terceira
Academia, recebendo os ensinamentos de Arcesilau e
Carnéades, o que resultou na posição dogmática do
filósofo cristão quanto à impossibilidade do
conhecimento da verdade, sendo o conhecimento
humano apenas verossímil.
D) A alma é a morada da verdade, todo conhecimento
nela repousa. Assim, a posição de Agostinho afasta-se
da filosofia platônica, ao admitir que a alma possui uma
existência anterior, na qual ela contemplou as ideias, de
modo que o conhecimento de Deus é anterior à
existência.
12. Sobre a doutrina da iluminação divina de Santo
Agostinho, considere o conteúdo das assertivas abaixo:
I) A iluminação divina dispensa o homem de ter
intelecto próprio.
II) A iluminação divina capacita o intelecto humano
para entender que há determinada ordem entre o
mundo criado e as realidades inteligíveis.
B) moral agostiniana que propõe ao homem regras para
uma vida santa e ascética, apartada do mundo;
III) Agostinho nomeia as realidades inteligíveis de
forma pouco precisa como, por exemplo, idéia, forma,
espécie, regra ou razão e afirma, platonicamente, que
essas realidades já foram contempladas pela alma.
C) doutrina da iluminação que afirma que o
conhecimento humano é iluminado pela Verdade
Eterna, isto é, Deus;
IV) A iluminação divina exige que o homem tenha
intelecto próprio, a fim de pensar corretamente os
conteúdos da fé postos pela revelação.
D) estética intelectualista de Agostinho, que consiste
num profundo desprezo pela sensibilidade humana.
Assinale a alternativa que contém somente as
afirmações corretas:
A) II e III
11. A teoria da iluminação divina, contribuição original
de Agostinho à filosofia da cristandade, foi influenciada
pela filosofia de Platão, porém, diferencia-se dela em
seu aspecto central.
B) I e III
C) II e IV
D) III e IV
Assinale a alternativa abaixo que explicita esta diferença.
A) A filosofa agostiniana compartilha com a filosofia
platônica do dualismo, tal como este foi definido por
Agostinho na Cidade de Deus. Assim, a luz da teoria da
iluminação está situada no plano suprasensivel e só é
13. Nos Solilóquios, Agostinho escreveu: “A luz
comum, à medida que pode, nos indica como é aquela
luz. Pois há alguns olhos tão sãos e vivos que, ao se
abrirem, fixam-se no próprio sol sem nenhuma
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Prof. Anderson Pinho
perturbação. Para esses a própria luz é, de algum modo,
saúde, sem necessidade de alguém que lhes ensine,
senão talvez apenas de alguma exortação. Para eles é
suficiente crer, esperar, amar”.
Agostinho, Solilóquio e Vida feliz. São Paulo: Paulus, 1998, p.23.
Em conformidade com a Teoria da Iluminação, analise
as assertivas abaixo.
I – A luz comum é o conhecimento humano, obtido
por intermédio das demonstrações da lógica e da
matemática, porém, ainda resta saber como tal
conhecimento é possível.
II – A luz, que é superior à luz comum, é o intelecto
humano, que, servindo-se unicamente de si mesmo,
encontra em si toda a certeza e o fundamento da
verdade.
III – O intelecto humano, pela sua natureza perecível,
não pode se colocar como a certeza do conhecimento,
pois a verdade é eterna. Aquela luz, então, acima da luz
comum, é Deus.
IV – A saúde é alcançada por todos, uma vez que a
salvação e a felicidade são unicamente o resultado do
esforço do homem nesta vida terrena.
Assinale a ÚNICA alternativa que contém as assertivas
verdadeiras.
A) II e IV
B) II, III e IV
C) I, II e IV
D) I e III
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nesta vida é proveniente das verdades eternas que se
encontram na mente de Deus.
b) Segundo a doutrina da Iluminação Divina, o
conhecimento que possuímos nesta vida provém de
uma recordação do mundo das Idéias.
c) A doutrina da Iluminação Divina nada mais é do que
a versão cristã da teoria das Idéias de Platão.
d) No processo do conhecimento humano, por causa
da Iluminação Divina, a razão é totalmente passiva.
15. (UFU) Considere o trecho abaixo: “Quando, pois,
se trata das coisas que percebemos pela mente (...),
estamos falando ainda em coisas que vemos como
presentes naquela luz interior da verdade, pela qual é
iluminado e de que frui o homem interior.
Santo Agostinho. Do mestre. São Paulo: Abril Cultural,1973, p.
320 (Os Pensadores)
Segundo o pensamento de Santo Agostinho, as
verdades contidas na filosofia pagã provêm de que
fonte? Assinale a alternativa correta.
A) De fonte diferente de onde emanam as verdades
cristãs, pois há oposição entre as verdades pagãs e as
verdades cristãs.
B)Da mesma fonte de onde emanam as verdades
cristãs, pois não há oposição entre as verdades pagãs e
cristãs.
C) De Platão, por ter chegado a conceber a Ideia
Suprema do Bem.
D) De Aristóteles, por ter concebido o Ser Supremo
como primeiro motor imóvel.
14. O texto a seguir refere-se à doutrina da Iluminação
Divina, elaborada por Agostinho de Hipona.
Para Agostinho, as Verdades Eternas e imutáveis (que
Platão coloca no mundo das Idéias) têm sua sede em
Deus, que é a Verdade. Não as conhecemos por meio
de uma recordação ou reminiscência de uma existência
anterior à atual, como pensava Platão, mas mediante um
ato consciente de interiorização, no qual a razão toma
consciência da presença de Deus. A presença divina é a
Luz que nos faz ver essas Verdades Eternas.
BOEHNER, P. e GILSON, E. História da Filosofia Cristã.
Petrópolis: Vozes, 1988. p. 164.
Em relação a tal doutrina, assinale a alternativa correta.
a) Segundo a doutrina da Iluminação Divina, o
conhecimento verdadeiro que o homem pode alcançar
13
Prof. Anderson Pinho
5. A ESCOLÁSTICA (Séc. VIII ao XIV)
Abrange pensadores europeus, muçulmanos e
judeus. É o período em que a Igreja romana dominava
a Europa, ungia e coroava reis, organizava Cruzadas à
chamada Terra Santa e criava, à volta das catedrais, as
primeiras universidades ou escolas. A partir do século
XII, por ter sido ensinada nas escolas, a filosofia
medieval também é conhecida com o nome de
escolástica.
A escolástica é a filosofia cristã que se
desenvolve desde o século VIII, tem o seu apogeu no
século XIII e começo do século XIV, quando entra em
decadência. Tem esse nome por ter sido dominante nas
escolas que começaram a surgir durante o
Renascimento carolíngio.
Carlos Magno (séc. VIII), preocupado em
incrementar a cultura, funda as escolas monacais e
catedrais (junto aos mosteiros e igrejas), contratando
diversos sábios, como o inglês Alcuíno. O ensino aí
desenvolvido baseia-se sobretudo no trivium
(gramática, retórica e dialética) e no quadrivium
(aritmética, música, geometria e astronomia).
Conservando e discutindo os mesmos
problemas que a patrística, a filosofia escolástica
acrescentou outros.
Durante esse período surge propriamente a
filosofia cristã, que é, na verdade, uma teologia fundada
na nova fé dominante no Ocidente.
Alguns de seus grandes temas são:
1) a diferença e separação entre infinito (Deus)
e finito (homem, mundo);
2) a diferença entre razão e fé (a primeira deve
subordinar-se à segunda);
3) a diferença e separação entre corpo (matéria)
e alma (espírito);
4) o Universo como uma hierarquia de seres,
pela qual os superiores (Deus, serafins, querubins,
arcanjos, anjos, alma) dominam e governam os
inferiores (corpo, animais, vegetais, minerais);
5) a subordinação do poder temporal dos reis e
nobres ao poder espiritual de papas e bispos.
Outra característica marcante da escolástica foi
o método por ela inventado para expor as ideias
filosóficas, conhecido como disputa. Apresentava-se
uma tese e esta devia ser ou refutada ou defendida com
argumentos tirados da Bíblia, de Aristóteles, de Platão
ou de padres da Igreja, particularmente Pedro
Lombardo.
Assim, uma ideia era considerada uma tese
verdadeira ou falsa dependendo da força e da qualidade
dos argumentos encontrados nos vários autores. Por
causa desse método de disputa, costuma-se dizer que,
na Idade Média, o pensamento estava subordinado ao
princípio da autoridade, isto é, uma ideia é
considerada verdadeira se tiver respaldo nos
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argumentos de uma autoridade reconhecida – Bíblia,
Platão, Aristóteles, um papa, um santo.
A partir do século XI, com o renascimento
urbano, começam a surgir ameaças de ruptura da
unidade da Igreja, e as heresias anunciam o novo tempo
de contestação e debates em que a razão busca sua
autonomia. Inúmeras universidades aparecem por toda
a Europa (de Paris, Bologna, Oxford etc.), tornando-se
locais de fecunda reflexão filosófica, e são indicativas
do gosto pelo racional, focos por excelência de
fermentação intelectual.
No século XII, aparecem traduções de obras de
Arquimedes, Euclides, Aristóteles e Ptolomeu. Muitas
vezes o pensamento desses autores chegava deformado
à Europa, pois era traduzido do grego para o sírio, do
sírio para o árabe, do árabe para o hebraico e do
hebraico para o latim medieval. Por isso, a Igreja
condenou de início o pensamento aristotélico, que na
tradução árabe adquirira contornos panteístas.
A partir do século XIII, consultando na
tradução feita diretamente do grego, Santo Tomás de
Aquino recuperou o pensamento original de Aristóteles
e faz a síntese mais fecunda da escolástica. Mais que
isso, fez as devidas adaptações à visão cristã e escreveu
uma obra monumental, a Suma teológica, onde, uma vez
mais, as questões de fé são abordadas pela "luz da
razão" e a filosofia é o instrumento que auxilia o
trabalho da teologia. É com um Aristóteles
cristianizado que surge então a filosofia aristotélicotomista.
Daí para frente a influência de Aristóteles se
fará sentir de maneira forte, sobretudo pela ação dos
padres dominicanos e mais tarde dos jesuítas, que desde
o Renascimento, e por vários séculos, mostraram-se
empenhados na formação dos jovens.
Se por um momento a recuperação do
aristotelismo constitui um recurso fecundo para Santo
Tomás, já no período final da escolástica torna-se um
entrave para o desenvolvimento da ciência.
5.1 O ARISTOTELISMO
O aristotelismo chegou ao ocidente por meio
por meio dos árabes, particularmente Avicena e
Averróis.
5.1.1 AVICENA
A primeira forma sistemática
pela qual o aristotelismo se
apresentou aos pensadores
medievais foi mediada pelo
filosofo persa Avicena (980 –
1037) que era também médico,
além de filósofo.
A obra de Avicena
constitui a primeira grande
14
Prof. Anderson Pinho
síntese especulativa que tem raízes na cultura clássica e
que constituiu um ponto de referência essencial para a
cultura ocidental e a orientou de modo decisivo.
Sua filosofia é profundamente permeada de
Neoplatonismo e de elementos extraídos da religião
islâmica que completaram suas perspectivas
aristotélicas (sobretudo no que se refere à teologia e à
cosmologia), o que permitiu entusiástica acolhida por
muitos pensadores cristãos.
O Neoplatonismo era um velho conhecido dos
latinos e já assimilado pelo pensamento cristão desde a
época patrística; a religião islâmica apresentava não
poucas verdades em comum com o cristianismo. E,
desse modo, muitas teses aristotélicas, filtradas através
de elementos neoplatônicos e islâmicos, não
encontraram dificuldades para se impor no ambiente
medieval.
Na sua monumental obra “Suma Teológica”,
Tomás de Aquino cita Avicena mais de 250 vezes, tanto
para aceitar como para reelaborar o pensamento deste.
O ser possível e o ser necessário
Do pensamento filosófico de Avicena devemos
destacar a distinção entre existência e essência, o primeiro
concreto e a segunda abstrata. Os homens, por
exemplo, constituem a existência, ao passo que a
humanidade constitui a essência.
Os primeiros existem de fato, mas a segunda
prescinde da existência, pois representa a definição, que
em si mesma não denota a existência nem a nãoexistência, a necessidade ou a contingência. Portanto,
uma coisa é a essência e outra a existência. E a primeira,
em si mesma, não denota a segunda.
Ademais, no que se refere à existência, é preciso
distinguir entre o ser necessário e o ser possível. O que existe
de fato, mas que, em si mesmo, poderia também não
existir é chamado por Avicena ser possível, trata-se do ser
que não tem em si mesmo a razão de sua própria
existência, encontrando-a em uma causa que o fez ser.
Diferente dele é o ser necessário, isto é, o ser que
não pode deixar de ser, porque possui em si mesmo a
razão do seu existir.
Essa distinção é fundamental, porque separa o
mundo de Deus.
Um é apenas possível, pois sua existência atual
é contingente, não postulada por sua essência, ao passo
que o outro é necessário; o primeiro é dependente, o
segundo é independente.
A geração
Mas qual é a relação entre o mundo e Deus?
Trata-se de relação de necessidade ou de liberdade, de
emanação ou de criação?
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Avicena responde a essas questões,
fundamentais para os pensadores medievais, fundindo
Aristóteles e o neoplatonismo.
Com efeito, em sua opinião, o mundo é ao mesmo
tempo contingente e necessário. É contingente enquanto a
existência atual não lhe cabe em virtude de sua essência,
sendo então apenas possível; no entanto, é necessário
enquanto Deus, de quem recebe a existência, não pode
deixar de agir segundo sua natureza.
Concebido aristotelicamente como pensamento do
pensamento, Deus produz necessariamente a primeira
Inteligência e esta a segunda, dando início a um
processo descendente necessário e não livre, de índole
claramente neoplatônica. A partir da primeira, cada
Inteligência cria a imediatamente inferior, até a décima,
ao mesmo tempo que cria os céus respectivos, dos quais
são forças motrizes.
Diferentemente das outras, a décima
Inteligência não gera nova realidade, mas atua
diretamente sobre o mundo terreno, posto sob o nono
céu, o da lua, tanto no plano ontológico como no plano
gnosiológico.
No primeiro plano, estruturando o mundo
terreno em matéria e forma, onde a matéria corruptível,
ao contrário da matéria incorruptível dos céus, é
princípio de mutação e multiplicidade e, portanto, de
individualidade.
Como se vê claramente. Estamos diante da
concepção hilemórfica de Aristóteles, mas repensada
conforme as categorias neoplatônicas. Com efeito, as
formas se irradiam da décima Inteligência, que é
"doadora de formas", no sentido de que é ela que irradia
as formas na matéria-prima do mundo sublunar. E
entre essas formas estão também as almas
incorruptíveis e imortais infundidas nos corpos.
