1 - UNIESC

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COSTA, Keyla Soares da e SOUZA, Rose Keila Melo de. O aspecto sócio-afetivo no processo
ensino-prendizagem na visão de Piaget, Vygotsky e Wallon. Retirado em 14/04/2006, de
Educação
on-line
no
Word
Wide
Web:
http://www.educacaoonline.pro.br/art_o_aspecto_socio_afetivo.asp?f_id_artigo=549
O ASPECTO SÓCIO-AFETIVO NO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM NA
VISÃO DE PIAGET, VYGOTSKY E WALLON.
Rose Keila Melo de Souza
Keyla Soares da Costa1
RESUMO
Admitindo-se que somos seres geneticamente sociais e, sobretudo afetivos, dotados de
interesses e desejos próprios, o presente estudo focaliza a homogeneização de valores e
diferenças sociais imposta pela lógica mercadológica do capitalismo às políticas públicas
nacionais, tomadas aqui as que versam especificamente sobre o sistema educativo. E através de
uma análise qualitativa de amplitude micro, ou seja, efetuada a partir da prática pedagógica de
professores do ensino fundamental, chegou-se à premissa de que parte de nossas escolas não
foge à regra, na ocasião que em legitima o ensino intelectualista e pragmático, desconsiderando
significativamente o importante papel do conteúdo sócioafetivo
discente enquanto recurso motivacional imprescindível para a construção do conhecimento
significativo, cujas implicâncias ao se menosprezá-lo tem se manifestado na crescente apatia
discente pela aquisição formal de conhecimento veiculado na escola. À idéia de se utilizar o
conteúdo sócio-afetivo como mola propulsora do processo educativo, defendida neste artigo,
convergem os postulados de teóricos clássicos como o psicólogo suíço Jean Piaget, o educador e
também psicólogo russo Lev Vygotsky e o médico francês Henry Wallon.
_____________________________________
1
Graduadas em Pedagogia pela UFPA / 2002.
1
O ASPECT O SÓCIO- AFET IVO NO PROCESSO ENSI NO- APRENDI ZAGEM NA
VI SÃO DE PIAGET , VYGOT SKY E WALLON.
1.1-
CONCEPÇÕES DE INFÂNCIA VERSUS MODELOS PEDAGÓGICOS
A pedagogia moderna, cuja existência se deve ao estabelecimento de um estatuto de indivíduo
atribuído à criança por Montaigne e Rousseau, seus principais formuladores nos séculos XVI e
XVIII, tem sua trajetória permeada por inúmeras transformações da noção de infância,
acarretando conseqüentemente alterações no pensamento pedagógico no desenrolar de sua
história; sendo que, essas noções se constituiriam e se constituem em consonância com os
interesses do modelo político e econômico vigentes.
Para Montaigne (1533 – 1592), filósofo francês, a criança não passa de um adulto em miniatura.
Pensando assim, ele critica qualquer ação de agrado, de ludicidade com relação às crianças. E
desta forma, desenvolve a gênese para a racionalização do processo educativo, através da
supervalorização da razão, princípio este que perdura até hoje, e constitui-se neste momento,
parte da nossa investigação.
Assim, sob o imperativo de suas idéias, é nesta época que a escola vai se reorganizar para
ocupar-se da função disciplinar e instrutiva contra a “paparicação” promovida no lar. No entanto,
a esta função disciplinar e instrutiva apontada por Montaigne, contrapõe-se o pensamento de
Rousseau (1712-1778), para o qual à Pedagogia caberia o cultivo da intimidade infantil, ou seja,
a preservação de sua subjetividade. Isso o leva a classificar as funções pedagógicas, defendidas
nas bases teóricas de Montaigne, como intromissões desastrosas a serem veementemente
repudiadas em favor de uma pedagogia da autonomia, que prime pela relação íntima e pela
disciplina interior.
Embora ele tenha criticado essa racionalização, com o desdobramento da modernidade, do
século XIX ao início do século XX, consubstanciada nas diretrizes da sociedade do trabalho e da
sociedade científica e tecnológica, a pedagogia é “convidada” a rever os seus princípios,
atrelando a noção de infância, e o seu estatuto de indivíduo adquirido, aos ditames do
capitalismo, ou melhor, ao mundo do trabalho.
A estreita relação “mundo da criança” e “mundo do trabalho”, trouxe para o cenário da
pedagogia moderna, contribuições da Sociologia representada pelas idéias de Durkheim, da
mesma forma a Filosofia da Educação, bem como a Psicologia de Dewey; para o bojo
2
das discussões pedagógicas concernentes às determinações preestabelecidas entre o vínculo
escola, trabalho e infância.
A escola que hoje possuímos, com regras, conteúdos programáticos, divisão por séries a partir de
critérios cronológicos, etc., é assim, portanto, algo articulado ao surgimento do novo sentimento
dos adultos em relação às crianças, onde se enfatiza sua capacidade intelectual em detrimento de
sua autonomia afetiva.
A noção de trabalho, ocupada pela Psicologia, no contexto educacional, ganhou contorno bem
mais amplo que seu conceito usual, desvinculando-se de sua conotação econômica e passando a
ser fator intrínseco à vida infantil na definição de “ocupações ativas”, ou seja, o interesse do
aluno e a preocupação em propiciar -lhe a construção do conhecimento, em colocá-lo em
permanente estado de ação com o meio; enfim, o objetivo de aprimorar a capacidade cognitiva
da criança, tornou-se nesse momento o âmago do processo ensino-aprendizagem, e grande parte
dos procedimentos pedagógico-didáticos centraram-se nesse propósito.
O reconhecimento da individualidade da criança, de suas necessidades e vontade própria
implicou necessariamente o repensar da prática educativa, da mesma maneira sua condição de
ser psicológico propôs à Psicologia a superação do caráter dicotômico que por bastante tempo
fundamentou sua base teórica. Visto que, por um longo período, a Psicologia tradicional
preocupou-se em estudar o funcionamento psicológico, em especial o funcionamento cognitivo
fragmentadamente; isolando deste o aspecto afetivo, negligenciando-o enquanto substrato da
constituição humana.
A separação do intelecto e do afetivo, diz,Vygotsky, “enquanto objeto de estudo, é uma das principais
deficiências da Psicologia Tradicional, uma vez que esta apresenta o processo de pensamento como
fluxo autônomo de “pensamentos que pensam a si próprios”, dissociados da plenitude da vida, das
necessidades dos interesses pessoais, das inclinações e dos impulsos daquele que pensa.(Kohl: 1992, p.
76)
Assim, Vygotsky, defende a tese de que diferentes culturas produzem modos diversos de
funcionamento psicológico, e busca romper com as teses que relativizam o papel que a
afetividade detém para a promoção do desenvolvimento psico-social do homem, colocando-a
independentemente de especificidades culturais. Para ele, existe a necessidade do
reconhecimento de que a afetividade possui um caráter de ação volitiva2, que norteia toda
atividade humana.
3
Este postulado teórico, em que o desenvolvimento cognitivo pressupõe-se uma base afetivovolitiva, também estará presente nos princípios teóricos de diversos autores, como Henry Wallon
e Jean Piaget, em maior ou menor intensidade.
Desta forma, ao longo deste capítulo buscaremos considerar as diferentes matizes conceituais
dadas por esses teóricos ao termo afetividade e à dimensão ocupada em suas teorias, enfatizando,
ainda que implicitamente, o desvelamento das mentalidades tradicionalistas que co-relacionam a
afetividade à “desorganização da vida racional”, e a racionalidade, o intelecto, à superação
absoluta do nosso estado afetivo-emocional. Reconhecendo que isto evidentemente supõe o
conhecimento íntimo do modo de funcionamento da inteligência, da afetividade, e da
interligação existente entre si.
1.2 - AS RELAÇÕES SOCIAIS E A AFETIVIDADE NA TEORIA PIAGETIANA.
Costuma-se atribuir críticas aos postulados piagetianos, pela suposta indolência com que tratam
os aspectos sociais no desenvolvimento humano, porém, convém ressaltar que, apesar das
atenções não convergirem exclusivamente sobre esses fatores, Piaget destaca com clareza as
influências e determinações da interação social no desenvolvimento da inteligência, afirmando
que “a intelig ência humana somente se desenvolve no indivíduo em função de interações sociais
que são, em geral, demasiadamente negligenciadas” (PIAGET, 1967 apud LA TAILLE, 1992, p.
11).
Nesse sentido, julgamos ser importante enfatizar previamente sua definição de homem como ser
social, assim como sua visão, no que tange ao comprometimento dos fatores sociais para o
desenvolvimento humano, já que, a nosso ver, as relações sociais são bastante complexas e
compõem fundamentalmente o cenário contínuo da história, determinando desde o nascimento
até a vida adulta do ser, conteúdos sócio-históricos anunciantes de valores, regras e signos, por
certo definidores do desenvolvimento psicosocial. Segundo Piaget (ibidem, p. 14), “o ser social”
de mais alto nível, é justamente aquele que consegue relacionar-se com seus semelhantes de
forma equilibrada; isso significa afirmar que, a cada estágio de
_____________________________________________________________
2
Ação volitiva: ato que há determinação de vontade, segundo consulta ao dicionário Aurélio.
4
desenvolvimento do sujeito, definido por Piaget, compreende-se uma maneira de ser social, daí a
forma como uma criança, no período préoperatório, interage socialmente diferente de uma
pessoa que atingiu o nível das operações formais, haja vista esta conseguir estabelecer com
coerência e equilíbrio trocas intelectuais.
Assim, denota dizer que, o desenvolvimento das operações lógicas no indivíduo corresponde
simultaneamente ao seu desenvolvimento social. Para tanto, é conveniente apresentarmos tal
relação nas variadas etapas fixadas por este autor. Inicialmente, no período sensório-motor, o
nível de socialização da inteligência mostra-se extremamente precário, pouco devendo às trocas
sociais. Entretanto, no estágio pré-operatório, caracterizado pela presença da linguagem e da
representação simbólica, esta socialização da inteligência, outrora pouco perceptível, ganha
efetiva significância, embora alguns fatores ainda empeçam as consistentes trocas intelectuais
equilibradas, tais como: a ausência de condições favoráveis na criança para enquadrar-se em uma
categoria comum de referência, condição indispensável ao autêntico diálogo; a incapacidade
circunstancial da criança para sustentar suas definições ou afirmações; além de não conseguir
promover relações de reciprocidade, de ver-se a partir do ponto de vista do outro. Situações estas
peculiares ao pensamento egocêntrico.
Apesar, de nesta fase a criança designar seu ponto de vista como único ou verdade absoluta,
demonstrando uma suposta autonomia, ela ainda não possui consciência do próprio eu, e, um
exemplo prático, percebemos quando nas diversas situações do cotidiano a criança mostra-se
facilmente influenciável pela opinião dos adultos, admitindo-a fervorosamente; muito comum na
fase heterônoma do desenvolvimento do juízo moral na criança. Portanto, aceitar simplesmente
tal fato como aspecto da formação autônoma é ignorar a falta de domínio do eu, ou melhor, sua
heteronomia tanto nos modos de pensar como de agir.
Todavia, a partir do estágio das operações concretas, as reais trocas intelectuais começam a ser
permanentes e a reciprocidade nas relações constituídas, dando início à consolidação da
personalidade, entendida por Piaget, desta maneira,
não o eu enquanto diferente dos outros eus e refratário à socialização, mas é o indivíduo se
submetendo voluntariamente às normas de reciprocidade e de universalidade. Como tal, longe de estar
à margem da sociedade, a personalidade constitui o produto mais refinado da socialização. Com efeito,
é na medida em que o eu renuncia a si mesmo para inserir seu ponto de vista próprio entre os outros e
se curva assim às regras da reciprocidade, que o indivíduo torna-se personalidade(...).
(...) a personalidade consiste em tomar consciência desta relatividade da perspectiva individual e a
coloca-la em relação com o conjunto das outras perspectivas possíveis: a personalidade é, pois uma
coordenação da individualidade com o universal (PIAGET, 1967, p.245 apud LA TAILLE, 1992,
p.17).
Diante disso, notamos dentre outros motivos, a importância das relações sociais na construção da
noção do eu e do outro, num processo concomitante de diferenciação e socialização. Todas as
5
questões evocadas aqui levam-nos a refletir as diferentes dimensões do ser social e sua íntima
relação com as etapas do desenvolvimento cognitivo; mas, vale daí pensarmos também a ampla
influência das interações sociais sobre esse desenvolvimento; haja vista, os fatores
interindividuais permitirem à inteligência atingir a coerência possível, sobretudo pelas
necessidades oriundas da vida em sociedade. Mas, nesse sentido, cremos ser impreterível
mencionar que Piaget não confia fielmente na argumentação de que toda e qualquer relação
interindividual supõe desenvolvimento satisfatório; pois em seus estudos sobre estas, distingue
dois tipos: a coação e a cooperação, compreendidas igualmente a partir de reflexões sobre o
desenvolvimento do juízo moral na criança. Tecendo as devidas conceituações no âmbito do
processo ensinoaprendizagem, apreciamos entre os demais elementos, o vínculo entre
inteligência e afetividade.
