ASSOCIAÇÃO ENTRE ALTERAÇÕES DO SONO E QUALIDADE DE

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE SO SUL
FACULDADE DE MEDICINA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS MÉDICAS: PSIQUIATRIA.
Dissertação de Mestrado
ASSOCIAÇÃO ENTRE ALTERAÇÕES DO SONO E QUALIDADE DE
VIDA EM PACIENTES COM TRANSTORNO DE HUMOR BIPOLAR EM
EUTIMIA
Larriany Maria Falsin Giglio
Orientador: Prof. Dr. Flávio Pereira Kapczinski
Porto Alegre, julho de 2008
2
Dedico este trabalho ao meu pai, que mesmo distante,
tenho certeza, continua acreditando e torcendo por mim.
3
Agradecimentos
Flávio Kapczinski, obrigada pela oportunidade de conviver com você, exemplo de
profissional. Obrigada principalmente por acreditar no meu trabalho.
Carlos Galia, o primeiro e grande incentivador a iniciar esse mestrado. Importante ter
alguém que acredite que somos capazes.
Ana Cristina, obrigada por acreditar que o sono dos nossos pacientes é importante,
sem isso esse sonho ainda não estaria realizado.
Júlio Walz, incansável, presente em todos os momentos desse trabalho.
A todos os colegas do Laboratório de Pesquisa Experimental, lugar que escolhi como
extensão da minha casa.
Aos pacientes do programa de Atendimento de Transtorno de Humor Bipolar do
Hospital de Clínicas, sem eles nada disso seria possível.
Agradecimento especial a Tainá, ao Luiz e ao Carlos, meu porto seguro.
4
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .........................................................................................................7
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA...............................................................................8
2.1 Transtorno de humor bipolar..............................................................................8
2.1.1 - Características clínicas .............................................................................8
2.1.2 Fisiopatologia do THB ..............................................................................10
2.1.3 THB e qualidade de vida ..........................................................................13
2.2 Fisiologia do sono ...........................................................................................14
2.2.1 Sono normal.............................................................................................18
2.2.2 Insônia.......................................................................................................18
2.2.2.1 Fisiopatologia da insônia ...................................................................19
2.2.2.2 Diagnóstico .........................................................................................20
2.3 Distúrbios do Sono em Psiquiatria ..................................................................22
2.3.1 Transtornos do humor ...............................................................................23
2.3.2 Transtornos de ansiedade.........................................................................25
2.3.3 Transtorno do pânico ...............................................................................26
2.3.4 Transtorno de estresse pós-traumático.....................................................27
2.3.5 Esquizofrenia ............................................................................................28
2.3.6 Alcoolismo.................................................................................................29
2.3.7 Demências ................................................................................................30
2.4 Sono e THB .....................................................................................................32
3 REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICA.....................................................................................34
4 JUSTIFICATIVA .....................................................................................................55
5 OBJETIVOS ...........................................................................................................55
6 METODOLOGIA.....................................................................................................57
7 ASPECTOS ÉTICOS .............................................................................................57
8 ARTIGO..................................................................................................................59
9 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................69
5
LISTA DE ABREVIATURAS
BDNF = fator neurotrófico derivado do cérebro (do inglês brain-derived neurotrophic
factor)
BPD = do inglês, bipolar disorder
CREB = elemento responsivo ao cAMP (do inglês cAMP response element binding)
COMT = catecol-metiltransferase
DA = dopamina
EEG = eletroencefalograma
EMO = eletromiograma
EOG = eletroculograma
GAF = do inglês, Global Assessment of Functioning, Avaliação Global da
funcionalidade
GSK-3b = glicogênio sintase cinase 3-beta (do inglês glycogen synthase kinase 3beta)
HAM-D = escala para avaliação de depressão de Hamilton
WHOQOL = instrumento de avaliação da qualidade de vida da organização mundial
da saúde
5-HTTR= receptor do transportador de serotonina
Li+ = lítio
MAO = mono-aminotrasferase
NREM = do inglês Non Rapid Eye Movement, não movimento rápido dos olhos
PB = paciente bipolar
QV = qualidade de vida
PET = tomografia por emissão de pósitrons
PGO = ponto-genículo-occipital
REM = do inglês, Rapid Eye Moviment, movimento rápido dos olhos
SCID = entrevista clínica estruturada para transtornos mentais
SP = sono paradoxal
TAG = transtorno de ansiedade generalizada
THB = transtorno de humor bipolar
VPT = valproato
6
Resumo
Introdução: Distúrbios do sono têm sido descrito no transtorno de humor bipolar
(THB). Dentre as queixas específicas podemos incluir: os despertares freqüentes
durante a noite; pobre qualidade de sono; redução do tempo total de sono e
pesadelos. A maioria dos pacientes com THB apresentam problemas relacionados à
insônia, mas uma porcentagem significativa de pacientes apresenta sintomas de
hipersonia com aumento de horas de sono a noite e sonolência excessiva diurna.
Métodos: cento e noventa pacientes bipolares tipo I diagnosticados através de uma
entrevista clínica estruturada para transtornos mentais DSM-IV (SCID), foram
distribuídos em dois grupos baseados na presença ou ausência de distúrbios do sono
verificadas pelas questões 4, 5 e 6 da escala de avaliação para depressão de
Hamilton (HAM-D), qualidade de vida (QV), incapacidade e disfunção global foram
avaliadas usando o instrumento de avaliação da qualidade de vida da organização
mundial da saúde (WHOQOL-Brief), a escala de incapacidade (Sheehan) e a
avaliação de funcionalidade global (GAF), respectivamente. Resultados: as queixas
de sono tiveram um impacto negativo na qualidade de vida geral, observada na
diminuição dos escores da WHOQOL e da GAF e aumento nos escores da Sheehan.
Conclusão: os nossos resultados mostraram que pacientes eutímicos possuem
alterações significativas do sono e, especialmente, que estas alterações estão
fortemente associadas a uma pior qualidade de vida avaliada através da WHOQOL,
GAF e SHEEHAN, indicando a importância de manter um sono normal nos pacientes
bipolares (PB). Futuros estudos são justificáveis para pesquisar o dano do distúrbio
do sono usando escalas mais específicas.
Palavras chaves: Doença Bipolar, Sono, Qualidade de Vida, Insônia, Incapacidade,
Funcionalidade Geral
7
1 INTRODUÇÃO
Pacientes com THB freqüentemente apresentam dificuldades sociais,
relações interpessoais e ocupacionais. A avaliação da qualidade de vida (QV) tem
como objetivo determinar a preferência do paciente, além de permitir comparações
entre condições diferentes e detecta diferenças sutis na resposta ao tratamento que
podem ser perdidas pelas medidas de desfecho tradicionais (Michalak et al., 2005).
Pacientes com THB mostraram pior QV principalmente nos domínios físico e
psicológico. O estudo de Gazalle et al (2007) detectou que os sintomas maníacos
estiveram associados a piores escores de QV na maioria dos domínios e que os
itens “irritabilidade” e “sono” foram os mais associados à pior QV (Gazalle et al.,
2007).
Muitos estudos mostraram que aproximadamente metade dos pacientes com
insônia crônica tem um problema de sono que surgiu devido a um transtorno
psiquiátrico. As causas psiquiátricas de insônia são encontradas: nas psicoses, nos
transtornos do humor, ansiedade, transtorno do pânico e demência. Além disso,
problemas do sono são especialmente prevalentes na esquizofrenia, na depressão,
na mania e em outras doenças mentais. Todos os anos, transtornos do sono,
privação do sono e sonolência somam milhões para as contas de seguros de saúde
em países industrializados (Costa e Silva, 2006).
8
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 Transtorno de humor bipolar
2.1.1 Características clínicas
O Transtorno de Humor Bipolar (THB) acomete de 1-3% da população em
todo o mundo, e está associado a um alto índice de suicídio e desemprego
(Weissman et al., 1996; Grant et al., 2005; Müller-Oerlinghausen et al., 2002).
Segundo a Organização Mundial da Saúde, o THB é considerado uma das dez
principais causas de incapacitação (Lopez e Murray, 1998). O curso clínico do THB é
crônico, usualmente caracterizado por períodos de exacerbação dos sintomas
(episódios agudos) intercalados por períodos subsindrômicos e períodos de
remissão (eutimia). Em um estudo de seguimento, que acompanhou pacientes
bipolares tipo I por um período médio de 13 anos, se observou que os pacientes
permaneceram metade deste período sintomático (Judd et al., 2002). Além disto,
observa-se que a persistência de sintomas subsindrômicos está associada a um
maior risco de reagudização da doença (Perlis et al., 2006) e maior índice de
incapacitação (Judd et al., 2005).
Do ponto de vista do diagnóstico, os autores pressupõem que a ocorrência de
pelo menos um episódio maníaco ou hipomaníaco durante a vida é suficiente para a
identificação do THB, na qual a presença de episódio maníaco confere o diagnóstico
de THB tipo I, enquanto a presença de episódio hipomaníaco, definido como
confere o diagnóstico de THB tipo II (Belmaker, 2004). A presença de um episódio
maníaco é definida por uma elevação persistente do humor (humor eufórico ou
irritável), acompanhado por pelo menos 3 dos seguintes sintomas (4 se humor
irritável):
a) aumento da autoconfiança ou grandiosidade;
b) taquilalia ou pressão por falar;
c) diminuição da necessidade do sono;
d) pensamento acelerado ou fuga de idéias;
e) distratibilidade;
9
f) alteração
do
comportamento
dirigido
para
atividades
prazerosas,
freqüentemente imprudentes ou perigosas;
g) ou agitação psicomotora.
O episódio hipomaníaco é definido como um período distinto, durante o qual
existe um humor anormal e persistentemente elevado, expansível ou irritável, com
duração mínima de 4 dias O período de humor anormal deve ser acompanhado pelo
menos 3 sintomas (4 se humor irritável) adicionais iguais aos relacionados na lista
de sintomas citados para diagnóstico de mania.
