Departamento de Química INTERAÇÕES AMINOÁCIDOS - SURFACTANTE NÃO IÔNICO EM FORMULAÇÕES À BASE ÁGUA Aluna: Ana Luiza Bandeira de Mello de Albuquerque Campos Orientadora: Aurora Pérez Gramatges Introdução As interações de proteínas com surfactantes são cruciais para um amplo espectro de aplicações nas indústrias biológica, farmacêutica e cosmética [1,2]. O estudo do mecanismo das interações proteína-surfactante contribui à maior compreensão sobre o papel desses compostos anfifílicos na purificação e desnaturação das proteínas e outras biomoléculas de interesse. Os surfactantes iônicos, tais como o laurel sulfato de sódio (SDS), perturbam fortemente a estrutura da proteína nativa [3]. Por outro lado, os surfactantes não iônicos possuem um efeito insignificante na conformação da proteína devido à ausência de cargas nas moléculas superficialmente ativas. Embora exista um grande número de estudos na literatura que descrevam a interação de surfactantes iónicos com proteínas, as interações com surfactantes não iônicos não tem sido vastamente exploradas. Em particular, é interessante avaliar a interação a nível molecular dos aminoácidos essenciais que apresentam grupos na sua estrutura capazes de interagir com as moléculas de surfactante. Objetivo Estudo das interações a nível molecular entre aminoácidos e um surfactante não iônico (Tween 20) em soluções aquosas. Metodologia Os aminoácidos utilizados durante o projeto foram Fenilalanina (Fen), Alanina (Ala) e Cisteína (Cis), os quais foram preparados em solução tampão de fosfatos (PBS, pH=7,2). O surfactante avaliado foi o éster de sorbitol polietoxilado (polissorbato 20, Tween®20), um surfactante não iônico comumente usado como excipiente nas indústrias farmacêutica, cosmética e de alimentos. Água destilada e deionizada foi usada em todos os experimentos. O método experimental para a avaliação das interações entre os aminoácidos e o surfactante foi baseado em medidas de tensão superficial de equilíbrio pelo método do anel (du Nuoy), usando um tensiômetro Kruss. Os experimentos foram realizados para avaliar o comportamento da tensão superficial do surfactante e de cada aminoácido, assim como das misturas surfactante-aminoácido, todas em solução aquosa. No primeiro caso, foram adicionadas progressivamente alíquotas da solução do surfactante ou do aminoácido à cubeta contendo água, até a tensão superficial alcançar um valor mínimo estável. No caso das misturas, a solução inicial na cubeta continha uma solução de aminoácido em concentração 1 mmol L-1 e o surfactante foi adicionado até a tensão superficial ficar estável. A concentração micelar crítica (CMC) foi determinada pela interseção entre as duas tendências lineares no gráfico de tensão superficial vs. logaritmo da concentração. Esse valor crítico foi usado para determinar o grau de interação entre o surfactante e o aminoácido em questão. Departamento de Química Resultados Os aminoácidos escolhidos não possuem carga ao longo de sua estrutura no pH de trabalho (7,2), em concordância com os valores de pKa correspondentes aos grupamentos ácido (-COOH) e amino (-NH2). Os respectivos pKa para os aminoácidos são: 2,58 / 9,24 (Fen); 2,35 / 9,87 (Ala); 2,05 / 10,25 (Cis). Percebe-se que, para um pH 7,2, os grupos carboxílicos não se dissociam em –COO- e H+, mas se mantêm na forma ácida. O mesmo raciocínio se aplica aos grupos amino, que se mantêm na sua forma básica (-NH2). Os resultados do estudo da tensão superficial dos aminoácidos individuais mostraram que a alanina praticamente não muda a tensão da água, enquanto a fenilalanina e a cisteína apresentaram certa atividade superficial, sendo maior no caso da última. Entretanto. é importante salientar que os três aminoácidos apresentaram uma tensão mínima acima de 58 mN m-1, na faixa de concentrações estudadas (0,05 mmol L-1 - 0,02 mol L-1). Portanto, esperase que essas contribuições individuais não interfiram na avaliação da interação com o surfactante, o qual é muito mais ativo superficialmente. Por outro lado, as curvas de tensão superficial do surfactante não iônico em presença das soluções de aminoácidos mostraram que existe uma interação significativa com os três compostos, observando-se um deslocamento dos valores da CMC do surfactante. Esses resultados podem ser entendidos considerando as estruturas e características físico-químicas dos aminoácidos, em particular com relação aos parâmetros de solubilidade (S) e hidrofobicidade (logP). A solubilidade máxima segue a ordem Fen (S = 0,16 mol L-1) < Ala (S = 1,84 mol L-1) < Cisteína (S = 2,29 mol L-1). A análise quanto a afinidade com a fase orgânica é similar, fazendo uso do logP, onde P é o coeficiente de partição: quanto maior o valor de logP, maior é a quantidade de soluto na fase orgânica. Assim, a Fenilalanina é a mais hidrofóbica (logP = -1,38), depois Alanina (logP = 2,85) e Cisteína (logP = 2,49). Conclusões Os aminoácidos Fenilalanina, Alanina e Cisteína, os quais formam parte da estrutura molecular das proteínas globulares comumente usadas em formulações farmacêuticas e cosméticas, apresentaram uma interação significativa com o surfactante não iônico Tween®20. Apesar dos aminoácidos exibirem atividade na interface água/ar, a mesma não interfere na determinação da interação com o surfactante. Os resultados deste estudo indicam que o efeito de excipiente deste tipo de surfactante em formulações pode ser atribuído às interações moleculares com os aminoácidos de caráter anfifílico que compõe as proteínas. Referências 1. BUTLER, H. (Ed.), Poucher's Perfumes, Cosmetics and Soaps, 10th ed., Kluwer Academic Publishers, Dordrecht, 2000. 2. CARPENTER, J.F., MANNING, M. (Eds.), Rational design of stable protein formulations, Kluwer Academic/Plenum Publishers, New York, 2002. 3. OTZEN, D. Protein–surfactant interactions: A tale of many states, Biochim. Biophys. Acta, 1814, 562–591, 2011.