Tanto a coação quanto a cooperação, compõem o cenário do cotidiano escolar, seja no espaço
próprio da sala de aula, quão na instituição como um todo. São relações que se estabelecem,
muitas vezes, em lugares específicos inconscientemente, em apologia a uma educação de
qualidade e formadora. Destarte, convém classificar coercitiva qualquer relação subsidiada pela
unilateralidade, pela imposição ao outro da forma de pensar, de princípios e valores tidos como
verdades absolutas. Assim, tal realidade aponta-se contraditória ao desenvolvimento intelectual,
sócio-afetivo e moral, pois à medida que não promove a reciprocidade entre os sujeitos,
lamentavelmente impede a construção de sua autonomia. No entanto, as relações de cooperação
são opostas às já referidas, denotam o ponto de partida para o progresso moral, intelectual e
afetivo, por garantir a reciprocidade entre os indivíduos, tornando-os capazes de aceitar o ponto
de vista alheio e perceber-se nele. Como podemos deduzir, enquanto na coação os elementos
afetivos seguem do medo ao sentimento de obrigatoriedade, na cooperação prevalece o respeito
mútuo, a autonomia. Fatores decisivos a serem considerados na prática educativa intra e extraescolares, buscando respeitar e aproveitar as relações de cooperação que naturalmente emergem
dos contatos entre as crianças.
A propósito, os argumentos salientados dispõem evidenciar a função construtora das relações
interindividuais cooperativas, destacar a dinamicidade de sua natureza na constituição humana e,
trazer para o cerne das discussões pedagógicas no cotidiano, o reconhecimento de que o conjunto
das atitudes realizadas é resultante de múltiplas determinações, conferindo à afetividade o devido
lugar na promoção de uma educação mais recíproca com suas finalidades, já que o intuito desta é
a formação plena do educando.
Ao discorrer outrora, a respeito do conteúdo social determinante à formação humana, cabe
evidenciar duas realidades diferenciadas, porém, complementares, igualmente responsáveis, à
dimensão cognitiva enquanto fonte de transmissão educativa e lingüística das contribuições
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culturais e à dimensão afetiva como fonte de sentimentos específicos, em especial, os
sentimentos morais.
Partindo deste princípio, torna-se indispensável darmos ênfase à evolução do aspecto cognitivo
do sujeito, compreendido por meio de uma seqüência de estruturas que se formam através das
experiências vivenciadas, superando os obstáculos reais e convergindo a partir destas novas
estruturas à consolidação ulterior. Da mesma maneira, não poderia deixar de ser o
desenvolvimento sócio-afetivo ao evoluir atendendo a mudanças qualitativas e graduais
semelhantes no cognitivo. O desenvolvimento cognitivo, afetivo e social encontram-se tão
imbricados um ao outro, a ponto da simples mudança circunstancial em um dos aspectos
ocasionar a transformação nos demais, positiva ou negativamente, dependendo dos seus
elementos constituidores. Enfim, considerando que “esses dois aspectos são ao mesmo tempo,
irredutíveis, indissociáveis e complementares, não é, portanto, muito para admirar que se
encontre um notável paralelismo entre suas respectivas evoluções”.(PIAGET e INHELDER,
1990, p.24).
O processo contínuo e construtivo de socialização do sujeito se dá também, em primeira
instância, no máximo de interações sócio-afetivas interdependentes, deste com o outro e com o
meio – fator característico da primeira infância – na busca pela satisfação orgânica e psicológica,
seguindo progressivamente em direção ao limite da individualidade e, conseqüentemente, da
autonomia. Desse modo, a manifesta correspondência entre os aspectos afetivo e cognitivo, no
tocante às respectivas evoluções, compete tornar explícito o papel da afetividade nos períodos do
transcurso do desenvolvimento humano.
No estágio sensório-motor do desenvolvimento cognitivo, notamos a princípio a passagem de um
momento inicial, centrado na ação própria da criança, a posterior
estruturação do mundo
objetivo e descentrado; ao passo que, na afetividade instaura-se o estado de não-diferenciação
entre o eu e os construtos físicos e humanos, para na etapa seguinte imprimir trocas entre o eu
diferenciado e o alheio.
Piaget, em parceria com Inhelder, no livro “A psicologia da criança”, recorre a J. M. Baldwin, ao
complementar o momento referido sob a conceituação de “adualismo inicial”, termo já atribuído
por Baldwin para explicar a não -consciência do eu, ou seja, a verticalidade no conjunto das
relações exteriores como se fosse extensão do mundo particular. De fato, são as primeiras
relações, as trocas interindividuais que a criança estabelece afetivamente que a permite distinguir
as particularidades do mundo objetivo e subjetivo, substanciadas por uma série de influências do
meio circundante, que correspondem às atividades espontâneas da criança, num estágio de
satisfação de suas necessidades. Segundo Spitz e Wolf, autores referenciados por Piaget e
Inhelder3, exprimem que na análise dos afetos observáveis, nessa etapa do desenvolvimento
7
psicosocial, há muito mais de trocas afetivas, contágios, do que verdadeiramente reconhecimento
ou diferenciação das pessoas e das coisas. Nesse sentido
o contato com as pessoas torna-se, destarte, cada vez mais importante e, anuncia uma
passagem do contágio à comunicação (ESCALONA). De fato, antes que se
construam de modo complementar o eu e o alheio, assim como as suas interações,
assiste-se à elaboração de todo um sistema de trocas graças à imitação, à leitura dos
indícios, dos gestos e das mímicas. A criança passa, desde então, a reagir às pessoas
de modo diferente das coisas e age segundo esquemas que podem ser relacionados
com os da ação própria. (ESCALONA, 1963 apud PIAGET, 1990, p.27)
O processo seguinte da evolução afetivo-social é constatado no estágio préoperatório, quando a
criança apresenta vantagens outrora não percebidas: mobilidade mental, jogo simbólico e a
linguagem. Fatores estes responsáveis pela configuração de novos afetos, advindos sob formas
de simpatias ou antipatias duradouras, concernentes à outrem; de consciência ou valorização em
relação a si (ao eu); visto que agora essas manifestações não dependem primordialmente da
presença direta do objeto afetivo designado pela criança. Uma vez que, no subseqüente estágio
das operações concretas o sujeito adquire uma personalidade individualizada capaz de permiti-lo
liberar-se em relação às interdependências iniciais.
Nota-se agora, a configuração do processo de socialização nas ações interindividuais, enquanto
que no nível pré-operatório encontrávamos ainda a condição pré-cooperativa, devido a presença
marcante do egocentrismo infantil, ou seja, a dificuldade em falar e agir partindo do ponto de
vista dos interlocutores, em descentrar-se. Vemos, então, por intermédio do exercício constante
da criança, o alcance ao nível das operações concretas, constituidoras de novas relações
interindividuais, de natureza cooperativa e, nesse limite, a promoção de trocas afetivas e
cognitivas equilibradas, como aspectos indissociáveis da conduta humana. Segundo Piaget e
Inhelder (1990, p.109),
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3
Bibliografia: PIAGET, J. e INHELDER, B. A psicologia da criança. 11 ed. ED. Bertrand Brasil S/ª 1990.
Rio de Janeiro.
a afetividade, a princípio centrada nos complexos familiais, amplia sua escala à
proporção da multiplicação das relações sociais, e os sentimentos morais, a princípio
ligados a uma autoridade sagrada mas que, por exterior, não chega a redundar senão
em obediência relativa, evoluem no sentido de um respeito mútuo e de sua
reciprocidade, cujos efeitos de descentração são em nossa sociedade, mais
profundos e duráveis.
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À vista disso, o último estágio, corresponde à adolescência, ocasião onde a estruturação do
pensamento formal conduz, a partir do concreto, à projeção de planos futuros. As novidades
afetivas do tipo, o interesse por teorias, mudança social, a solidificação de novos valores, ou seja,
a inserção propriamente dita do adolescente no bojo dos ideais sociais, foram por muito tempo
encaradas como dispositivos inatos do sujeito, negligenciando o inestimável papel das interações
sociais, responsáveis primeiras pelo desenvolvimento global do ser humano.
Este resgate da teoria piagetiana faz-se pelo esforço em deixar evidente o lugar ocupado pela
afetividade no desenvolvimento humano, em caracterizá-la como instrumento propulsor das
ações, estando a razão a seu serviço. De fato, o embate estabelecido entre a afetividade e
inteligência pode ser resumido na seguinte citação, conforme as interpretações de La Taille, no
que se refere à visão de Jean Piaget sobre a afetividade e razão.
A afetividade seria a energia, o que move a ação, enquanto a razão seria o que possibilitaria ao sujeito
identificar desejos, sentimentos variados, e obter êxito nas ações. Neste caso, não há conflito entre as
duas partes. Porém, pensar a razão contra a afetividade é problemático porque então dever-se-ia, de
alguma forma, dotar a razão de algum poder semelhante ao da afetividade, ou seja, reconhecer nela a
característica de móvel, de energia.(LA TAILLE, 1992, p.65 e 66).
1.3- AFETIVIDADE NO PROCESSO DE FORMAÇÃO DE CONCEITOS, SEGUNDO
VYGOTSKY.
Um importante pesquisador do funcionamento intelectual humano, o psicólogo russo Lev
Semenovich Vygotsky (1896-1934), cujas idéias são imprescindíveis ao embate teórico ao qual
nos propomos neste capítulo, trata o assunto sob o enfoque de uma psicologia sócio-histórica,
caracterizada fundamentalmente pela tentativa de se reunir dialeticamente, num mesmo modelo
explicativo, tanto os mecanismos cerebrais subjacentes ao funcionamento psicológico, quanto o
desenvolvimento do indivíduo e da espécie humana, ao longo de um processo sócio-histórico, de
forma tal, a constituir-se de importância inegável à apreciação da temática em curso.
Porém, para explicitar o pensamento vygotskiano acerca da relação entre as dimensões cognitiva
e afetiva para o desenvolvimento humano, há que se retomar ao severo questionamento que
inflige a sua tradicional divisão na Ciência Psicológica, pois
[somente uma abordagem holística, promotora de uma análise totalizante e nãofragmentada]
Demonstra a existência de um sistema dinâmico de significados em que o afetivo e o intelectual se
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unem. Mostra que cada idéia contém uma atitude afetiva transmutada com relação ao fragmento de
realidade ao qual se refere. Permite-nos ainda seguir a trajetória que vai das necessidades e impulsos
de uma pessoa até à direção específica tomada por seus pensamentos, até o seu comportamento e a sua
atividade.(VYGOTSKY, 1989, p. 6-7 apud LA TAILLE, 1992, p. 77).
Com essa citação, além da crítica à divisão entre as dimensões cognitiva e afetiva do
funcionamento psicológico, podemos afirmar que, Vygotsky sugere uma aparente anterioridade
da ação – ou seja, da experiência direta, onde se encontra o fluxo desenfreado de nossos anseios,
necessidades, etc. – ao pensamento generalizante - função psicológica superior que ordena as
representações mentais, dadas culturalmente, do mundo real -, que se desfaz ao advertir sobre a
existência do processo inverso; ou seja, vê o afetivo como força volitiva para o cognitivo, e este
como regulador do primeiro.
Muito embora o léxico da psicologia soviética da sua época não dispusesse do termo cognitivo,
Vygotsky estudou o processo de desenvolvimento cognitivo relacionando-o à estruturação
dinâmica entre o que definiu como funções mentais e consciência. Assim, de acordo com sua
definição, entendemos por funções mentais, ou funções psicológicas superiores (em
contraposição às funções elementares, de caráter involuntário), processos voluntários, ações
conscientemente controladas, mecanismos intencionais, tais como: o pensamento, memória,
percepção e atenção; que dispõem de maior grau de autonomia em relação aos fatores biológicos,
sendo antes resultado da inserção do indivíduo em um contexto sócio-histórico.
No tocante à consciência, visando combater o reducionismo comportamentalista, por um lado, e
o idealista, por outro, que respectivamente ora associa a consciência a processos elementares
(como percepções sensoriais e reflexos), ora a um estado interior preexistente, Vygotsky concebe
a partir de sua dimensão social, a qual a dimensão individual é derivada e secundária, como
“organização objetivamente observável do comportamento, que é imposta aos seres humanos
através da participação em práticas sócio-culturais”, por sucessivos processos de internalização
que não se restringem à mera cópia da realidade externa num plano interior já existente.