Além disso, o episódio deve ser suficientemente grave para causar prejuízo
significativo no âmbito familiar, social ou ocupacional, ou necessidade de
hospitalização ou ter presença de sintomas psicóticos. Devido ao seu curso crônico
e à freqüente reincidência e gravidade dos sintomas de humor, o tratamento do THB
atualmente baseia-se no manejo dos episódios agudos e no tratamento de
manutenção como prevenção para ocorrência de novos episódios (Yatham et al.,
2005). Além dos episódios serem incapacitantes, estudos mostram que a demora no
diagnóstico e o número maior de crises refletem ou prognosticam uma piora
cognitiva e clínica geral do paciente bipolar. Além disto, estudos ainda indicam que
alterações neuroquímicas induzidas pela mania estão associadas ao surgimento de
efeitos lesionais em células neurais (Post et al., 1982; Friedman et al., 1993;
Johnston-Wilson et al., 2000). Ou seja, a conduta para que os pacientes se
mantenham eutímicos o maior tempo possível, tem um efeito de proteção neuronal,
na medida em que durante as fases maníacas e depressivas os mesmos estão mais
suscetíveis aos efeitos de danos ao ácido desoxiribonucléico (DNA) (Andreazza et
al., 2007).
Entretanto, os índices de recorrência e de resistência aos medicamentos de
primeira linha são bastante elevados. Dois estudos que avaliaram indivíduos
bipolares tratados em instituições acadêmicas demonstraram que uma alta
porcentagem
dos
pacientes
permanece
sintomática,
mesmo
quando
“adequadamente tratados” (Post et al., 2003; Dennehy et al., 2005). Embora os
medicamentos de última geração possuam um melhor perfil de tolerabilidade e
segurança em relação aos tradicionais, muito pouco se adicionou, do ponto de vista
da eficácia, em relação aos primeiros medicamentos (Castrén, 2005). Possivelmente
este pequeno avanço no tratamento do THB se deve ao pouco conhecimento que
ainda se tem acerca dos mecanismos fisiopatológicos envolvidos neste transtorno
10
(Zarate et al., 2006). O tratamento do THB tipicamente envolve farmacoterapia.
Entretanto, mesmo em pacientes aderentes a esse tratamento, o risco de recaída
num período de 5 anos tem sido estimada em 73% (Gitlin et al., 1995).
2.1.2 Fisiopatologia do THB
Apesar dos crescentes esforços para o entendimento da neurobiologia do
THB, sua exata fisiopatologia permanece indeterminada. As bases biológicas do THB
incluem
estudos
relacionados
à
genética,
às
vias
neuro-hormonais,
à
neurotransmissão, às vias de transdução de sinal, à regulação da expressão gênica,
ao estresse oxidativo, entre outros (Yatham et al, 2005). As bases biológicas do THB
mostram ser um quadro complexo de interação entre os múltiplos genes que causam
suscetibilidade, bem como a relação destes com os fatores ambientais e suas
conseqüências para o organismo.
Dados provenientes de estudos genéticos demonstram que o risco de um
indivíduo com familiar em primeiro grau portador de THB de desenvolver a doença é
cerca de 10 vezes maior do que a população em geral (Goodwin and Jamison, 1990).
Além disso, estudos com gêmeos homozigóticos mostram que o risco de desenvolver
THB para um indivíduo cujo gêmeo idêntico possui a doença é de 67% (Goodwin and
Jamison, 1990). Embora o THB apresente um elevado padrão de herdabilidade, a
busca por genes de suscetibilidade tem demonstrado que a maioria das pesquisas,
envolvendo estudos de genes únicos, apresenta resultados negativos. Resultados de
meta-análise sugerem, entretanto, que alguns genes funcionais apresentam modesta,
mas significativa associação com aumento de suscetibilidade para THB (Craddock
and Forty, 2006). São eles: o gene do transportador de serotonina (5-HTTR), o gene
da enzima que degrada as catecolaminas, catecol-O-metiltransferase (COMT) o gene
da enzima que degrada as monoaminas, monoamine oxidase A (MAO) e o gene do
fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF) (Cradock e Forty, 2006). De fato, esses
achados sugerem que a suscetibilidade para THB pode estar associada a genes
diretamente envolvidos com os sistemas de neurotransmissão (5-HTTR, COMT e
MAO) e maturação, sobrevivência e plasticidade neuronal (BDNF) (Coyle e Duman,
2002).
Estudos neuroanatômicos, baseados nas imagens obtidas por ressonância
magnética, demonstram alterações do volume de determinadas regiões cerebrais
envolvidas na regulação do humor. Achados que têm sido replicados no THB incluem:
11
a) diminuição do volume do córtex pré-frontal subgenual (Drevets et al, 2001).
O córtex pré-frontal de pacientes bipolares contém menos neurônios não-piramidais,
particularmente aqueles com fenótipo GABAérgico (Knable 1999; Beasley et al,
2002).
b) aumento do volume da amígdala e do estriado (Hajek et al, 2005;
Strakowski, et al, 2005).
Já os estudos neurofuncionais, baseados em ressonância magnética funcional
e tomografia por emissão de pósitrons (PET), apontam para uma diminuição
significativa do metabolismo do córtex pré-frontal durante a depressão e subseqüente
aumento em algumas regiões do córtex pré-frontal durante a fase maníaca (Malhi et
al., 2004; Strakowski et al, 2005). Além disso, diversos estudos de neuroimagem têm
sugerido níveis aumentados de dopamina durante episódios de mania e que os
efeitos anti-maníacos estão associados à diminuição de dopamina (para revisão ver
Yatham et al, 2005 e Berk et al, 2007). Um estudo de PET demonstrou que o
tratamento com valproato de sódio reduziu a captação de 18F-DOPA no estriado de
pacientes bipolares em episódio maníaco, sugerindo uma diminuição da função
dopaminérgica pré-sináptica após o uso de valproato de sódio (Yatham et al., 2002).
Alterações de receptores dopaminérgicos no THB têm sido demonstradas em dois
estudos que observaram um aumento de 25% da expressão do RNA mensageiro
(RNAm) do receptor dopaminérgico D1 na região CA2 do hipocampo (Pantazopoulos
et al., 2004) e uma menor expressão do receptor D3 em linfócitos de indivíduos
bipolares (Vogel et al., 2004). Mais recentemente, foi sugerido que variações do gene
do transportador de DA podem estar envolvidas na suscetibilidade para o
desenvolvimento do THB (Greenwood et al., 2006). Em conjunto, esses estudos
indicam que alterações do sistema dopaminérgico podem estar envolvidas nos
mecanismos fisiopatológicos do THB. Interessantemente, o aumento dos níveis de
dopamina é importante fonte de estresse oxidativo no cérebro, devido ao
metabolismo de oxidação da dopamina (Rees et al, 2007; Chen et al, 2008).
Em paralelo, tem sido demonstrado que antidepressivos e estabilizadores de
humor atuam modulando diversas cascatas de sinalização celular envolvidas em
neuroplasticidade e sobrevivência neuronal (Manji, Drevets e Charney, 2001;
Schaltiel, Chen e Manji, 2007). A primeira evidência surgiu dos trabalhos do
laboratório do Prof. Ronald Duman, demonstrando que o uso crônico de
antidepressivos e de choques eletroconvulsivos aumentam a expressão do RNAm do
12
fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF), do seu receptor TrkB (receptor
tirosina-cinase B) e do fator de transcrição nuclear CREB (elemento responsivo ao
cAMP) em hipocampo de ratos (Nibuya et al, 1995; Nibuya et al, 1996). Mais
recentemente, estudos pré-clínicos têm demonstrado que o tratamento crônico com
lítio (Li) ou valproato (VPT) (medicamentos de primeira linha para o tratamento do
THB) também são capazes de aumentar a expressão do BDNF no córtex frontal e
hipocampo (Einat et al., 2003; Fukumoto et al., 2001).
Além disso, os estabilizadores do humor possuem outros mecanismos de ação
em comum, como inibição da GSK-3b. A proteína GSK-3b está envolvida em uma
série de processos que regulam a arquitetura e a função celular. Por exemplo, a
GSK-3b regula a atividade de diversas proteínas que se ligam aos microtúbulos, que
são complexos protéicos que dão estabilidade estrutural para a célula (Coyle e Manji,
2002; Williams et al., 2002). Dessa forma, ao modular a atividade de proteínas ligadas
aos microtúbulos, a GSK-3b é capaz de alterar a plasticidade neuronal, crescimento
dendrítico e, por conseqüência, produzir uma marcada alteração na plasticidade
sináptica (Coyle e Manji, 2002; Williams et al., 2002). Além disso, também regula
fatores de transcrição celular, como o CREB, que estão envolvidos com a regulação
da neurogênese e morte/sobrevivência celular (Castrén, 2005; Coyle e Duman, 2003;
Nestler et al., 2002; Manji et al., 2001). O envolvimento da GSK-3b no THB é uma
importante contribuição do grupo de Housseini Manji. Este autor e seus
colaboradores iniciaram com trabalhos mostrando que o lítio é um potente inibidor da
GSK-3b tanto in vitro como in vivo (Manji et al., 2001). Mais tarde, estudos
subseqüentes demonstraram que o valproato também é um potente inibidor da GSK3b, o que propõe um mecanismo de ação em comum entre esses estabilizadores de
humor, que possuem estruturas farmacológicas marcadamente distintas (De Sarno et
al., 2000). Mais recentemente, estudos em modelos animais demonstraram que
camundongos geneticamente alterados que possuem um déficit marcado na
transmissão serotoninérgica apresentam um aumento da atividade da GSK-3b e este
aumento é associado a alterações comportamentais compatíveis com quadros
depressivos (Beaulieu et al., 2008). Além disso, Gould e Manji (2002) demonstraram
que o lítio, quando em concentrações próximas ao limiar de concentração terapêutica
(1-2mM), estimula a neurogênese em células progenitoras hipocampais adultas. Tal
efeito aparentemente envolve a inibição da GSK-3b e ativação da via intracelular Wnt
e B-catenina, mas independe da inibição da via do fosfatidilinositol. Além disso, mais
13
rececentemente Gould et al (2007) mostraram que camundongos com superexpressão de B-catenina apresentam comportamento semelhante ao observado com
administração de lítio. Em conjunto, estes trabalhos sugerem fortemente que a
ativação da via Wnt e a inibição da proteína GSK-3b podem estar envolvidas nos
efeitos terapêuticos dos estabilizadores de humor.
