XIII JORNADA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO – JEPEX 2013 – UFRPE: Recife, 09 a 13 de dezembro. O ESTADO DE BEM-ESTAR SOCIAL: ORIGEM, DESENVOLVIMENTO E FINALIDADE EM UM CONTEXTO DE CONSOLIDAÇÃO DO MODELO CAPITALISTA Stella D'Angelis Rodrigues Rocha1, Emmanuel Jurupytan Silva Rocha2, Sheilla Nadíria Rodrigues Rocha 3 Silvia Sibele da Mota e Silva4 Introdução A preocupação em fornecer bases para o bem-estar social pelo Estado encontra-se arraigada em um processo que tem origem ainda no sistema feudal. Essa evidência pode ser explicada através dos termos de troca entre senhores feudais e servos, onde os primeiros demandavam a força de trabalho dos segundos, e esses últimos recebiam seus pagamentos em forma de serviços básicos para própria subsistência, como o uso de um pedaço de terra para cultivo familiar e moradia. Esses termos de troca, mesmo que ainda rudimentares, podem ser entendidos como uma espécie de “proteção social” em uma fase anterior ao surgimento do Estado. E à medida que esse sistema se deteriora principalmente em função dos eventos da urbanização e do comércio que começam a alavancar, tornam-se necessários não só a unificação das áreas antes divididas pelos feudos para se obter melhorias no sistema tributário e para oferecer a um único ente a capacidade de gerir, atribuir direitos e cobrar deveres, mas também estabelecer regulamentações em prol da massa populacional que buscava ser absorvida pelo nascente sistema comercial, objetivando, ainda que de forma ineficiente, que a situação de extrema pobreza verificada não se tornasse cada vez mais aguda. Diante dessa problemática, foi criada na Inglaterra a chamada Lei dos Pobres, que previa trabalho e alguns benefícios a esse grupo populacional excluído em crescimento contínuo, como também, um meio de amenizar perturbações a ordem estatal. Inclusive, é válido salientar que essas iniciativas são reconhecidas como as primeiras bases para o que se convencionou chamar posteriormente como políticas públicas. Com o advento do Estado Moderno, a concordância a respeito da importância da participação desse último na garantia, no provimento e no controle do bem-estar social torna-se cada vez maior. O cumprimento desse papel se solidificava como a justificativa da existência e do poder do próprio Estado. Já em um contexto em que a industrialização revolucionava o modo de vida em sociedade, essa concepção estatal como um provedor de bens públicos, direito e garantias individuais e coletivos, passa a ser exigida por lideranças sindicais, como único meio de combater as discrepâncias sociais e de detenção dos meios de produção trazidas pelo capitalismo. Nesse sentido, as políticas sociais derivadas do plano de proteção social tornam-se imprescindíveis para contrabalançar o cenário de pobreza e passam a ter profundo valor, não só como instrumental para diminuir os efeitos da miséria e promover sua eliminação, mas também como meio de proporcionar a prática da cidadania. Assim, com base nesse contexto, esse trabalho objetiva expor a origem e o desenvolvimento do modelo estatal de bem-estar social em uma realidade capitalista, de modo a propiciar uma reflexão crítica acerca de suas especificidades como também da necessidade de concreção de sua finalidade dentro das perspectivas de justiça e equidade sociais no cenário contemporâneo. Material e métodos O presente trabalho foi estruturado com base em uma pesquisa bibliográfica, que de acordo com Gil (2002), referese a um tipo de “modalidade de pesquisa em que os dados são obtidos de fontes bibliográficas, ou seja, de material elaborado com a finalidade explícita de ser lido.” Nesse sentido, para que as orientações desse método pudessem ser atendidas, foram reunidos diversos estudos envolvendo artigos científicos e livros técnicos vinculados tanto com a literatura especializada em proteção social como com o arcabouço teórico formado pelas ciências sociais e econômica. Uma vez feita a fundamentação teórica, passou-se a analisar a importância da difusão desses conhecimentos no processo de contribuição com a efetiva vivência democrática a partir da apreensão do conceito de Estado Social, sua segurança jurídica e seus desdobramentos sobre os desenvolvimentos socioeconômico e humano na realidade capitalista contemporânea. Mestranda em Consumo, Cotidiano e Desenvolvimento Social pela UFRPE, especialista em Gestão Pública pelo PNAP/CAPES, graduada em Economia pela UFPE, graduanda em Administração Pública pela UFRPE e graduanda em Direito pela Faculdade dos Guararapes. E-mail: [email protected]. 