Grosso modo, a consciência passa a ser percebida como uma forma de organização dinâmica de
nossas funções mentais superiores, de nosso comportamento, tal como expresso na citação
anterior, onde é implicitamente definida como um sistema organizativo de significados em que o
afetivo e o dinâmico se unem. Seu desenvolvimento, determinado culturalmente segundo
Vygotsky, pode ser explicado na verdade, por possuir como elemento mediador entre indivíduo e
influências do mundo exterior, a linguagem, as operações com signos, o sistema de
representações que substitui o real, fornecidos por dada cultura aos indivíduos que a constituem.
10
Assim, a linguagem, esse sistema simbólico de mediação entre o sujeito e o objeto – que além do
intercâmbio social, presta-se principalmente à função de contribuir para a construção do
pensamento generalizante, que se dá a partir da generalização das experiências em categorias
conceituais, ou seja, classes de objetos com atributos em comum, selecionados sob a óptica de
um grupo cultural - , se consubstancia num instrumento de organização do conhecimento, de
ordenação do mundo real e, assim sendo, torna-se um importante fator desencadeante da
construção da própria consciência humana. Esta a qual Vygotsky confere papel central na
concepção que possui das relações entre afeto e intelecto.
Nessa perspectiva, a partir das investigações que efetivou dos processos internos relacionados à
aquisição, organização e uso do conhecimento através da sua dimensão simbólica, Vygotsky
chega a estabelecer um percurso genético do desenvolvimento do pensamento generalizante,
chamado por ele de pensamento conceitual, dentro do qual busca explicitar de que maneira se
corporifica a construção de significados, como se dá o processo de formação de conceitos.
Vygotsky o subdivide em três grandes estágios: 01. O da formação de conjuntos sincréticos; 02.
O do pensamento por complexos e; 03. O da formação de conceitos propriamente ditos.
No primeiro estágio, a criança agrupa os objetos do mundo circundantes a partir de nexos
subjetivos, baseada em fatores perceptuais; por isso, tais ligações são instáveis e não se
relacionam necessariamente aos atributos relevantes dos objetos. Já no estágio do pensamento
por complexos, essas ligações, descobertas por meio da experiência direta, estabelecem conexões
concretas e factuais entre os objetos, porém, ainda carecendo de unidade lógica, uma vez que
sofrem variações decorrentes do tipo de contato e relações existentes entre os elementos, e
baseiam-se na combinação por similaridade, na unificação de impressões diversas. Por fim, no
terceiro estágio, ocorre o agrupamento dos objetos com base num único atributo, abstraído de
características isoladas da totalidade da experiência direta; é o estágio onde opera o pensamento
lógico-abstrato.
No entanto, todo esse percurso, vale ressaltar, não se trata de um processo linear, visto que
discorre sobre a formação de conceitos cotidianos da vida infantil, impregnados de experiência,
onde primordialmente parte-se do concreto para o abstrato, desenvolvendose também na direção
contrária, quando se considera a formação de conceitos científicos no âmbito da instrução
escolar – da representação abstrata, através de uma atitude mediada, metacognitiva (de
consciência e controle de suas relações e conteúdo), sem confronto com uma situação direta,
para a realidade concreta.
Mas, adverte Vygotsky “é preciso que o desenvolvimento de um conceito espontâneo tenha
alcançado um certo nível para que a criança possa absorver um conceito científico correlato”.
Daí o importante papel que Vygotsky atribui à intervenção escolar promotora do agir coletivo
11
como alternativa pedagógica capaz de provocar aprendizagem e, conseqüentemente, gerar o
desenvolvimento dos educandos.
Contudo, a despeito do que explicitamos antes, há que se especificar agora o pensamento
vygotskiano às questões relacionadas mais estreitamente à temática da afetividade.
Tal como a percepção e a memória, as emoções compõem o quadro de nossas funções
psicológicas e, assim como as primeiras, apresenta uma dimensão social que a determina. Sendo,
pois, um fenômeno psico-social, as emoções dependem de uma consciência social fornecida pela
cultura que dite as diretrizes para o sentimento, no tocante a quando, onde e o que sentir; e que
estas estabeleçam, enfim, códigos legais, morais e sociais que as sustentem.
Por outro lado, a violação dessas regras do sentimento, equivale a desenvolver uma nova
ideologia social, um novo sistema social: vemos, por exemplo, segundo Ratner (1995, p. 67) as
constantes revoluções emocionais trazidas pelo proliferar das reivindicações feministas. Em
geral, “à medida que mudam as ideologias sociais e os sistemas sociais, eles trazem consigo
novas normas de emoções” (RATNER, 1995, p.67).
Podemos inferir, portanto que, muito embora haja correspondentes emocionais nos animais e
bebês humanos, as emoções de um ser humano adulto, sendo, pois, mediadas pela consciência
social, não mais possui uma base natural e espontânea comum aos primeiros. Como o próprio
Carl Ratner enfatiza,
embora algumas emoções possuam correspondentes naturais, a maior parte das
emoções, entre as quais a vergonha, a gratidão, o dever, a raiva, a piedade, o remorso,
a admiração, o ódio, o desprezo, a vingança, o amor e a culpa, não possuem. A falta
de correspondentes naturais para essas emoções torna ainda mais evidente seu caráter
social.(RATNER, 1995, p.68).
Se a dimensão social das emoções é culturalmente determinada, por certo a existência, a
qualidade e a intensidade delas são tão diversas quanto o universo de conceitos e práticas sociais
específicas existentes.
E ainda, sendo as emoções
compreendidas como constructos inventados para servir aos propósitos humanos e
que dependem da cognição, da interpretação e da percepção, as variações da
emocionalidade parecerão bastante plausíveis.(...).A qualidade socialmente mediada
das emoções reflete o fato de que as emoções servem a propósitos comunicativos,
morais e culturais complexos. O significado complexo de cada emoção é resultado do
12
papel que as emoções desempenham em toda a gama de valores culturais, relações
sociais e circunstâncias econômicas dos povos.(RATNER, 1995, p.68 – 73).
Este autor desvela, assim, por completo, a idéia reificada de que as reações emocionais estariam
intrinsecamente ligadas aos processos viscerais dos indivíduos. Estes, porém, desempenham
papel muito mais indireto e débil, frente ao poder das influências da significação perceptiva da
situação. Mesmo a secreção hormonal, que ativa certos estados emocionais, é causada por
processos psicológicos, despertados anteriormente. Não se trata apenas da atividade autônoma do
sistema nervoso, que influi somente na intensidade dessas reações emocionais; mas, da avaliação
cognitiva, um processo de interpretação do estímulo externo que se estende até a compreensão
sobre a origem da excitação interna, e influi na qualidade emocional.
No entanto, tal avaliação cognitiva impregnada pelo conteúdo histórico-cultural de uma
sociedade específica pode, por vezes, resultar em reações diversas, visto que são função antes de
memórias culturalmente condicionadas do que subprodutos da experiência.
Em suma, critica Ratner, a favor da autonomia relativa das emoções em relação aos processos
viscerais: “atribuir emoções a hormônios por si sós cria a falsa impressão de que determinadas
reações emocionais são produtos naturais, universais e inevitáveis.”
1.3-WALLON: A TEORIA DA EMOÇÃO.
Embora a teoria vygotskiana estabeleça um claro embasamento sobre a temática da relação entre
afetividade e desenvolvimento cognitivo, um encontro de paradigmas, ou seja, a apresentação de
outro ponto de vista, como o do médico, filósofo e militante francês Henri Wallon (1879-1962)
justifica-se pelo prolífico confronto teórico e aprofundamento analítico que, de fato, produziria.
Portanto, contribuindo inestimavelmente para uma maior cobertura e compreensão dos múltiplos
aspectos envolvidos; mediante a postulação da sua teoria da emoção, que o tornou destarte
indispensável também a qualquer estudo sobre afetividade que se venha empreender.
Apesar da dimensão afetiva ocupar lugar central na teoria walloniana, como em nenhuma outra,
o seu grande eixo é a questão da motricidade, posto que, para ele, o ato mental se desenvolve
necessariamente a partir do ato motor, intermediado por um processo cuja explicação
desenvolver-se-á mais adiante.
Deste modo, pondo-se a estudar a atividade muscular recorrendo aos órgãos que a constituem,
como: a musculatura e estruturas cerebrais responsáveis por sua organização, Wallon estabelece
uma tipologia do movimento, na qual identifica-lhe duas funções: a cinética e a postural. “A
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primeira correspondendo ao movimento visível, à mudança de posição do corpo, ou de
segmentos do corpo no espaço; a segunda, à manutenção da posição assumida (atitude) e à
mímica”.(LA TAILLE, 1992, p. 37)
Quando a sensório-motricidade incontinente lentamente se reduz, a partir do segundo ano de
vida, com a progressiva inibição dos centros corticais da função cinética, ocorre o fortalecimento
da função tônico postural. Notamos, portanto que, em contraposição aos movimentos
instrumentais, os movimentos simbólicos contém idéias projetivas que geram novos atos
refletidos: “imobilize -se uma criança de dois anos que fala e gesticula e atrofia-se seu fluxo
mental”, diz Heloysa Dantas, a partir do pensamento de Wallon, (ibdem, p. 41). Todavia,
acrescenta, “a transição do ato motor para o mental pode ser acompanhada na evolução das
condutas imitativas” (ibidem, p. 41), porém, entendendo-se por estas a imitação simbólica, que
aos poucos dará lugar à representação em si.
Na verdade, a afetividade na teoria walloniana, de inspiração darwinista, segundo Heloysa
Dantas, é vista como instrumento de sobrevivência na qual sua origem encontrarse- ia na função
tônico-postural.
Além disso, à afetividade compete a transição entre o estado orgânico do ser e sua etapa
cognitiva, racional; “suprindo a insuficiência da articulação cognitiva nos primórdios da história
do ser e da espécie.”
Nesse sentido, a afetividade, que corresponde à primeira manifestação do psiquismo, propulsiona
o desenvolvimento cognitivo ao instaurar vínculos imediatos com o meio social, abstraindo
deste, o seu universo simbólico, culturalmente elaborado e historicamente acumulado pela
humanidade. Por conseguinte, os instrumentos mediante os quais se desenvolverá o
aprimoramento intelectual são, irremediavelmente, garantidos por estes vínculos, estabelecidos
pela consciência afetiva.
Por essa razão, que costumamos associar transtornos emocionais ao comprometimento do pensar
reflexivo, bem como o inverso: a produção da emoção ao tocante poder dos grandes retóricos,
onde o domínio no manuseio de meios puramente representacionais é fator decisivo para garantir
a geração (muitas vezes manipulação ideológica) de variantes emocionais.
Contudo, partimos da afirmação walloniana de que toda alteração emocional corresponde a uma
flutuação tônica, acrescentando a esta uma terceira relação que, muito embora ainda constitua-se
intuitivamente no plano científico, segundo Ajuriaguerra, autor referido por Dantas, discorre
sobre a atuação mecânica, periférica, de excitação corporal, seja através de massagens, ou por
meio de influências de atividades rítmicas intensas, para o desencadear de reações emocionais.
Em suma, tais associações, segundo Wallon, correspondem a três diferentes naturezas assumidas
pelas manifestações afetivo-emocionais: a primeira, de natureza química, central; outra de tipo
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mecânico-muscular e, por fim, uma abstrata, representacional. E para além destas, Wallon
identificou outras duas, a hipotônica e a hipertônica, classificando-as segundo variações no tônus
muscular.
Assim, as emoções de natureza hipotônica (tais como o susto e a depressão) são consideradas
redutoras do tônus, visto que lhe conferem uma consistência flácida, de caráter relaxado; por
outro lado, as de natureza hipertônica, geradoras do tônus, como a cólera e a ansiedade, resultam
num tônus rijo, retesado, numa musculatura pétrea, cuja duração se torna extremamente penosa.
É comum em várias teorias descrevê-las como desorganizadoras da “vida racional”,
desconsiderando-se, no entanto, que o seu potencial explosivo e imprevisível surge apenas
quando não conseguem transmutar-se em ação mental ou motora, quando permanecem emoção
pura e, somente assim pode ser comparada como o próprio Wallon o fez à “uma forma somática,
confusa, global da sensibilidade, que subindo como uma onda, apaga a percepção intelectual e
analítica do exterior.”
Porém, ao reconhecer sua origem na ontogênese e filogênese do homem, Wallon admite que,
nesta perspectiva,
a afetividade não é apenas uma das dimensões da pessoa : ela é também uma fase do
desenvolvimento, a mais arcaica. O ser humano foi, logo que saiu da vida puramente
orgânica, um ser afetivo. Da afetividade diferenciou-se, lentamente, a vida racional.