Atualmente acredita-se que os transtornos de humor estão associados a
alterações no sistema de comunicação entre os circuitos cerebrais reguladores do
humor, e que antidepressivos e estabilizadores do humor ativam cascatas de
sinalização que regulam a plasticidade e sobrevivência celular, com subseqüente
melhora gradativa da transmissão da informação nesses circuitos cerebrais (Castrén,
2005; Coyle e Duman, 2003; Nestler et al., 2002; Manji et al., 2001).
2.1.3 THB e qualidade de vida
Três revisões abordam qualidade de vida (QV) relacionada ao THB (Namjoshi
and Buesching, 2001; Dean et al., 2004; Michalak et al., 2005). Os estudos de
Namjoshi e Buesching (2001) se mostraram muito heterogêneos e os instrumentos
utilizados eram genéricos e específicos para a depressão para avaliar diferentes
aspectos da QV relacionada à saúde. Estes estudos eram relativamente pequenos (a
maioria com menos de 100 pacientes) e os pacientes participantes eram deprimidos
ou eutímicos mais do que com pacientes hipomaníacos e maníacos.
O estudo de Dean et al (2004) avaliaram QV, prejuízos no trabalho ou custos
dos cuidados e utilização dos serviços de saúde de pacientes com THB. A definição
aplicada neste estudo era muito ampla para avaliação de QV, incluindo nesta
categoria estudos que avaliaram funcionamento social ou físico isoladamente. A
revisão identificou 65 estudos de QV em pacientes com THB. Os autores concluíram
que déficits na QV em pacientes com THB eram similares àqueles observados em
pacientes com depressão unipolar e igual ou pior que os níveis de QV observados em
pacientes com outras condições médicas crônicas.
Michalak et al (2005) fizeram uma revisão até novembro de 2004 e a maioria
dos artigos indicou que a QV estava muito prejudicada em pacientes com THB,
mesmo quando eles eram considerados clinicamente eutímicos.
Analisando esses
principais estudos conclui-se que a avaliação da QV é considerada uma medida útil
para recuperação/incapacidade tanto funcional (Yatham et al., 2004) como
sintomática (Thunedborg et al.,1995) em centros de atendimento de saúde mental.
14
Russo et al (1997), conduziu um estudo com pacientes hospitalizados onde
avaliou pacientes psiquiátricos com uma grande variedade de diagnósticos incluindo
mania aguda, depressão bipolar aguda, depressão unipolar aguda, esquizofrenia,
transtorno esquizoafetivo entre outros. Pacientes maníacos apresentavam altos
escores de QV (subjetiva) em comparação com os outros grupos, apesar dos seus
baixos escores em medidas funcionais objetivas. Os autores sugerem que esta
discrepância em pacientes maníacos pode estar relacionada ao estado eufórico e
diminuição do insight relacionado à doença.
Gazalle et al (2005) observaram que a pior QV está relacionada à depressão e
aos sintomas depressivos dos pacientes com THB, além de que o número de anos
sem diagnóstico de THB pode ser um preditor de pior QV em pacientes bipolares;
Kauer-Sant’ Anna et al (2007) relataram que a comorbidade ansiosa está relacionada
à pior QV entre esses pacientes (Kauer-Sant’ Anna et al., 2007). Além disso, Gazalle
et al (2007) detectou que os sintomas maníacos estiveram associados a piores
escores de QV na maioria dos domínios e que os itens “irritabilidade” e “sono” foram
os mais associados à pior QV.
2.2 Fisiologia do sono
Embora o envolvimento do sistema nervoso central na regulação do ciclo sonovigilia seja estudado desde o século V A.C., a base neurobiológica do sono foi
mistério até o século XX. Nas últimas décadas, as pesquisas têm demonstrado que o
sono não é simplesmente o resultado da diminuição do funcionamento dos sistemas
de vigília. Ao contrário, é o resultado de um processo ativo que requer a interação de
vários sistemas do tronco encefálico e do cérebro (Rechtschaffen and Bergamann,
2002).
O sono normal é considerado um estado ativo e complexo. A evolução dos
potenciais eletroencefalográficos durante o sono reflete a existência de várias fases,
que se agrupam em dois estados distintos. O primeiro caracteriza-se pela presença
de ondas sincronizadas (sono sincronizado – NREM). O segundo, no qual
predominam potenciais de baixa voltagem e alta freqüência (sono dessincronizado –
movimento rápido dos olhos - REM ). Os termos “sincronizado” e “dessincronizado”
referem-se à presença ou à ausência de descargas conjuntas entre neurônios do
córtex cerebral (Rechtschaffen and Bergmann, 2002).
15
O sono sincronizado ou NREM ou sono de ondas é caracterizado pela
presença de ondas sincronizadas no eletroencefalograma (EEG) e pode ser
subdividido em quatro fases: estagio 1, 2, 3 e 4 (3 e 4 equivalem ao sono de ondas
lentas, sono profundo ou sono delta).
A medida que passamos do estado de vigília
para os estágios de sono cada vez mais profundos, a alteração que ocorre no EEG é
a passagem de uma atividade de alta freqüência e baixa amplitude, típica da vigília,
para a de baixa freqüência e elevada amplitude do sono profundo (Hobson, 1990).
O sono dessincronizado também é conhecido por outras denominações, tais
como: sono REM, sono paradoxal (SP), sono dos sonhos e sono ativo. O sono REM
apresenta um conjunto de características que o distingue bem de outras fases de
sono: EEG dessincronizado, ou seja, ondas de baixa amplitude e alta freqüência;
ritmo teta hipocampal; atonia muscular observada pelo registro da eletromiografia
(EMG); movimentos oculares rápidos observados pelo eletroculograma (EOG).
Diferente do sono sincronizado, o sono REM não é dividido em fases; no
entanto, apresenta algumas características que são divididas em eventos fásicos e
tônicos. Os eventos fásicos são intermitentes, representados pelos movimentos
oculares, abalos musculares e ondas ponto-genículo-occipitais (PGO). Os eventos
tônicos são persistentes, tais como: atonia muscular, dessincronização cortical e ritmo
teta-hipocampal (Aserinsky and Kleitman,1953).
A intensa atividade elétrica e metabólica observada no sono REM é o maior
argumento em favor de que o sono é um fenômeno ativo resultante de várias
estruturas nervosas específicas. A sincronização-dessincrononização das ondas do
EEG do sono NREM-REM e vigília são conseqüência da atividade neural nos
circuitos tálamo-corticias (núcleos reticulares do tálamo e córtex cerebral),
decorrentes da interação entre os núcleos monoaminérgicos e colinérgicos do tronco
encefálico (Aserinsky and Kleitman, 2003). Há um predomínio de sono NREM na
primeira metade da noite, enquanto que o sono REM predomina na segunda metade
da noite. A distribuição dos estágios de sono durante a noite pode ser alterada por
vários fatores, como: idade, ritmos circadianos, temperatura ambiente, ingestão de
drogas e patologias diversas.
16
Estágio 2
Figura 1 – Polissonografia mostrando Estágio 2 do sono (NREM)
Sono delta: ondas lentas e sincronizadas
Figura 2 – Polissonografia mostrando Estágio 4 do sono NREM (sono de ondas
lentas, sono reparador)
17
Movimentos oculares
Atonia muscular
SONO REM
Figura 3 – Polissonografia mostrando Sono REM
NREM
REM
Transição para atonia muscular
Figura 4 – Polissonografia mostrando a transição do sono NREM para sono REM
18
2.2.1 Sono normal
O sono normal apresenta variações conforme a faixa etária. Do recémnascido até o idoso, o sono sofre modificações quanto à distribuição dos diversos
estágios e, quanto ao próprio ritmo circadiano, passando de polifásico para
monofásico
na
idade
adulta,
podendo
ainda
ser
mais
fragmentado
no
envelhecimento. Além disso, o idoso tem maior tendência aos cochilos diurnos. O
adulto dorme em média sete a oito horas por dia. Entretanto, alguns indivíduos
necessitam normalmente de um número menor de horas de sono, denominados de
dormidores curtos, e outros, que necessitam de mais horas, são considerados
dormidores longos (Curzi-Dascalova and Challamel, 2000).
Sono Normal (adulto jovem)
V
REM
1
2
DESPERTARES
NORMAIS
3
4
Figura 5 – Hipnograma de um paciente com sono normal
2.2.2 Insônia
A insônia atualmente é considerada um problema de saúde pública, afetando
10 a 40% da população, com conseqüências médicas, psicológicas e sociais (Leger
et al., 2000), é um sintoma que pode ser definido como dificuldade em iniciar e/ou
manter o sono, presença de sono não reparador, ou seja, insuficiente para manter
uma boa qualidade de alerta e bem-estar físico e mental durante o dia, com o
19
comprometimento conseqüente do desempenho nas atividades diurnas (Manual
Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 1995). Por tratar-se de um
sintoma, o conceito de insônia é muito mais abrangente que o proposto pelo DSMIV, podendo ser interpretado como sendo a percepção pelo paciente que seu sono é
inadequado ou anormal. Na maioria das vezes, a insônia está relacionada à redução
da quantidade de horas necessária para um sono satisfatório, podendo ser devido
ao aumento do tempo para iniciar o sono (insônia inicial), ocorrendo em 68% dos
casos, ao aumento de despertares durante toda a noite (insônia de manutenção),
em 64% dos pacientes ou sendo causada por despertar precoce (insônia terminal),
em 32% dos casos (Moul et al., 2002). A quantidade de sono ideal é uma
característica individual. A média da população necessita de sete a oito horas de
sono. Os pacientes com insônia apresentam-se cansados, mal-humorados,
sonolentos, irritados (Morin, 1993).
A escala de avaliação para depressão de Ham-D tem sido usada em pesquisa
como critério de inclusão, medidas de evolução (resposta, remissão, recaída) ou de
recuperação de um episódio depressivo. As questões 4, 5 e 6 avaliam a presença de
insônia inicial, insônia intermediária e insônia tardia (Hamilton, 1960).
2.2.2.1 Fisiopatologia da insônia
Um modelo simples tem sido utilizado para entender a evolução temporal da
insônia. Podemos identificar fatores precipitantes, predisponentes e perpetuantes.