No plano gnosiológico a décima Inteligência
opera a passagem da potência ao ato do intelecto
possível ou passivo, ou seja, do intelecto humano e
individual. E isso por meio da irradiação tanto dos
princípios primeiros (com o que temos o intelecto
habitual) como dos conceitos universais que
apreendemos por meio da abstração (com o que temos
o intelecto em ato), e mediante a elevação do nosso
intelecto individual ao supremo intelecto agente
(empresa difícil e reservada a poucos, apenas dos quais
se pode falar de intelecto santo).
Em todas essas formas de contato com o
intelecto agente único, permanecem intactas a
individualidade e a personalidade singular do homem.
O homem, animal munido de razão, tem o
poder de conhecer, através da alma racional, as formas
inteligíveis. Essas formas inteligíveis constroem a alma
racional de três formas: primeiro através de uma
emanação, de um prolongamento da substância e
natureza divina, através da qual o homem pode
conhecer os primeiros princípios; segundo através do
raciocínio e da demonstração é possível conhecer as
15
Prof. Anderson Pinho
coisas inteligíveis do mundo utilizando para isso a
lógica; e terceiro através dos sentidos.
Sobre as causas do mal no mundo, Avicena
afirmou que ele é disseminado por acidente e que ele
surge por causa da imperfeição da natureza. Além disso
o filósofo acreditava que o bem deve deixar espaço
também ao seu contrário.
O propósito da filosofia é de esclarecer e
demonstrar através da razão as verdades reveladas por
Deus. Aos filósofos cabe fazer considerações e
elucidações sobre as partes obscuras e ocultas das
doutrinas divinas reveladas.
Nos estudos de Avicena podemos encontrar
também elementos da filosofia da ciência. Ele
descreve um método de investigação científica e se
pergunta como é possível alcançar hipóteses,
afirmações que não necessitam de prova para que sejam
consideradas verdadeiras ou deduções iniciais sem que
elas sejam inferidas das premissas. Para ele a solução é
a combinação do antigo método indutivo aristotélico
com um método que utiliza a experimentação e a
observação atenta do que se quer conhecer.
Influência de Avicena
Essas são algumas teses do filosofo persa, que
terão grande influência sobre Tomás de Aquino (a
distinção real entre essência e existência, ou melhor,
entre essência e ser).
Porém, mais do que as teses em particular, o que
determinou a sorte do seu pensamento foi a tentativa
de harmonizar a filosofia aristotélica com a religião
islâmica e, portanto, para os cristãos, com algumas teses
fundamentais
do
cristianismo,
coisa
que,
aprioristicamente, não parecia possível.
Com efeito, era essa a medida de avaliação de
qualquer proposta filosófica e também o objetivo de
muitos repensamentos e retificações subsequentes.
5.1.2 AVERRÓIS
No fim das contas, o
aristotelismo de Avicena não
provocou grande perplexidade
nos filósofos cristãos, por
causa de sua constante
tentativa de harmonizar as
teses de Aristóteles com as
verdades da religião islâmica.
Mas o mesmo não ocorreu com o aristotelismo
de Averróis (1126-1198), que escreveu um Tratado
decisivo sobre a concordância entre filosofia e religião, obra que
permaneceu desconhecida na Idade Média.
Ele diz querer delimitar os âmbitos respectivos
do saber e da fé corânica, mas a confiança que tem na
razão é total e ilimitada. E a razão o leva a afirmar, com
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Aristóteles, a eternidade do mundo, negando a
imortalidade da alma singular. Obviamente, construída
sobre essas bases, a filosofia de Averróis logo se
transformou em fonte de preocupação para a
autoridade eclesiástica e de acesos debates para os
mestres parisienses.
O primado da filosofia e a eternidade do mundo
Persuadido de que a verdadeira filosofia é a de
Aristóteles, Averróis procurou captar o seu pensamento
autêntico por meio de comentário escrupuloso,
apresentando assim a exposição de uma filosofia que
fosse não apenas independente da teologia e da religião,
mas também sede privilegiada da verdade. Escrevia
Averróis: "A doutrina de Aristóteles coincide com a
suprema verdade”.
Esta é a razão pela qual Averróis considera justo
pensar que Aristóteles "foi criado e nos foi dado pela
divina providência, para que pudéssemos conhecer
tudo o que é cognoscível".
Defendendo-se da acusação de ser incrédulo,
destaca com vivacidade que as divergências de opinião
dos filósofos e teólogos devem ser creditadas mais a
diferenças de interpretação do que a uma efetiva
diversidade de princípios essenciais, que fossem
negados por uns e defendidos por outros.
E, nessas divergências, é preciso estar ao lado
dos filósofos, pois estes, servindo-se da razão, nada
mais fazem do que se ater ao direito tutelado pela
própria religião. Se é verdade que filosofia e religião
ensinam a verdade, então não pode haver desacordo
substancial entre elas. Em caso de contrastes, é preciso
interpretar o texto religioso no sentido exigido pela
razão, porque a verdade é uma só, a da filosofia. Não
existe, portanto, dupla verdade. Existe apenas a verdade
da razão; as verdades religiosas expostas no Corão são
símbolos imperfeitos, que devem ser interpretados e
propostos à mentalidade dos simples e ignorantes, da
verdade única que a filosofia sistematiza.
Além dessa tese fundamental, em claro
contraste com o concordismo de Avicena, Averróis
destaca, com Aristóteles, que o motor supremo e os
motores dos céus, sendo inteligências que refletem
sobre si mesmas, pensando-se, movem necessariamente
não como causas eficientes, mas sim como causas
finais, isto é, como aquele bem ou perfeição ao qual
cada céu aspira com seu movimento.
Assim, a relação entre o motor supremo e os
motores intermediários não é relação de eficiência,
como queria Avicena, mas sim de finalidade. O
movimento que assegura a unidade para todo o
universo é o movimento do primeiro motor, sendo,
portanto, eterno e de natureza final, não eficiente.
A tese da eternidade do mundo e do caráter
necessário do movimento do primeiro motor inscrevese na própria concepção aristotélica de Deus como
16
Prof. Anderson Pinho
"pensamento de pensamento" e, portanto, como
atividade necessária e eterna.
Unicidade do intelecto
Além do primado da filosofia e da eternidade do
mundo, a terceira tese de Averróis discutida pelos
medievais foi a relativa a unicidade do intelecto
possível, o único do qual é predicável a imortalidade,
tanto que Averróis nega a imortalidade individual.
Com efeito, o intelecto possível, pelo qual
conhecemos e formulamos noções e princípios
universais, não pode ser individual, isto é, não pode ser
forma do corpo, porque nesse caso não poderia estar
disponível às formas inteligíveis de caráter universal.
Por isso, falando do intelecto, Aristóteles diz que ele é
separado, simples, impassível e inalterável. Se fosse
individual, o intelecto seria individualizado pela matéria
- a qual é o princípio da individualização - e, então, seria
incapaz de alcançar o universal e, portanto, o saber. O
intelecto, portanto, é único para toda a humanidade e
não misturado com a matéria.
Mas, então, como é que o homem individual
conhece? E em que sentido o conhecimento pode ser
considerado individual?
O intelecto possível, enquanto tal, conhece
passando da potência ao ato. Para tanto, necessita do
intelecto ativo ou inteligência divina, que, sendo em ato,
pode desenvolver tal ação.
Escreve Averróis: "Assim como a luz faz com
que a cor em potência passe a ser cor em ato, de modo
que possa mover nossa vista, do mesmo modo o
intelecto agente faz com que os conceitos inteligíveis
em potência passem a ser conceitos em ato, de modo
que o intelecto material os receba".
O intelecto agente, porém, não atua diretamente
sobre o intelecto possível, mas sim sobre a fantasia ou
imaginação, que, sendo sensível, contém os universais
somente em forma potencial. E essa imaginação
sensível, sobre a qual atua o intelecto divino, que, sendo
individual, dá a sensação de que o conhecimento seja
individual.
Na realidade, ela é apenas um continente
potencial dos universais, que, porém, transformados em
ato pela luz do intelecto divino, só podem ser recebidos
pelo intelecto possível que se torna atual e que, em si
mesmo, é espiritual e, portanto, separado, único, não
misturado à matéria e, desse modo, supra-individual.
Assim, além do intelecto divino, que é único,
também o intelecto possível é único para todos os
homens, que a ele se ligam provisoriamente por meio
da fantasia ou da imaginação, onde os universais estão
contidos em forma potencial. Desse modo, o ato de
entender é do homem individual, uma vez que está
ligado à fantasia ou imaginação sensível, mas ao mesmo
tempo é supra-individual, visto que o universal em ato
não pode ser contido pelo individuo em particular, por
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sua natureza desproporcional ao caráter supraindividual do universal.
No fundo, com essa tese, Averróis pretende
salvaguardar o saber, que não perece com o indivíduo
porque é patrimônio de toda a humanidade. E o arquivo
onde esses resultados se conservam, em benefício de
toda a humanidade, é o chamado "intelecto possível",
superior à capacidade do indivíduo e, portanto,
independente.
É uma espécie de mundo feito de Ideias, de
criações humanas que transcendem o indivíduo e a ele
sobrevivem, tendo em vista outras conquistas, com as
quais cresce a concretização do intelecto possível, até
sua completa concretização, com a qual se concluirá a
história da humanidade.
Alcançada essa meta, realizar-se-á então a
perfeita união do intelecto possível, atualizado pelo
saber, com o intelecto divino, que está sempre em ato.
A atualização penosamente amadurecida do intelecto
possível se fundira então com a atualidade permanente
do intelecto divino. É esse o epílogo ou união mística
de que falam as religiões.
Consequências da unicidade do intelecto
Enquanto as teses relativas ao papel da filosofia
no âmbito do saber e eternidade do mundo seriam
diversamente repensadas, a tese que mais agitou os
medievais foi a da unicidade do intelecto possível, porque se
encontrava em claro contraste com a fé na imortalidade
pessoal, um dos dados de fundo da religião cristã, e não
apenas desta.
Se o intelecto possível não é parte da alma
humana, mas está apenas temporariamente ligado a ela,
então a imortalidade não cabe ao homem em particular,
mas sim a essa realidade supra-individual.
Ora, essa doutrina se prestava a duas
interpretações: uma de caráter ascético; outra de caráter
materialista e hedonista.
É verdade que a atividade vegetativo-sensitiva é
típica da alma, forma do corpo, mas esta no homem
tende a elevar-se e unir-se à inteligência. Todavia, se
essa interpretação ascético-mística era possível e talvez
até fundada, a interpretação que se difundiu, em
consonância com o despertar da vida econômica e com
a redescoberta da positividade terrena, foi a
interpretação de cunho hedonista.
Se tudo o que é individual se dissolve com a
morte e se o homem não é, em última instância,
responsável por sua atividade espiritual, que é supraindividual, então a pregação sobre a morte e suas
consequências, relativas sobretudo à inutilidade do
mundo, perde o seu vigor, revelando-se pura ficção.
Não é difícil perceber aí os germes primordiais
e inequívocos da concepção materialista ou apenas
naturalista da vida e do homem, que a redescoberta de
alguns clássicos do pensamento antigo alimentavam.
17
Prof. Anderson Pinho
Na matéria, tudo se transforma e se move
eternamente, nascendo em outro lugar e em outro
tempo, em ciclo perene, em relação ao qual o indivíduo
é apenas presença transitória.
Primeiras reações ao aristotelismo
Foram particularmente essas consequências que
animaram o debate entre os Escolásticos, decididos a
combater suas premissas, seja por meio de uma leitura
mais atenta de Aristóteles, seja redescobrindo o sentido
mais genuíno de algumas verdades da religião cristã.
É esse o contexto no qual deve ser lida a
interdição posta por Roberto de Courçon nos primeiros
estatutos universitários de 1215:
"Nos fundamentos da Leitura devem estar os
livros de Aristóteles sobre a dialética, tanto da antiga
como da nova lógica, nos cursos institucionais, mas não
nos extraordinários (...). Entretanto, não devem ser
lidos a Metafisica ou os livros naturales de Aristóteles ou
sínteses deles (comentários de Averróis)".
Na mesma linha está a decisão de Gregório IX,
que, em 1231 (por ocasião da greve dos estudantes, que
durou dezoito meses e a qual não era estranho o
problema do aristotelismo, defendido pela faculdade de
artes e combatido pela faculdade de teologia),
confirmou a proibição de 1215, mas só até que os
escritos de Aristóteles não fossem corrigidos.
Nomeada por Gregório IX e composta por
homens que deram provas de abertura para as novas
correntes filosóficas, a comissão não concluiu o
trabalho de revisão dos escritos aristotélicos por causa
da complexidade dos problemas e, talvez, também por
causa da imperícia dos membros. Mas aquilo que não
foi feito por autoridade realizar-se-ia espontânea e
progressivamente por meio da reflexão crítica e dos
acesos debates dos pensadores cristãos.
Os caminhos seguidos foram substancialmente
dois: um de maior adesão às indicações de Aristóteles,
repensadas e corrigidas no contexto de teses
propriamente cristãs; outro, de maior adesão às
indicações agostinianas, integradas por elementos de
origem aristotélica.
O primeiro foi seguido por santo Tomás de
Aquino, o segundo por São Boaventura, ambos
empenhados na obra de harmonização da razão com a
fé.
5.2 A QUESTÃO DOS UNIVERSAIS
Aristóteles não será conhecido na Idade Média
a não ser a partir do século XIII, quando suas obras são
traduzidas para o latim. No entanto, no século VI
Boécio traduzira a lógica aristotélica, tecendo um
comentário a respeito da questão da existência real ou
não dos universais.
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Chamam-se universais os termos que designam
todos os seres de determinada espécie. Assim, o termo
boi designa todos os bois que possam existir, qualquer
que seja sua raça e características. Do mesmo modo, o
termo “homem alto e moreno”, que servem para
qualificar alguém são nomes comuns usados para
nomear não uma entidade singular, mas um modo
universal. 'Homem', 'alto', 'moreno' são nomes
chamados "universais".
Tradicionalmente, os universais (universalia)
foram chamados de "noções genéricas", "ideias" e
"entidades abstratas". Outros exemplos de universais
são 'o leão', 'o triângulo','4' (o número quatro, escrito
mediante a cifra 'quatro').
O universal é o conceito, a ideia, a essência
comum a todas as coisas (por exemplo, o conceito de
homem). Em outras palavras, perguntava-se se os
gêneros e espécies tinham existência separada dos
objetos sensíveis: as espécies (como o cão) e os gêneros
(como os animais) teriam existência real"? Ou seja,
seriam realidades, ideias ou apenas palavras?”.