Portanto, no início da vida, afetividade e inteligência estão sincreticamente
misturadas, com predomínio da primeira.(ibdem, p.90)
No entanto para Wallon, essa predominância é subjugada à intensa atividade cognitiva, porém,
perdurando um longo estado de reciprocidade, de forma que as aquisições de cada uma
repercutem sobre a outra decisiva e permanentemente.
Para Wallon, a evolução afetiva está intrinsecamente ligada ao desenvolvimento cognitivo, visto
que difere sobremaneira entre uma criança e um adulto, supondo-se a partir disto que há
incorporação de construções da inteligência por ela, seguindo a tendência que possui para
racionalizar-se.
Assim, tal como os familiares estágios do desenvolvimento cognitivo, Wallon define etapas na
evolução da afetividade, cuja fase inicial, a chamada afetividade emocional - centrípeta e
anabólica de construção exclusiva do eu, e mencionada anteriormente como pura emoção estaria circunscrita a manifestações somáticas, inteiramente dependentes da presença concreta do
outro para o estabelecimento de trocas afetivas. É o caso, por exemplo, do caráter comunicativo
dos negligenciados movimentos impulsivos do recém-nascido, pois a manifestação de uma
intencionalidade que os originam, qual seja, a da satisfação de necessidades básicas, pressupõe a
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existência de uma mediação social subjacente, o que, num estudo sobre a comunicação gestual,
Ajuriaguerra, consonante às idéias wallonianas, segundo Dantas, chamou de “diálogo tônico”,
aquele efetivado entre mãe e filho.
Porém - paralelamente ao desenvolvimento e maturação de competências necessárias ao
posterior interesse pela exploração da realidade externa - com a gradual aquisição, pela
inteligência, da função simbólica, através da utilização da linguagem, seja por via oral e depois
escrita, dá-se a constituição de uma forma cognitiva de vinculação afetiva – a da afetividade
simbólica, onde Wallon assinala que
no início, o gesto gráfico precede a intenção: o projeto é uma resultante, antes de ser um controlador
do gesto que realiza o desenho [isto é, uma criança só poderá dizer-nos sobre o que está desenhando
após concluí-lo, pois também não saberá do que se trata seu desenho se já não o fez]. No discurso, a
palavra disponível, seja em seu aspecto semântico, seja em seu nível puramente sensorial de
ressonâncias e rimas, conduz à idéia. Só muito mais tarde, quando o processo pensante for mais sólido,
a idéia presidirá à busca e à escolha da palavra. (ibdem, p.93)
Mas, com a chegada, por fim, da puberdade, exigências racionais se impõem às relações afetivas,
através da valorização de noções tais como: respeito recíproco, justiça, igualdade de direitos etc.
E, por conseguinte, ao discorrer sobre o processo de construção do sujeito, Wallon (ibidem,
p.90), ainda demonstra que, de acordo com as etapas evolutivas da afetividade que estabeleceu, a
construção do eu (sujeito) se dá nos momentos dominantemente afetivos do desenvolvimento, na
interação com outros sujeitos; enquanto nos de caráter predominantemente cognitivo se dá a
construção do objeto, a modelação da realidade externa frente à constante aquisição das técnicas
cuja elaboração se devem à cultura geral de sociedade, chegando até a transcender essa realidade,
quando a sua gestualidade atinge o apogeu e inicia sua etapa regressiva, e como diz
Dantas(ibidem, p.94): “o destino da evolução psicomotora é a economia, a especialização, a
virtualização”.
Ora, se à intensa atividade cognitiva concomitantemente se desenvolve a construção do si,
ressalta Dantas,
cabe à educação, em cada um desses momentos, a satisfação das necessidades orgânicas e afetivas, a
oportunidade para a manipulação da realidade e a estimulação da função simbólica, depois a
construção de si mesmo. Esta exige espaço para todo tipo de manifestação expressiva: plástica, verbal,
dramática, escrita, direta, ou indireta, através de personagens susceptíveis de provocar identificação.
(DANTAS,1992,p.95)
Assim, é fácil inferirmos a partir dessa afirmação que um processo de ensinoaprendizagem
limitado ao desenvolvimento de algumas poucas habilidades, exigidas socialmente, através de
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atividades curriculares, onde predominam as de caráter lógicomatemático, intelectualistapragmático, estaria apenas obstruindo inestimavelmente o desenvolvimento dos educados ao
qual estão submetidos.
Observamos, portanto a inigualável importância dos aspectos afetivos para o desenvolvimento
psicológico, e constatamos que limitá-los ao alcance de uma única teoria, ou seja, ao pensamento
de um único pesquisador, seria considerá-los apenas parcialmente, o que significa comprometer
substancialmente toda a rigorosidade das análises e reflexões a que buscamos empreender.
Assim, os autores referenciados – Piaget, Vygotsky e Wallon – ao implementarem investigações
acerca do desenvolvimento psicológico humano acabam por identificar na afetividade o seu
caráter social, amplamente dinâmico e construtor da personalidade humana, além de estabelecer
o elo de ligação entre o indivíduo e a busca do saber (por meio das interações sociais),
convergindo os três para o postulado de que, embora considerada sob diversas matizes, à
afetividade cabe a função de desencadeadora do agir e do pensar humanos, isto é, para a
efetivação do desenvolvimento sócio-cognitivo.
Visando por fim, classificar essas matizes conceituais da afetividade pelos autores escolhidos,
resgatando destes os pontos teóricos aos quais tomamos como “faróis norteadores” de nossas
investigações , partimos do pensamento piagetiano para o qual a afetividade está circunscrita ao
âmbito das interações sociais, subdivididas por ele em dois tipos, a coação, inibidora da
autonomia afetivo-intelectual e moral, visto sustentar-se por sentimentos de medo, de respeito
unilateral e irrestrita subserviência; e a cooperação como condição propícia à recíproca
verdadeira, ou seja a configuração do respeito mútuo, garantindo ao sujeito a autonomia suprema
para acatar algumas determinações sociais e outras não.
Já na psicologia de Vygotsky, as emoções, tidas como integrantes de nossas funções mentais
superiores, são antes produto da inserção humana num dado contexto sócio-histórico do
resultado da atividade independente do sistema nervoso central sobre os processos viscerais do
corpo somático. Encontram-se, pois, sujeitas às interferências e determinismos do que chamou
de consciência social, culturalmente produzidas e impostas, incutindo-lhe códigos legais
reguladores de suas manifestações no tocante a como, quando e onde surgirem, tornando-se mais
expressivos no comportamento afetivo do ser humano adulto. Porém, tal determinismo é
relativizado pela constante e gradual ampliação do processo de avaliação cognitiva, no qual o
indivíduo percebe e interpreta o papel das influências exteriores para o desencadear interno de
suas reações emocionais, o que torna-o apto a compreende-las e posteriormente domina-las.
Finalmente, na concepção walloniana de afetividade, destacamos a inspiração darwinista a qual
vincula-se. Pois para Wallon, a afetividade é considerada um instrumento de sobrevivência do
qual o bebê humano se utiliza para suprir a insuficiência da articulação cognitiva por meio da
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significação de sua atividade motora; o que a torna a primeira manifestação do psiquismo em
busca de abstrair, compreender e utilizar-se do universo simbólico que o cerca.
2- MOTIVAÇÃO E APRENDIZAGEM
Sendo o aspecto afetivo constructo da natureza humana e elemento responsável pela definição
das relações interindividuais, base para todo desenvolvimento sócio-cognitivo do ser humano,
convém, destacarmos também a motivação como parte integrante desse aspecto e seus
determinantes no processo ensino-aprendizagem, bem como, todas as ações da vida prática do
indivíduo.
No campo da Psicologia muitos estudos são desenvolvidos a fim de se compreender as variáveis
motivacionais do comportamento humano. Hoje, contamos com um número significativo de
pesquisas envolvendo esse assunto, porém não há ainda entre os autores que se preocupam com
esse tema, usualmente, uma concepção universal aceita.
Todavia, o que nos interessa nesse contexto é perceber a partir desses estudos, as contribuições
trazidas, no tocante, ao lugar ocupado no âmbito educacional e as conseqüências do fator
motivação4, no desenvolvimento das estruturas cognitivas do sujeito.
No campo educativo, costumamos responsabilizar a motivação tanto à facilidade com que o
educando aprende, quanto pela ausência de sua aprendizagem, no entanto, não podemos ser
reducionistas a ponto de negarmos os inúmeros fatores que envolvem essas realidades, destarte, a
motivação consiste apenas em mais um elemento considerável e imprescindível, seja para
aprender ou realizar algo. Nesse sentido, vale ressaltar que todo comportamento pressupõe um
motivo, seja no espaço específico de sala de aula, quão em todas as ações da vida humana, estas
são movidas por uma força motivacional, embora não esteja explícita.
Segundo Geraldina Witter, o conceito motivação, dependendo do autor, destaca um ou três tipos
de variáveis: * determinantes ambientais; * forças internas (necessidade, desejo, emoção,
impulso, instinto, vontade, propósito, interesse e etc.); * incentivo, alvo ou objeto que atrai ou
repele o organismo.
A concepção de motivação que mais ganhou destaque condiz à vinculada à teoria da evolução,
por seu caráter utilitário-funcional para a sobrevivência e desenvolvimento filogênico e
ontogênico. Partindo dessa ótica, todo comportamento é motivado e, sobretudo corresponde às
necessidades do organismo, daí dizer que o comportamento configura-se em instrumento pelo
qual a necessidade é satisfeita.
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Sem dúvida, como podemos perceber, a motivação implica componente basilar de toda atividade
humana a ser aprendida. Comporta inúmeras situações
em que pressupõe
_________________________________________________________________
4
Segundo o dicionário Aurélio define: o conjunto de fatores os quais agem entre si, e determina a conduta de um
indivíduo
aprendizagem. Nesse sentido, é comum observarmos no meio educacional, em particular, no
cotidiano de nossas escolas públicas, o incômodo de muitos educadores em compreender o
desinteresse dos educandos, o pouco caso destes pelo que o professor ensina-lhes, ou seja, a
busca por alternativas para solucionar ou senão amenizar os problemas advindos por não se
possuir as condições motivacionais favoráveis à aprendizagem. Atribuídas na grande maioria das
vezes somente ao mundo extra-escolar dos educandos.
No entanto, vale destacar que tanto para a ação de aprender quanto de ensinar, fazse necessário
uma força propulsora motivacional que determine ambas as situações, bem como, garanta a
otimização do processo ensino-aprendizagem através da melhoria da motivação.
Partindo dessa premissa, é de convir que o problema da falta de motivação, tão discutido no dia a
dia da prática educativa, não se limita apenas ao alunado, apresenta proporção bem maior, capaz
de ir desde a direção ao corpo docente, devido às condições que asseguram o desenvolvimento
da educação brasileira serem precárias e desoladoras.
As variáveis responsáveis pela falta de motivação dos professores sobremaneira justificáveis,
como: a pouca disponibilidade de tempo para planejar, a baixa remuneração, condição material
desfavorável, sobrecarga de trabalho, formação deficiente, desvalorização social, enfim, dentre
outros elementos impeditivos e propícios à resistência a mudanças, ao avanço, à inovação, são
aspectos fidedignos da realidade educacional brasileira, todavia, seria no mínimo ingenuidade
falar sobre motivação sem refletir e mencionar a real situação de boa parte de nossas instituições
escolares.
Embora vítima dessa superestrutura que requer mudanças significativas, o educador será sempre
o responsável primeiro pelo desenvolvimento sócio-cognitivo de seus educandos, o grande
encarregado de promover as contingências reforçadoras que garantam a motivação e
conseqüentemente levem à aprendizagem. E nesse caso, acaba tornando-se o elemento motivador
por meio de seus estímulos antecedentes (decoração da sala, material didático, engenharia do
ambiente e disposição dos alunos), também pelo modo como relaciona-se, sua postura, sua
linguagem, etc.
É inegável a relevância do fator motivação no desenrolar da prática pedagógica e, nesse sentido,
não importa as estratégias motivacionais que o educador disponha e, sim, o seu compromisso em
envolver o educando levando-o a perceber a aprendizagem adquirida também como conquista
pessoal.
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BIBLIOGRAFIA
LA TAILLE, Yves de. – Piaget, Vygotsky e Wallon: teorias psicogenéticas em discussão /
Yves de La Taille, Martha Kohl de Oliveira, Heloysa Dantas. – São Paulo: Summos, 1992.
PIAGET, J. & INHALDER, B. A psicologia da criança. Ed. 11. – Rio de Janeiro: Ed.
Bertrand Brasil S/A, 1990.