Como fatores precipitantes podemos citar o estresse social (divórcio, desemprego,
etc), estresse por problema médico (doença, efeito de drogas, gravidez, etc),
estresse por inadaptação circadiana (jet lag, trabalho em turnos, etc) e estresse
ambiental (viagem, barulho, parceiro, casa nova, etc.); como fatores predisponentes
o cognitivo (atividade ruminativa), os fatores fisiológicos (estar mais alerta de dia,
maior taxa metabólica, aumento da temperatura corporal e aumento de ondas
rápidas no estágio 1) e os fatores afetivos (maior ansiedade, depressão e
somatização); e como fatores perpetuantes a má higiene do sono, a persistência dos
fatores precipitantes, o uso de álcool ou medicações, a ansiedade e a depressão, a
ruminação sobre o sono e o condicionamento, as alterações secundárias do ritmo
circadiano e o surgimento de qualquer condição médica após a insônia original
(Spielman, 1996).
20
Se transitória e de curta duração, comumente identificamos um fator
precipitante, que usualmente está relacionado à causa da insônia. Na insônia
crônica, no entanto, esta relação é menos óbvia, uma vez que o fator precipitante
ocorreu há meses ou anos antes da avaliação e pode não ser mais relevante para o
paciente. Nesta situação, fatores perpetuantes e predisponentes podem explicar a
sua persistência a partir de um episódio inicial (Spielman, 1996).
Os fatores predisponentes são basicamente os fatores de risco para a
insônia, anteriormente mencionados, acrescidos de predileção por estar acordado
até tarde, da presença de um ciclo vigília- sono irregular e da condição do
hiperalerta. A condição de hiperalerta refere- se à inabilidade desenvolvida em obter
sono adequado, com aumento do alerta total nas 24 horas do dia.
Os pacientes com insônia crônica tais como os deprimidos, têm uma alta
incidência de queixas médicas e procuram mais serviços médicos do que a
população em geral, tendo uma qualidade de vida reduzida (Bonnet et al., 1995).
Durante o sono existe um balanço da atividade dos componentes do sistema
nervoso autônomo. Uma ativação simpática pode prejudicar o sono. Além disso, é
rapidamente desencadeada, tardando muito a se dissipar. Uma descarga
autonômica também pode ser condicionada. São exemplos de fatores exógenos e
endógenos associados com o aumento da atividade simpática: cafeína, nicotina,
exercício intenso, calor, ruídos, preocupações, fome, dor, medo e esforço intenso
para dormir, que devem, portanto ser evitados. (Benca, 2000). O despertar do sono
por qualquer razão está automaticamente associado à ativação simpática com uma
resposta reflexa de aumento da pressão arterial e da freqüência cardíaca. Muitas
vezes, esses sintomas fazem parte do despertar psicofisiológico, onde os pacientes
contam que se sentem tão alertas que mal podem continuar na cama, com sensação
de taquicardia (Bonsignores et al., 1994).
2.2.2.2 Diagnóstico
Na clínica e nos estudos sobre o sono devem-se observar sempre dados
sobre hábitos de sono, noturnos ou diurnos, possível associação com fatores
ambientais, desempenho no trabalho e atividades diárias, presença de fadiga e
sonolência diurna. Dever ser investigada a presença de condições clínicas,
especialmente quadros dolorosos, história positiva para depressão, ou transtornos
de ansiedade e presença de pânico noturno. Investigar história de medicações já
21
utilizadas
e
em
uso,
como
estimulantes,
tranqüilizantes,
hipnóticos
ou
antidepressivos. Questionar uso de álcool, tabagismo, ingestão de café e prática de
atividade física, freqüência e horário das mesmas. Deve também ser identificada a
presença de fatores desencadeantes e perpetuantes da insônia. Por fim, pode-se
investigar condições familiares e profissionais que podem funcionar como
desencadeantes ou perpetuantes da insônia, tais como conflitos conjugais,
separações, lutos, drogas, abuso sexual, dificuldades de relacionamento no
trabalho, aposentadoria, perdas econômicas etc.
Um roteiro mínimo de perguntas pode ser realizado no primeiro atendimento:
1. início da insônia
2. fator desencadeante
3. fatores de piora e melhora
4. tratamentos já realizados
5. horário que vai para cama
6. atividades na cama antes de adormecer
7. tempo que demora para adormecer
8. despertares durante a noite
9. presença de ronco ou sono agitado
10. horário em que acorda
11. horário em que se levanta
12. como se sente ao despertar
13. ambiente em que dorme
14. como passa durante o dia: cansaço, sonolência, irritabilidade
15. dores no corpo
16. atividade física: freqüência e horário
17. trabalho: tipo e horário
18. refeições, café, refrigerantes
19. medicamentos: tipo e horário
20. ansiedade
21. depressão
22. relacionamento social e familiar
23. uso de álcool
24. demais doenças
22
2.3 Distúrbios do Sono em Psiquiatria
Nós gastamos um terço da nossa vida dormindo. Se vivermos 70 anos,
aproximadamente 27 deles dormimos. O dormir é um estado ativo crítico para o
nosso bem estar físico, mental e emocional. De fato, é uma necessidade básica da
vida, tão fundamental para a manutenção da saúde como o ar, os alimentos e a
água. Mais de 90 patologias do sono têm sido identificadas, e, quando o sono é
interrompido, as pessoas param de funcionar efetivamente. Insônia é a alteração do
sono mais comum em psiquiatria (Coleman et al., 1982).
Muitos estudos mostraram que aproximadamente metade dos pacientes com
insônia crônica tem um problema de sono que surgiu devido a um transtorno
psiquiátrico. As mais proeminentes causas psiquiátricas de insônia são as psicoses,
transtorno do humor, ansiedade, transtorno do pânico e demência. Problemas do
sono são especialmente prevalentes na esquizofrenia, na depressão, na mania e em
outras doenças mentais, e todos os anos, transtornos do sono, privação do sono e
sonolência somam milhões para as contas de seguros de saúde em países
industrializados (Costa e Silva, 2006).
Alterações do sono são notáveis na maioria dos transtornos psiquiátricos
(Benca et al., 1992). Em um levantamento realizado em diversas cidades
americanas, 40% dos entrevistados que relataram insônia e 46,5% dos que
relataram hipersonia preenchiam os critérios para doença mental segundo o DSM-IV
(Ford et al., 1989).
Nota-se uma divergência em relação à classificação de transtornos mentais,
na qual os transtornos do pânico fazem parte dos distúrbios ansiosos. A justificativa
para esta separação na classificação internacional dos distúrbios do sono é que
alguns transtornos do pânico podem ter somente manifestações episódicas durante
o sono. Os quadros psiquiátricos por sua vez, têm mudanças nos padrões do sono
como critérios diagnósticos, tais como: depressão maior, estresse pós-traumático,
transtorno de ansiedade generalizada (American Psychiatry Association, 1994).
Serão abordados os transtornos psiquiátricos que mais freqüentemente
apresentam alterações de sono na prática clínica e os principais achados
polissonográficos descritos. Alguns estudos realizados sobre a fisiopatologia destas
23
alterações em determinados transtornos e modificações no sono causadas por
tratamentos medicamentosos mais utilizados serão também referidos.
2.3.1 Transtornos do humor
Os transtornos do humor geralmente acarretam despertar precoce pela
manhã como observado na figura 6.
INSÔNIA FINAL
V
REM
REM
1
2
3
4
DESPERTAR
DESPERTAR
PRECOCE
PRECOCE
LATÊNCIA
LATÊNCIAde
deSONO
SONOPROLONGADA
PROLONGADA
Figura 6 – Hipnograma típico de pacientes com depressão
a) Depressão
Cerca de 80% dos pacientes com depressão se queixam de mudanças nos
padrões do sono. Destes, a maioria apresenta insônia terminal, despertando horas
antes do necessário (despertar precoce). Nos casos de sintomas ansiosos
associados o paciente apresenta dificuldade para iniciar o sono, a insônia inicial
também é freqüente (Guerra et al., 2004). Em estudos epidemiológicos longitudinais,
a insônia é um importante preditor do aumento do risco de depressão no seguimento
de 1 a 3 anos (Rieman et al., 2003).
Além disso, a persistência de insônia é
associada com o aparecimento de um novo episódio depressivo (Ohayon et al.,
2003).
24
Queixas específicas podem incluir despertares noturnos freqüentes, sono não
restaurador, redução do sono total e sonhos perturbadores (Benca et al., 2000).
Embora queixas de hipersonolência diurna sejam raras no transtorno depressivo
maior,
alguns pacientes com insônia relatam aumento da fadiga e tentam
compensar com cochilos diurnos (Wooten et al., 1999).
Uma pequena porcentagem de pacientes com depressão maior tem queixas
de sonolência excessiva, sendo a maioria destes adultos jovens (Wooten et al.,
1999). A maioria dos pacientes com transtorno bipolar também relata insônia quando
em depressão, mas uma significativa porcentagem de pacientes relatam sintomas de
hipersonia, com alargamento do período noturno, dificuldade de despertar e
sonolência excessiva diurna Os pacientes com transtorno afetivo sazonal e com
depressão atípica também relatam hipersonia (American Psychiatric Associantion,
1994; Benca et al., 2000).
Achados polissonográficos: As alterações polissonográficas na depressão
podem ser divididas em três categorias principais referentes à continuidade do sono,
ao sono de ondas lentas e ao sono REM. Na primeira pode-se observar aumento da
latência do sono, aumento de despertares durante sono e despertar precoce, que
resulta em fragmentação do sono e redução da eficiência deste (Gann et al., 2004).
Estudos comparando grupos de depressivos e controles pareados por idade
confirmaram estes resultados (Benca et al., 1992; Benca et al., 2000).
O déficit no sono de ondas lentas é fato encontrado em numerosos relatos,
mas nem todos os estudos mostraram esta redução (Benca et al., 1992; Benca et
al., 2000).
A redução do sono de ondas lentas parece ser mais significativa no
primeiro período NREM, o que altera sua distribuição no decorrer da noite. Também
se observa redução na potência de delta em estudos de eletrencefalografia
quantitativa durante o sono (Kupfer et al., 1986).