Os universais contrapõem-se aos "particulares"
e estes últimos tem sido equiparados com entidades
concretas ou singulares.
Um problema central relativo aos chamados
"universais" é o de seu status ontológico. Trata-se de
determinar que classe de entidades são os universais, ou
seja, qual é a sua forma peculiar de existência. Ainda que
se trate primordialmente, como dissemos, de uma
questão ontológica, vem tendo importantes implicações
e ramificações em outras disciplinas como a lógica, a
teoria do conhecimento e até a teologia.
A questão foi posta com frequência na história
da filosofia, especialmente desde Platão e Aristóteles,
mas como foi discutida muito intensamente na Idade
Média, virou praxe colocá-la no início da chamada
querela dos universais.
A "querela dos universais", já desde Platão, mas
sobretudo da Idade Média, ofereceu uma multiplicidade
de temas e questões, tais como:
1) A questão do conceito (natureza e funções do
conceito, natureza do indivíduo e suas relações com o
geral);
2) A questão da verdade (critério ou critérios da
verdade e da correspondência do enunciado com a
coisa);
3) A questão da linguagem (natureza dos signos
e suas relações com as entidades significadas).
Todas essas questões foram levantadas, e em
grande parte resolvidas, em função de vários problemas
teológicos.
Em princípio, o problema dos universais parece
abarcar todas as questões básicas filosóficas,
ontológicas, gnosiológicas e lógicas. Além disso, no fim
da Idade Média e no Renascimento, o problema dos
universais incluiu a questão da natureza e do indivíduo
como ser pensante.
18
Prof. Anderson Pinho
A questão dos universais pode ser assim
formulada: qual a relação entre as palavras e as
coisas? Por exemplo, Rosa é o nome de uma flor.
Quando a flor morre, a palavra ou o conceito universal
“rosa” continua existindo. Nesse caso, a palavra ou
conceito fala de uma coisa inexistente; tal palavra ou
conceito geral existe independentemente da coisa (no
caso, o ser concreto que morreu)? Que relação existe
entre as coisas concretas (as espécies, por exemplo) e os
seus conceitos? Essa questão é retomada nos séculos XI
e XII, alimentando longa polêmica, cujas soluções
principais são o realismo, o conceitualismo e o nominalismo.
Os realistas, como Santo Anselmo e
Guilherme de Champeaux, de tendência platônica,
sustentavam que as ideias gerais, ou os universais,
deviam possuir existência independente, uma existência
ante res (antes das coisas reais), na mente divina ou em
outro lugar. Esta solução, de matriz platônica, afirmava
que o universal existe realmente no mundo das ideias.
Existiriam, em um mundo ideal, desprovidas
totalmente de matéria, as puras ideias. Lá existiriam o
boi ideal, a rosa ideal, o homem ideal, etc. Esse mundo
das ideias, segundo Platão, seria um mundo puramente
espiritual, perfeito e divino. É a solução denominada
realista, porque considera o universal realmente
existente.
Já os nominalistas, como Roscelino e
Guilherme de Ockham acreditavam que as ideias gerais
ou universais não passam de simples nomes, sem
realidade fora do espírito ou da mente. A única
realidade são os indivíduos e os objetos individualmente
considerados.
Para eles, além das substâncias singulares, só
existem os nomes puros, o que descarta a realidade das
coisas abstratas e universais. O universal não existe por
si, resume-se a um vocábulo com significado geral, mas
sem conteúdo concreto, que só se apresenta no
individual e no particular.
5.3 PEDRO ABELARDO
Idade Média.
Pedro Abelardo (10791142) foi um filósofo escolástico
francês, considerado um dos
maiores pensadores do século XII.
Destinado por família a seguir
carreira militar, escolheu o
caminho da filosofia e das letras.
Aprendeu o Trivium, conjunto de
disciplinas ligadas à linguagem na
A teologia passou a ser logo o centro das
preocupações de Abelardo. Sua obra principal,
”Dialética”, inspirada em Boécio, foi muito usada e
bastante difundida nas escolas medievais, junto aos
primeiros estudos contidos no Trivium. A obra
ensinava aos estudantes como debater questões
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teológicas e metafísicas. Seu método de ensino foi
considerado revolucionário na época, pois estimulava
os debates e as contradições entre as questões
estabelecidas.
A frase "a dúvida nos leva à pesquisa e através
dessa conhecemos a verdade" é um dos princípios de
Abelardo que direciona tanto seus pensamentos
filosóficos como teológicos. O filósofo parte dessa ideia
inicial para formar e fundamentar o seu raciocínio
crítico. A dúvida é onde começa o caminho para a
pesquisa, é uma frequente interrogação que nos leva a
um exame mais aprofundado das questões que nos
interessam. Através da dúvida o filósofo Abelardo
emprega um caráter científico às suas investigações.
A dialética é para Abelardo muito mais do que
um discurso feito de forma habilidosa, ela é o
instrumento que ajuda a distinguir com clareza o
verdadeiro do falso. Seguindo regras lógicas ela vai
conseguir determinar se o discurso científico é
verdadeiro ou é falso.
Abelardo pretende utilizar o vigor da dialética
nos estudos e nas argumentações teológicas para
descobrir quais são os argumentos legítimos e quais são
os argumentos não autênticos e através dela fazer
prevalecer as verdadeiras doutrinas cristãs.
Não é a razão que vai assimilar a fé, mas a fé que
vai apropriar-se da razão, pois o discurso filosófico não
vai tornar sem efeito o conjunto de sentenças da
teologia, mas vai auxiliar no seu entendimento e tornálo mais fácil de compreender.
A filosofia vai ser a mediadora entre as verdades
reveladas e o pensamento humano. Segundo a filosofia
de Abelardo, não é possível crer nas coisas que não se
compreende.
O método lógico de análise utilizado por
Abelardo consistia em estudar a questão filosófica
fazendo um exame das partes que a constituem,
percebendo assim os diversos pontos de vista
incoerentes e contrários.
É necessário a realização de uma investigação
completa que vai determinar as diferenças entre as
argumentações de um tema. A razão vai prevalecer
sobre a opinião de quem tem grande entendimento
sobre determinado assunto. Abelardo não vai contra a
utilidade do pensamento de uma autoridade enquanto
não houver meios ou conhecimentos suficientes para se
colocar em prática a razão. A partir do momento que a
razão encontrar condições de por si mesmo encontrar
a verdade, a autoridade passa a ser inútil.
Abelardo busca fazer uma conciliação, um
entendimento, um acordo ou ao menos um diálogo ente
os primeiros filósofos, em especial Platão, e as teorias
teológicas do cristianismo. Pedro Abelardo acreditava
que os primeiros filósofos, mesmo estando fora do
cristianismo, buscavam também a verdade através da
19
Prof. Anderson Pinho
investigação lógica. Os primeiros filósofos e os
filósofos cristãos estão unidos pela razão.
A essência de Deus é impossível de ser definida,
pois ela não pode ser expressa. E não pode ser expressa
porque para isso Deus teria que ser uma substância, e
Deus está fora de todas as coisas que conhecemos e que
possamos vir a conhecer.
Para tentar explicar a trindade da pessoa divina
Abelardo usa como metáfora a gramática que diferencia
quem fala, para quem se fala e o que se fala. Na unidade
divina as três pessoas podem ser uma só, pois é possível
falar de si a si mesmo. A primeira pessoa é também o
fundamento das outras duas, pois se não existir quem
fala não existirá também o que se fala e a quem se fala.
Sobre as questões éticas Abelardo afirma que o
pecado não é em si a ação física, mas o elemento
psicológico dessa ação, ou seja, o pecado é a intenção
de pecar e não a ação.
A posição de Pedro Abelardo com relação aos
universais ficou conhecida por conceitualismo,
diferenciando-se do realismo, pois nega que os
universais sejam entidades metafísicas, e do
nominalismo, pois para ele, os universais existem como
entidades mentais, que fazem a mediação entre o
mundo do pensamento e o mundo do ser, portanto, não
podem ser apenas palavras.
Para ele os universais teriam uma existência
simbólica na mente, e outra, concreta, nas coisas. Em
outras palavras, Abelardo sustenta que existem apenas
indivíduos, nenhum dos quais é, em si, espécie nem
gênero, e que os gêneros e as espécies são concepções
ou conceitos. Segundo ele, as coisas se parecem, e essas
semelhanças, que por si só não são coisas, produzem os
universais.
5.4 SÃO TOMÁS DE AQUINO
Natural de Nápoles na
Itália, Tomás de Aquino (1225 –
1274) foi ordenado monge
dominicano e estudou na
universidade de sua cidade natal
e na de Bolonha. Mais tarde
tornou-se professor da maior
universidade europeia daquela
época, a de Paris.
Se Santo Agostinho cristianizou Platão, Tomaz
de Aquino cristianizou Aristóteles ao usar sua teoria
filosófica para explicar a fé e até mesmo a existência de
Deus. A influência de seu pensamento penetrou toda a
Europa a ponto de ele ser considerado o conselheiro
dos conselheiros dos reis. Ou seja, o mestre dos
mestres. Sua obra principal foi a Suma Teológica .
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Se em Santo Agostinho o lema era “crer para
entender”, aqui é “entender para crer”. Apesar de dar
uma valorizada na razão, ele também a entendia como
a serviço da fé.
A teologia não substitui a filosofia - Razão e fé
O objeto primário das reflexões de Tomás é
Deus, não o homem ou o mundo, porque somente no
contexto da revelação é que se torna possível raciocinar
sobre o homem e o mundo.
Muito se tem discutido sobre se existe ou não
uma razão autônoma da fé em Tomás, ou seja, uma
filosofia distinta da teologia.
A verdade é que em Tomas há uma razão e uma
filosofia como preparação para a fé. A filosofia tem sua
configuração e sua autonomia, mas não exaure tudo o
que se pode dizer ou conhecer. Assim, é preciso integrála a tudo o que está contido na sagrada escritura em
relação a Deus, ao homem e ao mundo.
A diferença entre a filosofia e a teologia não está
no fato de que uma trata de certas coisas e a outra de
outras coisas, porque ambas falam de Deus, do homem
e do mundo.
A diferença está no fato de que a primeira
oferece um conhecimento imperfeito daquelas mesmas
coisas que a teologia está em condições de esclarecer
em seus aspectos e conotações específicos relativos à
salvação eterna.
A fé, portanto, melhora a razão assim como a
teologia melhora a filosofia. A graça não suplanta, mas
aperfeiçoa a natureza. E isso significa duas coisas:
a) a teologia retifica a filosofia, não a substitui,
assim como a fé orienta a razão, não a elimina;
b) a filosofia, como preparação para a fé, tem
sua autonomia, porque é formulada com instrumentos
e métodos não assimiláveis aos da teologia.
Dessa maneira, teologia (fé) e filosofia (razão
natural) são conciliáveis, desde que a razão ampare o
caminho até a verdade revelada, isto é, um bom uso da
razão faz com que possamos acessar a verdade de Deus.
Portanto, não deve haver conflito entre fé e razão. O
saber teológico não suplanta o saber filosófico nem a fé
substitui a razão, até porque, e este é o último motivo,
a fonte da verdade é única.
É preciso partir das verdades "racionais",
porque é a razão que nos une. É sobre essa base que se
podem obter os primeiros resultados universais, porque
racionais, com base nos quais se pode depois construir
um discurso de aprofundamento de caráter teológico.
Discutindo com os judeus, pode-se assumir
como pressuposto o Antigo Testamento; discutindo
com os heréticos, pode-se assumir toda a Bíblia. Mas
que pressuposto pode tornar possível a discussão com
os pagãos ou gentios senão aquilo que nos assemelha,
isto é, a razão?
20
Prof. Anderson Pinho
A esse motivo, de índole apologética, devem-se
acrescentar duas considerações de caráter mais geral,
isto é, no sentido de que a razão constitui nossa
característica. Deixar de utilizar essa força, mesmo que
em nome de uma luz superior, seria deixar de lado uma
exigência primordial e natural. Ademais, existe um
corpus filosófico que é fruto de tal exercício racional,
como a filosofia grega, cujos resultados foram
apreciados e utilizados por toda a tradição cristã.
Por fim, Tomás tinha a convicção de que,
apesar de sua radical dependência de Deus no ser e no
agir, o homem e o mundo gozam de relativa autonomia,
sobre a qual deve-se refletir com os instrumentos da
razão pura, fazendo frutificar todo o potencial
cognoscitivo para responder a vocação original de
"conhecer e dominar o mundo".
Teoria do conhecimento
De acordo com a sua teoria do conhecimento,
o homem é um ser duplo, composto por um corpo
material e por uma alma inteligível. O homem conhece
porque é alma, mas não tem acesso direto a Deus
porque também é corpo.
Nosso conhecimento sempre parte dos
sentidos, mas atinge o inteligível por meio da abstração.
Desse modo, a teoria tomista do conhecimento é a do
realismo, ou seja, considera que os conceitos que
apreendemos pelo conhecimento possuem uma
realidade autônoma e objetiva. O que a faculdade do
conhecimento recebe do objeto é uma impressão deste.
O que primeiro conhecemos são essas impressões,
porque elas remetem de forma intencional ao objeto
observado.
Tomás fixou-se num realismo moderado,
tomando como ponto de partida o ser captado pela
inteligência no âmbito do conhecimento sensível, de
onde o abstrai, para em seguida buscar novos resultados
da especulação sem nunca ultrapassar o âmbito limitado
do ser sensível.
A ontologia
A metafisica de Tomás distingue o ente
(existente) da essência e privilegia o primeiro em relação
a segunda. O ente pode ser lógico (conceitual) e real
(extramental).
O ente lógico tem a função de unir mais
conceitos, mas isso não significa que para cada ente
lógico corresponda um ente real (por exemplo, ao
conceito de cegueira não corresponde nenhum ente
real). É esta posição do "realismo moderado" que
recorre ao poder de abstração do intelecto para explicar
os universais.
Tudo o que existe é ente e, portanto, também
Deus e o mundo. Todavia, Deus e o mundo são entes
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de modo diverso; o ser se predica deles por analogia;
Deus é o ser, o mundo tem o ser.
A essência é o "o que é" de uma coisa, mas é
apenas potência de ser, apenas em Deus potência e
existência coincidem; no mundo e no homem não há
correspondência entre potência de ser e existência real.
Por este motivo, apenas Deus é necessário (possui
como próprio o ato de ser), o mundo, ao contrário, é
contingente, porque possui o ser apenas por
participação.
Em Tomás o ato de ser tem proeminência sobre
a essência, a tal ponto que sua filosofia pode ser
considerada uma metafisica do ser. O problema
dominante é, portanto, estabelecer o que é o ser (e não
o que é a essência), ou por que existe o ser e não o nada.
