agosto2011 Jornal Unesp Ciências humanas Zero Dólar, Cildo Meirelles Qual a saída para a crise do dólar? Economista dos EUA ressalta que apesar da perda de influência, moeda ainda não tem substituta A crise econômica mundial de 2008 e 2009 colocou em xeque a posição dominante do dólar no mercado global. No entanto, não há outra moeda que possa substituí-lo como referência monetária, segundo Benjamin Cohen, professor de Política Econômica Internacional da Universidade da Califórnia, em Santa Barbara, EUA. Cohen veio ao Brasil a convite do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas, da Unesp, Unicamp e PUC-SP, e do Instituto de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre os Estados Unidos (INCT-Ineu). Cohen ministrou palestras sobre o tema, no dia 13 de junho, na PUC-SP, e, no dia 14 de junho, na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). (Daniel Patire) Cohen: cresce risco de crises financeiras Daniel Patire Jornal Unesp: Como a última crise econômica global pode ter afetado a confiança no dólar como principal moeda de reserva dos mercados? Benjamin Cohen: A crise foi gerada após a quebra do mercado imobiliário dos Estados Unidos, em meados de 2007, provocando a maior agitação nos mercados financeiros desde a Grande Depressão, em 1929. Muitos especialistas em economia selaram o fim da hegemonia do dólar como a moeda mais importante do mundo. No entanto, a crise temporariamente reforça a posição global do dólar, com os investidores fugindo para ele, para a segurança. No ano passado, a demanda global por contas do Tesouro dos EUA foi muito intensa, porque não há uma moeda com capacidade de substituí-lo. De qualquer modo, a confiança no dólar está muito abalada, com o persistente déficit norte-americano em conta corrente, isto é, uma conta negativa entre o que o governo arrecada e o quanto ele gasta, além da crescente dívida externa do país. E tudo isso alimentado por uma crise de governança, causada pela maior polarização entre democratas e republicanos. Isso inviabiliza a aprovação de reformas necessárias, como o corte de despesas. JU: Com a possível queda do dólar, qual moeda poderia substituí-lo? Cohen: Muitos colocam o euro como a moeda concorrente natural da norte-americana. Contudo, há problemas críticos para a unidade monetária da comunidade europeia. Entre eles está um forte viés anticrescimento para a política monetária e fiscal na área do euro, e outros fatores que tendem a enfraquecer o potencial da Europa, como o envelhecimento das populações e as crises vividas por muito de seus países. O iene do Japão parece enfrentar uma erosão gradual no mercado global de títulos, com a estagnação econômica dessa nação. A utilização internacional da moeda de uma das maiores economias do mundo, o yuan chinês, ainda é rudimentar, apesar dos recentes esforços de Pequim para ampliar o apelo da moeda. No entanto, a aceitação é desencorajada por obstáculos muito mais graves, incluindo controle de capital e um sistema financeiro bastante subdesenvolvido. JU: Na ausência de uma moeda dominante, como será o cenário da globalização? Cohen: Algum movimento de distanciamento em relação ao dólar pode ser esperado, como o deslocamento do centro de gravidade da economia mundial em direção a China, Índia e outros mercados emergentes. Assim, começa a se desenhar um sistema monetário mais fragmentado, com muita concorrência e nenhuma moeda claramente dominante. Sem alguma forma de liderança para assegurar um grau mínimo de compatibilidade entre as políticas nacionais, as relações monetárias globais estarão em constante risco de instabilidade. A última vez que o mundo foi obrigado a conviver com um sistema de moeda fragmentada, durante o período entre guerras, o resultado foi, para dizer o mínimo, triste. A falta de cooperação dos britânicos, com sua libra enfraquecida, e uma posição isolacionista dos Estados Unidos foram causas importantes das calamidades financeiras que se seguiram ao crash da bolsa em 1929. JU: Como o Brasil deve enfrentar essa situação? Cohen: Se ele puder alcançar coletivamente acordos com os outros BRICs (grupo formado por Brasil, Rússia, Índia e China), pode, talvez, influenciar a estrutura da economia mundial. Mas esses países têm diferenças entre si, e não possuem uma agenda comum. Nessas circunstâncias o país deve agir defensivamente. Deve agir por meio de medidas de controle de capital. Não é difícil criar alguns limites sobre o modo como o capital entra no país. Isso não representa o abandono do princípio do mercado liberal, mas significa que se pode gerenciar o fluxo de capital que entra no país.