emotivismo

Propaganda
EMOTIVISMO
O Emotivismo é uma teoria meta-ética que investiga o significado da
linguagem moral descrevendo, clarificando e comentando o uso dos termos morais,
por oposição à ética normativa que se ocupa dos princípios morais a adoptar.
O Emotivismo apresenta-se como uma teoria meta-ética não cognitivista,
argumentando que não é possível ter crenças morais nem conhecimento moral.
Segundo o Emotivismo, as afirmações que expressam crenças tentam representar o
mundo, e por isso são avaliadas em termos do seu conteúdo de verdade ou falsidade,
enquanto que as afirmações morais têm por base a expressão de emoções, cujo
objectivo não é o de representar o mundo, e por isso não podem ser analisadas em
termos do seu conteúdo de verdade. Consequentemente, defendem os emotivistas,
os juízos morais expressam, por um lado, as atitudes de aprovação ou desaprovação
de quem emite o juízo e, por outro lado, tentam que os ouvintes dos juízos morais
sintam semelhante aprovação ou desaprovação. Por exemplo, quando se diz “Mentir
é errado” está a expressar-se hostilidade sobre o acto de mentir e, simultaneamente,
a tentar que os outros partilhem dessa hostilidade. Dado o perfil desenhado do
Emotivismo, pode compreender-se porque C.D. Broad o baptizou como teoria moral
do “Hurray-Boo”, já que para os emotivistas dizer que “Mentir é errado” parece ser
equivalente a dizer “Booo! Abaixo o mentir”.
História do Emotivismo
Nos anos que se seguiram a 2ª Guerra Mundial, a ética foi dominada pela
discussão da teoria meta-ética conhecida por Emotivismo. Apesar de aparecer como
uma crítica e reacção ao Intuicionismo de G.E. Moore, o Emotivismo retém do
Intuicionismo a convicção da necessidade de uma concepção filosófica meta-ética, ao
considerar que o papel da filosofia é o de elucidar o carácter linguístico dos juízos
morais, em vez de estabelecer quais os juízos normativos sobre o bom e o mau, sobre
o que é correcto e o que é errado. Assim, as questões sobre o significado das
afirmações morais e dos termos morais são centrais para a concepção emotivista e,
segundo esta perspectiva, nenhuma conclusão de primeira ordem (ou seja,
normativa) decorre da análise meta-ética de segunda ordem. Esta interpretação da
tarefa filosófica da ética passou a ser dominante nas seguintes duas décadas, fazendo
da meta-ética o modo privilegiado de reflexão.
A primeira versão do Emotivismo aparece na Suécia, na obra de Axel
Hägerström (1911), e foi articulada pela primeira vez no panorama anglo-saxónico,
em 1923, por C.K. Ogden e I.A. Richards, em The Meaning of Meaning. No entanto, é
© DICIONÁRIO DE FILOSOFIA MORAL E POLÍTICA
Instituto de Filosofia da Linguagem
nas obras de Alfred Jules Ayer (1910-1989) e do filósofo americano Charles Leslie
Stevenson (1908-1979) que encontramos
as formulações clássicas da teoria
emotivista.
Em Linguagem, Verdade e Lógica (1936), na linha do Positivismo Lógico, Ayer
classifica as afirmações numa tipologia tripartida. A primeira corresponde às
afirmações de tipo lógico, onde temos a classe das verdades da lógica e da
matemática; a segunda, relativa às afirmações de tipo factual, inclui todas as
afirmações que são empiricamente verificáveis, como as verdades falsificáveis das
ciências e o conhecimento do senso comum; finalmente, a terceira, trata das
afirmações de tipo emotivo, onde se inserem todas as afirmações que não pertencem
nem à primeira nem à segunda classe, como as da ética, da estética e da teologia. É
analisando o carácter da terceira classe de asserções que Ayer formaliza a posição
emotivista, afirmando que os conceitos éticos são pseudo conceitos inanalisáveis,
que carecem de teste para os validar ou invalidar (Ayer, 1991, p.92). Assim, segundo
Ayer, ao fazer uma afirmação ética como “Pedro agiu mal ao roubar dinheiro” não se
está afirmar nada mais do que “Pedro roubou dinheiro” num tom de horror e
repugnância. No entanto, como o tom não acrescenta nada ao significado da frase,
serve apenas para tornar aparente os sentimentos de quem a pronuncia (Ayer, 1991,
p.92).