Mas a solução pertence ao âmbito do mistério, e ao
homem cabe maravilhar-se a cada momento do fato de
que tudo o que é existe, enquanto, seria mais lógico que
não existisse. Diverso, porém, é o discurso sobre os
modos de ser que são para nosso filosofo as dez
categorias.
Todo ente compreende em si o uno, o
verdadeiro e o bom (os assim chamados
transcendentais do ser), motivo pelo qual se pode dizer
que o ser é uno, verdadeiro e bom.
Dizer que o ser é uno significa afirmar que ele é
intrinsecamente não contraditório; mas também neste
caso a unidade se predica de Deus e do homem apenas
por analogia. Deus com efeito, é verdadeiramente
simples; o homem, ao contrário, é uma unidade por
composição (essência + actus essendi).
O verdadeiro é um transcendental do ente no
sentido de que todo ente é inteligível. Mas isso pode ser
dito em dois sentidos: de um lado, para afirmar que
existe uma verdade ontológica (todo ente é
verdadeiro porque se adapta ao intelecto divino que o
pensa), e por outro lado para afirmar que existe uma
verdade lógica, que é a adequação da nossa mente
humana ao objeto. A verdade de um ente depende do
grau de ser que possui; neste sentido, Deus, que é sumo
ente, e também suma verdade.
21
Prof. Anderson Pinho
Por fim, tudo o que é, é também bom porque é
fruto da bondade difusiva de Deus. Nessa concepção,
Deus se apresenta como Sumo bem.
Dado que Deus é causa do criado, o próprio
criado apresenta algumas semelhanças com Deus. Por
outro lado, a transcendência de Deus implica também
uma insuperável dessemelhança entre o Criador e o
criado, a ponto de nosso conhecimento de Deus (pelo
fato de que Deus não tem nenhuma essência especifica)
tornar-se impossível, e exprimível apenas por via
negativa. Essa contemporânea semelhança e
dessemelhança do mundo com Deus constitui a relação
de analogia.
As provas da existência de Deus
Segundo Santo Tomás a razão pode provar a
existência de Deus através de cinco vias, todas de índole
realista: considera-se algum aspecto da realidade dada
pelos sentidos como o efeito do qual se procura a causa.
1. Movimento - A primeira fundamenta-se na
constatação de que no universo existe movimento.
Baseado em Aristóteles, Santo Tomás considera que
todo movimento tem uma causa, que deve ser exterior
ao próprio ser que está em movimento, pois não se
pode admitir que uma mesma coisa possa ser ela mesma
a coisa movida e o princípio motor que a faz
movimentar-se.
Por outro lado, o próprio motor deve ser
movido por um outro, este por um terceiro, e assim por
diante. Nessas condições, é necessário admitir ou que a
série de motores é infinita e não existe um primeiro
termo (não se conseguindo, assim, explicar o
movimento), ou que a série é finita e seu primeiro termo
é Deus.)
2. Causa eficiente - A segunda via diz respeito
à ideia de causa em geral. Todas as coisas ou são causas
ou são efeitos, não se podendo conceber que alguma
coisa seja causa de si mesma. Nesse caso, ela seria causa
e efeito no mesmo tempo, sendo, assim, anterior e
posterior, o que seria absurdo. Por outro lado, toda
causa, por sua vez, deve ter sido causada por outra e
esta por uma terceira, e assim sucessivamente. Impõese, portanto, admitir uma primeira causa não causada,
Deus, ou aceitar uma série infinita e não explicar a
causalidade.
3. Contingente e necessário – A terceira via
refere-se aos conceitos de necessidade e contingência. Todos
os seres estão em permanente transformação, alguns
sendo gerados, outros se corrompendo e deixando de
existir. Mas poder ou não existir não é possuir uma
existência necessária e sim contingente, já que aquilo
que é necessário não precisa de causa para existir.
Assim, o possível ou contingente não teria em si razão
suficiente de existência e, se nas coisas houvesse apenas
o possível, não haveria nada.
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Para que o possível exista é necessário,
portanto, que algo o faça existir. Ou seja: se alguma
coisa existe é porque participa do necessário. Este, por
sua vez, exige uma cadeia de causas, que culmina no
necessário absoluto, ou seja, Deus.
4. Graus de perfeição – A quarta via tomista
para provar a existência de Deus é de índole platônica e
baseia-se nos graus hierárquicos de perfeição observados nas
coisas. Há graus na bondade, na verdade, na nobreza e
nas outras perfeições desse gênero. O mais e o menos,
implicados na noção de grau, pressupõem um termo de
comparação que seja absoluto. Deverá existir, portanto,
uma verdade e um bem em si: Deus.
5. Causa final - A quinta via fundamenta-se na
ordem das coisas. De acordo com o finalismo aristotélico
adotado por Tomás de Aquino, todas as operações dos
corpos materiais tenderiam a um fim, mesmo quando
desprovidos da consciência disso. A regularidade com
que alcançam seu fim mostraria que eles não estão
movidos pelo acaso; a regularidade seria intencional e
desejada. Uma vez que aqueles corpos estão privados
de conhecimento, pode-se concluir que há uma
inteligência primeira, ordenadora da finalidade das
coisas. Essa inteligência soberana seria Deus.
O livre arbítrio
Para Tomás, o homem é natureza racional, isto
é, um ser capaz de conhecer. E é justamente essa
concepção de homem que encontramos na base da sua
ética e da sua política.
Antes de mais nada, o homem conhece o fim ao
qual cada coisa tende por natureza, e conhece uma
ordem das coisas no cume da qual está Deus como Bem
supremo.
Naturalmente, se o intelecto pudesse oferecer a
visão beatífica de Deus, a vontade humana não poderia
deixar de querê-la. Mas, aqui embaixo, isso não é
possível. Na vida terrena, o intelecto só conhece o bem
e o mal de coisas e ações que não são Deus. Portanto, a
vontade é livre para querê-las ou não.
E é exatamente na liberdade do homem (que
não é de forma alguma reduzida pela presciência de
Deus, que prevê o que é necessário e o que
propriamente será livre, isto é, devido unicamente a
liberdade humana), que Tomás vê a raiz do mal,
concebido, com Agostinho, como ausência de bem.
"Por sua própria natureza, o homem tem o livre22
Prof. Anderson Pinho
arbítrio", ele não se dirige para um fim, como a flecha
lançada pelo arqueiro, mas sim se dirige livremente para um
fim. E como há nele um habitus natural de captar os
princípios do conhecimento, também há sempre nele
uma disposição ou habitus natural – a assim chamada
sindérese - que o leva a compreender os princípios que
inspiram e guiam as boas ações.
Mas compreender ainda não significa agir. E o
homem, justamente porque é livre, peca quando se
afasta deliberadamente e infringe as leis universais que
a razão lhe dá a conhecer e a lei de Deus lhe revela.
A doutrina do Direito
Tomás distingue três tipos de leis: a lex aeterna, a
lex naturalis e a lex humana. E acima delas está a lex divina,
ou seja, a lei revelada por Deus. A lex aeterna é o plano
racional de Deus, a ordem do universo inteiro, pela qual
a sabedoria divina dirige todas as coisas para seu fim. É
o plano da Providência conhecido unicamente de Deus
e de poucos eleitos. Entretanto, há uma parte dessa lei
eterna da qual, como natureza racional, o homem é
participe. E tal participação é definida por Tomas com
o nome de lei natural.
Em suma, enquanto seres racionais, os homens
conhecem a lei natural, cujo núcleo essencial está no
preceito de que "se deve fazer o bem e evitar o mal".
Para o homem, como para todo ente, a sua própria
conservação é um bem. Para o homem, como para todo
animal, é bem seguir os ensinamentos universais da
natureza, união do macho e da fêmea, proteção e
crescimento dos filhotes etc. Para o homem, enquanto
ser racional, é bem conhecer a verdade, viver em
sociedade etc. Entretanto, mais do que especificação do
que é o bom e do que é o mal ele vê a lei natural
principalmente como forma da racionalidade.
Estreitamente ligada a lex naturalis, Tomás
considera a lex humana.
Trata-se da lei jurídica, isto é, o direito positivo,
a lei feita pelo homem. E os homens, que são sociáveis
por natureza, fazem as leis jurídicas para dissuadir os
indivíduos do mal.
E como toda lei é algo que pertence à razão,
(uma vez que pertence à razão estabelecer os meios para
os fins e ver a ordem dos fins), a lex humana é a ordem
promulgada pela coletividade ou por quem tem a
responsabilidade pela comunidade, tendo em vista o
bem comum.
Se os preceitos da lei humana ou positiva são
derivados da lei natural, eles são conhecidos pela razão
e estão presentes no conhecimento. Desse modo, a
sociedade poderia até não fixá-los na lei humana ou
jurídica. Entretanto, nós os encontramos estabelecidos
no direito.
E isso se dá porque existem "pessoas propensas
aos vícios e neles obstinadas, e dificilmente podem ser
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guiadas pela persuasão. Assim, é necessário que sejam
obrigadas pela força e pelo temor a evitar o mal, para
que, abstendo-se de fazer o mal pelo menos por esse
motivo, deixem os outros em paz e, finalmente, por esse
hábito de evitar o mal, sejam levadas a fazer
voluntariamente o que antes só faziam por medo,
tornando-se assim virtuosas".
A coerção exercida pela lei humana, portanto,
tem a função de tornar possível a convivência pacífica
entre os homens, embora para Santo Tomás ela tenha
também função pedagógica. A lei humana, portanto,
pressupõe homens imperfeitos. E como ela não
reprime todos os vícios, mas somente os "que
prejudicam os outros" e que, como "os homicídios, os
furtos etc.", "ameaçam a conservação da sociedade
humana", da mesma forma "não se precisa ordenar
todos os atos virtuosos, mas somente aqueles que são
necessários ao bem comum".
Se a derivação da lei natural é essencial para a lei
humana, então é evidente que, quando uma lei humana
contradiz a lei natural, nesse caso ela não existe como
lei. Essa é a razio pela qual a lei deve ser justa. A
exemplo de Agostinho, também para Tomás "não
parece que possa haver lei se ela não for justa".
Se uma lei positiva estivesse em desacordo com
a lei natural, então ela "não seria mais urna lei, mas urna
corrupção da lei".
Portanto, se a lei humana não concorda com a
lei natural, ela não é lei, mas corrupção da lei. Essa ideia
de Tomás teve enorme influência, sendo
frequentemente invocada para impugnar leis jurídicas
consideradas em contradição com aquilo que aqueles
que impugnam tal lei consideram direito natural. Para
Tomás, a lei humana é moralmente valida quando
deriva da lei natural.
Na opinião de Tomás, as leis jurídicas injustas
são "mais violência do que leis". Entretanto, considera
ele, tais leis podem até ser obrigatórias, mas somente
onde seja necessário "evitar escândalo ou desordem".
Em todo caso, porém, é preciso sempre
desobedecer à lei injusta se ela for contra a lei divina
positiva, impondo a idolatria, por exemplo. E também
é justificada a rebelião contra o tirano. Para Tomás, é
lícito rebelar-se contra o tirano, com a condição de que
a rebelião não ocasione para os súditos males piores e
maiores do que a própria tirania.
Na opinião de Tomás, a monarquia é o melhor
tipo de governo, porque assegura melhor a ordem e a
unidade do Estado. E o pior tipo de governo é
precisamente a tirania, já que uma força que atua para o
mal é mais eficaz e, portanto, mais danosa, quando está
unida (como na tirania).
O Estado pode encaminhar os homens para o
bem comum e pode favorecer algumas virtudes, mas
não permite ao homem alcançar o seu fim último, que
é sobrenatural. Em suma, a lei natural e as leis positivas
servem aos fins terrenos do homem. Mas o homem tem
23
Prof. Anderson Pinho
um fim sobrenatural, que é precisamente a bemaventurança eterna. E a lex naturalis e a lex humana não
são suficientes para conduzir o homem a esse fim. Para
tanto, é necessária uma lei sobrenatural, trata-se da lex
divina, isto é, a lei revelada, a lei positiva de Deus que
encontramos no Evangelho, que é guia para alcançar a
bem-aventurança e que, além disso, preenche as lacunas
e imperfeições das leis humanas.
A fé como guia da razão
Deus é o ser supremo e perfeito, o ser
verdadeiro. Todo o resto é fruto do seu ato criativo,
livre e consciente. Essas são as duas teses aceitas por fé,
que cumprem a função de guias do discurso racional,
ou melhor, essa é a medida de avaliação com que Tomás
examina qualquer outro discurso filosófico e se
aproxima de Aristóteles para repropor suas teses mais
qualificadas.
O peso dessas teses na elaboração da metafisica
e das provas da existência de Deus foi tão relevante que
chegou a levar não poucos estudiosos a falarem de
filosofia cristã e não simplesmente de "filosofia". É
fácil nesse caso compreender como todos os problemas
propostos pela filosofia grega se modificam no quadro
da afirmação de que Deus é o ser supremo e criador.
Enquanto, no contexto tomista, Deus é fonte
do ser, de todo o ser, no contexto grego Deus é aquele
que dá forma ao mundo, moldando uma matéria
preexistente (Platão), ou então que dá origem ao cosmo,
atraindo-o com sua própria perfeição (Aristóteles).
O Deus dos filósofos gregos não dá o ser em
sentido radical e total, mas apenas certo modo de ser,
porque também a matéria existe desde a eternidade e é
dele independente. Para Tomás, ao contrário, além da
forma dos seres, Deus é o criador do ser dos seres.
Portanto, as provas cosmológicas, que parecem
tomadas em peso de Aristóteles, de certo modo mudam
de fisionomia. As provas não são físicas, mas físicometafisicas, por causa da relação primária e fundante,
constituída pelo ato criador.
Se o discurso no nível de ser mostra a
profundidade da relação dos seres com o ser supremo,
o discurso sobre o ato criador mostra a nova
perspectiva com a qual Tomás interpreta o mundo.
Como Deus é fonte de todo o ser nada escapa a sua
ação, nem mesmo a última determinação individual.
Mas só se pode dizer que cada coisa tem um
significado e uma vocação se cada realidade, enquanto
existente, é por ele conhecida e querida.
Os antigos problemas reencontram-se no
quadro dessas duas teses fundamentais, mas
aprofundados e renovados. Se Deus é o ser supremo e
criador, então as criaturas também são seres. Elas,
porém, não são o ser, mas têm o ser através do ato
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causal que, além das formas dos entes, também
determina o ser dos entes.
Além disso, se Deus é o ser supremo e o ser por
essência, como conceber criaturas fora dele? A essa
pergunta Tomás responde com a doutrina da analogia,
extraída de Aristóteles, mas com nova valência, porque
explica a similitude e a dessemelhança entre o ser
supremo e o ser parcial.