RATNER, Carl. A psicologia sócio-histórica de Vygotsky: aplicações contemporâneas /
trad. Lólio Lourenço de Oliveira. – Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
VYGOTSKY, L. A formação social da mente. – São Paulo: Martins Fontes, 1989.
Educ@ação: Artigos
A DIMENSÃO AFETIVA DA AÇÃO PEDAGÓGICA1
Valdete Maria Ruiz2 e Marli Jorge Vischi de Oliveira
RESUMO
O artigo trata da importância do desenvolvimento da afetividade paralelamente ao
desenvolvimento cognitivo nas escolas mostrando, por meio das teorias de Piaget,
Vygotsky e Wallon, como estão intimamente relacionados. Oferece contribuições para
que o professor desenvolva a dimensão afetiva de seus alunos e discute a necessidade
de atenção a essa dimensão na relação que estabelece com os educandos.
Palavras-Chave: afetividade, desenvolvimento afetivo, relação professoraluno.
1 Artigo parcialmente baseado no Trabalho de Conclusão de Curso A Importância da
afetividade para uma aprendizagem efetiva apresentado ao curso de Pedagogia do
CREUPI em 2004 pela segunda autora, sob orientação da primeira.
2 Valdete Maria Ruiz é psicóloga pela USP-Ribeirão Preto, Mestra em Psicologia
Escolar e Doutora em Psicologia como Ciência e Profissão pela PUC-Campinas.
Docente nos cursos de Pedagogia e Letras do Centro Regional Universitário de
Espírito Santo do Pinhal – UNIPINHAL e no de Psicologia do Centro Universitário das
Faculdades Associadas de Ensino de São João da Boa Vista – UNIFAE.
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Endereço para correspondência: Rua José Bonifácio, 220 – Mogi Mirim (SP), CEP
13800-060.
Fones:
(19)
3862-1874/
3862-4517.
Endereço
eletrônico:
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INTRODUÇÃO
A educação moderna está em crise, porque não é humanizada,
separa o pensador do conhecimento, o professor da matéria, o aluno da
escola, enfim, separa o sujeito do objeto (CURY, 2003, p. 139).
Afetividade é um termo utilizado para designar e resumir não só os afetos
em sua acepção mais estrita, mas também os sentimentos ligeiros ou matizes de
sentimentais de agrado ou desagrado, enquanto o afeto é definido como qualquer
espécie de sentimento e (ou) emoção associada a idéias ou a complexos de idéias
(CABRAL e NICK, 1999).
Nas escolas em geral, alunos experimentam diversos afetos: o prazer de conseguir
realizar algo pela primeira vez, tristeza ao saber da doença de um amigo, raiva ao
discutir com colegas. Além disso, podem gostar ou não de seus professores, sentir-se
felizes quando seus companheiros de sala os aceitam e culpados quando não estudam
o suficiente.
Em Psicologia os afetos costumam ser classificados em positivos e negativos. A
afetividade positiva (AP) se refere ao tipo de emoções positivas tanto de alta energia
(entusiasmo e excitação) como de baixa energia (calma e tranqüilidade) O prazer e a
alegria também são exemplos da afetividade positiva. Já a afetividade negativa (AN) se
refere a emoções negativas como a ansiedade, a raiva, a culpa e a tristeza. Note-se
que é possível que um aluno apresente alta energia em ambas dimensões (AP e AN)
ao mesmo tempo. Seria o caso de apresentar um alto nível de energia entusiasta e, ao
mesmo tempo, estar irritado (SANTROCK, 2002).
Os exemplos e descrições anteriores, por si só, demonstram como a afetividade faz
parte do processo de ensino-aprendizagem, não se podendo desconsiderá-la.
No entanto, a história da Educação mostra que, desde que a escola adquiriu seus
contornos atuais, houve um prejuízo na dimensão afetiva da ação pedagógica – o que
se tornou ainda mais acentuado na chamada era pós-moderna, como destaca o trecho
em epígrafe.
Na própria história da Psicologia, as dimensões cognitiva e afetiva da
dinâmica da personalidade do indivíduo tenderam a ser tratadas de forma separada.
Atualmente, entretanto, percebe-se uma tendência de reunião dessas duas
dimensões, “numa tentativa de recomposição do ser humano completo” (SISTO,
OLIVEIRA e FINI, 2000, p. 75).
Diante de tudo isso, tem havido um apelo entre psicólogos e educadores no sentido de
humanizar o conhecimento (e os próprios mestres) com o intuito de se desenvolver,
paralelamente ao aspecto cognitivo, também o afetivo. Isto principalmente depois da
publicação das obras Inteligências Múltiplas (GARDNER,
1995) e Inteligência Emocional (GOLEMAN, 1995).
Vale dizer que os sentimentos e emoções do aluno precisam ser levados em conta, já
que podem favorecer ou desfavorecer o desenvolvimento cognitivo – com o qual está
intimamente relacionado desde que o bebê vem ao mundo, como é melhor discutido na
seqüência.
21
O DESENVOLVIMENTO DA AFETIVIDADE DA CRIANÇA
Desde que a criança nasce, o ambiente precisa satisfazer suas necessidades básicas
de afeto, apego, desapego, segurança, disciplina e comunicação, pois é nele que se
estrutura a mais importante forma de aprendizagem: a de estabelecer vínculos, isto é, a
capacidade de se relacionar, tendo-se em conta que o ser humano é um ser social
(BOSSA, 1998).
Além disso, diversos psicólogos salientam que a evolução normal da atenção,
memória, pensamento, juízo, percepção, linguagem, motricidade e afetividade
depende, em boa parte, das condições externas do meio, mais especificamente da
relação mãe-bebê, na qual se estabelece uma comunicação especial desde os
primeiros momentos da vida do recém-nascido.
O trabalho de Spitz foi o primeiro que chamou a atenção para a importância do afeto na
relação mãe-filho no aparecimento e desenvolvimento da consciência do bebê e para a
participação vital que a mãe tem ao criar um clima emocional favorável ao
desenvolvimento da criança, sobre todos os aspectos. Segundo Spitz, são os
sentimentos maternos que criam esse clima emocional que confere ao bebê uma
variedade de experiências vitais muito importantes por estarem interligadas,
enriquecidas e caracterizadas pelo afeto materno (BÖING e CREPALDI, 2004).
Por outro lado, o trabalho de Spitz mostrou que bebês institucionalizados tendem a
sofrer uma série de regressões ou falhas de desenvolvimento por sentirem a ausência
da mãe ou de um substituto afetivo para ela, mesmo que tenha boas condições de
materiais de higiene e cuidados. Nesse caso, a explicação para o atraso no
desenvolvimento não pode ser dada simplesmente pela separação da figura materna,
mas pelo ambiente físico e humano que é carente de estimulação e resulta num atraso
no desenvolvimento de diversas funções como a fala, a coordenação motora e o
controle dos esfíncteres (SILVA, 1997). Isto comprova que os diversos âmbitos do
desenvolvimento, incluindo ao afetivo, se inter-relacionam.
A abordagem etológica do estudo do recém-nascido propõe que a criança vem ao
mundo com os equipamentos sensorial, motor e de comunicação perfeitamente
adaptados para sua sobrevivência nas condições da espécie. Sua sobrevivência
depende da proteção, atenção e cuidados prestados pelo adulto e, nesse sentido, a
relação de apego desempenha a função de garantir o recebimento desses cuidados.
Baseado nesta concepção, na teoria da evolução e na psicologia cognitiva, Bowlby
(1988 e 1989) também demonstrou como o contato materno é necessário para a
criança pequena. Em sua teoria do apego este autor postula a existência de uma
organização psicológica interna situada no sistema nervoso central, responsável pela
formação e manutenção de laços emocionais íntimos entre indivíduos. A propensão
para estabelecer tais laços é considerada um componente básico da natureza humana,
encontrando-se presente no recém-nascido em forma germinal e continuando na idade
adulta e na velhice, quando os primeiros laços persistem e são
complementados por outros.
Assim, a vivência de uma relação calorosa, íntima e contínua com a mãe ou mãe
substituta permanente, ou seja, uma pessoa que desempenha regular e
constantemente esse papel mostra-se necessária à saúde mental do bebê. É essa
relação complexa, rica e recompensadora com tal figura nos primeiros anos de vida,
enriquecida de inúmeras maneiras pelas relações com o pai, familiares e professores –
22
entre outros agentes importantes de socialização – que a comunidade científica julga
estar na base do desenvolvimento da personalidade e da saúde mental.
Portanto, mais uma vez se tem como clara a necessidade de considerar de forma
integrada o desenvolvimento da afetividade com os demais âmbitos da natureza
humana – em especial com o cognitivo. Na Psicologia contemporânea, esta tendência
de integração é particularmente observada em três teorias do desenvolvimento: na de
Piaget, na de Vygotsky e na de Wallon.
Na teoria de Piaget, a afetividade é caracterizada como instrumento propulsor das
ações, estando a razão a seu serviço. Sobre este ponto, Taille, Dantas e Oliveira
(1992, p.66) explicam que, para Piaget, a afetividade seria a energia, o que move a
ação, enquanto a Razão seria o que possibilitaria ao sujeito identificar desejos,
sentimentos variados, e obter êxito nas ações. Neste caso, não há conflito entre as
duas partes. Porém, pensar a Razão contra a afetividade é problemático porque então
dever-se-ia, de alguma forma, dotar a Razão de algum poder semelhante ao da
afetividade, ou seja, reconhecer nela a característica de móvel, de energia.
Vygotsky (1993) propõe uma visão de homem como um sujeito social e interativo,
sendo que a criança, inserida num grupo, constrói seu conhecimento com a ajuda do
adulto e de seus pares. Dessa forma, considera que a aprendizagem ocorre a partir de
um intenso processo de interação social, através do qual o indivíduo vai internalizando
os instrumentos culturais, ou seja, as experiências vivenciadas com outras pessoas é
que vão possibilitar a re-significação individual do que foi internalizado.
Remetendo-se a Vygotsky, Sisto, Oliveira e Fini (2000), afirmam que o pensamento
tem sua origem na esfera da motivação, a qual inclui inclinações, necessidades,
interesses, impulsos, afeto e emoção. Nesta esfera estaria a razão última do
pensamento e, assim, uma compreensão completa do pensamento humano só é
possível quando se compreende sua base afetivo-volitiva.
Na teoria de Wallon a dimensão afetiva ocupa lugar central, como não acontece em
nenhuma outra. Nela a afetividade constitui um domínio funcional tão importante
quanto o da inteligência, desempenhando um papel fundamental na constituição e
funcionamento dessa última e determinando os interesses e necessidades individuais.
Afetividade e inteligência constituem, portanto, na sua concepção, um par inseparável
na evolução psíquica, pois embora tenham funções bem definidas e diferenciadas entre
si, são interdependentes em seu desenvolvimento, permitindo à criança atingir níveis
de evolução cada vez maiores (TAILLE, DANTAS e OLIVEIRA, 1992; GALVÃO, 2003).
Wallon (1989) acredita que a afetividade não é apenas uma das dimensões da pessoa,
mas também uma fase do desenvolvimento, a mais arcaica. Segundo ele, o ser
humano foi, logo que saiu da vida puramente orgânica, um ser afetivo. Da afetividade
diferenciou-se, lentamente, a vida racional e, portanto, no início da vida, afetividade e
inteligência estão sincreticamente misturadas, com predomínio da primeira. Desta
forma, em sua teoria, o desenvolvimento da pessoa é visto como
uma construção progressiva em que fases se sucedem com predominância
alternadamente afetiva e cognitiva.
No estágio impulsivo-emocional, que abrange o primeiro ano de vida, o
atributo particular é dado pela emoção, instrumento privilegiado de interação da
criança com o meio. A predominância da afetividade orienta as primeiras reações do
bebê às pessoas, as quais intermediam sua relação com o mundo físico.
No estágio sensório-motor e projetivo, que vai até o terceiro ano, o
23
interesse da criança se volta para a exploração sensório-motora do mundo físico. O
pensamento precisa do auxílio dos gestos para se exteriorizar, o ato mental “projetase”
em atos motores. Ao contrário do estágio anterior, neste predominam as relações
cognitivas com o meio.
No estágio do personalismo, dos três aos seis anos de idade, a tarefa central é o
processo de formação da personalidade. A construção da consciência de si, que se dá
por meio das interações sociais, reorienta o interesse da criança para as pessoas,
definindo o retorno da predominância das relações afetivas. Por volta dos seis anos,
inicia-se o estágio categorial. Os progressos intelectuais dirigem o interesse da criança
para as coisas, para o conhecimento e conquista do mundo exterior, imprimindo
preponderância do aspecto cognitivo às suas relações com o meio.