O primeiro achado relativo ao sono REM foi à redução de sua latência
(período de tempo entre o início do sono e o início do REM) (Benca et al., 1992;
Benca et al., 2000; Wooten et al., 1999). Com o passar dos anos, este provou ser o
fator mais freqüentemente descrito em pacientes com depressão maior, embora
ainda não se saiba se a latência do REM é um indicador específico para depressão
corrente ou passada, podendo estar ligado à hiperatividade colinérgica (Benca et al.,
2000). Outros achados dizem respeito ao aumento do primeiro período de sono
25
REM, aumento da densidade REM (aumento na taxa de movimentos rápidos de
olhos) e aumento da porcentagem de REM (Benca et al., 1992; Benca et al., 2000;
Wooten et al., 1999; Gann et al., 2004).
Em estudo que procurou correlacionar queixas subjetivas de sono e dados
polissonográficos em pacientes com depressão, estes não foram capazes de estimar
acuradamente o número de despertares durante a noite. A avaliação subjetiva da
qualidade do sono pareceu estar associada à continuidade do mesmo e da
quantidade do sono de ondas lentas (Argyropoulos et al., 1986).
b) Mania
Durante episódios maníacos, os pacientes relatam quantidades reduzidas de
tempo total de sono, com uma sensação subjetiva de redução da necessidade de
sono. Em vários casos, a mudança para a fase de mania é precedida por períodos
de falta de sono. Também foi sugerido que a passagem da eutimia ou depressão
para a fase maníaca ocorre durante sono (Wooten et al., 1999).
Achados polissonográficos: A principal característica parece ser a redução
do tempo total de sono; o paciente maníaco parece ter uma inabilidade para
adormecer. Quando adormece, ele desperta duas ou três horas depois, totalmente
revigorado. Como para a depressão, a duração dos estágios 3 e 4 pode estar
encurtada, mas os achados relativos ao sono REM foram menos
consistentes
(Benca et al., 1992; Benca et al., 2000; Wooten et al., 1999).
2.3.2 Transtornos de ansiedade
Os transtornos de ansiedade geralmente acarretam aumento da latência do
sono e múltiplos despertares durante a noite como mostrado na figura 7.
26
INSÔNIA INICIAL
V
REM
REM
1
2
3
Aumento
Aumento da
da Latência
Latência
4
Figura 7 – Hipnograma típico de paciente com transtorno de ansiedade
generalizada
a) Transtorno de ansiedade generalizado (TAG)
Os pacientes com TAG têm freqüentemente queixas de que não conseguem
relaxar ou parar de se preocupar com seus problemas quando estão no leito (Uhde,
1994). O distúrbio de sono mais freqüentemente associado a quadros de ansiedade
generalizada é a insônia de manutenção do sono (Monti et al., 2000) e também a
dificuldade de iniciar o sono (insônia inicial).
Além disso, queixas de sono não
reparador e interrompido são relatadas (Uhde, 2000; Wooten et al., 1999; Monti el
al., 2000).
Achados polissonográficos: Pacientes com ansiedade generalizada tem
aumento da latência do sono (sendo que esta latência freqüentemente ultrapassa
uma hora) aumento dos estágios mais superficiais do sono, menor porcentagem de
sono REM e, com exceção de casos isolados, latência para o sono REM aumentada
ou normal (Benca et al., 1992; Uhde, 2000; Wooten et al., 1999).
2.3.3 Transtorno do pânico
As queixas mais comuns de pacientes com transtorno do pânico, em relação
ao sono, incluem insônia inicial ou de manutenção (aproximadamente 70% dos
27
pacientes), e sono não restaurador, fragmentado (Uhde, 2000; Wooten et al., 1999;
Sheik et al., 2003). Os ataques de pânico podem ocorrer durante o sono. Nos
pacientes que tem ataques noturnos de pânico, os níveis de ansiedade e a duração
dos ataques parecem ser maiores; há maior presença de sintomas somáticos e
maior
ocorrência
de
co-morbidades
com
outras
doenças
psiquiátricas,
principalmente depressão (O”Mahony et al., 2003). Sintomas similares associados
com ataques de pânico durante o sono podem ser encontrados em pacientes com
arritmias, refluxo gastro-esofágico, apnéia do sono, terror noturno, distúrbios
comportamentais do sono REM (Wooten et al., 1999). É necessário levar isto em
conta na avaliação diagnóstica diferencial.
Talvez a mais importante complicação de ataques de pânico noturno seja a
privação crônica do sono. De fato, estes pacientes desenvolvem ansiedade
antecipatória e comportamentos de esquiva, como vistos para ataques diurnos. No
caso especifico de ataques de pânico no sono muitos pacientes desenvolvem medo
de dormir e relutam em adormece (Uhde, 2000; Sheik et al., 2003).
Achados polissonográficos: quando comparados com indivíduos controles,
pacientes com distúrbio do pânico têm latência do sono discretamente elevada e
redução da eficiência do sono (Uhde, 2000; Sheik et al., 2003).
Há um aumento no tempo de movimentação durante o sono, mas não há uma
relação temporal entre esta movimentação e os ataques noturnos de pânico (Brown
and Uhde, 2003). Os ataques de pânico durante o sono geralmente acontecem no
final do estágio 2 ou início do estágio 3 do sono NREM (Uhde, 2000; Wooten et al.,
1999; Sheik et al., 2003).
2.3.4 Transtorno de estresse pós-traumático
As principais queixas de sono em pacientes com estresse pós-traumático são
insônia, despertares ansiosos ou pesadelos, sendo comum encontrar um estado de
hiperatividade autonômica, com hipervigilância e insônia (Uhde, 2000; Wooten et al.,
1999; Sheik et al., 2003).
Pesadelos freqüentes ocorrem em 59 a 68% dos pacientes e são um
marcador desta doença, envolvendo tanto experiências revividas como cenários
imaginários de conteúdo assustador ou de ameaça à vida. Os despertares ansiosos,
por sua vez, parecem estar mais relacionados ao sono REM (Uhde, 2000; Wooten et
al., 1999; Sheik et al., 2003).
28
Achados polissonográficos: estresse pós-traumático tem sido associado
com aumento da latência do sono, redução de sua eficiência, aumento do tempo em
vigília após o início do sono, redução do tempo total de sono, redução do estágio 2 e
aumento do estágio 1 do sono NREM (sono mais superficial) (Uhde, 2000; Wooten
et al., 1999; Sheik et al., 2003).
Há controvérsias entre os autores sobre os efeitos no sono REM. Alguns
autores relatam parâmetros de REM normais, enquanto outros relatam latência
reduzida para o sono REM e aumento na densidade REM (Benca et al., 1992;
Wooten et al., 1999; Sheik et al., 2003).
2.3.5 Esquizofrenia
Embora os distúrbios do sono em esquizofrenia sejam suficientemente
severos para garantir atenção clínica, eles raramente são a queixa predominante
(Monti and Monti, 2004). Em estado de agitação psicótica há períodos prolongados
de total falta de sono; quando a agitação melhora, uma insônia expressiva tem lugar.
Há relatos de quase total reversão do ciclo vigília-sono, com o paciente dormindo
durante o dia e ficando acordado durante a noite. A insônia severa também é
descrita em exacerbações do quadro esquizofrênico e pode preceder o
aparecimento de outros sintomas por ocasião de recaídas (Benson et al., 2000). Os
pacientes esquizofrênicos podem vivenciar alucinações hipnagógicas aterrorizantes
e pesadelos. Podem ter vários distúrbios primários de sono associados, como
higiene de sono inadequada e aumento de movimentos periódicos de membros
inferiores (Benson et al., 2000). A co-morbidade da apnéia do sono, quando existe,
pode agravar os sintomas esquizofrênicos (Wooten et al., 1999).
Existem
vários
estudos
relacionando
esquizofrenia
e
os
achados
polissonográficos, como veremos a seguir. Com referência ao sono de ondas lentas
parece haver uma relação inversa entre a quantidade deste e a manutenção do sono
e o tamanho dos ventrículos cerebrais; sugere-se que a redução deste tipo de sono
e aumento dos sintomas negativos da esquizofrenia podem estar relacionados a um
metabolismo cerebral reduzido e envelhecimento acelerado ou atrofia cerebral
(Keshavan et al., 1995).
A primeira tentativa de estabelecer uma conexão entre anormalidades do
sono REM e esquizofrenia foi relatada por Dement em 1955. Neste estudo, feito
29
antes do advento dos neurolépticos, o autor encontrou redução da latência para o
sono REM, mas não observou diferença na densidade deste em esquizofrênicos
(Dement, 1955). Seguiram-se a estes diversos estudos com achados distintos nos
parâmetros do REM (Benca et al., 1992; Wooten et al., 1999; Benson et al., 2000).
Esta variação pode ser explicada por diferentes fases da doença, pelo grau do
desequilíbrio de neurotransmissores e pelo uso de medicação de curto e longo prazo
(Wooten et al., 1999).
Apesar destes conflitos, a semelhança entre a atividade
alucinatória que ocorre normalmente no sono REM e as alucinações encontradas na
esquizofrenia continua a intrigar pesquisadores e várias teorias foram aventadas
para tentar explicá-la (Wooten et al., 1999; Benson et al., 2000).
Achados polissonográficos: foram observados distúrbios da continuidade
do sono, redução no sono de ondas lentas, redução na latência do REM, aumento
da porcentagem REM e redução da quantidade do sono NREM em minutos (Benca
et al.,1992; Wooten et al., 1999; Monti and Monti, 2004; Benson et al., 2000). Os
antipsicóticos
atípicos
olanzapina,
risperidona
e
clozapina
aumentam
significativamente o tempo total do sono e o estágio 2. Além do mais, olanzapina e
risperidona aumentam o sono de ondas lentas. Os antipsicóticos típicos haloperidol,
tioxitene e flupentixol reduzem significativamente o estágio 2 e aumentam a
eficiência do sono (Monti and Monti, 2004).