A essa categoria agrega-se outra noção, a de
participação, que esclarece ulteriormente como é
possível haver outros seres fora de Deus. Esses seres
nada mais são do que "participação" do ser divino.
Deus é o ser por essência, as criaturas por
participação.
Tal conceito implica amor, liberdade e
consciência, por meio dos quais Deus transmite seu ser
fora de si. O Deus de Aristóteles atrai para si as coisas
como causa final, coisas que, porém, não foram criadas
por ele; o Deus de Tomás atrai para si as criaturas, que
criou por amor, encerrando o ciclo de amor aberto com
o ato criador.
Mas poderá Deus criar para a sua gloria sendo
esta inalterável, porque não pode crescer nem diminuir?
Deus cria outros seres para que desfrutem de sua gloria,
como ele próprio a desfruta. Não é para si mesmo,
portanto, mas sim para nós que Deus difunde sua
gloria; não é para ganhá-la, porque já a possui; nem para
aumentá-la, porque já é perfeita, mas apenas para
comunicá-la.
O Deus de Tomás é o Deus do amor, sendo,
portanto, criador e provedor, não ficando encerrado no
círculo de seus pensamentos, como o Deus de
Aristóteles.
Nesse contexto, o problema do mal assume
outras conotações. Se Deus não existe, então o bem não
se explica. Mas, se Deus existe, de onde vem o mal?
Para a filosofia antiga, como o ser e o bem, o mal é o
não-ser, a matéria que se rebela contra a forma ou
contra a ação plasmadora do Demiurgo (Platão).
Tomás, para quem tudo provém de Deus, propõe o
problema do mal (físico e moral) em contexto diferente.
Sua raiz se encontra na contingência do ser
finito, que explica as mutações e a morte, bem como a
liberdade da criatura racional, que pode não reconhecer
sua dependência de Deus. O mal moral não é causado
pelo corpo. Não é o corpo que faz o espírito pecar, mas
o espírito que faz pecar o corpo. O mal moral não
significa diminuir o papel da racionalidade, como para
os filósofos gregos; não é identificável com o erro. O
mal é desobediência a Deus, é rejeição da dependência
fundamental em relação ao Criador. A raiz do mal está
na liberdade.
O pensamento de São Tomás de Aquino, por
ser o que de melhor a Igreja produziu na idade média,
influenciou suas ações durante séculos. Foi o que os
jesuítas, responsáveis pela educação dos jovens,
ensinaram nos mosteiros, escolas e universidades. E foi
24
Prof. Anderson Pinho
sobre o seu aporte teórico que caíram as críticas de
cientistas renascentistas como Galileu, e filósofos como
Descartes e Thomas Hobbes.
Leitura complementar
As verdades da razão natural não
contradizem as verdades da fé cristã
Se é verdade que a verdade da fé cristã
ultrapassa as capacidades da razão humana, nem por
isso os princípios inatos naturalmente à razão podem
estar em contradição com esta verdade sobrenatural.
É um fato que esses princípios naturalmente
inatos à razão humana são absolutamente verdadeiros;
são tão verdadeiros, que chega a ser impossível pensar
que possam ser falsos. Tampouco é permitido
considerar falso aquilo que cremos pela fé, e que Deus
confirmou de maneira tão evidente, que só o falso
constitui o contrário do verdadeiro, como se conclui
claramente da definição dos conceitos, é impossível que
a verdade da fé seja contrária aos princípios que a razão
humana conhece em virtude das suas forças naturais.
(...) Deus não pode infundir no homem
opiniões ou uma fé que vão contra os dados do
conhecimento adquirido pela razão natural.
É isto que faz o apóstolo São Paulo escreve, na
Epístola aos Romanos: "A palavra está bem perto de ti,
em teu coração e em teus lábios, ouve: a palavra da fé,
que nós pregamos" (Romanos, - capitulo 10. versículo
8). Todavia, já que a palavra de Deus ultrapassa o
entendimento, alguns acreditam que ela esteja em
contradição com ele. Isto não pode ocorrer.
Também a autoridade de Santo Agostinho o
confirma. No segundo livro da obra Sobre o Gênese
comentado ao pé da letra, o Santo afirma o seguinte:
"Aquilo que a verdade descobrir não pode contrariar
aos livros sagrados, quer do Antigo quer do Novo
Testamento".
Do exposto se infere o seguinte: quaisquer que
sejam os argumentos que se aleguem contra a fé cristã,
não procedem retamente dos primeiros princípios
inatos à natureza e conhecidos por si mesmos.
Por conseguinte, não possuem valor
demonstrativo, não passando de razões de
probabilidade sofismáticas. E não é difícil refutá-los.
(Santo Tomás de Aquino, Súmula contra os gentios, Os
pensadores, São Paulo. Abril Cultural, 1973, p. 70.)
Deus é imóvel
Daqui se infere ser necessário que o Deus que
põe em movimento todas as coisas é imóvel. Com
efeito, por ser a primeira causa motora, se Ele mesmo
fosse movido, sê-lo-ia ou por si mesmo ou por outro.
Ora, Deus não pode ser posto em movimento por outra
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causa motora, pois neste caso haveria, outra causa
anterior a Ele, com o que já não seria Ele a primeira
causa motora. Se fosse movido por si mesmo,
teoricamente isto poderia ocorrer de duas maneiras: ou
sendo Deus, sob o mesmo aspecto, causa e efeito ao
mesmo tempo, ou sendo Ele, sob um aspecto, causa de
si mesmo, e, sob outro, efeito.
Ora, a primeira hipótese não pode ocorrer, pois
tudo o que é movido está em potência, ao passo que o
que move está em ato (na qualidade de causa motora).
Se Deus fosse sob um e mesmo aspecto causa e efeito
ao mesmo tempo, seria necessariamente potência e ato
sob o mesmo aspecto e ao mesmo tempo, o que é
impossível.
Tampouco pode-se verificar a segunda hipótese
acima apontada. Pois, se Deus fosse sob um aspecto
causa motora, e sob outro efeito movido, já não seria a
primeira causa em virtude de si mesmo. Ora, o que é
por si mesmo, é anterior ao que não o é. Logo, é
necessário que a primeira causa motora seja totalmente
imóvel.
A mesma argumentação pode ser feita a partir
das causas motoras e dos defeitos existentes no
universo criado. Com efeito, parece que todo o
movimento procede de uma causa imóvel, a qual não é
movida segundo o mesmo tipo de movimento. Assim,
observamos que os processos de alteração, de geração
e de corrupção verificados no reino criado inferior se
reduzem ao corpo celeste (o Sol) como à sua primeira
causa motora, a qual por sua vez não é movida por
nenhuma outra situada dentro da mesma esfera, uma
vez que não pode ser gerada, nem corrompida, nem
alterada. Conclui-se, portanto, necessariamente que
aquele que constitui o princípio primário de todo
movimento é totalmente imóvel.
(Santo Tomás de Aquino, Compêndio de teologia, Col. Os
pensadores, São Paulo, Abril Cultural, 1973, p. 78.)
5.5 GUILHERME DE OCKHAN
A figura que mais do que
qualquer outra representa as
múltiplas instâncias com que se
encerra a Idade Média e se abre
o século XIV é o franciscano
Guilherme de Ockham, que
nasceu na vila de Ockham,
na Inglaterra, em 1285.
Conhecido como "o príncipe dos nominalistas",
no passado ele era lembrado o mais das vezes como
teórico de vis sutilezas, privadas de qualquer contato
com a realidade.
Logo, porém, sua originalidade emergiu
novamente nas várias vertentes do saber lógico,
cientifico, filosófico e teológico.
Além de suas contribuições lógicas, também se
destacam suas teorias físicas e, sobretudo, a concepção
25
Prof. Anderson Pinho
do conhecimento físico de natureza especificamente
empírica, bem como a separação entre a filosofia e a
teologia; no campo político-religioso, a autonomia do
aspecto temporal em relação ao espiritual, com suas
consequências políticas e institucionais.
O espirito "laico", mas não "laicista", se inicia
com ele, porque, com sua doutrina e sua vida, ele
encarna a incipiente afirmação dos ideais de dignidade
de cada homem, do poder criador do individuo e da
cultura em expansão, livre de censuras, ideias que a
nova época do Renascimento desenvolverá.
Independência da fé em relação à razão
Mais do que ninguém, Ockham tinha
consciência da fragilidade teórica da harmonia entre
razão e fé, bem como do caráter subsidiário da filosofia
em relação à teologia.
As tentativas de Tomás no sentido de mediar a
relação entre razão e fé com elementos aristotélicos ou
agostinianos, através da elaboração de complexas
construções metafisicas e gnosiológicas, pareciam-lhe
inúteis e danosas. O plano do saber racional, baseado
na clareza e evidência lógicos, e o plano da doutrina
teológica, orientado pela moral e baseado na luminosa
certeza da fé, são planos assimétricos.
Não se trata apenas de distinção, mas de
separação. As verdades de fé não são evidentes por si
mesmas, como os princípios da demonstração; não são
demonstráveis, como as conclusões da própria
demonstração; não são prováveis, porque parecem
falsas para os que se servem da razão natural.
A filosofia não é serva da teologia, que não é
mais considerada ciência, mas sim um complexo de
proposições mantidas em vinculação não pela coerência
racional, e sim pela força de coesão da fé.
Nesse contexto e em tal direção, Ockham
transformou outra verdade cristã, a suprema
onipotência de Deus, em instrumento de dissolução das
metafisicas do cosmo que se haviam cristalizado nas
filosofias ocidentais de inspiração aristotélica e
neoplatonizante.
Se a onipotência de Deus é ilimitada e o mundo
é obra contingente de sua liberdade criadora, então, diz
Ockham, não há nenhuma vinculação entre Deus
onipotente e a multiplicidade dos indivíduos finitos,
singularmente, além do laço que brota de puro ato de
vontade criadora da parte de Deus e, portanto, não
tematizável por nós, mas conhecido apenas por sua
sabedoria infinita.
Então, o que são os sistemas de exemplares
ideais, de formas platônicas ou de essências universais,
propostos por Agostinho como intermediários entre o
Logos divino e a grande multiplicidade das criaturas,
senão resíduos de razão soberba e pagã?
O mesmo se diga das doutrinas da analogia, das
causas e, antes, da metafisica do ser de Tomás de
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Aquino, que instituem relações reais ou de alguma
continuidade entre a onipotência de Deus e a
contingência das criaturas. Essas metafisicas pertencem
a um reino que está a meio caminho entre a fé e a razão,
incapaz de alimentar uma e sustentar a outra.
O primado do indivíduo
A clara distinção entre Deus onipotente e a
multiplicidade dos indivíduos, sem nenhum laço além
do que pode ser identificado com o puro ato da vontade
divina criadora, racionalmente indecifrável, é tão clara a
ponto de induzir Ockham a conceber o mundo como
conjunto de elementos individuais, sem nenhum laço
verdadeiro entre si e não ordenáveis em termos de
natureza ou de essência. A exaltação do indivíduo é tal
que Ockham nega até mesmo a distinção interna entre
matéria e forma no indivíduo, distinção que, se fosse
real, comprometeria a unidade e a existência do
indivíduo.
Eis, então, as duas consequências fundamentais
do primado absoluto do indivíduo. Antes de mais nada,
em contraste com as concepções aristotélicas e
tomistas, segundo as quais o verdadeiro saber tem
como objeto o universal, Ockham considera que o
objeto próprio da ciência é constituído pelo objeto
individual. A segunda é que todo o sistema de causas
necessárias e ordenadas, que constituíam a estrutura do
cosmo platônico e aristotélico, cede seu lugar a um
universo fragmentado em inúmeros indivíduos
isolados,
absolutamente
contingentes
porque
dependentes da livre escolha divina.
Nesse contexto, pode-se compreender a
irrelevância dos conceitos de ato e potência, bem como
de matéria e forma, nos quais baseava-se há mais de um
século a problemática metafisica e gnosiológica
ocidental.
Conhecimento intuitivo e abstrativo
O primado do indivíduo leva ao primado da
experiência, na qual se baseia o conhecimento. A esse
respeito, é necessário distinguir entre conhecimento
não-complexo, relativo aos termos singulares e aos
objetos que eles designam, e conhecimento
complexo, relativo às proposições resultantes,
compostas de termos. A evidência de uma proposição
deriva da evidência dos termos que a compõem. Não
havendo esta, não pode haver aquela. Daí a importância
do conhecimento não-complexo, que pode ser
intuitivo e abstrativo.
O conhecimento intuitivo se refere à existência
de um ser concreto e por isso move-se na esfera da
contingência, porque atesta a existência ou não de uma
realidade. A importância do conhecimento intuitivo
consiste antes de mais nada no fato de que é o
conhecimento fundamental, sem o qual os outros tipos
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de conhecimento não seriam possíveis. Com o
conhecimento intuitivo chegamos a saber se uma coisa
existe ou não existe, e assim o intelecto julga de modo
imediato sobre a realidade ou irrealidade de qualquer
coisa.
O conhecimento intuitivo perfeito se tem
quando o objeto, por exemplo, da arte ou da ciência, é
uma realidade presente; ele é, ao contrário, imperfeito,
quando se refere a qualquer realidade do passado.
O conhecimento intuitivo pode ser tanto
sensível (conhecer esta mesa) como intelectual,
enquanto o intelecto conhece também seus próprios
atos e os movimentos da alma, como o amor, a dor ou
o prazer. Portanto, o empirismo de Ockham é
indubitavelmente radical, mas absolutamente não
fundamentado nos sentidos.
O conhecimento abstrativo deriva do
conhecimento intuitivo e pode ser entendido de dois
modos: de um lado, quando se refere a algo abstraído
de muitos singulares; por outro lado, enquanto faz
abstração da existência e não-existência das coisas
contingentes.
Consequentemente, o objeto de ambos os
conhecimentos é idêntico, mas captado sob aspectos
diversos: o intuitivo capta a existência ou a inexistência
de uma realidade, ao passo que o abstrativo prescinde
desses dados. Os dois conhecimentos são
intrinsecamente distintos porque cada qual tem o seu
próprio ser: o primeiro diz respeito a juízos de
existência, o segundo não; o primeiro está ligado à
existência ou não de uma coisa (por exemplo, este livro
sobre a mesa), o segundo prescinde disso; o primeiro é
causado pelo objeto presente, o segundo o pressupõe e
é posterior sua apreensão; o primeiro trata de verdades
contingentes, o segundo de verdades necessárias e
universais.
Mas em que sentido o conhecimento abstrato
persegue verdades necessárias e universais?