Na base da argumentação de Ayer está a ideia de que as outras teorias metaéticas sobre a natureza dos juízos morais, ou violam os princípios do positivismo
lógico, ou incorrem na chamada falácia naturalista, ou seja, na tentativa de definir
termos morais em termos naturais. Se, por um lado, afirmarmos que os juízos morais
descrevem
estados
não
naturais,
defendendo
uma
posição
absolutista
ou
intuicionista, ficamos comprometidos com a perspectiva de que os juízos morais são
inverificáveis e que têm origem em misteriosas intuições intelectuais (Ayer, 1991,
p.91). Esta posição é inaceitável pois, como afirma Ayer, “o que parece certo
intuitivamente para um indivíduo pode parecer duvidoso, ou mesmo falso, para
outro” (Ayer, 1991, p.91). Na verdade, o apelo a uma intuição é um teste em vão, e
é necessário algum critério para poder decidir perante intuições conflituosas1. Se,
por outro lado, adoptarmos uma posição naturalista, defendendo que os termos
morais podem ser definidos exclusivamente em termos factuais e empíricos,
cometemos a falácia naturalista (Smith, 1994, p.19). Tanto o utilitarismo como a
ética subjectivista situam os juízos morais numa subclasse de juízos psicológicos ou
sociológicos. Ayer, que considera estas propostas filosóficas atraentes, mostra que
1
Simon Blackburn mostrou que com a proposta do projectivismo ético, não e necessário cair no
intuitionismo na defesa de uma meta teoria não naturalista, já que se pode explicar o acesso ao
conhecimento dos factos morais de outras formas (Balckburn, 1987).
© DICIONÁRIO DE FILOSOFIA MORAL E POLÍTICA
Instituto de Filosofia da Linguagem
não podem estar correctas: se assim fosse, as afirmações éticas não seriam
diferentes das factuais e as hipóteses empíricas também se lhes aplicariam. Em
suma, se há factos morais, estes não podem ser naturais; mas também não podem ser
não naturais, pois nesse caso não se chamariam factos. Este dilema, apresentado por
Ayer, e com que se vê confrontado o naturalista moral, ainda não foi resolvido com
sucesso (Smith, 1994, p.16).
Deste modo, Ayer conclui que a facticidade da moral é apenas uma aparência
e que os juízos morais não representam o mundo como sendo desta ou daquela
maneira, ou seja, não têm uma função descritiva. A função dos juízos morais é a de
expressar as atitudes de aprovação ou desaprovação de quem emite os juízos e de
provocar sentimentos nos outros de modo a provocar a acção (Ayer, 1991, p.93). Ayer
tem o cuidado de distinguir a posição emotivista das éticas subjectivistas ao
sublinhar a diferença entre a expressão e a asserção de sentimentos (Ayer, 1991,
p.94). Os defensores das éticas subjectivistas argumentam que os enunciados éticos
são enunciados sobre os sentimentos dos falantes e, deste modo, estão sujeitas a
uma objecção sobre a impossibilidade de discutir questões de valor. Segundo estas
teorias, quando alguém afirma que “respeito é uma virtude” e outro argumenta que
“o respeito é um vício sendo outro nome para a subserviência”, não há qualquer
razão para que ambos os enunciados não sejam verdadeiros, já que são afirmações
acerca das emoções e sentimentos dos falantes. Ao contrário, o Emotivismo não está
sujeito a tal objecção dado que as afirmações éticas apenas expressam e comunicam
as atitudes do falante, não tendo qualquer valor de verdade (Ayer, 1991, p.95).
Uma das consequências imediatas da posição emotivista é a de impossibilitar
a razoabilidade e a relevância da argumentação moral, uma preocupação levantada
por G.E. Moore em “The Nature of Moral Philosophy”. A resposta de Ayer a este
problema foi negar que as disputas morais fossem de facto possíveis, argumentando
que na discórdia moral não se pode discutir sobre a aceitação ou rejeição de um
princípio moral: a única coisa que é possível discutir é a relevância de certos factos.
Mas esta visão das disputas morais não permite fazer justiça aos modos como os seres
humanos de facto discutem sobre assuntos éticos e morais. É no seguimento desta
dificuldade filosófica que Charles Stevenson tenta apresentar uma versão do
Emotivismo que faça justiça à argumentação ética.