2.3.6 Alcoolismo
O álcool é provavelmente a substância indutora do sono mais usada pela
população geral. Quando administrado a voluntários normais antes da hora de
dormir, de forma aguda, tem a tendência de encurtar a latência para o sono,
aumentar o sono NREM e reduzir o sono REM nas primeiras horas após
administração. No entanto, o álcool é rapidamente metabolizado. Quatro a cinco
horas após a ingestão, as concentrações no sangue baixam substancialmente e o
indivíduo pode apresentar sono interrompido por irritação gástrica, cefaléia,
pesadelos, taquicardia e suores abundantes. Pode haver também rebote do sono
REM (Castaneda et al., 1998).
Pacientes alcoolistas geralmente relatam insônia, hipersonia, distúrbios do
ritmo circadiano e parassonias. Os sintomas da abstinência do álcool podem ser
30
confundidos com os de ataque de pânico e o diagnostico diferencial deve ser
realizado (Lotufo-Neto and Gentil, 1994).
O álcool aumenta a probabilidade de roncar, a resistência respiratória e da
ocorrência de eventos apneicos mesmo em indivíduos sem história de apnéia do
sono ou ronco (Castaneda et al., 1998).
Achados polissonográficos: latência do sono aumentada, eficiência do sono
reduzida, diminuição do tempo total de sono, do sono de ondas lentas e do sono
REM (Castaneda et al., 1998). O álcool inibe o sono REM de uma maneira dosedependente, ainda que na presença de um débito de sono REM fisiológico, como a
privação de sono (Lobo and Tufik, 1997).
2.3.7 Demências
As demências não são homogêneas no que se refere ao sono. No entanto, na
demência com corpos de Lewy e na demência frontotemporal também existe déficit
na transmissão colinérgica, com conseqüente redução percentual do sono REM, tal
como na doença de Alzheimer. A demência com corpos de Lewy tem a
particularidade de apresentar maior freqüência de distúrbio comportamental do sono
REM. Isto ocorre porque a perda de neurônios colinérgicos no núcleo reticular
magnocelular da ponte é mais precoce nesta demência causando prejuízo da
conexão excitatória desse núcleo com o locus coeruleus, responsável pela atonia do
REM (Ferman et al., 1999).
Na demência vascular as alterações do sono são bastante heterogêneas,
dependendo da distribuição das lesões corticais e subcorticais, mas se observa uma
redução importante da porcentagem de sono de ondas lentas (Autret et al., 2001).
Faltam, no entanto, estudos mais completos sobre o sono em demências que não a
de Alzheimer.
a) Doença de Alzheimer
A doença de Alzheimer é a mais estudada de todas as demências. Muitas das
alterações do sono presentes no envelhecimento normal também ocorrem no
paciente com esta doença, porém de forma mais intensa. Assim, ocorre redução do
tempo total e da eficiência do sono (Montplaisir et al., 1995), adiantamento de fase
com tendência a deitar-se mais cedo e a despertar precocemente (Richardson et al.,
31
1982), diminuição da amplitude de diversos ciclos circadianos, tais como o de
secreção hormonal, de atividade e de temperatura, (Sakai et al., 1990; Witting et al.,
1990) redução do sono de ondas lentas (estágios 3, 4) e do sono REM, com
aumento do estágio 1 (Montplaisir et al., 1995; Vitiello et al., 1990). Além disso, os
pacientes com doença de Alzheimer apresentam episódios de agitação noturna,
alucinações hipnagógicas e deambulação sem finalidade (Johnson, 1987).
Algumas das disfunções presentes na doença de Alzheimer podem ser
atribuídas à crescente desorganização nos ciclos circadianos, possivelmente
associada à atrofia do núcleo supraquiasmático (Swaab et al., 1985).
Essa
desorganização aumenta de acordo com a gravidade da doença (Aharon-Petetz et
al., 1991). Também foi observado que a falta de um padrão rítmico na secreção de
melatonina altera o sono desses pacientes e que a administração de melatonina
exógena, ou o estímulo de sua produção por meio da fototerapia matinal, ajudam a
corrigi-lo parcialmente (Jean-Louis et al., 1998). Na doença de Alzheimer, as
disfunções que afetam o sono REM são de especial importância devido à sua
fisiopatologia, uma vez que uma das estruturas mais afetadas no início da doença
de Alzheimer é justamente um núcleo colinérgico envolvido na atividade cortical
durante este estágio, o núcleo basal de Meynert. Especula-se, por esse motivo, que
a relação entre sono REM e doença de Alzheimer é funcional, uma vez que o sono
REM está relacionado a processos de aprendizagem, intensamente prejudicados
nesta doença (Christos, 1993). De fato, quando os pacientes recebem drogas que
potenciam a condução colinérgica ocorre um aumento da percentagem de sono
REM paralelamente à melhora cognitiva (Moraes et al., 2001).
Achados polissonográficos: Como já foi discutido, observa-se redução
acentuada da percentagem de sono REM, menor freqüência de movimentos
oculares rápidos durante o sono REM (menor densidade de REM), e menor
eficiência do sono devido ao aumento do número de despertares após o seu início.
Na análise espectral do EEG durante o sono REM observa-se diminuição do ritmo
de base (Petit et al., 1992). Segundo alguns autores, a diminuição do ritmo de base
do sono REM na análise espectral é um marcador sensível para diferenciar a doença
de Alzheimer do envelhecimento normal (Hassainia et al., 1997). Nota-se também a
presença de ritmos delta e teta difusos, tanto no sono como na vigília, com
alentecimento geral do eletroencefalograma nas derivações temporal e frontal
(Montplaisir et al., 1995; Moraes et al., 2001).
32
A depressão do idoso pode simular a demência de Alzheimer, porém na
depressão o quadro polissonográfico indica hiperatividade colinérgica, com aumento
da percentagem e redução da latência do sono REM (Bahro et al., 1993).
2.4 Sono e THB
Os ritmos diários são importantes para a regulação do ciclo sono/vigília,
temperatura corporal, níveis de hormônios, e mesmo cognição, atenção e humor
(Bunney and Bunney, 2000; Reppert and Weaver, 2001).
Os rompimentos nos
ritmos biológicos estão fortemente associados com transtornos do humor. De fato
alguns das características de algumas doenças como depressão maior e transtorno
de humor bipolar são anormalidades no ciclo sono/vigília, apetite, e nos ritmos
sociais (Boivin, 2000; Bunney & Bunney, 2000; Lenox et al., 2002; Grandin et al.,
2006). Sintomas depressivos são também diurnos com a maioria dos sintomas
ocorrendo tipicamente pela manhã (Rusting & Larsen, 1998), e depressão é mais
prevalente em áreas do mundo que recebem pouca luz na maior parte do tempo
(Booker et al.,1991). Estudos têm evidenciado que os transtornos do humor como
depressão maior e transtorno do humor bipolar podem ser mais prevalentes em
indivíduos que nasceram com pulso de disparo anormalmente deslocado ou
arrítmico. O ritmo circadiano anormal está relacionado a uma variedade de funções
fisiológicas incluindo temperatura corporal, cortisol plasmático, pressão arterial,
pulso, e melatonina que se demonstram alterados em pacientes com depressão e
transtorno de humor bipolar (Atkinson et al., 1975; Kripke et al., 1978; Souetre et al.,
1989).
Queixas especificas de sono podem incluir despertares durante a noite,
despertar precoce, dificuldade de manter o sono, pobre qualidade de sono, redução
do tempo de sono, sensação de que dormiu e não descansou e pesadelos. As
maiorias dos pacientes com transtorno de humor bipolar também relatam insônia
quando em depressão, mas uma percentagem significante desses relata sintomas
de hipersonia, com dificuldade para levantar, tempo prolongado de sono durante a
noite e/ou excessiva sonolência diurna.
Três linhas de pontos de evidências apontam para a importância do sono em
transtorno bipolar. Primeira indução experimental de privação de sono está
associada com o inicio de hipomania ou mania em uma proporção considerada de
pacientes (Wu & Bunney, 1990). Segunda, em uma revisão sistêmica de 11 estudos
33
envolvendo 631 pacientes com transtorno bipolar, alterações de sono foram o
pródromo mais comum de mania (relatado por 77% dos pacientes) e o sexto
pródromo mais comum em depressão bipolar (relatado por 24% dos pacientes)
(Jackson & Scott, 2003). Terceira, o ciclo sono/vigília tem sido o componente central
da conceitualização teórica do transtorno bipolar. Hipóteses têm sido levantadas que
pacientes com transtorno bipolar tem uma condição genética que pode levar a uma
instabilidade do ritmo circadiano. Estresses psicossociais são possíveis causas de
rompimento da rotina e do sono, que, em conseqüência, alteram o ritmo circadiano
tornando-se um gatilho para um episódio (Goodwin et al. 1990.; Wehr et al. 1990). A
relação entre mania e diminuição do tempo de sono é particularmente aparente no
início de um episódio maníaco, quando uma escalação típica de três estágios foi
descrita (Carlson and Goodwin, 1973). No começo de um episódio maníaco clínicos
freqüentemente observam uma privação espontânea de sono devido a uma
hiperatividade do paciente, resultando em um aumento dos sintomas maníacos e
depois uma subseqüente perda do sono. Então, a perda de sono parece agir não
apenas como um fator provocando a mania, mas também como um fator que
aumenta durante um episódio maníaco resultando na piora dos sintomas seguidos
por uma consistente perda de sono. (Barbini et al.,1996).
Muitas hipóteses considerando a função do sono têm sido propostas. Uma
dessas sugere que os períodos de sono são favoráveis para a plasticidade cerebral
(Benington & Frank,2003). Esta capacidade do cérebro mostrar plasticidade
possibilita-o realizar novas funções por mudanças dos elementos do núcleo central
dos nichos (lugares) e/ou conecções em resposta as restrições ambientais (Vayman
& Gómez-pinilla, 2005). Sugeriu-se que o papel do sono em favorecer a plasticidade
cerebral pode ser multidimensional e abranger os processos que variam da
reativação dos ensembles neuronais durante o sono no pós-treinamento as
mudanças celulares (Maquet,2001).
Harvey e col. mostraram em um estudo de sono em pacientes bipolares que
os distúrbios de sono eram um problema significativo em 70% desses pacientes,
definitivamente, mesmo quando estavam eutímicos, e 55% fechavam critério para o
diagnóstico de insônia. Esses achados somados as evidências prévias indicam que
os pacientes bipolares apresentam sintomas relacionados aos distúrbios de sono
mesmo quando não estão na fase aguda da doença (Hlastala at col. 2003).