O que é então o conhecimento abstrativo? É
sinônimo do conhecimento extraído de muitos objetos
individuais. Se cada realidade singular provoca um
conhecimento também singular, a repetição de muitos
atos de conhecimento relativos a coisas semelhantes
entre si gera no intelecto conceitos que não significam
uma coisa singular, mas uma multiplicidade de coisas
semelhantes entre si.
Como sinais abreviatórios de coisas
semelhantes, tais conceitos são chamados universais,
não representando, portanto, nada mais que a reação do
intelecto à presença de realidades semelhantes. Assim,
se o nome "Sócrates" se refere a determinada pessoa, o
nome "homem" é mais genérico e abstrato, porque se
refere a todos os indivíduos que podem ser indicados
pela forma geral e abreviatória típica daquele conceito,
que por isso é chamado de universal.
Mas, se não existe uma natureza comum nem se
pode considerar real o universal, como fica então a
ciência que, segundo os aristotélicos e os agostinianos,
não tem por objeto o singular, mas sim o universal?
Naturalmente, as premissas de Ockham
excluem um sistema de leis universais e, mais ainda,
uma estrutura hierárquica e sistemática do universo.
Mas será que a queda dessa construção metafisica
prejudica todo saber?
Segundo o príncipe dos nominalistas, tal tipo de
saber metafísico cristaliza danosamente o saber. Para
ele, é suficiente um tipo de conhecimento provável,
que, baseando-se em repetidas experiências, permite
prever que o que aconteceu no passado tem alto grau
de possibilidade de acontecer também no futuro.
Abandonando,
portanto,
a
confiança
aristotélica e tomista nas demonstrações metafisicofísicas, ele teoriza certo grau de probabilidade derivada
da pesquisa e, ao mesmo tempo, a estimula em um
universo de coisas individuais e múltiplas, não
correlatas por nexos imutáveis e necessários.
O nominalismo
A “navalha de Ockham”
Em muitas oportunidades e sem vacilações,
Ockham afirmou que o universal não é real. A realidade
do universal, portanto, é contraditória, devendo ser
total e radicalmente excluída. A realidade é
essencialmente individual.
Os universais são nomes, não uma realidade,
nem algo com fundamento na realidade. A realidade,
portanto, é essencialmente individual.
Como ficam então o conhecimento abstrativo e
o caráter universal de suas proposições? Se ele não é real
nem tem fundamento na realidade, é licito falar ainda
de universal?
Os universais não são coisas existentes fora da
alma, nas coisas. Eles são simplesmente formas verbais
por meio das quais a mente humana estabelece uma
série de relações de exclusiva dimensão lógica.
Nesse contexto de extrema fidelidade ao
individual não é difícil captar as implicações do preceito
metodológico, simples na enunciação, mas fecundo em
consequências, assim formulado: "Não se deve
multiplicar os entes se não for necessário".
Conhecido como a "navalha de Ockham", esse
lema tornou-se arma crítica contra o platonismo das
essências e contra os aspectos do aristotelismo em que
se percebe mais a presença de elementos platônicos.
Em rápida sequência, vejamos como, na filosofia de
Ockham, caem por terra os pilares da metafisica e da
gnosiologia tradicional.
Antes de mais nada, é fundamental a rejeição da
metafisica do Ser analógico de Tomás, em nome do
único laço entre finito e infinito, constituído pelo puro
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ato da vontade criadora de Deus, ato que não é passível
de nenhuma tematização racional.
Juntamente com o conceito metafísico de ser
analógico, cai também o conceito de substância. Nós só
conhecemos das coisas as qualidades ou os acidentes
que a experiência revela. O conceito de substância
representa apenas uma realidade desconhecida,
arbitrariamente enunciada como conhecida. Nenhum
motivo milita em favor de tal entidade, cuja admissão
viola o princípio da economia da razão.
O mesmo se diga da noção metafísica de causa
eficiente. Aquilo que é cognoscível empiricamente é a
diversidade entre causa e efeito, ainda que no constante
suceder-se deste àquela. É possível enunciar as leis que
regulam o decurso dos fenômenos, mas não um
pretenso vínculo metafísico e, portanto, necessário
entre causa e efeito. E o que se diz da causa eficiente
vale também para a causa final.
Quem afirma que ela atua enquanto querida e
desejada fala metaforicamente, porque o desejo e o
amor não implicam ação efetiva. Ademais, não é
possível demonstrar que um evento qualquer tenha
causa final. Não tem sentido dizer que o fogo queima
em função de um fim, uma vez que não é necessário
postular um fim para que se tenha tal efeito.
No que se refere à gnosiologia, com suas
implicações metafísicas, o discurso é mais simples.
Diante do tema de se é ou não necessário distinguir o
intelecto agente do intelecto possível, tão debatido
entre aristotélicos e averroístas e aristotélicos-tomistas,
Ockham afirma que essa é uma questão ociosa.
Ele não apenas nega essa distinção como
supérflua, mas afirma com decisão a unidade do ato
cognoscitivo e a individualidade do intelecto que o
realiza.
A suposta necessidade de categorias e de
princípios universais, que levara a distinção entre
intelecto agente e intelecto possível, é considerada
artificiosa e completamente inútil para a concretização
efetiva do conhecimento. Se o conjunto das operações
cognoscitivas é único, também único deve ser o
intelecto que o realiza.
Tal sequência de críticas à construção metafisica
e gnosiológica com a qual Ockham se defronta nos
sugere duas observações.
Antes de mais nada, a "navalha de Ockham"
abre caminho para um tipo de consideração
"econômica" da razão, que tende a excluir do mundo e
da ciência os entes e conceitos supérfluos, a começar
pelos entes e conceitos metafísicos, que imobilizam a
realidade e a ciência, configurando-se como norma
metodológica que mais tarde seria definida como
rejeição das "hipóteses ad hoc". Por outro lado, tal crítica
parte do pressuposto de que não é necessário admitir
nada fora dos indivíduos, bem corno, por fim, de que o
conhecimento fundamental é o conhecimento
empírico.
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Deus
No que se refere ao conhecimento de Deus,
Ockham nega que se possa conhecer Deus
intuitivamente e afirma que nenhuma das provas a
posteriori precedentemente elaboradas sobre causas
seja convincente. Neste caso, mais que falar de causas
eficientes (que fazem as coisas ser ou não ser),
deveríamos falar de causas conservantes (que
conservam ou não conservam), graças as quais e fácil
inferir, da existência em ato do mundo, a existência de
Deus.
O conhecimento que a razão pode obter de
Deus é de fato escasso, enquanto de outro porte é o que
a fé consegue obter por meio da revelação. Desse
modo, por causa da manifesta incapacidade do
pensamento de afirmar algo de significativo sobre
Deus, não há mais razão de continuar na busca de uma
colaboração entre fé e razão; o equilíbrio entre fé e
razão fora um dos principais problemas de todo o
pensamento medieval.
A síntese do pensamento de Ockham não será,
portanto, nem entender para crer (Tomás), nem crer
para entender (Agostinho), mas crer e entender.
Poder papal e real
Ockham foi um dos mais inteligentes
intérpretes da decadência, na consciência coletiva, dos
ideais e dos poderes universais encarnados pelas duas
figuras teocráticas: o imperador e o pontífice romano.
A defesa intransigente do "individuo" como
única realidade concreta, a tendência de basear o valor
do conhecimento na experiência direta e imediata, bem
como a separação programática entre a experiência
religiosa e o saber racional e, portanto, entre fé e razão,
não podiam deixar de conduzi-lo à defesa da autonomia
do poder civil em relação ao poder espiritual e,
portanto, a exigência de profunda transformação da
estrutura e do espirito da Igreja.
Trata-se de projeto que, pelo que se pode ver a
partir destes últimos elementos, atinge todos os
fundamentos da cultura medieval, lançando os
pressupostos da cultura humanista-renascentista.
Envolvido no conflito entre o papado e o
império, Ockham pretende redimensionar o poder do
pontífice e retirar o caráter sagrado do império,
interessado mais no primeiro do que no segundo.
Se o papa tivesse recebido de Cristo tal
plenitude de poderes e se comportasse em
consequência, submeteria a si todos os cristãos.
Teríamos então uma escravidão pior do que a antiga,
porque diria respeito a todos os homens.
Trata-se então de uma tese não apenas contrária
ao Evangelho, mas também às exigências fundamentais
da convivência humana.
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Na realidade, seu poder é limitado. O papa é
ministrador, não dominador; deve servir, não sujeitar.
Seu poder foi instituído em benefício dos súditos e não
para que lhes fosse retirada aquela liberdade que está na
base do ensinamento de Cristo.
E tal poder não cabe ao papa, nem ao Concilio,
porque ambos são falíveis. Não é o papa, nem o
Concilio, e sim a Igreja, como comunidade livre de fiéis,
que, no curso de sua tradição histórica, sanciona as
verdades que constituem sua vida e seu fundamento.
A que seria reduzida a presença do Espirito
Santo na comunidade dos fiéis se a função de sancionar
leis ou impor verdades coubesse ao papa e ao Concilio?
A teocracia e a aristocracia não têm lugar na
Igreja. É preciso abrir espaço para os fiéis, para todos
os fiéis, membros efetivos da Igreja, cuja comunidade é
a única à qual compete a infalibilidade.
8. A DECADÊNCIA DA ESCOLÁSTICA
Do século XIV em diante, a escolástica sofre
um processo de autoritarismo de nefastas influências no
pensamento filosófico e científico. Posturas
dogmáticas, contrárias à reflexão, obstruem as
pesquisas e a livre investigação. O princípio da
autoridade, ou seja, a aceitação cega das afirmações
contidas nos textos bíblicos e nos livros dos grandes
pensadores, sobretudo Aristóteles, impede qualquer
inovação. É a obscura fase do magister dixii, que significa
"o mestre disse"...
O rigor do controle da Igreja se faz sentir nos
julgamentos feitos pelo Santo Ofício (Inquisição),
órgão que examinava o caráter herético ou não das
doutrinas.
Conforme o caso, as obras eram colocadas no
Index, lista das obras proibidas. Se a leitura fosse
permitida, a obra recebia a chancela Nihil obstat (nada
obsta), podendo ser divulgada. Quando consideravam
o caso muito grave, o próprio autor era julgado.
Foi trágico o desfecho do processo contra
Giordano Bruno (séc. XVI), acusado de panteísmo e
queimado vivo por ter defendido com exaltação poética
a doutrina da infinitude do universo e por concebê-lo
não como um sistema rígido de seres, articulados em
uma ordem dada desde a eternidade, mas como um
conjunto que se transforma continuamente.
Foi talvez a lembrança ainda recente deste
acontecimento que tenha levado Galileu a abjurar,
temendo o mesmo destino de Bruno.
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QUESTÕES
1. A Escolástica é o período da filosofia crista da Idade
Média, que vai do século IX ao século XIV. Sobre a
Escolástica é correto afirmar, EXCETO
A) No século XIII, servindo-se das traduções das obras
de Aristóteles, que foram feitas diretamente do grego,
Tómas de Aquino realizou a síntese magistral entre a
teologia crista e a filosofia aristotélica.
B) A fundação das universidades, já no século XI,
permitiu a expansão da cultura letrada, secularmente
guardada nos mosteiros e a fermentação de idéias que
culminaram nos grandes sistemas filosóficos e
teológicos do século XIII.
C) No século XII a Igreja condenou o pensamento
platônico, principalmente na sua versão árabe, porque
os teólogos perceberam um ateísmo intrínseco na
forma de argumentação dialética da personagem
Sócrates.
D) No século XIV surgiram pensadores, tais como
Guilherme de Ockam, que criticaram a filosofia tomista
pelo seu caráter substancialista; isto abriu perspectivas
fecundas para o advento da ciência moderna.
2. Uma das tendências fundamentais de pensamento da
Idade Média é a Escolástica. A Escolástica caracterizase por vários elementos, tais, como:
A) A filosofia aristotélico – tomista, o pensamento de
Descartes, o ensino trivium e quadrivium e o pensamento
de Santo Agostinho.
B) O pensamento de Patrística, a valorização da
indagação empírica, as universidades e a filosofia
platônica.
C) O ensino do trivium e quadrivium, filosofia platônica,
o pensamento de Descartes e as universidades.
D) A influencia da filosofia grega, o ensino do trivium e
quadrivium, as universidades e a filosofia aristotélicotomista.
3. Os árabes, entre os Séculos VII e XI, ampliaram suas
conquistas e forjaram importante civilização. Sob a ação
catalisadora do Islã, foi mantida a unidade política,
enquanto que o comércio destacou-se como elo do
relacionamento tolerante com muitos povos. Além
disso, argumenta-se que os valores culturais da
Antiguidade Clássica chegaram ao conhecimento do
Mundo Moderno Ocidental porque os árabes
A) traduziram e difundiram entre os europeus
importantes obras sobre o saber grego.
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B) propagaram a obra Mil e uma Noites, mostrando que
ela se baseia em lendas chinesas.
C) introduziram na Europa novas técnicas de cultivo e
a habilidade na representação de figuras humanas.
D) profetizavam o destino do homem através das
estrelas.
E) desenvolveram uma ciência não submetida aos
ensinamentos religiosos.
4. Leia o texto abaixo : “Dos gêneros e das espécies não
direi aqui se eles existem ou são postos somente no
intelecto, nem, no caso que existam, se não corpóreos,
se separados das coisas sensíveis ou situados nas
próprias coisas e exprimindo os seus caracteres
comuns”.
PORFÍRIO, Isagoge, I.
No texto acima, que deu origem à disputa sobre
universais no período da Escolástica, Porfírio faz
referência
A) À teoria das Ideias de Platão que, por meio de
Sócrates, afirmava que nada se podia saber.
B) À teoria da iluminação de Santo Agostinho, porque
Agostinho foi o primeiro a criticar o recurso à lógica
para se investigarem as verdades eternas.
C) Às Categorias de Aristóteles, em que se encontra
enunciada a lista das dez maneiras pelas quais um
atributo pode ser predicado de um sujeito.
D) À prova da existência de Deus, apresentada por
Santo Tomás de Aquino através das cinco vias da Suma
Teológica.
5. (UFU 2010) Para responder a questão, leia o seguinte
texto.
O universal é o conceito, a ideia, a essência comum a
todas as coisas (por exemplo, o conceito de ser
humano). Em outras palavras, pergunta-se se os
gêneros e as espécies têm existência separada dos
objetos sensíveis: as espécies (por exemplo, o cão) ou
os gêneros (por exemplo, o animal) teriam existência
real? Ou seriam apenas ideias na mente ou apenas
palavras?
(ARANHA, M. L. A. & MARTINS, M. H. Filosofando. 3ª
edição. São Paulo: Moderna, 2003, p. 126.)