Na adolescência, surge a necessidade de uma nova definição dos contornos da
personalidade, desestruturados devido às modificações resultantes da ação hormonal,
trazendo à tona questões pessoais, morais e existenciais, numa retomada da
predominância da afetividade. Na verdade, a afetividade na teoria walloniana é vista
como instrumento de sobrevivência e neste sentido, de acordo com Taille, Dantas e
Oliveira (1992), a afetividade – que corresponde à primeira manifestação do psiquismo
– impulsiona o desenvolvimento cognitivo ao instaurar vínculos imediatos com o meio
social, abstraindo deste seu universo simbólico, culturalmente elaborado e
historicamente acumulado pela humanidade. Por conseguinte, os instrumentos
mediante os quais se desenvolverá o aprimoramento intelectual são irremediavelmente
garantidos por estes vínculos estabelecidos pela consciência afetiva. Conhecer
aspectos teóricos do desenvolvimento afetivo e cognitivo como os que foram aqui
enfocados é fundamental para o educador preocupado com sua ação pedagógica.
Entretanto, muitas vezes faltam-lhes outros elementos para subsidiar sua praxis,
sobretudo para poder desenvolver a afetividade de seus alunos. Por isso, a seguir são
discutidos alguns aspectos que poderão ajudá-lo nesse sentido.
O DESENVOLVIMENTO DA AFETIVIDADE NA ESCOLA
Consoante concepções contemporâneas do desenvolvimento humano (entre as quais
as enfocadas no tópico anterior) e também nas idéias de Goleman (1995) e Gardner
(1995), Ferreira (2001) explica que quando a criança atinge a idade escolar as funções
neurossensório-motoras e as demais funções cerebrais (sensação, percepção e
emoção) estão ainda confusas e, por isso, a discriminação entre seu eu e sua
experiência não se realiza apenas na dimensão cognitiva. Para isso, segundo a autora,
é necessária a ação mediadora da educação, que deve tomar como sua função
promover a construção da afetividade e a organização dessas funções. Com este
objetivo, Ferreira sugere que a educação deve, inicialmente, se concentrar na
avaliação de quatro pontos: (1) como a criança procura resolver suas dificuldades, (2)
seu nível de auto-estima, (3) características de seu humor e (4) posturas da criança
diante do adulto resultantes de sua relação com a família, tais como nível de
autonomia, relação com figuras de autoridade e relação com estruturas de poder.
Além de indicar estratégias para avaliar estes pontos, a mesma autora, na obra citada,
sugere atividades para desenvolver a afetividade no processo educacional,
considerando três âmbitos que devem ser alvos de trabalho pedagógico: - no âmbito
emocional – identificar os sentimentos, expressar os sentimentos, avaliar sua
identidade, adiar a satisfação, controlar os impulsos, reduzir a tensão. - no âmbito
cognitivo – saber a diferença entre sentimento e ação, ler e interpretar indícios sociais,
24
compreender a perspectiva dos outros, usar etapas para resolver problemas, criar
expectativas realistas sobre si, compreender normas de comportamento. - no âmbito
comportamental – comportamentos não verbais: comunicar-se com os olhos, com
gestos, com expressão facial; comportamentos verbais: fazer pedidos claros, resistir a
influências negativas, ouvir os outros, responder eficientemente a críticas
(FERREIRA, 2001, p. 70).
Taille, Dantas e Oliveira (1992) também destacam a importância do desenvolvimento
da afetividade no processo educativo ao afirmarem que ele deve incluir a oportunidade
para a manipulação da realidade e a estimulação da função simbólica, depois da
construção de si mesmo – o que, segundo eles, exige espaço para todo tipo de
manifestação expressiva, plástica, verbal, dramática, escrita, direta ou indireta
mediante personagens susceptíveis de provocar identificação. Entre os personagens
mencionados por estes autores estão os professores e, portanto, não se pode
esquecer que a afetividade na própria relação professor/aluno é outro aspecto
fundamental a ser considerado. Mesmo porque, é bom lembrar que ao conceptualizar a
aprendizagem por observação (modelação), Bandura (apud COLL, PALACIOS e
MARCHESI, 1996) lembra que, em todas as culturas, crianças
adquirem e modificam padrões complexos de comportamentos, conhecimentos e
atitudes por meio da observação dos adultos, inclusive de seus professores. Sobre a
relação professor-aluno, Rey (apud SISTO, OLIVEIRA e FINI, 2000) destaca que esta
não pode ser reduzida ao processo cognitivo de construção de
conhecimento, mas envolve dimensões afetivas e de motivação de ambos (professor e
aluno).
Por sua vez, Antunes (1996) reforça que os professores precisam estar comprometidos
com mudanças em suas idéias e posturas tradicionais, as quais trazem ranços de
práticas escolares que apenas depositam informações nos alunos,
desconsiderando a afetividade no processo ensino-aprendizagem. Entretanto, para
Witter (apud SISTO, OLIVEIRA, FINI, 2000, p.160), a falta de motivação do professor
geralmente se reflete em sua resistência em aceitar inovações tecnológicas e em
assumir novos papéis. Para essa autora, a formação, ou a falta de formação adequada,
os baixos salários, a desvalorização social do professor, as condições materiais em
que se vê compelido a trabalhar, a falta de um sistema adequado de reforços pelo
empenho em concretizar um bom trabalho, a diversidade dos alunos, a falta de uma
boa administração do tempo, planejamentos deficientes, a sobrecarga de trabalho (em
número de alunos, de turmas e até de escolas em que atua), a falta de envolvimento
dos alunos entre outras variáveis a que estão sujeitos, conduzem à apresentação de
respostas de manutenção da situação atual, de falta de iniciativa, de desinteresse pela
mudança e não-engajamento efetivo em qualquer inovação. Com tudo isto posto e
apesar das dificuldades mencionadas, espera-se que os educadores se sensibilizem
para a necessidade de desenvolver a afetividade de seus alunos, ajudando-os, assim,
a se tornarem seres humanos melhor formados em todos os sentidos.
CONCLUSÃO
O currículo das escolas atuais (pelo menos das ocidentais) prioriza o desenvolvimento
cognitivo. A emoção humana nunca foi vista como um conhecimento a ser explorado e
desenvolvido nas crianças e nos jovens. Por isso, reclama-se uma educação mais
humanista. Para tanto, como diz Moreno (1999), é preciso que o professor se
desprenda de velhas concepções sobre as quais os conteúdos são trabalhados na
escola e vá em direção a uma concepção que possa construir uma sociedade mais
justa, democrática e solidária. Sobre a mesma questão, Saltini (1999) acrescenta que
as escolas deveriam entender mais de seres humanos e de amor do que de conteúdos
25
e técnicas educativas. Por isso, acredita ele, a educação deve ser pensada não através
de suas diversas disciplinas mas, principalmente, como meio de promover a própria
vida.
Estas idéias, além das demais aqui apresentadas, reforçam a necessidade dos
professores incrementarem a dimensão afetiva de sua ação pedagógica e, nesse
sentido, o presente artigo pretendeu oferecer algumas contribuições para sua
formação, sob o ponto de vista da Psicologia. Espera-se que possam ser úteis para
subsidiar sua reflexão e sua prática docente.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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26
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PARTE IV
O DESENVOLVIMENTO AFETIVO SEGUNDO PIAGET E A
EDUCAÇÃO PARA A AUTONOMIA
Piaget, Experiências Básicas para utilização pelo professor – Ed. Vozes. Petrópolis, RJ –
1983.
A partir da década de 40, os estudos piagetianos voltaram-se prioritariamente para a análise do
desenvolvimento das estruturas cognitivas. Embora tenha crescido em profundidade de análise, a
elaboração do grande teórico parece ter perdido em amplitude; por volta de 1932, ao analisar
como se desenvolve o julgamento moral, Piaget utilizou um modelo psicogenético que levava
em conta a estrutura cognitiva sem perder de vista a competência lingüística (capacidade de
dialogar, utilizando idéias abstratas para compor argumentos) e a competência moral
(consciência da arbitrariedade e do caráter consensual do mundo social). O acompanhamento do
processo desde o nível de anomia (pré-moral) até o de autonomia permitia uma abordagem da
competência lógica, sem perder de vista o social e o afetivo.
Neste momento, parece-nos oportuno retornar às considerações piagetianas sobre o
desenvolvimento afetivo, estreitamente relacionado com a elaboração do julgamento moral. É o
próprio Piaget (1968) quem ressalta a importância deste aspecto do desenvolvimento:
“O aspecto cognitivo das condutas consiste na sua estruturação e o aspecto afetivo na sua
energética. Esses dois aspectos são, ao mesmo tempo, irredutíveis, indissociáveis e
complementares; não é, portanto, muito para admirar que se encontre um notáve1 paralelisnio
entre as suas respectivas evoluções”.
O
esquematismo cognitivo evolui de um estado inicial centrado na própria ação para a
construção de um universo objetivo e descentrado; a afetividade, por sua vez, evolui de um
estado de não-diferenciação entre o eu e o mundo para um processo diferenciado, no qual são
comuns as trocas entre o eu e as pessoas (sentimentos interindividuais) e o eu e as coisas
(interesses variados).
1. A EVOLUÇÃO DA AFETIVIDADE
27
O nível sensório-motor
Nos subestádios I e II deste nível, a criança apresenta os afetos que J. M. Baldwin
denominou adualismo inicial. Não existe, então, nenhuma consciência do eu, nenhuma fronteira
entre o mundo interior ou vivido e o conjunto das realidades exteriores. Freud falou de
narcisismo, mas sem perceber que se tratava de narcisismo sem Narciso. Anna Freud falou, mais
tarde, de narcisismo primário”, no sentido de uma não diferenciação entre o eu e o alheio. Tratase, para Piaget, não de uma centração consciente num eu, mas de uma centração inconsciente por
não diferenciação. O sorriso infantil, reforçado pelo sorriso do parceiro, torna-se instrumento de
troca ou contagio e, logo, de diferenciação das pessoas e coisas.
Nos subestádios III e IV do estádio sensório-motor, apresentam-se as reações
intermediárias. Nesta oportunidade há, segundo Escalona, uma passagem do contágio à
comunicação. A criança passa a reagir às pessoas de modo cada vez mais específico, porque elas
agem segundo esquemas que podem ser relacionados com os da sua própria ação. Chega a
estabelecer-se uma causalidade relativa às pessoas, na medida em que proporcionam prazer,
conforto, sossego, segurança, etc. Surgem aqui sentimentos de inquietude em presença de
estranhos, predileção por certas pessoas, reações de estranheza às situações, etc.
Os subestádios V e VI são marcados pelas chamadas relações \ objetais; ocorre, então, o que
Freud chamou “escolha do objeto” afetivo, o que de considerava ser transferência de libido do eu
narcísico para a pessoa dos pais. Este período é marcado pela constituição de um eu diferenciado
do alheio e de um alheio que se torna objeto de afetividade.
A descentração afetiva é, pois, correlativa da ‘descentração cognitiva, não porque uma
domine a outra, mas porque ambas se produzem em função do mesmo processo. Ao mesmo
tempo que a criança apresenta condições (intelectuais) de centrar a atenção em um objeto fora
dela mesma, distinguindo o eu-mundo, da adquire condições (afetivas) de amar este objeto
exterior.
Há uma correlação entre a constituição das relações objetais e o esquema do objeto
permanente. Gradualmente, a criança deixa de relacionar tudo aos seus estados e à sua ação e
substitui um mundo de quadros flutuantes, sem consistência espácio-temporal nem causalidade
exterior, por um universo estruturado de objetos permanentes. Assim, sua afetividade se ligará
aos seus objetos permanentes localizáveis e fontes de causalidade exterior em que se
transformam as pessoas.
O nível objetivo-simbólico
O objeto afetivo, no nível sensório-motor, não passa de um objeto de contato direto, que
não se pode evocar durante as separações. Com o advento da linguagem, da imagem mental, do
jogo simbólico, o objeto afetivo está sempre presente e sempre atuante, até em sua ausência
física. Assim é que surgem simpatias e antipatias duradouras e ainda a valorização ou
consciência duradoura de si.
A partir dessa valorização de si, a criança começa a opor-se à pessoa alheia, e surge o que
Charlotte Bühler chamou crise de oposição. As relações objetais do nível sensório-motor são
marcadas pela necessidade de segurança; a crise de oposição, contudo, é assinalada pela
necessidade de afirmação e independência, assim como por todos os tipos de rivalidade, quer do
tipo edipiano, quer em geral. Não se trata, ainda, de uma autonomia no sentido em que da deverá
ocorrer ao nível da cooperação, por volta de 7-8 anos, em relação com o desenvolvimento das
operações concretas. A autonomia que virá a ocorrer supõe uma submissão do eu a regras
(nomia) que o indivIduo se dá a si mesmo (auto) ou que elabora em cooperação com seus
semelhantes. Neste momento, trata-se apenas de independência (anomia e não autonomia) e
precisamente de oposição, isto é, dessa situação complexa em que o eu quer, simultaneamente,
28
ser livre e estimado por outrem.