2 Especialista em Gestão Pública pela Universidade de Pernambuco e graduado em Direito pela Faculdade dos Guararapes. E-mail: [email protected]. 3 Doutora, mestre e graduada em Serviço Social pela UFPE. Professora da Universidade Católica de Pernambuco. E-mail: [email protected] 4 Bacharela em Serviço Social pela UFPE, Especialista em Gestão de Políticas Públicas e Mestranda em Consumo. Cotidiano e Desenvolvimento Social UFRPE. E-mail: [email protected] 1 XIII JORNADA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO – JEPEX 2013 – UFRPE: Recife, 09 a 13 de dezembro. Resultados e Discussão O Estado de Bem-Estar Social teve na origem da sua formulação, influências tanto do modelo macroeconômico Keynesiano, como do Fordismo e, fundamentalmente, do Plano Beveridge. Em detalhes, a participação do paradigma Keynesiano está circunscrita ao rompimento com ideologia liberal idealizada por Adam Smith. O Estado, segundo John Maynard Keynes, passa ater atuação direta através de uma política fiscal e monetária (com a manipulação das variáveis como poupança, tributação, oferta de moeda e taxa de juros) para que a renda e o investimento sejam estimulados e com isso ocorra o aumento dos níveis de consumo e emprego (Brue, 2005). Já no que diz respeito ao Fordismo, por ser esse último ser baseado na produção em massa, para que ele funcionasse, necessitaria obrigatoriamente também de um consumo de massa. E para tal objetivo, quanto mais a população tivesse melhores condições de vida e emprego, mas renda estaria disponível para essas metas de consumo em larga escala. Q uanto ao plano Beveridge, este iniciou um novo formato em termos de seguridade social. Foi aplicado na Inglaterra após o fim do conflito mundial, como um avanço relacionado as limitações do plano de seguridade idealizado por Otto von Bismarck, que era concedido apenas aos que trabalhavam na indústria. O plano Beveridge baseava-se no princípio da necessidade e, por isso, foi elaborado para incluir a toda população da Grã-Bretanha. Esses avanços em termos de políticas sociais serviram de modelo para vários economias e representaram um amadurecimento a respeito do papel do Estado, tirando-o da posição exclusiva de ferramenta para o alcance dos interesses de alguns poucos e fazendo com que tivesse a sua principal função atrelada a promoção do bem-estar social. De acordo com Duriguetto e Montaño (2011), “Keynes pode ser considerado um dos fundadores do planejamento estatal, do Estado intervencionista para corrigir os problemas do mercado, enfim, do Estado de Bem-Estar Social (ou Welfare State)”. Assim, o modelo Keynesiano e o modelo de Bem-Estar Social possuem como ponto de convergência, a necessidade de intervenção do Estado na economia. Porém, enquanto o Keynesianismo prioriza a participação estatal na elaboração e execução das políticas monetárias e fiscais para se garantir níveis de produção e renda que provoquem o aumento do nível de emprego, o modelo de Bem-Estar Social concentra suas bases na necessidade de proteção social. Ou seja, enquanto um se preocupa prioritariamente com a geração de emprego, o segundo, tem como finalidade também a sustentabilidade desse último, através de mecanismos jurídicos que garantam direitos sociais, previdenciários e trabalhistas. No entanto, apesar da defesa da intervenção estatal como instrumento determinante para levar a economia para o pleno emprego, nesse modelo macroeconômico, a iniciativa privada não perde totalmente a sua autonomia. De acordo com Keynes (1982), “uma socialização algo mais ampla dos investimentos, será o único meio de assegurar uma situação aproximada de pleno emprego, embora isso não implique a necessidade de