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55
4 JUSTIFICATIVA
Considerando que as alterações de sono são um problema de grande
repercussão na saúde geral e na fisiologia e patologia, ainda não existem estudos
que associem alterações de sono com a qualidade de vida dos pacientes com
Transtorno de Humor Bipolar em eutimia.
56
5 OBJETIVOS
5.1 Objetivo geral
Este estudo visa avaliar a prevalência de pacientes com THB em eutimia, que
apresentam distúrbio do sono. Além disso, avaliar o impacto do distúrbio do sono na
qualidade de vida, na incapacidade e em seu funcionamento global.
5.2 Objetivo específico
•
Avaliar a prevalência do distúrbio do sono através das questões 4,5 e 6 da
escala Hamilton Depressão em pacientes bipolares do tipo I em eutimia
diagnosticados pelo DSM IV;
•
Avaliar se os pacientes com distúrbio do sono apresentam prejuízo na
qualidade de vida, avaliada através de escores da WHOOQOL.;
•
Avaliar se os pacientes bipolares com distúrbio do sono apresentam
incapacidade, avaliada através da escala Sheehan.
•
Avaliar se os pacientes bipolares com distúrbio do sono apresentam prejuízo
na funcionalidade global, avaliada através da Global Functional Assessment
Scale (GAF).
57
6 METODOLOGIA
6.1 Delineamento
Estudo transversal com amostragem por conveniência.
6.2 População
Pacientes com diagnóstico de pacientes com diagnóstico de transtorno bipolar
atendidos no Ambulatório de Transtorno Bipolar do HCPA (PROTAHBI) e na
Unidade de Internação Psiquiátrica do HCPA.
6.3 Critérios de inclusão para pacientes
1) Diagnóstico de Transtorno de Humor Bipolar – eutímico, de acordo com os
critérios do DSM-IV.
2) Idade entre 18-60 anos.
3) Capacidade de entender e fornecer consentimento informado.
6.4 Critérios de inclusão para controles
1) Sem diagnóstico psiquiátrico ou história de tratamento psiquiátrico.
2) Sem história familiar de transtorno bipolar, esquizofrenia, depressão ou
outro transtono psicótico.
3) Capacidade de entender e fornecer consentimento informado.
6.5 Critérios de exclusão:
1) Doença clínica importante (HIV, diabetes melitus, hepatite, doença renal).
7 ASPECTOS ÉTICOS
58
Todos os pacientes assinaram o termo de consentimento informado
previamente ao estudo. Foi assegurada a ausência de vinculação da concordância
em participar do estudo com a continuidade do atendimento no programa de
atendimento de transtorno de humor bipolar (PROTAHBI).
Este estudo abrangeu os princípios bioéticos de autonomia, beneficência,
não-maleficência, veracidade e confidencialidade, sendo aprovado pelo Comitê de
Ética em Pesquisa do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
59
8 ARTIGO
Submetido para a revista Sleep and Breathing
Sleep in bipolar patients
Larriany M.F. Giglioa, Ana C. Andreazzaa,b, Mônica Andersen, Keila M. Cereséra
Julio C. Walza , Laura Sterza, Flávio Kapczinskia
a
Bipolar Disorders Program, Centro de Pesquisas, Hospital de Clínicas de Porto
Alegre
b
Department of Biochemistry, ICBS, Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
Porto Alegre, RS, Brazil
Corresponding author:
Larriany Giglio
Bipolar Disorders Program-Centro de Pesquisas
Hospital de Clínicas de Porto Alegre
Rua Ramiro Barcelos, 2350
90035-003
Porto Alegre, RS
Brazil
Tel.: +55 51 32227309
Fax: +55 51 21018846
E-mail address: [email protected]
60
ABSTRACT
Background: Sleep disturbance has been described in bipolar disorder
(BPD). Specific complaints may include frequent nighttime awakenings, poor quality
of sleep, reduction in total sleep time and nightmares. Most patients with BPD also
report insomnia when in depression, but a significant percentage of patients report
hipersomnia symptoms with prolonged night time sleep, difficult in wakening and
excessive day time sleepiness. Objectives: The present study aims to investigate
whether bipolar patients with sleep disorders presented impairment in quality of life,
disability and global function. Methods: One hundred ninety bipolar patients type I
diagnosed by application of Structured Clinician Interview for DSM-IV Disorders
(SCID), were distributed in two groups based on absence or presence of sleep
disorders. Quality of life, disability and global dysfunction were evaluated using the
Health Organization’s Quality of Life instrument (WHOQOL-Brief), the Sheehan
Disability Scale and the Global Assessment of Functioning (GAF), respectively.
Results: Sleep complaints have negative influence on general quality of life,
observed by decreased scores in WHOQOL and GAF domains and increased
Sheehan scores, indicating the importance of maintenance of normal sleep in bipolar
patients. Conclusion: Our results suggest that sleep complains impair quality of life
and global function. Collectively, further studies are warranted to investigate the
impairment of sleep disturbance on others neurotrophic factors and neurochemical
pathways.
Key words: Bipolar Disorder, Sleep, Quality of life, Insomnia, Disability, GAF
61
INTRODUCTION
Sleep is an active state, critical for our physical, mental and emotional wellbeing and is favorable for brain plasticity [1-3]. Several studies showed that sleep
periods encompass processes ranging from reactivation of neuronal ensembles
during post-training sleep to molecular changes [1, 4]. Further, sleep is important for
optimal cognitive and overall functioning [5]. However, sleep disorders are very
common in the general population, affecting 10-20% of adults [6, 7] with an impact in
daytime functioning [8].
Sleep disorder coexists with a number of physical and psychiatry conditions,
including psychoses, anxiety disorders and mood disorders [5-7]. The sleep-wake
cycle has been a core component of theoretical conceptualizations of bipolar disorder
(BPD) and circadian rhythm instability is a frequent complaint in these patients [9].
Insomnia as well as hypersomnia with prolonged night time sleep, difficulty in
awakening and excessive daytime sleepiness are often experienced by depressive
bipolar patients [10]. Longitudinal studies have shown that the insomnia is often
perceived as a symptom of depression, but it is also associated with a substantial
increase in the relative risk of major depression [5, 6]. Moreover, a systematic review
showed that seep disturbance was the most common prodrome of mania [9, 11].
BPD is frequently associated with difficulties with social, interpersonal
relationships and occupational functioning [12]. Bipolar patients showed poor quality
of life, particularly in physical and psychological domains when assessed by the
WHOQOL [13, 14]. Individuals with both depressive symptoms and sleep complaints
showed lower QOL and more difficulties in work activities than patients without mood
symptoms [8]. Moreover, sleep disturbance and depressive symptoms are especially
related to exhaustion, fatigue and reports of extra bed time [11].
Thus, we questioned if sleep plays an additional role that contributes to
the difficulties persons with BPD experience in physical, psychological, social and
environmental domains. This study was therefore conducted to evaluate the influence
of sleep disturbance in quality of life assessed by WHOQOL in euthymic bipolar
patients.
Materials and methods
One hundred ninety bipolar patients’ type I diagnosed by application of SCID
[15] from General Hospital of Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brazil were assessed
62
in a cross-sectional design. The entire evaluation included, besides SCID I, a
questionnaire for demographic, social and clinical information; Hamilton Depression
Rating Scale [16]; Young Mania Rating Scale [17]; Global Assessment of Functioning
[18]; Sheehan Disability Scale [19] and WHOQOL-Brief [20]. Trained researches
made all interviews and the General Hospital of Porto Alegre ethical committee
approved this project (07553). After being provided with a complete description of the
study, written informed consent to participate was obtained from all participants. The
inclusion criteria was patients have bipolar disorder type I, diagnosed by SCID and
was in euthymia (HAM-D <7 and YMRS<7).
The patients were separated in two groups, presence and absence of sleep
complaints. Patients were present score equal or higher than 17 in the questions 4, 5
and 6 of the Hamilton Depression Rating Scale were considered to have sleep
problems.
Data analysis
Histograms and the Kolmogorov–Smirnov test were used to check variables for
normality. This sample presented normal distribution. In order to test the hypothesis
that there would be a discrepancy between self-reported QOL and functional
(objective) measures in bipolar patients we used Chi-square tests for verify the
differences in proportions between the groups, while t-tests were employed to
compare means between groups. Statistical significance was set at p<0.05.
RESULTS
Table 1 describes the patients in terms of demographic and socioeconomic
variables. There were more women than men in our sample and half of the patients
were aged 40-59 years. 58.42% (111) of bipolar patients presented sleep problems.
Table 2 show alteration in QOL, disability (Sheehan disability) and global
assessment function (GAF) in bipolar patients. Patients with sleep problems showed
worse quality of life scores in all domains (physical;t=5,041; df=178 p<0.001,
psychological; t=4,67; df178; p<0.001, social; t=2,407; df=178; p=0.017 and
environmental;t=2,843; df=178 p=0.005). We also observed that the score of physical
and
psychological
domains
presented
worse
impairment
than
social
and
environmental domains (14.72%, 14.15%, 8.35% and 6,.68%, respectively). Sheehan
disability scales verify impairment in tree domains: work social comportment and
63
familial, since that bipolar patients with sleep alteration presented high scores in
every domain indicating functional impairment in these patients (2.46%, 2.05%,
1.63%, respectively). Confirming the results obtained in the Sheehan scale, the GAF
presented a diminished score in BP with sleep dysfunction representing 6.66% of
worse, representing functional impairment in these patients.
Discussion
Our aim was to investigate the sleep-related quality of life in euthymic bipolar
patients. Although patients experienced symptomatic recovery with low scores of
HAM-D and YMRS, the sleep disturbance remained 58.42% of our sample. One
reason for high rates of sleep disturbance reported in the current study is the lack of
proper routine experienced by bipolar patients. Furthermore, patients with both BPD
and sleep disturbance showed lower quality of life than bipolar patients that did not
experienced insomnia. Bipolar patients with impaired sleep might feel especially
exhausted with need for more time in bed which could explain the physical disability.