É hoje plenamente aceito o caráter indissociável e paralelo dos desenvolvimentos cognitivo
e afetivo ou social. Sendo assim, é provável que as trocas sociais peculiares ao nível préoperatório possam caracterizar-se como pré-cooperativas, isto é, ao mesmo tempo sociais, do
ponto de Vista do sujeito e centradas na própria criança e em sua atividade própria, do ponto de
vista do observador A isto se chama “egocentrjsmo infantil”. Já no nível das operações concretas
se constituem novas relações interindividuais de natureza cooperativa e as trocas não se limitam
ao cognitivo, mas também ao afetivo.
Os fatos são clarificados em três domínios: jogos de regras, ações em comum e trocas
verbais. Os logos de regras constituem instituições sociais na medida em que se transmitem de
uma geração a outra e, além disso, as normas que os orientam independem da vontade dos
Jogadores Alguns desses jogos transmitem-se com a participação do adulto, ‘nas outros
permanecem especificamente infantis, corno o jogo das bolinhas de gude entre meninos. Isto os
Coloca na dupla qualidade de lúdicos e exclusivamente infantis, para dar lugar ao
desenvolvimento da vida social entre crianças.
Depois dos 7 anos as partidas de bolinha são bem estruturadas com observação comum das
regras conhecidas dos parceiros, com vigilância mútua sobre essa observação e, sobretud o, com
espírito coletivo de competição honesta, de modo que uns ganham e outros perdem de acordo
com as regras admitidas Entretanto, o logo de Crianças em fase pré-operacional apresenta
Características inteiramente diversas. Em primeiro lugar, cada um aprendeu com os mais velhos
regras mais ou menos diferentes, porque o seu conjunto é complexo e a criança começa por
guardar apenas parte delas. Além disso, o que é mais significativo, não há controle, isto é, cada
qual joga como bem entende, sem se preocupar demasiado com os outros. Enfim, e sobretudo
ninguém perde e todo o mundo ganha ao mesmo tempo, pois o objetivo é distrair-se Ao mesmo
tempo, a criança ioga para si, e é estimulada pelo grupo a participar de uma experiência coletiva
Não há, pois, cooperações autênticas, mesmo no plano lúdico a conduta social, neste período não
se impôs, ainda, à centração na própria ação.
No tocante ao trabalho em comum, R. Froyland Nielsen(R.F. NIELSEN. Le divelopment de la sociabilite
ebez I enfant. Delachaux & Nicastlé, 1951.) procedeu ora observando diretamente atividades espontâneas ora
submetendo a criança a atividades que necessitam de um mínimo de organização: trabalhar aos
pares, em mesas muito pequenas, dispor de um único para desenhar ou de lápis amarrados um ao
outro, utilizar um material comum, etc. Obteve, assim, duas espécies de resultados De um lado,
observou uma evolução, mais ou menos regular, do trabalho solitário à colaboração O trabalho
solitário eventual das crianças de 7 anos ou mais não tem, contudo, a mesma significação não
intencional e, por assim dizer, não consciente do que é feito por crianças menores. Estas,
trabalham cada qual para si, se sentem em comunhão com os vizinhos, mas não se ocupam do
que eles fazem em detalhe. Por outro lado, constatou uma dificuldade inicial, mais ou menos sistemática, de achar e até de procurar modos de colaboração, como se esta não constituísse um fim
específico que se busca por si mesmo, com métodos apropriados.
Quanto às funções da linguagem na troca entre crianças, Piaget observou que nos meios
escolares em que as crianças trabalham, brincam e falam livremente, as expressões dos sujeitos
de 4 a 6 anos não se destinam todas a fornecer informações ou a formular perguntas (linguagem
socializada), mas consistem, geralmente, em monólogos ou “monólogos coletivos” em cujo
transcurso cada um fala para si, sem escutar os outros (= linguagem egocêntrica).
A observação mostra a dificuldade sistemática de crianças na fase pré-operatória de se
colocarem no ponto de vista do parceiro, de fazê-lo compreender a informação desejada e de
modificar-lhe a compreensão inicial. Não é senão depois de longo exercício que a criança chega
(no nível operatório) a falar não mais para si, porém na perspectiva de outrem. Em sua critica da
linguagem egocêntrica, R. Zazzo concluiu que, em tais situações, a criança não fala “para ela”
mas segundo ela”, isto é, em função de suas limitações bem como de suas possibilidades.
2. OS SENTIMENTOS E JULGAMENTOS MORAIS
29
A formação da consciência e dos sentimentos morais é um dos resultados da relação
afetiva entre a criança e os pais. Freud popularizou a noção de superego e Baldwin mostrou que,
a partir de certa fronteira, o eu dos pais não pode ser imitado imediatamente e torna-se um eu
ideal, fonte de’modelos coativos e portanto da consciência moral.
Ao analisar a gênese do dever, P. Bovet considerou que o sentimento de obrigação está
subordinado a duas condições: a primeira é a intervenção de instruções dadas do exterior (não
mentir, não ferir o colega) e a segunda é a aceitação dessas instruções, o que supõe a existência
de um sentimento sui generis da parte de quem recebe as instruções para a pessoa que as dá Ele
define este sentimento como respeito, composto de afeição e temor. A afeição, sozinha, não
bastaria para impor a obrigação e o temor, sozinho, provocaria uma submissão material ou
interessada. O respeito que gera o sentimento de obrigação é, nesta perspectiva, unilateral,
porque liga um inferior (a criança) a um superior (o pai) e por isto é distinto do respeito mútuo”,
fundado na reciprocidade da estima.
A criança não respeita o pai como representante da lei ou do grupo social, mas como
indivíduo superior, fonte das coações e das leis. Neste sentido, a análise da psicologia da criança
se opõe às de Kant e Durkheim, que vêm o respeito como um sentimento que nau se liga a uma
pessoa como tal, mas a uma pessoa como encarnação ou representação da lei moral.
Este respeito unilateral, embora seja a fonte do sentimento de dever, gera na criança
pequena uma moral de obediência essencialmente caracterizada pela heteronomia, que depois se
atenua, dando lugar à autonomia própria do respeito mútuo.
As reações afetivas próprias do julgamento moral antes de 7-8 anos são caracterizadas pela
heteronomia (hétero = de fora do sujeito e nomia = regra). Inicialmente, o poder das instruções
está ligado à presença material de quem as deu; em sua ausência, a lei perde a ação e sua
violação provoca apenas um mal-estar momentâneo.
Aos poucos, contudo, este poder se torna duradouro e produz-se uma espécie de
assimilação sistemática que os psicanalistas denominaram identificação com a imagem dos pais
ou com a imagem de autoridade.
A submissão não poderia ser total e os componentes do respeito se dissociam em afeição e
hostilidade, simpatia e agressividade, ciúmes, etc., o que pode envolver um certo sentimento de
culpa.
A heteronomia conduz a uma estrutura pré-operatória que tem características próprias dos
mecanismos cognitivos relacionais e dos processos de socialização: é o realismo moral, segundo
o qual “as obrigações e valores são determinados pela lei ou pelas instruções em si mesmas,
independentemente do contexto das intenções e relações” (PIAGET, 1968).
Usando como exemplo a mentira, verifica-se que, na fase pré-operatória, à criança parece
grave a mentira na medida cm que se afasta da verdade objetiva e não na medida em que a uma
intenção de enganar. Perguntando-se a da, por exemplo, qual das duas mentiras abaixo é mais
grave:
a) o menino contar em casa que teve uma boa nota na escola e não teve;
b) após ter tido medo -de um cachorro, o menino diz que o cachorro era do tamanho de
uma vaca;
a segunda mentira foi considerada mais grave e a criança argumentou que com freqüência se
obtém boas notas e a mãe pode acreditar nisto, ao passo que não há cachorro do tamanho de
vaca.
Graças à cooperação, ao desenvolvimento operatório, a criança vai chegando a relações
morais novas, fundadas no respeito mútuo e que conduzem a uma certa autonomia.
Tivemos a oportunidade de relatar, neste trabalho, que, nos jogos de regras, as crianças de
menos de 7 anos recebem as regras prontas dos mais velhos (mecanismo derivado dá respeito
unilateral) e as consideram “sagradas”, intangíveis, de origem transcendente. As crianças mais
velhas já vêm as regras como produto do ajuste entre contemporâneos e admitem que podem
mudá-las desde que haja acordo unânime, ajuste democrático. O exemplo deixa claro o caráter
consensual, carregado de reciprocidade, da elaboração de regras num momento mais adiantado
30
de desenvolvimento.
Um produto essencial do respeito mútuo e da reciprocidade é o sentimento de justiça; por
volta de 7.8 anos, a justiça sobreleva-se à própria obediência e torna-se norma central,
equivalente, no terreno afetivo, às normas de coerência no terreno das operações cognitivas, a
ponto de, no nível da cooperação e do respeito mútuo, haver um paralelismo entre as operações e
a estruturação dos valores morais.
Usando-se as escolhas sociométricas, no sentido de Moreno, verifica-se uma evolução dos
motivos invocados para escolher os líderes: os pequenos invocam razões heterônomas
(apreciação feita pelos professores, boas notas, etc.) e os grandes invocam critérios como ser
justo, saber guardar segredo, não delatar, etc.
Assim, a afetividade, a princípio centrada nos complexos familiais, amplia sua escala na
medida em que se multiplicam as relações sociais. Os sentimentos morais, ligados no início, a
uma autoridade sagrada, evoluem no sentido de um respeito mútuo e de uma reciprocidade. As
trocas sociais que englobam as reações precedentes porque são todas, ao mesmo tempo,
individuais e interindividuais, dão lugar a uma estruturação gradual ou socialização, que passa de
um estado de não coordenação ou de indiferenciação relativa entre o ponto de vista próprio e o
dos outros, a um estado de coordenação nas ações e informações.
3. UMA EDUCAÇÃO VOLTADA PARA A AUTONOMIA
Voltamos a falar, nos últimos tempos, em desenvolver autonomia nas pessoas que
educamos, em respeitar a liberdade do outro e deixar-lhes a chance de escolher. Isto
não ocorre casualmente; é fruto de um processo sócio-político, no qual o papel da
educação tem de ser alterado. Não é sem razão, também, que estamos colocando de
lado o modelo comportantentista de ensino, abandonando urna disciplina centrada no
controle exercido pelo professor e retomando os estudos piagetianos.
No plano intelectual, é fácil justificar a opção por Piaget. Estamos acreditando na
construção, pelo sujeito, de sua própria aprendizagem; estamos dando ênfase à resposta
elaborada pelo aluno (se possível, urna resposta criativa) e tentando abandonar os modelos
preestabelecidos de respostas definidas na formulação operacional de objetivos.
No plano social, contudo, a opção não se apresenta de forma tão evidente. inicialmente,
convém lembrar que, ao propor seu método de trabalho, Piaget fixou-se nos «erros” cometidos
pelos sujeitos e não em seus “acertos”. isto significa centrar a atenção no aluno, na gama de seus
interesses, ria estrutura mental que ele apresenta em dado momento e não mais no professor,
antes considerado o único capaz de definir o que devia ser feito. Esta nova maneira de encarar a
relação observador-observado, que nos remete a uma outra visão pedagógica, é altamente
inovadora, pois elimina a verticalidade de uma relação, substituindo-a por uma igualdade,
quando quem observa ou quem ensina não se posiciona acima de quem é observado ou de quem
aprende.
Durante muitos anos, o enfoque intelectualista da teoria piagetiana supervalorizou a
“operação” como produto de uma etapa do desenvolvimento humano. Sem pretender negar a
importância da maturação como determinante do processo, deve-se levar em conta o papel da cooperação. A teoria piagetiana não afirmou que o indivíduo isolado chega, em dado momento, a
operar, construindo seu próprio conhecimento; Piaget realçou, isto sim, a interação com o
ambiente e, quanto mais rica ela for do ponto de vista das tropas verbais e outras formas de
comunicação, mais possibilidades tem o indivíduo de desenvolver o raciocínio lógico.
O ponto mais importante, contudo, das inferências educacionais que estamos propondo se
prende ao desenvolvimento moral da criança. A descrição deste desenvolvimento revela a
passagem de uma fase de anomia, uma etapa pré-moral, para uma fase de heteronomia, a qual se
faz seguir de semi-autonomia e depois de autonomia.