Apoiado por desenvolvimentos da teoria da linguagem, que tornam claro que
uma afirmação pode ter significado ainda que este não seja analitica ou
empiricamente verificável, Stevenson apresenta outra versão do Emotivismo: o
projeccionismo. O declínio da teoria verificacionista permite-lhe afirmar que para
saber o significado duma afirmação linguística é necessário saber o uso que é feito
© DICIONÁRIO DE FILOSOFIA MORAL E POLÍTICA
Instituto de Filosofia da Linguagem
dessa afirmação. Partindo desta consideração, Stevenson vai então desenvolver o que
ele denominou de teoria causal do significado, segundo a qual o significado dum
signo linguístico é a sua propriedade de ser capaz de causar disposições para a acção
através de processos psicológicos nos oradores e ouvintes. Neste quadro teórico,
Stevenson distingue dois tipos de significado: o descritivo, que capta a capacidade de
um signo afectar as actividades de tipo cognitivo, como a reflexão e o cálculo, e o
emotivo, que se prende com a capacidade de um signo afectar o mundo emocional, e
com o seu poder de evocar e expressar atitudes, dada a sua história em situações
emocionais. Naturalmente, para Stevenson a linguagem moral vive sobretudo do
significado emotivo. Como emotivista, concorda com a posição de Ayer de que a
função das afirmações morais é o de expressar e modificar as atitudes emocionais.
No entanto, enquanto que Ayer se concentra no facto de os juízos morais
expressarem as emoções e atitudes do orador, Stevenson vai acrescentar outro
aspecto do juízo moral, nomeadamente o facto de este ter também como objectivo
influenciar as emoções e atitudes dos outros.
Stevenson identifica dois traços da linguagem moral: o seu carácter expressivo
(de manifestar a atitude emocional) e o seu carácter dinâmico (o de levar à acção) e,
ainda que argumente que a apreensão do significado emotivo só pode ser feita por
aproximação, oferece dois modelos para a compreensão do significado das palavras
morais. No primeiro modelo, Stevenson diz que afirmar que “Isto é bom” é mais ou
menos equivalente a afirmar que “Eu gosto disto. Faz como eu”. No segundo modelo,
aponta as expressões (por ele denominadas “definições persuasivas”) com significado
descritivo e às quais se associa um significado emotivo. De acordo com esta última
perspectiva, a definição do que é bom, assim como a de outras expressões de valor,
nunca pode ser completa em termos descritivos. Tal como Ayer, Stevenson concorda
com a perspectiva de Moore, segundo a qual afirmar que algo é “bom” não pode
funcionar como a afirmação de uma propriedade natural, empiricamente verificável.
Partilhando a convicção de que a ética deve ser uma actividade neutral e que
as doutrinas sobre o significado das expressões morais não nos devem comprometer
com nenhuma posição moral, Stevenson considera fundamental, como critério de
uma meta-ética apropriada, manter as condições para a discórdia interminável
relativamente às questões morais. E embora dê corpo e sentido à necessidade dessa
discórdia perpétua, Stevenson quer mostrar que não há limites para a discórdia e que
não se pode estabelecer um método de resolução da discórdia.
© DICIONÁRIO DE FILOSOFIA MORAL E POLÍTICA
Instituto de Filosofia da Linguagem
Problemas e Virtudes do Emotivismo
O Emotivismo pretende ser uma teoria meta-ética satisfatória porque, ao
evidenciar a ligação intrínseca entre os juízos morais e as atitudes não cognitivas do
agente, consegue dar uma explicação compreensiva sobre a ligação entre a
motivação para a acção e o juízo moral. Além disso, ao fazer do significado emotivo
o significado primeiro da linguagem moral, os emotivistas estão a preservar a
unicidade da linguagem moral e, consequentemente, conseguem também explicar a
noção de verdade aparentemente presente na avaliação dos juízos morais como
testemunho da contínua concordância entre diferentes agentes, ou do mesmo agente
em diferentes momentos temporais.