Furthermore, the poor quality of sleep promotes difficulties in concentration, learning
and memory. Although a body of evidence reported that quality of life was inversely
correlated with the level of depression, a comparison study between bipolar and
unipolar patients suggested that the level of depression did not fully explain the lower
quality of life within patients with BPD [21, 22]. We demonstrated here that the sleep
alteration was another factor that contributes to low quality of life experienced by
bipolar patients. In accordance with our results, Harvey et al. [9] have reported that
70% of bipolar patients experienced sleep alteration and it was associated with low
daytime activity levels.
In addition to being associated with quality of life, three lines of evidence
point to the importance of sleep in bipolar disorder. First, experimentally induced
sleep deprivation is associated with the onset of hypomania and mania in a
considerable proportion of patients. Second, in a systematic review of studies of
patients with bipolar disorder, sleep disturbance was the most common prodrome of
mania and the sixth most common prodrome of bipolar depression. Third, the sleepwake cycle has been a component of theoretical conceptualizations of bipolar
disorder. It has been hypothesized that bipolar disorder patients have a genetic
diatheses that may take the form of circadian rhythm instability [9].
64
In fact, sleep disturbance has been considered as a cardinal symptom of
endogenous depression, and it is known that sleep deprivation exerts an
antidepressant effect [23]. It is rare that some form of sleep “change” is not
associated with the presence of clinical depression. The essential linkage of sleep
disturbance and clinical depression has long been recognized [24]. The relationship
between mania and sleep loss is particularly apparent at the beginning of a manic
episode, when a typical three-stage escalation has been described [25]. At the
beginning of a manic episode, clinicians often
observe spontaneous sleep
deprivation, due to the hyperactivity of the patient, resulting in an increase in manic
symptomatology and then in subsequent sleep loss [26]. Thus, sleep loss appears to
act not only as a triggering factor of mania, but also as an augmenting factor during
the manic episode, with worse symptomatological outcomes following consistent
sleep loss [26].
Finally, it has been suggested that sleep periods are favorable for brain
plasticity [27]. Recent studies have provided evidence that the expression of genes
involved in synaptic plasticity is affected by sleep-wake state. For example, the
phosphorylated form of cAMP response element binding protein (CREB), important
transcription factor, is present at higher levels after periods of waking than periods of
sleep [28]. Down-regulation of phosphorilated CREB was observed in post-mortem
brain tissue of affective patients [29]. Furthermore, selective REM sleep deprivation
(6h) suppresses brain derived neurotrophic factor (BDNF) protein levels in the
cerebellum and brainstem without producing changes in the hippocampus [30]. Our
group has demonstrated that BDNF levels were decreased in manic and depressed
BPD patients [31] and this was negatively correlated with manic symptoms [32]. Of
note, BDNF has been involved in memory and learning [33], and trophic actions,
such as altered neuronal plasticity and cellular morphology while CREB is a
transcription factor and one of the genes regulated by the cAMP-CREB cascade is
BDNF [34].
Consideration that (1) sleep dysfunction leads to alteration in
neurotrophic and transcription factors; (2) these factors are very important for
maintaining the normal neuronal plasticity; (3) sleep dysfunction has been described
in BPD, our results suggest that sleep complains impair quality of life and global
function. Collectively, further studies are warranted to investigate the impairment of
sleep disturbance on others neurotrophic factors and neurochemical pathways.
65
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68
Table 1. Sociodemographic variables among patients
Sleep Disfunction
Absence (n=69)
Presence (n=111)
Gender
Female
Male
Year of Age
Age of on set
Years of illness
NYU
HAM-D Score
YMRS
38,60%
38,90%
Mean
SD
40,26
9,75
23,32
11,08
16,96
11,31
5,04
8,75
5,36
5,25
3,88
5,67
Chi-square
61,40%
61,10%
Mean
44,05
26,94
17,15
7,32
12,68
5,23
SD
12,08
12,29
11,72
11,61
7,04
5,76
Sig
0,001
0,974
T-test
-2,23
-2,24
-0,11
-1,4
-7,58
-1,55
Sig
0,126
0,044
0,913
0,16
0,001
0,122
Table 2. QOL, disability (Sheehan disability) and global assessment function (GAF)
in bipolar patients.
WHOQOL
Phisical Domain
Psychological Domain
Social Domain
Environmetal Domain
SHEEHAN DISABILITY
Work Domain
Social Domain
Familial Domain
GAF
Sleep Disfunction
Absence (n=69)
Presence (n=111)
Mean
SD
Mean
SD
Levene's Test
F
Sig
t-test for Equality of Means
t
df
Sig (2-tailed)
61,56
60,24
57,97
58,85
19,62
21,23
24,01
17,2
46,84
46,09
49,62
52,17
18,57
18,79
21,7
14,04
0,31
2,605
0,448
3,712
0,578
0,108
0,504
0,056
5,041
4,67
2,407
2,843
178
178
178
178
0,001
0,001
0,017
0,005
3,52
3,02
3,64
3,75
3,49
5,98
6,05
4,83
3,46
3,45
3,34
1,717
2,704
0,56
0,192
0,102
0,455
-4,595
-3,801
-3,523
178
178
178
0,001
0,001
0,001
66,54
16,22
59,88
12,87
7,262
0,008
3,101
178
0,002
69
9 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nosso objetivo foi investigar a qualidade de vida relacionada ao sono em
pacientes bipolares - tipo I em estado de eutímia. Apesar dos pacientes terem
apresentado uma recuperação sintomática mostrada pelo baixo índice na HAM-D e
YMRS, as questões que se referem a alterações de sono mostraram-se alteradas
em 58,42% da nossa amostra. Um das razões para as altas taxas de distúrbio do
sono apresentada nesse estudo é a falta de uma rotina adequada dos pacientes
bipolares, o que é facilmente observado na clinica. Além disso, pacientes com THB e
distúrbio do sono apresentaram pior qualidade de vida que os pacientes com THB
sem queixa de insônia. Os pacientes com distúrbio do sono sentem-se
especialmente exausto com maior necessidade de tempo no leito o qual pode
explicar a incapacidade física. Ainda a pobre qualidade do sono promove
dificuldades na concentração, no aprendizado e na memória. Embora existam
evidências mostrando que a qualidade de vida é inversamente correlacionada com o
grau de depressão, um estudo comparativo entre pacientes bipolares e unipolares
sugere que o grau de depressão não explicava completamente à baixa QV dentre
pacientes com THB (Berlim et al., 2004; Yathan et al., 2004).
Neste estudo nós demonstramos que a alteração do sono pode ser um
importante fator para a baixa QV dos pacientes bipolares. Em consonância com os
nossos resultados, Harvey et al. (2005) reportaram que 70% dos pacientes bipolares
apresentaram alteração de sono e estava associada com baixos níveis de atividades
diária.
Além do distúrbio de sono estar associado com a qualidade de vida, três
linhas de evidência apontam para a importância do sono no THB. A primeira mostra
que a indução de privação de sono está associada com o início da hipomania e
mania em uma proporção considerável de pacientes bipolares. Em segundo, o
distúrbio do sono foi associado como um dos pródomos mais comuns para o inicio
de um episódio de mania e o sexto pródromo mais comum de depressão bipolar. Em
terceiro, o ciclo sono/vigília tem sido um componente de conceptualizações teóricas
do THB. Tem sido hipotetizado que pacientes bipolares têm uma diástese genética
que pode levar a instabilidade do ritmo circadiano (Harvey et al., 2002).
70
O distúrbio de sono tem sido considerado como um sintoma cardinal de
depressão endógena (Adrien, 2002), além disso, é raro que alguma forma de
“mudança” no sono não esteja associada com a presença de depressão clinica
(Kupfer, 2006). Os distúrbios de sono não estão associados somente a depressão,
mas também a quadros de mania (Carlson and Goodwin, 1973). Tem sido
demonstrado que no início de um episodio maníaco os clínicos freqüentemente
observam uma privação espontânea do sono, devido à hiperatividade do paciente,
resultando em um aumento dos sintomas maníacos e então na subseqüente perda
do sono. Conseqüentemente, a perda de sono parece agir não só como um gatilho
para a mania, mas também como um fator agravante no episodio maníaco levando a
um pior resultado sintomatológico seguido de consistente perda de sono.
Finalmente, foi sugerido que períodos de sono são favoráveis a plasticidade
do cérebro (Guzman-Marin et al., 2006). Estudos recentes têm disponibilizado
evidências que a expressão dos genes envolvidos na plasticidade sináptica está
alterada no ciclo sono-vigilia. Por exemplo, a forma fosforilada do CREB, importante
fator de transcrição, está presente em altos níveis após períodos de vigília quando
comparados aos períodos de sono. Baixa regulação do CREB fosforilado em tecido
cerebral pós-morte de pacientes bipolares (Young et al., 2004). Além disso, privação
do sono REM (6h) suprime os níveis protéicos do fator neurotrófico derivado do
cérebro (BDNF) no cerebelo e tronco cerebral sem mudança na produção no
hipocampo (Sei et al., 2000). Nosso grupo demonstrou que níveis de BDNF estavam
diminuídos em pacientes maníacos e deprimidos e isso tem correlação negativa com
os sintomas maníacos (Machado-Vieira et al., 2006). O BDNF está envolvido em
memorização, aprendizado (Tramontina et al., 2007), assim como as ações tróficas,
como a plasticidade neuronal alterada e morfologia celular, enquanto CREB é um
fator de transcrição e um dos genes regulados pela cascata AMPc-CREB.
Considerando que (1) distúrbio do sono leva a alterações nos fatores
neurotróficos e de transcrição; (2) esses fatores são muito importantes para manter a
plasticidade neuronal normal; (3) distúrbios do sono foram descritos em pacientes
bipolares, nossos resultados sugerem que queixas de sono interferem na QV e na
função global. Assim, futuros estudos devem ser realizados para investigar o efeito
do distúrbio de sono em outros fatores neurotróficos e caminhos neuroquímicos.
Futuros estudos são justificáveis para pesquisar especificamente alterações
no ritmo circadiano, dentre elas os distúrbios do sono em pacientes bipolares, pelo
71
impacto observado na vida desses pacientes. Uma escala específica seria relevante
para avaliação e tratamento desse distúrbio concomitantemente com o tratamento
medicamentoso.
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