Semiologia Cardiovascular B3, B4, Cliques, Estalidos e Atrito Pericárdico Por Gustavo Amarante 1 – Bulhas Acessórias (B3 e B4) A) Revisão do Ciclo Cardíaco e Posição das Bulhas Para entender as bulhas acessórias, primeiramente precisamos localizá-las no ciclo cardíaco. Portanto, vamos fazer uma breve revisão do ciclo. A figura abaixo foi desenhada expondo diversos componentes que podem ser localizados no ciclo cardíaco. Mas para melhor entendimento devemos analisá-la por partes. Dê atenção, inicialmente, às curvas de pressão arterial (parte superior da figura) onde estão representadas as curvas da aorta, do ventrículo e do átrio. Veja que o ciclo inicia-se pelo fechamento das válvas atrioventriculares (mitral e tricúspede) o que corresponde ao início da contração ventricular. Nesse momento a contração ventricular isovolumétrica, ou seja, sem ejeção de sangue, é responsável pelo grande aumento da pressão intraventricular. Essa pressão eleva-se até que se atinja a pressão da aorta, quando abre a sua valva e o sangue começa a ser ejetado. Agora, com a ejeção do sangue, a pressão no ventriculo sobe de maneira menos brusca e começa a diminuir até que seja menor que a pressão aórtica, ocorrendo o fechamento da sua valva. Nesse momento tanto a valva aortica quando a mitral estão fechadas e o ventrículo passa a relaxar, o que leva à brusca redução da sua pressão. Quando a pressão ventricular estiver mais baixa que a do átrio, a valva atrioventricular abrirá e o sangue que estava no átrio passará a encher o ventrículo. O enchimento ventricular ocorre em 3 fases : enchimento rápido, enchimento lento e contração atrial, nessa ordem. Após revisada essa parte do ciclo cardíaco, devemos lembrar da posição das bulhas. A primeira bulha ocorre pelo fechamento das valvas atrioventriculares, ou seja, é um ruído que define o início da sístole (sendo, portanto, um som sistólico). Já a segunda bulha ocorre pelo fechamento das valvas semilunares, evento que delimita o início da diástole ventricular. Além disso, podemos ter outras 2 bulhas acessórias às principais. São elas: terceira e quarta bulhas. Ambas são ruídos DIASTÓLICOS, ou seja, encontram-se entre a B1 e a B2 no ciclo cardíaco. A diferença em relação ao momento do ciclo em que aparecem, é que a B3 ocorre na proto-diástole (após B2) e a B4 na pré-sistole (antes da B1). Veremos a seguir como isso é importante no diagnóstico estetoacústico das bulhas acessórias. B) Terceira Bulha Cardíaca (B3) 1) FISIOPATOGÊNESE A terceira bulha pode ser fisiológica ou patológica (quando há cardiopatia associada). Em ambos os casos ela ocorre na mesma fase do ciclo – o enchimento rápido. Essa fase é a primeira fase de enchimento ventricular, que ocorre logo após a abertura das valvas atrioventriculares. Ela torna-se audível e presente quando o sangue proveniente do enchimento rápido vibra na parede do ventrículo. Vamos entender quando ocorre essa vibração. Ocorre em crianças e adultos jovens. Devido à proximidade do coração com a parede torácica, e à Maior velocidade do sangue na fase de enchimento ventricular o Isso ocorre pelo fato do coração desses indivíduos apresentar um maior gradiente de pressão entre átrio e ventrículo, o que culmina na passagem mais veloz de sangue para este. Importante: o A B3 fisiológica é melhor audível com o indivíduo em decúbito lateral esquerdo. o É característico o seu desaparecimento quando o paciente está de pé ou sentado. Caso continue presente, deve-se pensar em cardiopatia. Ocorre pela vibração do sangue proveniente da fase de enchimento rápido em uma parede ventricular dilatada por hipertrofia excêntrica. Veja abaixo a diferença entre uma hipertrofia concêntrica e excêntrica, e como surge esta última. 2) A HIPERTROFIA EXCÊNTRICA C) Quarta Bulha Cardíaca (B4) 1) FISIOPATOGÊNESE A quarta bulha, na maioria das vezes, é patológica. Exceto em situações como as síndromes hipercinéticas ou quando trata-se de um atleta. Tanto é verdade que, diz-se que, caso ausculte uma B4 em um indivíduo normal e ele não apresenta síndrome hipercinética ou não é atleta, com certeza há uma cardiopatia associada que não foi inicialmente diagnosticada. Diferente da terceira bulha, a B4 ocorre na última fase do enchimento ventricular – representada pela contração atrial. Essa fase é responsável por cerca de 20 a 30% do sangue ejetado para o ventrículo. Ocorre pela vibração do sangue durante a contração atrial em um ventrículo pouco complacente. A baixa complacência do ventrículo pode ocorrer em diversos processos, como na hipertrofia concêntrica, doenças infiltrativas do miocárdio, inflamações miocárdicas, infarto, etc. Porém, dentre essas, aquela que mais frequentemente leva ao aparecimento da quarta bulha é a HIPERTROFIA CONCÊNTRICA. Portanto, iremos abordar apenas essa causa (veja mais a frente). A B4 desaparece na fibrilação atrial (FA). Fato justificado pela sua patogênese – a bulha surge na fase de contração atrial (ausente na FA). Note a diferença de uma hipertrofia concêntrica (à esquerda) para uma hipertrofia excêntrica (à direita). 2) A HIPERTROFIA CONCÊNTRICA D) Características Gerais (B3 e B4) São ruídos de baixa frequência (grave); o Portanto são melhores vistos na palpação; o Na ausculta são melhores audíveis utilizando a campânula do estetoscópio, pois esta transmite melhor os sons de baixa frequência. São diastólicos (B3 é proto-diastólico e B4 é tele-diastólico ou pré-sistólico); Podem ser auscultadas tanto no foco mitral como tricúspide, sendo devido a alterações do ventrículo direito ou esquerdo; São melhores auscultadas em decúbito lateral esquerdo, por aproximar a ponta do coração da caixa torácica. 2 – Cliques e Estalidos São sons de alta frequência (agudos) – melhores audíveis com o diafragma do estetoscópio; Ocorrem próximos a B1 (cliques de ejeção) ou à B2 (estalidos de abertura); Surgem quando há estenose valvar; Desaparecem quando a valva calcifica ou torna-se imóvel. A) Como diferenciá-los de B3 e B4? 3 – Atrito Pericárdico Ocorre na pericardite aguda; Desaparece quando surgem grandes derrames pericárdicos ou quando a pericardite é crônica; É um ruído de alta frequência, áspero e raspante. Assemelha-se ao ranger de “couro novo”; É melhor audível com a flexão do tronco do paciente e utilizando o diafragma do estetoscópio pressionado sobre o tórax; Pode ser audível em qualquer área do precórdio, mas predomina-se no foco pulmonar e na borda esternal esquerda; Pode ter 3 componentes, quando o atrito é completo. Sendo eles: o Componente pré-sistólico o Componente sistólico. Este é o componente mais comum. o Componente proto-meso-diastólico. Este é o componente mais raro.