Os críticos do Emotivismo desafiam estas supostas virtudes da posição
emotivista levantando uma série de críticas e objecções. Primeiro, ao tentar elucidar
as expressões morais em termos de atitudes e emoções, e ao não desenvolver nem
elaborar a natureza dessas mesmas emoções e atitudes, a teoria emotivista
permanece opaca. Assim, a noção de “significado emotivo” não aparece como uma
noção clara, ou pelo menos requer uma explicação e descrição mais detalhada do
que a que é oferecida pelos defensores do Emotivismo. Por exemplo, a perspectiva
emotivista não faz uma distinção clara entre o significado duma afirmação
(semântica), que permanece constante nos seus diferentes usos, e a variedade de
usos que se pode fazer duma afirmação (conteúdo pragmático). Embora o significado
semântico e o leque de possíveis usos da afirmação estejam necessariamente
relacionados, a perspectiva emotivista não oferece critério para a sua distinção ou
interligação (MacIntyre, 1984, p.32). Os críticos do Emotivismo apontam também
que, para explicar a discórdia moral, não é necessário recorrer à noção de significado
emotivo. A distinção entre o significado dos termos morais e as crenças dos sujeitos
sobre a extensão destes explicam porque é que há discórdia, ainda que os sujeitos
tenham a mesma definição dos termos morais.
Em segundo lugar, o Emotivismo não consegue fazer a necessária distinção
entre ‘guiar as atitudes e as acções de alguém’ e ‘levar uma pessoa a sentir e agir
duma certa maneira’, levantando assim algumas dúvidas relativamente à teoria
causal de Stevenson. Além disso, a descrição simplista do Emotivismo não deixa
transparecer que pode haver concordância moral sem que esta seja concordância de
atitude: pode haver discórdia moral sem haver discórdia de atitude moral (entre
moralistas com diferentes visões morais) e pode haver discórdia de atitude sem haver
discórdia moral (entre moralistas e imoralistas). Os críticos afirmam também que a
análise emotivista sobre os juízos morais exclui o reconhecimento de que há a
possibilidade de os juízos morais não reflectirem as atitudes dos sujeitos que emitem
© DICIONÁRIO DE FILOSOFIA MORAL E POLÍTICA
Instituto de Filosofia da Linguagem
juízos. Por exemplo, não é claro como é que o emotivista pode explicar a posição
amoralista – alguém que reconhece os requerimentos morais mas que é indiferente a
eles.
Talvez o aspecto mais problemático do Emotivismo seja a sua aniquilação do
papel da razão na esfera moral, e de que o conceito de validação não tem qualquer
aplicação na argumentação moral. O Emotivismo não só não consegue capturar os
elementos cognitivistas da discórdia moral, como também a sua análise semântica
dos termos morais não lhe permite lidar com a semântica dos predicados morais em
contextos ainda não afirmados, como os antecedentes dos juízos morais condicionais
(“Se ele fizer algo de errado, então terá que ser castigado”). Além disso, ao excluir a
noção de conteúdo de verdade, o Emotivismo não consegue dar espaço à noção de
erro moral, nem de entender a sua relevância na discórdia ética e moral. É discutível
se os filósofos que o defenderam estariam preocupados em preservar a importância
do argumento racional sobre assuntos morais. No entanto, mesmo que se mantenha a
função do juízo moral defendida pelos emotivistas – a de expressar esta ou aquela
emoção e a de suscitar nos outros emoções semelhantes – o argumento racional não
deixa de ser uma das maneiras com que tentamos que outros partilhem das nossas
opiniões. Este será um dos focos principais da crítica ao Emotivismo pelo
Prescritivismo, teoria meta-ética frequentemente associada ao filósofo R.M. Hare,
desde a publicação do seu livro The Language of Morals, em 1952. Dominando a
discussão filosófica nos meados do século XX, o Prescritivismo de Hare tornou-se o
paradigma da perspectiva não cognitivista do discurso moral.
Finalmente, como escreve Alaistair MacIntyre, a perspectiva emotivista separa
e distingue o discurso racional do discurso não racional (Mayntire, 1984, p.32) e,
assim, fracciona e fragmenta em compartimentos estanques a racionalidade e a
emotividade, revelando uma visão fragmentada e dissociada da noção de eu
(Johnson, 1993, p.137). A consequência desta fragmentação é o empobrecimento
geral da ética, já que não só reduz o universo da razão e da emoção como retira à
imaginação o seu papel moral (Johnson, 1993, p.137).
Em suma, ainda que como teoria meta-ética o Emotivismo ofereça uma
história coerente sobre a motivação moral, a teoria permanece inadequada. No
entanto, algumas das suas qualidades centrais influenciaram decisivamente a ética:
primeiro, a noção de uma neutralidade moral no exercício da análise filosófica;
segundo, a necessidade de trabalhar a distinção entre facto e valor; terceiro, o modo
de destacar como é difícil explicar a relação necessária entre juízo moral e
motivação; e finalmente, mostrar o carácter interminável da discórdia moral.