excluir ajustes e fórmulas de toda espécie que permitam o Estado cooperar com a iniciativa privada.” Assim, a economia passa a atuar de acordo com as decisões do Estado em determinados aspectos, mas não chega a ser controlada totalmente. Essa especificidade, inclusive, é um dos principais aspectos que diferencia a atuação intervencionista estatal do modelo Keynesiano com relação ao modelo socialista lançado por Karl Marx. Porém, mesmo havendo diferenças entre esses paradigmas sobre a regulação do mercado e do grau de atendimento do interesse público, não se pode deixar de considerar a inovação trazida, principalmente para a corrente capitalista, com a forma de gestão governamental ditada por Keynes. Como bem elucida Leal (1990), é significativa a amplitude e os limites desse Estado Keynesiano que toma forma nos anos 30 e se consolida no pós-guerra. As modificações impostas por essa verdadeira revolução na política burguesa não se limitam às transformações na estrutura econômica, mas abrem espaço para mudanças profundas no conjunto das relações sociais: a emergência de uma nova divisão do trabalho - com o taylorismo e o fordismo - e a passagem histórica para novas formas de relação entre o Estado e a Sociedade. Sendo assim, o próprio modelo de Bem-Estar Social tem suas origens alicerçadas no Keynesianismo e mesmo tendo objetivos divergentes, o ponto de partida é essencialmente o mesmo: o Estado deve regular e intervir no processo de mudança política, econômica e social. O modelo do Estado de Bem-estar Social, definido por Santos (2009) como “aquele que assume a proteção social de todos os cidadãos, patrocinando ou regulando fortemente sistemas nacionais de saúde, educação, habitação, previdência e assistência social; normatizando relações de trabalho e salários; e garantindo a renda, em caso de desemprego”, foi sendo gradualmente adotado por países em processo de desenvolvimento industrial como uma espécie de manobra para conter as pressões das classes trabalhadoras. Como exemplo, tem-se os casos da Inglaterra, a Noruega, a Suécia, a Dinamarca, a França e os Estados Unidos (Casadei & Góis, 2007). Com o passar do tempo, o custo da proteção social passou a ser demasiadamente oneroso para a capacidade de pagamento do governo nos anos 70 e os modelos estatais de Bem-Estar Social, começaram a sofrer duras críticas baseadas no argumento do ônus excessivo provocado a máquina pública. Em um período em que o capital especulativo se tornava mais atraente em contrapartida ao produtivo, as transações comerciais externas se tornavam mais viáveis e recomendadas em função do advento da globalização e formação dos blocos econômicos, gastos com a conjuntura social interna era considerado, principalmente pelos defensores do neoliberalismo, um desvirtuamento do foco dessa nova tendência e a acentuação do peso dos dispêndios previdenciários com uma população cada vez mais envelhecida e desempregada. Essa visão encontrou forte respaldo com a crise do Petróleo e com as inovações tecnológicas que trouxeram a automação de serviços em substituição as atividade laborais realizadas com a força de trabalho. Diante disso, a solução indicada para atenuar os efeitos dos processos inflacionários, do alto desemprego e da estagnação econômica, era o corte das despesas públicas principalmente com a proteção social. Nesse sentido, os benefícios promovidos pelo modelo de Bem- Estar Social, no que diz respeito principalmente a proteção dos direitos trabalhistas e previdenciários, ficaram cada vez mais ameaçados. Isso significou que as poucas garantias conquistadas foram reduzidas em um momento em XIII JORNADA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO – JEPEX 2013 – UFRPE: Recife, 09 a 13 de dezembro. que mais se precisava delas em função da alta instabilidade econômica gerada pelas transformações fomentadas pela nova ordem mundial. A capacidade de geração de emprego com os baixos níveis de crescimento econômico diminuiu e sem a contribuição tributária devida, não houve suporte para as receitas auferidas manterem as despesas, resultando no aprofundamento do déficit público. Mas isso apenas