A resposta correta à pergunta formulada no texto
acima, sobre os universais, é:
A) Segundo os nominalistas, as espécies e gêneros
universais são meras palavras que expressam um
conteúdo mental, sem existência real.
B) Segundo os nominalistas, os universais são
conceitos, mas têm fundamento na realidade das coisas.
C) Segundo os nominalistas, os universais (gêneros e
espécies) são entidades realmente existentes no mundo
das Ideias, sendo as coisas deste mundo meras cópias
destas Ideias.
D) Segundo os nominalistas, os gêneros e as espécies
universais existem realmente, mas apenas na mente de
Deus.
6. (UEM 2009) A questão dos universais é introduzida
na Filosofia Medieval pelos comentários de Boécio à
sua tradução da lógica de Aristóteles no século VI.
Todavia a polêmica acerca da existência real dos
universais assume forma e importância maior a partir
do século XI. Sobre a questão dos universais, assinale o
que for correto.
01) Para os realistas, os particulares são as coisas mais
reais; para os nominalistas, o mais real é o abstrato.
02) As coisas abrangidas por um universal, embora
diversas e múltiplas, são semelhantes em alguns
aspectos.
04) Santo Anselmo foi um realista em sua concepção
dos universais, ou seja, acreditou que os universais têm
realidade objetiva.
08) Para os nominalistas, como Roscelino, os universais
são simples palavras que expressam os conteúdos
mentais.
16) Por universal entende-se conceito, ideia, gênero,
espécie ou propriedade predicada de vários indivíduos.
7. (UEM 2008) A questão dos universais foi um dos
grandes problemas debatidos na Filosofia Medieval. A
dificuldade era determinar o modo de ser das idéias
gerais, gêneros ou espécies, tais como homem, animal
etc.; ou seja, saber se os universais correspondem a uma
realidade fora de nós ou se são puras abstrações do
espírito e sem realidade. Realismo e nominalismo foram
as duas soluções típicas do problema, surgindo o
conceitualismo como solução intermediária. Em
relação à questão dos universais, assinale o que for
correto.
01) O realismo, de inspiração platônica, afirmava que os
universais existiam na realidade, independentemente
das coisas individuais.
02) Os realistas foram os primeiros filósofos a
acreditarem na realidade virtual; foram, assim,
precursores da inteligência artificial.
04) Uma forma moderada de realismo foi defendida por
Santo Tomás de Aquino, o qual, sob influência de
Aristóteles, supôs que o universal estaria na coisa, como
sua forma ou substância; depois da coisa, como
conceito no intelecto; e antes da coisa, na mente divina,
como modelo das coisas criadas.
08) No conceitualismo de Pedro Abelardo, os
universais são conceitos que não existem na realidade,
nem são meros nomes; eles são o significado dos nomes
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Prof. Anderson Pinho
e podem subsistir mesmo na falta de particulares a que
se apliquem.
16) O nominalismo asseverou que os universais nada
têm de real; são meros nomes, pois o que realmente
existe são os particulares.
8. O filósofo grego que maior influência exerceu sobre
Santo Tomás de Aquino foi:
A) Platão
B) Aristóteles
C) Sócrates
D) Heráclito
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Tomás de Aquino está seguro de que nada se pode
acrescentar a Deus, porque
A) sua essência composta de essência e existência é
auto-suficiente para gerar indefinidamente matéria e
forma,
criando
todas
as
coisas.
B) sua essência simples é gerada incessantemente,
embora não seja composta de matéria e forma,
multiplica-se em si mesmo na pluralidade dos seres.
C) é essência divina, absolutamente simples e idêntica a
si mesma, constituindo-se, necessariamente, uma
essência única.
D) é ser contingente, no qual essência e existência não
dependem do tempo, por isso, gera a si mesmo
eternamente, dando existência às criaturas.
E) Parmênides
9. Para Santo Tomás de Aquino, um dos princípios do
conhecimento humano era o princípio da causa
eficiente. Esse princípio da causa eficiente exigia que o
ser contingente:
A) Não exigisse causa alguma
B) Fosse causado pelo intelecto humano
C) Fosse causado pelo ser necessário
D) Fosse causado por acidentes casuais
E) Fosse causado pelo nada
10. Em O ente e a essência, Tomás de Aquino argumenta
sobre a existência de Deus, refutando teses de outras
doutrinas da filosofia escolástica. Com este propósito
ele escreveu:
“Tampouco é inevitável que, se afirmarmos que Deus é
exclusivamente ser ou existência, caiamos no erro
daqueles que disseram que Deus é aquele ser universal,
em virtude do qual todas as coisas existem
formalmente. Com efeito, este ser que é Deus é de tal
condição, que nada se lhe pode adicionar. (...) Por este
motivo afirma-se no comentário à nona proposição do
livro Sobre as Causas, que a individuação da causa
primeira, a qual é puro ser, ocorre por causa da sua
bondade. Assim como o ser comum em seu intelecto
não inclui nenhuma adição, da mesma forma não inclui
no seu intelecto qualquer precisão de adição, pois, se
isto acontecesse, nada poderia ser compreendido como
ser, se nele algo pudesse ser acrescentado."
AQUINO, Tomás. O ente e a essência. Trad. de Luiz João
Baraúna. São Paulo: Nova Cultural, 1988, p. 15. Coleção .Os
Pensadores.
11. Leia o trecho a seguir e assinale se as proposições
apresentadas são (V) verdadeiras ou (F) falsas,
conforme o texto. “Se é verdade que a verdade da fé
cristã ultrapassa as capacidades da razão humana, nem
por isso os princípios inatos naturalmente à razão
podem estar em contradição com esta verdade
sobrenatural. É um fato que esses princípios
naturalmente inatos à razão humana são absolutamente
verdadeiros e mesmo impossível pensar que sejam
falsos. Tampouco é permitido considerar falso aquilo
que cremos pela fé, e que Deus confirmou de forma tão
evidente. Já que só o falso constitui o contrário do
verdadeiro, é impossível que a verdade da fé seja
contrária aos princípios que a razão humana conhece
naturalmente. Deus não pode infundir no homem
opiniões ou uma fé que vão contra os dados do
conhecimento adquirido pela razão natural. (...) Do
exposto se infere o seguinte: quaisquer que sejam os
argumentos que se aleguem contra a fé cristã, não
procedem retamente dos primeiros princípios inatos à
natureza e conhecidos por si mesmos. Por conseguinte,
não possuem valor demonstrativo, não passando de
razões de probabilidades ou sofismáticas. E não é difícil
refutá-los”.
(AQUINO, Santo Tomás. Suma contra gentios. Col. Os Pensadores.
São Paulo, Abril, 1970).
1 ( ) O texto exemplifica a preocupação, quase geral
dentre os chamados “filósofos medievais”, em conciliar
as verdades de fé contidas na Bíblia com as verdades
descobertas por nossa Razão, isto é, conciliar a Fé com
a Razão Natural.
2 ( ) O texto mostra como Tomás de Aquino
considerava a Filosofia inútil e perigosa para o
cristianismo, uma vez que, por si só, ela não prova as
verdades da fé além de levantar dúvidas sobre as
verdades bíblicas.
31
Prof. Anderson Pinho
3 ( ) Um dos objetivos do texto é mostrar que os
argumentos contrários à fé cristã podem ser todos
refutados, isto é, podemos mostrar racionalmente que
são todos falsos porque não há contradição entre
verdade de fé e verdade de razão.
4 ( ) Nesse texto, nos deparamos com um dos
pressupostos fundamentais do pensador católico
medieval: a crença na verdade revelada, isto é, a crença
nas proposições da Bíblia, como inquestionáveis
porque reveladas por Deus.
5 ( ) Pelo texto depreende-se a atitude filosófica de
Tomás de Aquino, para quem é impossível
compreender as verdades da fé cristã por meio de nossa
razão natural; somente a fé é que pode nos ajudar.
Marque a opção correta:
A) F, V, F, V, V
B) V, V, V, V, F
C) V, V, V, F, V
D) V, F, V, V, F
12. Leia o trecho abaixo:
“Respondo dizendo que a existência de Deus pode ser
demonstrada por cinco vias”.
Tomas de Aquino. Suma Teológica, São Paulo: Abril
Cultural, 1979. Col. Os Pensadores.
Assinale a afirmativa correta:
A) Todas as cinco vias seguem argumentos baseados
em elementos anímicos, como em Santo Agostinho.
B) Todas as cinco vias fundamentam-se nos dados
revelados da Sagrada Escritura.
C) Todas as cinco vias empregam argumentos baseados
na tradição patrística.
D)Todas as cinco vias partem de uma realidade sensível,
como elemento empírico, e do princípio de causalidade,
como elemento racional.
13. “Em sua teoria do conhecimento, Tomás de Aquino
substitui a doutrina da iluminação divina pela da
abstração, de raízes aristotélicas: a única fonte de
conhecimento humano seria a realidade sensível, pois
os objetos naturais encerrariam uma forma inteligível
em potência, que se revela, porém, não aos sentidos que
só podem captá-la individualmente - mas ao intelecto.”
(NÁCIO, Inês C. e LUCA, Tânia Regina de. Opensamento medieval.
São Paulo: Ática, 1988, p. 74.)
Considerando o trecho citado, assinale a alternativa
verdadeira.
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A) O texto faz referência à influência de Aristóteles no
pensamento de Tomás de Aquino, que se opõe, em
muitos pontos, à tradição agostiniana, que tinha
influência de Platão.
B) O texto expõe a doutrina da iluminação, formulada
por Tomás de Aquino para explicar a origem de nosso
conhecimento.
C) Para Tomás de Aquino, a realidade sensível é apenas
uma cópia enganosa da verdadeira realidade que se
encontra na mente divina.
D) Tomás de Aquino substitui a doutrina da iluminação
pela teoria da abstração aristotélica, a fim de mostrar
que a fé em Deus é incompatível com as verdades
científicas.
14. (UFU 2011) Considere o seguinte texto sobre
Tomás de Aquino (1226-1274). Fique claro que Tomás
não aristoteliza o cristianismo, mas cristianiza
Aristóteles. Fique claro que ele nunca pensou que, com
a razão se pudesse entender tudo; não, ele continuou
acreditando que tudo se compreende pela fé: só quis
dizer que a fé não estava em desacordo com a razão, e
que, portanto, era possível dar-se ao luxo de raciocinar,
saindo do universo da alucinação.
Eco, Umberto. “Elogio de santo Tomás de Aquino” in: Viagem na irrealidade
cotidiana, p.339.
É correto afirmar, segundo esse texto, que:
A) Tomás de Aquino, com a ajuda da filosofia de
Aristóteles, conseguiu uma prova científica para as
certezas da fé, por exemplo, a existência de Deus.
B) Tomás de Aquino se empenha em mostrar os erros
da filosofia de Aristóteles para mostrar que esta filosofia
é incompatível com a doutrina cristã.
C) o estudo da filosofia de Aristóteles levou Tomás de
Aquino a rejeitar as verdades da fé cristã que não
fossem compatíveis com a razão natural.
D) a atitude de Tomás de Aquino diante da filosofia de
Aristóteles é de conciliação desta filosofia com as
certezas da fé cristã.
15. (UFU 2009) Leia com atenção o texto abaixo:
“Nos três primeiros artigos da 2ª questão da Suma de
Teologia, Tomás de Aquino discute sobre a existência de
Deus. Suas conclusões são: 1) a existência de Deus não
é auto evidente, sendo preciso demonstrá-la; 2) a
existência de Deus não pode ser demonstrada a partir
de sua essência (pois isso ultrapassa a nossa capacidade
de conhecimento); 3) a existência de Deus pode ser
demonstrada, contudo, a partir de seus efeitos
(demonstração quia), isto é, a partir da natureza criada
podemos conhecer algo a respeito do seu Criador. A
partir disso, ele desenvolve cinco argumentos ou vias
32
Prof. Anderson Pinho
segundo as quais se pode mostrar, a partir dos efeitos,
que Deus existe.”
Adaptado de: MARCONDES, Danilo. Iniciação à história da filosofia. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Editor, 2000. p. 126-130.
Sobre as cinco vias da prova da existência de Deus,
elaboradas por Tomás de Aquino, assinale a alternativa
INCORRETA.
A) Nos argumentos de Tomás de Aquino sobre a
existência de Deus, pode-se perceber a influência dos
escritos de Aristóteles em seu pensamento.
B) Segundo a prova teleológica, tudo que obedece a
uma finalidade pressupõe uma inteligência que o criou
com tal finalidade, como o carpinteiro em relação a uma
mesa; ora, percebemos a finalidade no Universo (todas
as criaturas têm uma finalidade); logo, Deus é o
princípio que dá essa finalidade ao Universo.
C) Qualquer pessoa que consiga compreender os
argumentos das cinco vias conhecerá, com certeza
evidente, a essência de Deus.
D) Segundo a prova que se baseia no movimento, Deus
é considerado o motor imóvel, isto é, como a causa
primeira do movimento que percebemos no mundo, e
deve ser imóvel para evitar o regresso ao infinito.
16. (UFU 2012) A teologia natural, segundo Tomás de
Aquino (1225-1274), é uma parte da filosofia, é a parte
que ele elaborou mais profundamente em sua obra e na
qual ele se manifesta como um gênio verdadeiramente
original. Se se trata de física, de fisiologia ou dos
meteoros, Tomás é simplesmente aluno de Aristóteles,
mas se se trata de Deus, da origem das coisas e de seu
retorno ao Criador, Tomás é ele mesmo. Ele sabe, pela
fé, para que limite se dirige, contudo, só progride graças
aos recursos da razão.
GILSON, Etienne. A Filosofia na Idade Média, São Paulo: Martins Fontes,
1995, p. 657.
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AQUINO, Tomás de. Súmula contra os Gentios. Capítulo Terceiro: A possibilidade de
descobrir a verdade divina. Tradução de Luiz João Baraúna. São Paulo: Abril Cultural,
1979, p. 61.
Para São Tomás de Aquino, a existência de Deus se
prova
A) por meio do movimento que existe no Universo, na
medida em que todo movimento deve ter causa exterior
ao ser que está em movimento.
B) por meios metafísicos, resultantes de investigação
intelectual.
C) apenas pela fé, a razão é mero instrumento acessório
e dispensável.
D) apenas como exercício retórico.
E) através da investigação dialética
proporcionada pelo método maiêutico.
racional
18. Para Santo Tomás, filosofia e teologia são ciências
distintas porque:
a) A filosofia se funda no exercício da razão humana e
a teologia na revelação divina.
b) A filosofia é uma ciência complementar à teologia.
c) A filosofia nos traz a compreensão da verdade que
será comprovada pela teologia.
d) A revelação é critério de verdade, por isso não se
pode filosofar.
e) A teologia é a mãe de todas as ciências e a filosofia
serve apenas para explicar pontos de menor
importância.