© DICIONÁRIO DE FILOSOFIA MORAL E POLÍTICA
Instituto de Filosofia da Linguagem
O renovado interesse nas emoções em geral, e na filosofia em particular,
proporciona um reanimar da posição emotivista. Como explica Michael Stoker (1996),
esta possibilidade advém do facto de tanto os filósofos da ética que se ocupam das
emoções como os emotivistas tradicionais estarem de acordo acerca da relação
necessária e intrínseca entre as emoções e os valores (Stoker, 1996, p.59). No
entanto, como acrescenta Stoker, enquanto que os emotivistas argumentam que os
valores dependem das emoções, os filósofos da emoção propõem que as emoções
incorporam e dependem dos valores (Stoker, 1966, p.73).
A distância clara da posição emotivista relativamente ao recente interesse
pelo papel ético das emoções passa pela perspectiva filosófica sobre o conteúdo das
emoções (Stoker, 1996, p.26). Assim que se reconhece o conteúdo cognitivo das
emoções, a perspectiva filosófica distancia-se da posição emotivista, porque recusa a
simplicidade do quadro epistemológico do positivismo lógico. Se as emoções têm
conteúdo cognitivo, então não se pode afirmar, como o Emotivismo afirma, que não
pode haver qualquer tipo de conhecimento aliado ao mundo emocional. Assim, como
mostra De Sousa num interessante artigo intitulado “Moral Emotions”, a leitura
cognitivista das emoções está em desacordo com a posição emotivista (De Sousa,
2001, pp.117-8). A recente reflexão sobre a natureza das emoções reforça as falhas
da posição Emotivista. O facto de as emoções poderem ser criticadas racionalmente
e por vezes modificadas, mediante o debate racional – como aponta Smith (1994) –
torna mais profunda a falha do Emotivismo de não ser capaz de mostrar ou explicar
como e porquê o discurso e debate morais são sensíveis ao argumento racional.
Uma segunda falha do Emotivismo, realçada pela recente reflexão filosófica
sobre as emoções, tem a ver com a sua inadequada elaboração conceptual sobre a
natureza da emoção. A análise filosófica sobre as emoções aponta para o facto de
nem todas terem a mesma autoridade moral. Deste modo, a reflexão ética sobre as
emoções requer que se estabeleça um princípio de selecção que nos permita verificar
quais são as emoções com autoridade moral e porquê. Talvez ainda mais pertinente
seja o explicitar da necessidade de um princípio que seja passível de ser criticado,
de modo a possibilitar hipóteses de outros princípios de selecção.
As perspectivas éticas que se desenvolvem a partir da reflexão filosófica da
emoção, ao argumentarem que as emoções estão na base da ética, devem ser
designadas de Fundacionalismo Emocional (De Sousa, 2001, p.117). No entanto, o
Fundacionalismo Emocional pode ter diversas formas, dependendo do modo como
varia a sua perspectiva sobre a natureza das emoções ou sobre o modo como esta
base emocional da ética é considerada. Assim, as emoções podem ser essenciais à
© DICIONÁRIO DE FILOSOFIA MORAL E POLÍTICA
Instituto de Filosofia da Linguagem
estrutura ética porque são tidas como motivadores psicológicos do comportamento
ético, ou porque se pensa que os sentimentos morais (mundo emocional cultural) têm
por base entidades emocionais mais básicas e primárias (mundo emocional natural),
ou porque se considera que os sentimentos morais são formados a partir da criação
de valores baseados na dimensão de dor ou prazer que incorporam (De Sousa, 2001,
p.118). Seja qual for o formato do Fundacionalismo Emocional, será de certo bem
distante da posição emotivista, porque a concepção de que os juízos morais são
simples expressões de preferências não consegue acomodar a componente cognitiva
das emoções. Concluindo, a recente reflexão filosófica sobre as emoções não aponta
para o reanimar da perspectiva emotivista na meta-ética, ainda que evidencie a
relevância inultrapassável das emoções na ética.
Dina Mendonça
Bibliografia
- Arrigton, R.L., “Ethics II (1945 to the Present)”, in J.V. Canfield (ed.), Routledge History of
Philosophy. Vol. X: Philosophy of Meaning, Knowledge and Value in the Twentieth
Century, Routledge, London/New York, (1977), pp.163-196.
- Artosi, A., “The Limits of Emotivism. Some Remarks on Professor von Wright’s Paper
“Valuations””, in Ratio Júris, vol. 13, nº 4, (2000), pp.358-363.
