HERMENÊUTICA FILOSÓFICA E ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA – DISTINÇÕES BÁSICAS EM LÊNIO LUIZ STRECK Margareth de Abreu Rosa1 Marco Antônio Barbosa de Lellis2 RESUMO A crise da interpretação jurídica carece de uma resposta hermeneuticamente adequada à Constituição ou a resposta para o caso concreto, com fundamento na sustentação argumentativa, vez que o positivismo por ser discricionário e decisionista não atende o direito que depende da singularidade do caso concreto (interpretação). Palavras-chave: Argumentação. Direito constitucional. Hermenêutica filosófica. Interpretação. Pré-compreensão. Representação. Abstract The crisis of the legal interpretation lacks of a hermeneutically adequate reply to the constitution or the reply for the case concrete, with bedding in the argumentative sustentation, time that the positivism for being discretional and decisionistic it does not take care of to the right that depends on the singularity of the case concrete (interpretation). Keywords: Argumentation. Constitutional Law. Interpretation. Pre-understanding. Representation. Philosophical hermeneutics. 1. INTRODUÇÃO O autor, em suas obras, nos ensina que a hermenêutica trabalha com uma justificação do mundo prático e a teoria argumentativa tem por objeto a procedimentalidade. Pela teoria do, a pragmática é convertida no procedimento. O discurso jurídico passa a depender de argumentos persuasivos – retórica e argumentação, que é a busca pelo conhecimento e pela verdade. Baseando-se no estudo da ontologia (ser) deparamos com a superação do objetivismo (realismo 1 Graduada em História e Direito; Mestre em Ciências Penais e Doutoranda em Direito Processual Penal, todos pela UFMG. Professora do Curso de Direito da Faculdade Promove. 2 Graduado em Filosofia e Mestre em Teoria da Literatura pela UFMG. Professor do Curso de Direito da Faculdade Promove. filosófico) ocorre na modernidade com o movimento iluminista que permeia pela subjetividade. O esquema sujeito-objeto, em que o mundo passa a ser explicado e fundamentado pela razão, mediante o surgimento do Estado moderno, observa-se a ruptura com a filosofia da consciência – “esse é o ‘nome’ do paradigma da subjetividade” que ocorre no século XX, a partir do “giro linguístico – esse giro liberta a filosofia do fundamentum que na essência, passará na modernidade para a consciência”. (STRECK, 2010, p. 14). Os problemas filosóficos serão linguísticos, e no linguist turn, “a invasão que a linguagem promove no campo da filosofia transfere o próprio conhecimento para o âmbito da linguagem, onde o mundo descortina; é na linguagem que se dá a ação; é na linguagem que se dá o sentido (e não na consciência de si do pensamento pensante)”. (STRECK, 2010, p. 14). Com o giro ontológico-linguístico o sujeito não é o fundamento do conhecimento, uma vez que compreender é uma existencial da própria condição humana, portanto, faz também parte da dimensão ontológica, eis aí o circulo hermenêutico-ontológico, que através da fenomenologia haverá uma compreensão maior do ser-aí (dasein). A fenomenologia relaciona-se à hermenêutica por que há várias interpretações dos fenômenos que nos aparece, isto é, temos exegeses relativas e convencionais frente ao objeto a ser analisado. Por isso, diz-se de descrição linguística. ”Assim, o sentido não estará mais na consciência (de si do pensamento pensante), mas sim na linguagem” (STRECK, 2010, p. 16). A verdade “não pode se reduzir a um exercício da vontade do intérprete (julgar conforme sua consciência) como se a realidade fosse reduzida à sua representação subjetiva” (STRECK, 2010, p. 19). Para que se possa falar em hermenêutica filosófica haverá sempre que reportamos ao sentido da interpretação do texto jurídico sem, contudo, esquecermos o quanto está ligada ao paradigma representacional. As representações são traduzidas em formas simbólicas tendo como eixo principal, o objeto-ser revivificado, no entanto ainda que se utilizasse do círculo hermenêutico é possível que a interpretação ainda ocorra em etapas, o que limita o processo interpretativo. Para Gadamer, interpretar é explicar o compreendido, no entendimento de Paul Ricoeur “a compreensão fornece o fundamento, a saber, o conhecimento dos signos do psiquismo alheio, a interpretação fornece o grau de objetividade, graças à fixação e à conservação que a escrita confere aos signos” (RICOEUR, 1986, p. 147). Cumpre salientar que Paul Ricoeur em face de esse processo interpretativo denomina a hermenêutica filosófica como filosofia reflexiva, que é o “acabamento da inteligência do texto” (RICOEUR, 1986, p. 155). Apesar da grande alteração havida na estrutura do pensamento e a ruptura com os paradigmas essencialista-objetivista e da filosofia da consciência (subjetivista), “o direito continua até hoje refém do solipsismo próprio da filosofia da consciência" (STRECK, 2010, p. 70). A grande saída para o direito seria a utilização da fenomenologia hermenêutica ao invés da utilização da sociologia e da filosofia em face de interpretação jurídica. A hermenêutica como universo de três andares sustenta suas bases na précompreensão que é a antecipação dos sentidos pela percepção sobre o objeto; na compreensão e por consequência ocorre simultaneamente, motivo pelo qual não pode ser realizado em etapas, mas como um sentido único, na circularidade do eu, somente possível dentro do contexto do circulo hermenêutico. Logo, compreender é interpretar, “existe um processo de compreensão prévio (pré-compreensão) que antecipa qualquer interpretação e que é fundamental, levando-nos para uma ideia de duplo sentido” (STRECK, 2010, p. 75). Dessa forma o nível hermenêutico se contrapõe ao nível apofântico (descritivo) que engendra uma desmistificação das teorias argumentativas de cariz procedimental. A crise dos paradigmas do Direito e da própria dogmática jurídica acarretarão na ineficácia da realização dos direitos e deveres na sociedade. Somente haverá sentido se o paradigma for o modelo constitucional, pelo qual o texto jurídico tenha validade sem que se perca na instrumentalidade procedimentalista, tornando o texto inócuo e ineficaz. Assim, como o texto apreende diversas interpretações, a interpretação não pode ser literal, porém, contextualizada e de caráter produtivo. Através do processo hermenêutico é que poderá alterar a atual fase do direito extremamente positivista, procedimentalista, em que o intérprete busca o sentido do texto nas suas convicções de mundo sem se ater ao caráter constitucional do direito. CONCLUSÃO Conclui-se que a pré-compreensão é o novo modo de olhar a hermenêutica jurídica, que propicia ao intérprete-juiz a adequação de suas decisões aos dispositivos constitucionais ao apresentar respostas corretas aos casos concretos afastando-se da arbitrariedade positivista, bem como combatendo as súmulas que na qualidade de super-normas e, com uma alta carga de subjetivismo, ao serem reconhecidas prejudicam a analise do caso concreto, logo se afastam da interpretação hermenêutica. REFERÊNCIAS RICOUER, Paul. O Que é um Texto? In: do Texto à ação: ensaios de hermenêutica II. Porto/Portugal, s/d. (ed. original/1986). STRECK, Lênio Luiz. Hermenêutica e Possibilidades Críticas do Direito: Ensaio sobre a Cegueira Positivista. Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais. Nova Fase – 1962. Belo Horizonte, jan./jun. 2008. ________. O que é isto: decido conforme minha consciência? Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. ________. Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999.