De acordo com o texto acima, é correto afirmar que
A) a obra de Tomás de Aquino é uma mera repetição
da obra de Aristóteles.
B) Tomás parte da revelação divina (Bíblia) para
entender a natureza das coisas.
C) as verdades reveladas não podem de forma alguma
ser compreendidas pela razão humana.
D) é necessário procurar a concordância entre razão e
fé, apesar da distinção entre ambas.
17. (UFU 2013) Com efeito, existem a respeito de Deus
verdades que ultrapassam totalmente as capacidades da
razão humana. Uma delas é, por exemplo, que Deus é
trino e uno. Ao contrário, existem verdades que podem
ser atingidas pela razão: por exemplo, que Deus existe,
que há um só Deus etc.
19. “Em sua teoria do conhecimento, Tomás de Aquino
substitui a doutrina da iluminação divina pela da
abstração, de raízes aristotélicas: a única fonte de
conhecimento humano seria a realidade sensível, pois
os objetos naturais encerrariam uma forma inteligível
em potência, que se revela, porém, não aos sentidos que
só podem captá-la individualmente - mas ao intelecto.”
NÁCIO, Inês C. e LUCA, Tânia Regina de. Opensamento medieval.
São Paulo: Ática, 1988, p. 74.
Considerando o trecho citado, assinale a alternativa
verdadeira.
A) O texto faz referência à influência de Aristóteles no
pensamento de Tomás de Aquino, que se opõe, em
33
Prof. Anderson Pinho
muitos pontos, à tradição agostiniana, que tinha
influência de Platão.
B) O texto expõe a doutrina da iluminação, formulada
por Tomás de Aquino para explicar a origem de nosso
conhecimento.
C) Para Tomás de Aquino, a realidade sensível é apenas
uma cópia enganosa da verdadeira realidade que se
encontra na mente divina.
D) Tomás de Aquino substitui a doutrina da iluminação
pela teoria da abstração aristotélica, a fim de mostrar
que a fé em Deus é incompatível com as verdades
científicas.
20. Tomás de Aquino não via conflito entre a fé e a
razão, sendo possível para a segunda atingir o
conhecimento da existência de Deus. Contudo, Tomás
de Aquino defende a relação harmônica entre ambas,
pois, se a razão demonstra a existência de Deus, ela o
faz graças à fé que revela tal verdade. Assim, a filosofia
de Tomás de Aquino insistiu nos limites do
conhecimento humano.
Com base nas afirmações precedentes, assinale a
alternativa correta.
A) O conhecimento humano atinge a verdade do
mundo e de Deus sem precisar se servir de outra ordem
que não aquela da própria razão, o que se confirma com
o fato de que os governantes organizam o mundo
conforme sua inteligência.
B) A realidade sensível é a via direta e exclusiva para a
ascensão do conhecimento humano, porque, tal como
afirmou Santo Anselmo, a perfeição de Deus tem, entre
seus atributos, a existência na realidade mundana.
C) Existe um domínio comum à fé e à razão. Este
domínio é a realidade do mundo sensível, morada
humana, que a razão pode conhecer, porque a realidade
sensível oferece à razão os vestígios imperfeitos da
substância de Deus.
D) A razão humana é impotente para tratar de idéias
que estejam além da realidade do mundo sensível. Deus,
portanto, nada mais é que uma palavra que deve ser
reverenciada como o centro sensível de irradiação de
tudo o que existe.
21. (UNICENTRO 2011) Para São Tomás de Aquino,
existem, pelo menos, três motivos que conduzem os
homens à obediência da lei, que são
A) os costumes adquiridos em uma cultura, a
emancipação social e a prazerosa fruição estética.
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B) a educação recebida dos pais, o simples deleite ético
e o esclarecimento jurídico.
C) o medo da punição, os meros ditames da razão e a
bondade perfeita da virtude.
D) a tirania de um legislador, a consciência política e
social e a vocação religiosa.
E) a punição das instâncias divinas, a vocação religiosa
e o prazer de obedecer.
22. (UEM 2012) Tomás de Aquino (1225-1274), no seu
livro A Realeza, afirma: “Comecemos apresentando o
que se deve entender pela palavra rei. Com efeito, em
todas as coisas que se ordenam a um fim que pode ser
alcançado de diversos modos, faz-se necessário algum
dirigente para que se possa alcançar o fim do modo
mais direto. Por exemplo, um navio, que se move em
diversas direções pelo impulso de ventos opostos, não
chegará ao seu fim de destino se não for dirigido ao
porto pela habilidade do comandante”.
(AQUINO, T. de. A realeza: dedicado ao rei de Chipre. In:
Antologia de textos filosóficos. Curitiba: SEED-PR, 2009, p. 667.)
Conforme esse trecho, é correto afirmar que
01) o rei, como um dirigente, não tem um poder
opressor ou dominador sobre os súditos.
02) o rei é aquele que realiza as coisas sem
intermediários.
04) o rei não é necessário em todas as decisões, mas
somente naquelas que envolvem interesses coletivos.
08) as ações do rei não precisam levar em conta os
desejos dos súditos, mas considerar aquilo que é melhor
para o reino.
16) o rei ou o comandante tem a função de dirigir,
orientar, o que não implica uma imposição de sua
vontade aos súditos.
23. Leia o texto a seguir : Num livro muito lido durante
a idade média, a Isagoge, de Porfírio (234-305), o autor
se pergunta se os gêneros e espécies (por exemplo,
“animal” e “homem”) existem como realidades fora de
nosso pensamento ou são puro produto de nossa
atividade mental (conceitos ou idéias)?
Adaptado de: NASCIMENTO, CARLOS ARTHUR R. O que é
filosofia Medieval. São Paulo: Brasiliense, 2004. p. 40-41.
Assinale a alternativa correta.
a) O texto de Porfírio refere-se à questão dos universais,
um dos principais temas filosóficos debatidos durante a
Idade Média.
b) Os pensadores medievais não se interessaram pelo
problema posto por Porfírio, pois era impossível
resolvê-lo com os conhecimentos da época.
c) A resposta a esse problema, segundo a qual os
universais têm algum tipo de existência fora da mente
34
Prof. Anderson Pinho
humana, é chamada de nominalismo.
d) A posição filosófica que considera que os universais
são puro produto de nossa atividade mental é chamada
de realismo.
24. (UEM 2013) “Com efeito, não seremos capazes de
rebater as investidas dos hereges ou de quaisquer infiéis,
se não soubermos refutar suas argumentações e
invalidar seus sofismas com argumentos verdadeiros,
para que o erro ceda à verdade e os sofismas recuem
perante os dialéticos: sempre prontos, segundo a
exortação de São Pedro, a satisfazer a quem nos peça,
razões da esperança ou da fé que nos anima. Se no curso
dessas disputações conseguirmos vencer aqueles
sofistas, apareceremos como verdadeiros dialéticos; e
como bons discípulos, tanto mais nos lembraremos de
Cristo, que é a própria verdade, quanto mais fortes nos
mostrarmos na verdade das argumentações”
(ABELARDO, P. Epístola 13. In: CHALITA, G. Vivendo a
filosofia: ensino médio. 4.ª ed. São Paulo: Ática, 2011, p. 146).
A partir do trecho citado, assinale o que for correto.
01) O filósofo mostra a necessidade de argumentos
racionais (dialéticos) para a defesa da doutrina cristã.
02) Nos debates, não basta apenas invocar a palavra de
Cristo, é preciso elaborar argumentos racionais contra
os infiéis.
04) A dialética é um instrumento argumentativo contra
os sofismas, inserindo o debate no campo filosófico e
não no campo doutrinal da fé.
08) A fraqueza da argumentação dos infiéis está na sua
inconsistência lógica e racional.
16) Os hereges e os infiéis serão convencidos somente
com argumentos oriundos da Bíblia.
25. (UEM 2013) “Os artigos de fé não são princípios
de demonstrações nem conclusões, não sendo nem
mesmo prováveis, já que parecem falsos para todos,
para a maioria ou para os sábios, entendendo por sábios
aqueles que se entregam à razão natural, já que só de tal
modo se entende o sábio na ciência e na filosofia.”
(OCKHAM, G. [1280-1349]. In: COTRIM, G. Fundamentos de
Filosofia, São Paulo: Saraiva, 2006, p. 120).
A partir do trecho citado, é correto afirmar que
01) os argumentos calcados na fé não podem ser
submetidos a demonstrações lógicas.
02) o filósofo apresenta a típica separação entre aquilo
que é do domínio da fé e do domínio da razão para o
pensamento medieval.
04) os artigos de fé são falsos por natureza, visto que
não estão submetidos nem à ciência nem à filosofia.
08) as demonstrações e as conclusões, para os filósofos,
não podem ser deduzidas a partir de princípios falsos.
16) a distinção entre a teologia e a ciência ou a filosofia
está, entre outras coisas, nos diferentes procedimentos
ou nos métodos de comprovação utilizados por elas.
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26. (UEM 2008) Guilherme de Ockham (1280-1349)
traz novas idéias à teoria política, “ainda que continue
teológica, isto é, referida à vontade suprema de Deus.
Diante da tradição teocrática medieval, são novas as
idéias de comunidade política natural, lei humana
política e direito natural dos indivíduos como sujeitos
dotados de consciência e de vontade.”
(CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. 13.ª ed., São Paulo: Ática,
2008, p. 366).
Assinale o que for correto.
01) Guilherme de Ockham não separa o poder
espiritual da Igreja do poder temporal da comunidade
política; por essa razão, ele afirma que, em nenhuma
hipótese, o bom cristão pode contestar a autoridade da
palavra do Papa.
02) O tiranicídio não é admitido por Guilherme de
Ockham, todavia os governados podem resistir ao
tirano e procurar instrumentos legais que contestam sua
autoridade para forçá-lo a abdicar.
04) Guilherme de Ockham pertence à corrente
nominalista, segundo a qual os conceitos universais são
apenas conteúdos da nossa mente, expressos em
nomes, isto é, são apenas palavras sem nenhuma
realidade específica correspondente.
08) Contrariamente ao que pensava Santo Agostinho, o
homem, para Guilherme de Ockham, não foi dotado de
livre-arbítrio, razão pela qual não pode ser
responsabilizado pelos seus atos.
16) Guilherme de Ockham reconhece dois grandes
tipos de direitos naturais: o direito natural objetivo, isto
é, a ordem natural hierárquica estabelecida pela lei
divina, e o direito natural subjetivo, possuído pelo
indivíduo como ser racional e livre.
27. (UEM 2014) “Dizemos: cada pessoa é, por
exemplo, um ser humano, porém, há coisas que não lhe
pertencem como ser humano. Contudo, não se isenta
delas na existência como, por exemplo, a definição de
suas medidas, sua cor, sua aparência e aquilo que é
notório nele e outras coisas deste tipo. Todas estas
coisas, mesmo sendo humanas, não são condições para
que ele seja humano, caso contrário, todas as pessoas
seriam iguais neste âmbito. Apesar disso, inteligimos
que há algo, ou seja: o ser humano. Que pobre é o
discurso daquele que afirma o seguinte: o ser humano é
esta totalidade percebida (pelos sentidos)!”
(AVICENA. A filosofia e sua divisão, in MARÇAL, J., Antologia
de textos filosóficos. Curitiba: SEED-PR, 2009, p. 90-91).
Com base nesta afirmação de Avicena, assinale o que
for correto:
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Prof. Anderson Pinho
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01) A definição do ser humano depende de suas
atribuições sensíveis.
No trecho citado, Tomás de Aquino justifica a
monarquia como o regime de governo capaz de
02) A classe social de um indivíduo compõe um dos
elementos da definição do ser humano.
a) refrear os movimentos religiosos contestatórios.
04) A identidade racial distingue os seres humanos de
outros seres vivos.
b) promover a atuação da sociedade civil na vida
política.
08) O conceito de ser humano é inteligível.
c) unir a sociedade tendo em vista a realização do bem
comum.
16) Qualificações como peso, altura e aparência física
distinguem um ser humano de outro ser humano.
d) reformar a religião por meio do retorno à tradição
helenística.
QUESTÕES ENEM
e) dissociar a relação política entre os poderes temporal
e espiritual.
1. (2015) Se os nossos adversários, que admitem a
existência de uma natureza não criada por Deus, o
Sumo Bem, quisessem admitir que essas considerações
estão certas, deixariam de proferir tantas blasfêmias,
como a de atribuir a Deus tanto a autoria dos bens
quanto dos males. Pois sendo Ele fonte suprema da
Bondade, nunca poderia ter criado aquilo que é
contrário à sua natureza.
AGOSTINHO. A natureza do Bem. Rio de Janeiro: Sétimo
Selo, 2005 (adaptado).
Para Agostinho, não se deve atribuir a Deus a origem
do mal porque
A) o surgimento do mal é anterior à existência de Deus.
B) o mal, enquanto princípio ontológico, independe de
Deus.
C) Deus apenas transforma a matéria, que é, por
natureza, má.
D) por ser bom, Deus não pode criar o que lhe é
oposto, o mal.
E) Deus se limita a administrar a dialética existente
entre o bem e o mal.
2. (2015) Ora, em todas as coisas ordenadas a algum
fim, é preciso haver algum dirigente, pelo qual se atinja
diretamente o devido fim. Com efeito, um navio, que se
move para diversos lados pelo impulso dos ventos
contrários, não chegaria ao fim do destino, se por
indústria do piloto não fosse dirigido ao porto; ora, tem
o homem um fim, para o qual se ordenam toda a sua
vida e ação. Acontece, porém, agirem os homens de
modos diversos em vista do fim, o que a própria
diversidade dos esforços e ações humanas comprova.
Portanto, precisa o homem de um dirigente para o fim.
AQUINO. T. Do reino ou do governo dos homens: ao rei do
Chipre. Escritos políticos de Santo Tomás de
Aquino. Petrópolis: Vozes, 1995 (adaptado).
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GABARITO
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16. d
QUESTÕES PATRÍSTICA
17. a
1. 1/4/16
18. a
2. 1/4/8
19. a
3. 1/2/4/8/16
20. c
4. a
21. c
5. e
22. 1/4/8/16
6. d
23. a
7. c
24. 1/2/4/8
8. b
25. 1/2/8/16
9. c
26. 2/4/16
10. c
27. 8/16
11. b
QUESTÕES ENEM
12. c
1. d
13. d
2. c
14. b
15. b
QUESTÕES ESCOLÁSTICA
1. c
2. d
3. a
4. c
5. a
6. 2/4/8/16
7. 1/4/8/16
8. b
9. c
10. c
11. d
12. d
13. a
14. d
15. c
37
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