- Ayer, A.J., Linguagem, Verdade e Lógica, trad. de Anabela Mirante, Editorial Presença,
Lisboa (1991).
__________, Freedom and Morality and Other Essays, Clarendon Press, Oxford (1984).
- Blackburn, S., Spreading the World, Oxford University Press, Oxford (1984).
__________, “How to Be an Ethical Antirealist”, in P.A. French, T.E. Uehling e H.K. Wettstein
(eds.) Midwest Studies in Philosophy. Vol. XII: Realism and Anti-Realism, University of
Notre Dame Press, Indiana, (1987), pp.361-375.
- Broad, C.D., “Is ‘Goodness’ the Name of a Simple Non-natural Quality?”, Proceedings of the
Aristotelian Society, nº 34, (1933-4), pp.249-268.
- Darwall, S.; Gibbards, A.; Railton, P., “Toward Fin de Siècle Ethics: Some Trends”,
Philosophical Review, (1992), pp.115-89.
- De Sousa, Ronaldo, “Moral Emotions”, in Ethical Theory and Moral Practice, nº 4, (2001),
pp.109-126.
- Dreier, James, “Meta-ethics and Normative Commitment” in Philosophical Issues, nº 12,
(2002).
- Hare, R.M., The Language of Morals, Clarendon Press, Oxford (1952).
- Falk, W.D., “Goading and Guiding”, Mind, nº 67, (1953), pp.145-169.
- Johnson, M., Moral Imagination. Implications of Cognitive Science for Ethics, University of
Chicago Press, Chicago/London (1993).
© DICIONÁRIO DE FILOSOFIA MORAL E POLÍTICA
Instituto de Filosofia da Linguagem
- Kerner, G.C., The Revolution in Ethical Theory, Oxford University Press, New York/Oxford
(1966).
- MacIntyre, A., “18 - Modern Moral Philosophy”, in A Short History of Ethics, Macmillan, New
York, (1966), pp.249-269.
__________, After Virtue, University of Notre Dame Press, Indiana (1984).
- Miller, A., An Introduction to Contemporary Metaethics, Polity Press, Cambridge (2003).
- Moore, G.E., “The Nature of Moral Philosophy”, in Philosophical Studies, Kegan Paul, Trench
& Trubner, London (1922).
- Ogden, C.K.; Richards, I.A., The Meaning of Meaning, 8ª ed., Harcourt Brace, New York
(1923).
- Schnall, I.M., “Philosophy of Language and Meta-ethics”, in The Philosophical Quarterly,
vol. 54, nº 217, (2004), pp.587-594.
- Smith, M., The Moral Problem, Blackwell, Oxford (1994).
- Stevenson, C.L., Ethics and Language, Yale University Press, New Haven, CT (1944).
__________, Facts and Values: Studies in Ethical Analysis, Yale University Press, New Haven,
Conn. (1963).
- Stingl, M., “Ethics I (1900-45)”, in J.V. Canfield (ed.), Routledge History of Philosophy. Vol.
X: Philosophy of Meaning, Knowledge and Value in the Twentieth Century, Routledge,
London/New York, (1977), pp.134-162.
- Stoker, M., Valuing Emotions, Cambridge University Press, New York (1996).
- Swan, K.S., “Emotivism and Deflationary Truth”, in Pacific Philosophical Quarterly, nº 83,
(2002), pp.270-281.
- Urmson, J.O., The Emotive Theory of Ethics, Hutchinson University Library, London (1968).
- Warnock, G., Contemporary Moral Philosophy, Macmillan, London (1967).
__________, Ethics since 1900, Oxford University Press, New York (1960).
- Wiggins, D., “Ayer on Morality and Feeling: From Subjectivism to Emotivism and Back?”, in
L.E. Hahn (ed.), The Philosophy of A.J. Aye, The Library of Living Philosophers, vol. XXI,
Open Court, La Salle, Illinois, (1992), pp.633-660.
- Williams, B., “Morality and the Emotions”, in Problems of the Self: Philosophical Papers
1956-1972, Cambridge University Press, Cambridge, (1973).
- Wright, G.H. von, “Valuations – or How to Say the Unsayable”, in Ratio Juris, vol. 13, nº 4,
(2000), pp.347-57.
© DICIONÁRIO DE FILOSOFIA MORAL E POLÍTICA
Instituto de Filosofia da Linguagem
Download