do ponto de vista fiscal. Esse efeito também é agravado diretamente pela falta de investimentos e pelo baixo nível de renda. É importante destacar, que cada país apresenta características próprias em termos de organização política, social e administrativa, e em função disso, o modelo estatal de Bem – Estar Social também irá variar conforme essas especificidades. E todas essas variações encontram causalidade na história da formação de cada país, essencialmente relacionada a formação do mercado de trabalho e das conquistas trabalhistas. Em Esping-Andersen (1990 apud Santos, 2009) além desses aspectos citados, existe o chamado índice de descomodificação que parte da premissa de que o capitalismo industrial teria feito com que a força de trabalho se comparasse a uma commodity, levando a renda recebida pelo emprego a ser o único e exclusivo meio de sobrevivência do trabalhador. Nesse sentido, a iniciativa do poder público com base na “descomodificação”, consistiria no amparo governamental ao assalariado, no que diz respeito aos seus custos básicos, como alimentação e moradia. Os modelos de Bem-Estar Social também variarão conforme a extensão da cobertura da proteção social. Sendo assim, eles poderão ser: universalista; corporativos; e residuais. Além desse aspecto, tem também o grau de participação do Estado em relação a iniciativa privada, no financiamento desse sistema de proteção. De acordo com isso, existirão três regimes: o regime social democrata; o regime conservador; e o regime liberal. Em resumo, a idéia de Esping-Andersen revela que não há um modelo homogêneo e universal para todos os Estados, mas sim, um entrelaçamento de diversos fatores que estão em função das especificidades de cada país. De modo geral, como não houve nos países mais atingidos pela crise mundial, um planejamento público voltado para a sustentação e criação de empregos coordenado com as políticas de seguridade social praticadas, a vulnerabilidade do ambiente interno as mudanças internacionais, se tornou mais agressiva. Diante disso, os modelos de bem-estar social como os do tipo universalista, foram os mais retaliados em termos de críticas, quando comparados aos modelos classificados como liberais ou que seguiam o princípio do mérito. No entanto, não há como negar que naquela circunstância, com aquele formato de gestão administrativa, política e fiscal, não haveria como lidar com as transformações provocadas pela nova tendência da globalização e os seus ditames sobre o processo produtivo e político, sem passar pelo retrocesso econômico. Em outras palavras, as vantagens e desvantagens do modelo de bemestar social, dependem mesmo da forma como o poder público atua e leva em consideração o conceito de sustentabilidade. Se não houver mecanismos que ofereçam suporte para o médio e longo prazos em contrapartida aos gastos atuais com as necessidades básicas da população, não há como sustentar essas medidas diante de mudanças contínuas. E o efeito de promoção social que deve ser de toda e qualquer política pública, não será atingido. Agradecimentos Aos alunos, professores e demais colaboradores que fazem os espaços acadêmicos e profissionais com os quais os autores desse artigo se vinculam. Referências Brue, Stanley. História do pensamento econômico. 6d. São Paulo: Pioneira Thonsom Learning, 2005. 552p. Casadei, Salete; Góis, Cláudia. Políticas sociais comparadas. Revista Espaço Acadêmico, n. 70, ano 6, 2007. http://www.espacoacademico.com.br/070/70casadei_gois.htm 18 out. 2013. Duriguetto, Maria Lúcia; Montaño, Carlos. Estado, classe e movimento social. 3 ed. São Paulo: Cortez, 2011. 384 p. Gil, A. C. Técnica de pesquisa em Economia e elaboração de monografias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002. 219p. Keynes, John M. A Teoria Geral do Emprego do Juro e da Moeda. São Paulo: Atlas, 1982. 328p. Leal, Suely Maria. A outra face da crise do Estado de Bem-Estar Social: neo-liberalismo e os novos movimentos da sociedade do trabalho. Cadernos de Pesquisa, n. 13, Unicamp, 1990. 35p. Santos, Maria Paula Gomes. O Estado e os problemas contemporâneos. Brasília: CAPES, 2009. 144p.