BEM-ESTAR EM EQUÍDEOS DURANTE O TRANSPORTE Um dos assuntos de maior abordagem na atualidade é o bem-estar. Os conhecimentos sobre bem-estar animal também têm sua grande importância, sendo hoje foco de grande número de pesquisas. O transporte de equideos, sob as condições que geralmente ocorre em nosso país é com certeza um fator comprometedor do seu bem-estar. No Brasil, o maior volume de transportes acontece no período de agosto a março, para animais em reprodução, e de março a novembro para participação em eventos agropecuários e provas equestres. Infelizmente as condições de transporte de animais em nosso país são precárias, provavelmente por absoluto desconhecimento dos envolvidos, quer sejam o governo federal, órgãos fiscalizadores, transportadores, tratadores, alguns proprietários e uma minoria de médicos veterinários. Conhecer e identificar os diversos fatores que comprometem o bem-estar animal durante o transporte é de grande importância para que possamos tentar minimizar suas consequências. A ciência do bem-estar avalia parâmetros fisiológicos dos animais, em especial os indicadores comportamentais, que são as primeiras manifestações de um indivíduo frente aos estímulos ambientais. É importante lembrarmos sempre como deve ser o comportamento dos equideos em seu ambiente natural e em ambientes a eles impostos pelo homem para avaliar os efeitos do meio ambiente na sua qualidade de vida. Para uma avaliação criteriosa deve-se utilizar as Cinco Liberdades, propostas pelo Farm Animal Welfare Council, 1993, para classificar o nível de bem-estar animal. As Cinco Liberdades são: 1) Livre de fome e sede; 2) Livre de desconforto; 3) Livre de dor, injúria e doença; 4) Livre para expressar o comportamento normal; 5) Livre de medo e estresse. Importância do bem-estar durante o transporte Ao contrário de países do primeiro mundo, não existem normas para o transporte de animais que se preocupem com a real necessidade de preservação do bem-estar dos animais. Durante o transporte os animais são frequentemente submetidos a sensações como medo, fome, sede, excitação, dor e desconforto térmico que desencadeiam altos níveis de estresse. Condição de estresse extremo durante o embarque Entre os problemas desencadeados pelo estresse destacam-se laminite, desidratação, doenças respiratórias, cólicas, obstruções esofágicas, diarreia e morte embrionária. Nos eqüídeos, os três problemas clínicos mais comuns que ocorrem no transporte são os traumatismos, a desidratação e a pleuropneumonia. Injúrias e traumatismos As principais lesões relacionadas ao transporte ocorrem na região nasal, nas extremidades dos membros, musculatura e coluna vertebral. Geralmente são devidas a problemas no embarque e desembarque dos equinos, freadas repentinas e curvas acentuadas. Trauma ocorrido durante o embarque em rampa de acesso ao trailer com madeira podre O uso de protetores de membros e caudas, o posicionamento do animal no veículo, a prudência dos motoristas e principalmente, intervalos na viagem a cada 3 horas, são muito importantes para sua prevenção. Doenças respiratórias A doença respiratória mais comum devido ao transporte é a pleuropneumonia ou febre dos transportes. Está relacionada à queda de imunidade devido ao estresse e agentes microbianos. Entretanto observamos frequentemente um outro importante fator: a limitação nos movimentos da cabeça. É comum observarmos os animais viajando com cabrestos amarrados de forma que os animais não podem abaixar a sua cabeça. Este é um fator significativo que reduz a defesa natural das vias respiratórias dos animais. A ventilação inadequada também interfere na ocorrência de problemas respiratórios. Privação de água e alimentos Equinos submetidos a viagens com privação de água têm aumentos nas taxas de respiração, batimentos cardíacos e alterações sanguíneas diversas com consequente desidratação. A desidratação é um problema muito mais frequente do que se imagina e raramente é percebida. Pode desencadear várias doenças tais como laminite, impactações de cólon (cólicas), doenças musculares e redução da função renal. Cavalo em tratamento de laminite desencadeada por desidratação no transporte Animais submetidos a longas viagens devem ser hidratados, muitas vezes via parenteral (soro injetável). Água deve ser ofertada a cada 3 horas de viagem. A adição de flavorizantes, principalmente com sabor e aroma de maçã, devem ser misturados à água para animais possam ingerir maior quantidade durante a viagem. CONDIÇÕES IDEAIS DE TRANSPORTE a) Cuidados no embarque Talvez os principais problemas no transporte ocorram no embarque e desembarque dos animais, pois nessas etapas tem-se o maior número de injúrias e aumento na frequência cardíaca. Trailler com acesso seguro Rampa com alto risco de acidentes Cavalos e muares com resistência ao embarque em trailers têm maior predisposição a injúrias e estresse. Uma forma de minimizar este problema é submeter os animais a treinamentos para embarque e desembarque como forma de reduzir os níveis de estresse. O treinamento deve ser feito em 6 seções de 30 minutos cada, em dias alternados, antes do início das jornadas de viagens. Muitos dos equideos, que não tenham sido previamente treinados para o embarque e desembarque, rejeitam rampas de acesso ao trailer ou caminhões. Quando trailers são posicionados próximos a pequenos “barrancos”, permitindo que a rampa fique em posição horizontal, o embarque ocorre com naturalidade. Quanto menor o ângulo da rampa de aceso mais fácil e menos traumático é o embarque e desembarque. b) Posição e conforto durante a viagem Quando os equideos podem escolher sua posição de viagem eles optam por viajarem com a cabeça contrária ao sentido de viagem na rodovia. Pesquisas também mostraram que as posições de transporte em diagonal são muito menos estressantes que as posições de viagem laterais, ou seja, paralelas ao malhal ou à traseira do caminhão. No Brasil, estima-se que somente 10% do transporte de equídeos sejam realizados em traillers apropriados para esta atividade, sendo o restante feito em caminhões (CNA/MAPA, 2006). A densidade no transporte em valores medianos pode reduzir o estresse em longa distância, facilitar o controle de agressividade, propiciar o encontro da melhor posição de viagem, adotar o sentido de orientação preferencial e permitir o descanso quando o veículo estiver parado. Entretanto, muitos transportadores acreditam que viajando mais apertados e com cabrestos curtos os animais terão menor índice de problemas. Animais sendo colocados em posição de viagem com desconforto c) Tempo de viagem O tempo de viagem interfere na fisiologia equina. Ao final de uma jornada de 24 horas de viagem ocorrem significativas mudanças no seu metabolismo muscular, aumento no índice de estresse, desidratação, perda de peso e da eficiência do sistema imunológico. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Ampliar os conhecimentos sobre o bem-estar animal é uma obrigação de todas as pessoas envolvidas com eqüídeos, sendo importante a conscientização da necessidade de aguçarmos nossos conhecimentos em comportamento animal e nosso senso de observação e espírito crítico, visando proporcionar melhores condições de vida aos animais, quer seja durante o transporte, competição, leilão ou feira agropecuária, ou no dia a dia destes seres em seu habitat. As Cinco Liberdades devem ser um parâmetro para nos alertar sobre os principais pontos relacionados ao bem-estar animal. Cabe a nós compreendê-las e saber a melhor maneira de aplicá-las para uma melhor qualidade de vida aos animais. HAROLDO VARGAS L. Jr Médico Veterinário. CRMV-MG: 3811 Medicina Equina e Biotecnologias da Reprodução Tels: (32) 9917 4699 e (31) 8799 4699 [email protected]