Na etapa heterônoma do desenvolvimento moral da criança, as trocas sociais com o adulto
31
têm grande importância. É através da conversa (e, portanto, exercitando a função de
representação) que a criança entra em contato com o que é permitido e o que é proibido. Parecenos adequado lembrar que da mesma forma que Freud realçou a fase de formação do ego como
etapa para estruturação do superego, pode-se interpretar a referência piagetiana à etapa de
heteronomia como subestrutura para o desenvolvimento da autonomia.
A importância da relação com o adulto mais do que com a criança de sua idade é reforçada
quando recordamos que, na perspectiva piagetiana, a linguagem nesta fase (pré-operatória) é
essencialmente egocêntrica. Logo, o adulto, que desde a etapa das relações objetais ou mesmo
antes dela tem a oportunidade de estabelecer com a criança uma relação afetiva bem estruturada,
tem seu espaço assegurado na formação do sentimento de dever, como ficou claro anteriormente.
Repetindo Piaget, lembramos que nem a afeição sozinha, nem o
temor sozinho
se
prestam para impor o sentimento de obrigação. Esta referencia nos alerta para o comportamento
de adultos que, em nome de uma pseudoliberdade, deixam de colocar limites à ação da criança,
afirmando que, por si só, ela descobrirá o que é certo e desenvoIverá senso de moral.
É necessário que pais e professores compreendam que colocar certas restrições à ação não
faz com que a criança deixe de nos amar, se antes estabelecemos com ela uma relação afetiva
bem segura.
Por outro lado, é nas trocas com seus iguais que as crianças desenvolvem a autonomia.
Através da linguagem no brinquedo e outras atividades, desde a fase pré-escolar elas exercitam a
defesa dos seus direitos e vão aos poucos aprendendo a argumentar para defender seus pontos de
vista. O trabalho em comum constitui excelente oportunidade para estás trocas interindividuais e
o jogo com à medida que a criança vai sendo capaz de fazê-lo, se presta à opção do eu e do
outro, fundamental para o desenvolvimento de autonomia.
----ando o desenvolvimento cognitivo da criança já lhe permite a relação entre a falta
cometida e a sanção que ela deve me--- tem-se uma nova oportunidade para desenvolver a
autonomia.
--procedermos a uma análise da relação entre as faltas cometidas e o castigo imposto à
criança, veremos a falta de coerência que preside nossas decisões. O aluno que conversa durante
a aula obrigado a copiar n vezes urna frase do tipo «‘Devo ficar calado em sala de aula”. O “ficar
calado” acaba por tornar-se aversivo e escrever não tem nenhuma relação com o ato por ele
praticado. Se o
professor tivesse lhe dado a oportunidade de ouvir os colegas como
percebiam sua insubordinação, se tivesse permitido que ele optasse pelo que desejava fazer
naquele momento (sair da
sala por exemplo) responsabilizando-se pela conseqüência de sua ação, estudando, depois, a
matéria) asseguraria, por certo, uma oportunidade para o exercício da autonomia.
Nem sempre é fácil parar e discutir com a criança, numa relação dualitária, como
administrar sua vida. É também difícil respeitar a criança o bastante para reservar a maior parte
do tempo que lhe dedicamos às trocas com seus iguais, marcadas pela reciprocidade de relação.
Entretanto, quando se aproxima a fase operacional, só essa discrição do adulto oferece o suporte
para o desenvolvimento da
----- da criança moral e social e da estrutura cognitiva que fundamentam a autonomia.
BIBLIOGRAFIA
Este texto é basicamente, uma síntese das idéias de Jean Piaget sobre a afetividade e o
julgamento moral na criança, tal como estão contidas em PIAGET, J. & INHELDER, B.
Psicologia da criança. de Paulo, Difusão Européia do Livro, 1968. Adicionalmente, foram
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Silva. Rio, Forense, 1972.
_________ O Julgamento moral na criança. Trad. Elzon Lenardon, São Paulo Mestre Jou,
1977.
Olhando com o coração
sentindo com o corpo inteiro
no cotidiano escolar
Azoilda Loretto da Trindade
(Doutoranda em Educação pela PUC/RJ. Professora do ensino fundamental e Supervisora
da Rede Municipal de Ensino/RJ.)
Aos povos de ontem e hoje que
alguns tentam confinar nas senzalas.
Um convite ao sentir
Antes de começarmos a nossa parceria, este diálogo, convido você educador-leitor a fazer umm
pausa e observar as pessoas à sua volta: seus rostos, seus olhos, suas peles, seus cabelos, suas
peles, seus cabelos, suas expressões, seus jeitos... Agora imagine suas salas de aula, seus alunos
e alunas e traga-os à sua memória lembrando-lhes os jeitos, os cheiros, os sorrisos, as
implicâncias,_as angústias os medos as vestes e, adereços, as peles, as palavras, as belezas...
Tente lembrar deles com paixão, com o envolvimento de quem sabe na pele, no corpo e na alma,
o que é o cotidiano escolar e guarde aquecidamente esta imagem durante o percurso deste texto.
Reflexões
a) Histórias, preconceitos e diferenças
Vou contar uma história, uma pequena história:
Um dia, uma professora de primeira série de ensino fundamental resolveu tirar fotos das
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crianças da sua classe. Poses, euforia, sorrisos, brilhos nos olhos, exibicionismos, timidez... uma
série de comportamentos e sentimentos se apresentaram.
Fotos tiradas, fotos reveladas, mais sorrisos, muita curiosidade em serem vistos e se reverem
e certa alegria com o produto final: suas imagens fotografadas.
Crianças felizes e professora também,, e mais uma descoberta: a professora eufórica com as
conseqüências das fotografias resolve mostrá-las às colegas, à diretora e à supervisora. E uma
delas, que como num efeito dominó foi respaldada pelas outras, disse: — Nossa como eles estão
bonitos aqui!
Tal exclamação causou um profundo impacto na professora. Percebeu que as crianças
fotografadas, que cotidianamente estavam na escola em movimento, não eram vistas na sua
beleza de crianças pelas colegas docentes. Elas nunca tinham parado para ver de fato aquelas
crianças e só ali, diante da imagem fixa/parada, foi percebido o que no cotidiano era
invisibilizado: a beleza das crianças.
Naquele dia algo daquelas crianças tinha sido finalmente apresentado às professoras!
Este acontecimento tornou-se emblemático de um ciclo que acredito ser respaldador de
preconceitos: a gente olha mas não vê, a gente vê mas não percebe, a gente percebe, mas não
sente, a gente sente, mas não ama e, se a gente não ama a criança, a vida que ela representa, as
infinitas possibilidades de manifestação dessa vida que ela traz, a gente não investe nessa vida, e
se a gente não investe nessa vida, a gente não educa e se a gente não educa no espaço/ tempo de
educar, a gente mata, ou melhor, agente não educa para a vida; a gente educa para a morte das
infinitas possibilidades. A gente educa (se é que se pode dizer assim) para uma morte em vida: a
invisibilidade.
A nossa formação docente muitas vezes é marcada por urna inculcação de preconceitos
que, certamente, corroboram para a produção de maiorias invisíveis e silenciadas, e isto é tão
forte que nem percebemos. Exitem situações mais críticas, mais impactantes e outras mais sutis.
Veja-se:
A maioria dos cartazes para o “Dia das Mães” que são afixados nos murais, ou estão nas
matrizes para a reprodução, são confeccionados pelas professoras. Muitas das figuras de
mulheres estão longe de referir-se às mães reais dos alunos e das alunas e às próprias
professoras, obedecem a um modelo idealizado e internaliza do que idealizado e internalizado
que acaba por invisibilizar um grupo em detrimento de outro, de uma idealização.
Neste sentido, vou contar outra historinha:
Uma professora fazia seu mural de Natal com muitos anjinhos, todos lourinhos. Quando
alertada e indagada em relação aos anjos morenos, negros, ruivos... ela riu e disse que daquele
jeito era mais fácil, só precisava recortar uma cartolina, a amarela.
Muitos exemplos, muitas histórias podem ser citadas em relação a situações de
preconceitos e/ou invisibilização. Vou relatar mais uma bem significativa:
Numa festinha da escola, foi “proibido” pela diretora, com apoio da maioria das
professoras, que se tocasse o CD de determinado grupo musical bem popular. Uma professora
num tom irônico, diz: “Agora a ordem não é preparar para o trabalho? Então, não tem problema
tocar esse CD, pois a maioria delas vai ser isso mesmo.
Dois esclarecimentos se fazem necessários para o entendimento da história. Primeiro, “isso
mesmo” significava prostituta: o segundo, as crianças tinham entre quatro e cinco anos de idade.
E vocês leitores e educadores, quais são suas expectativas em relação às crianças sob sua
responsabilidade profissional?
Aprendemos nos livros, nos meios de comunicação, na grande mídia, nos filmes, revistas,
outdoors, jornais... a idealizar algumas características humanas como as representantes legítimas
e naturais do que seja ser humano. Normalmente homens, brancos, padrão euro-norte-americano
de vestir e agir. É só observarmos as grandes reuniões internacionais, o ministério do presidente
do Brasil, comitivas presidenciais etc.
Apreendemos este preconceito relativo ao que seja um ser humano ideal e quando nos
deparamos com nossos alunos reais ou abrimos mão dessa idealização ou passamos a exercer o
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nosso racismo, machismo; passamos a estigmatizar e invisibilizar nossa realidade.
“Apreendemos” o que é uma criança ideal, o que é uma criança bonita, educada, como é
família ideal, a classe social ideal... Mas, quando nos deparamos com nossa realidade, sobretudo
ao trabalharmos com crianças de classe popular (mas não só), nos colocamos diante de uma
bifurcação: hierarquizamos aquela realidade em relação ao ideal, negando-a, ou lutamos para
romper com aquele ideal apreendido; e, com paixão pela nossa realidade concreta nos
predispomos a aprender e a trabalhar com ela. Desafio árduo, duro, mas que carrega em si um
alto teor de gratificação diante da vida que, corno educadores, estamos ajudando a potencializar.
b) Dimensão, vida, escola pública e educadores
E explícito que neste texto se propõe urna aliança com a dimensão vida de nós educadores e
com a escola pública. Com a escola pública, por ser nosso espaço preferencial de atuação
profissional, na medida em que, além de ser um espaço onde as diferenças se encontram, as
culturas se cruzam, os excluídos podem ter a vivência da igualdade de acesso e de vivência de
aprendizagem escolar. Eu teria inúmeros exemplos de situações de acesso e aprendizagem de
crianças das mais diversas situações como aquelas com HIV, com câncer, crianças filhas de
prostitutas, de presidiários, de garis, com deficiência mental, auditiva, física, crianças filhas de
professoras, advogadas, funcionários públicos, de camelôs, de traficantes... crianças ali tendo a
oportunidade de ser criança num espaço como a escola, publica. Aliança com a dimensão vida,
porque esta dimensão nos fortalece a continuar, a querer aprender, criar, descobrir o trabalho
com as diferenças, com a diversidade, a olhar os nossos alunos, não com o olhar que os vê como
incapazes, incompetentes, doentes, sem perspectivas, olhar esse que pode destruir, impedir
qualquer possibilidade, mas com o olhar da fé, da confiança.
Se olharmos o(a) aluno(a) como incapaz, menor, nossa ação vai se dirigir a ele de modo a
subestimá-lo(a), de, modo a desinvesti-lo(a) das suas múltiplas possibilidades, e esse olhar/ação
pode, junto com outros fatores ajudar para que ele/ela se acredite assim, incapaz.
O olhar/ação do(a) professor(a) é fundamental para o crescimento do(a) aluno(a), e ele não
pode ser falso, porque implica outras sensibilidades; o(a) outro(a) sente, percebe, é influenciado
por nós. Afinal, o(a) outro(a) e nós sentimos com todo o nosso corpo, com todos os nossos
sentidos, com a pele, com o toque, com o olhar, todos(as) temos muitas formas de captar o
mundo a nossa volta, o nosso papel é muito importante. E só ativarmos a nossa memória e
encontraremos na nossa vida professores e/ou professoras que nos influenciaram, nos tocaram no
mais profundo do nosso coração, nos estimularam. Encontraremos também aqueles(as) mais
insignificantes ou ainda os/as que simplesmente nos prejudicaram.
O que importa deixar bem explícito é que qualquer aprendiz precisa ser estimulado
incentivado, encorajado; afinal, aprender é aproximar-se de novo do desconhecido, e é muito
importante nesse caminho ter alguém em quem confiar, alguém que nos diga: “vai/vá”; alguém
que nos diga: “vem”; ou alguém que seja capaz de dizer: “vamos”. Mas, para isto, nós
educadores(as), professores(as), temos que ter uma confiança inabalável na potência de vida dos
nossos (as) alunos(as), olhá-los e sermos capazes de nos fascinar com a vida e as múltiplas
possibilidades que ela nos apresenta.
Histórias submersas
Entra ano e sai ano, e assistimos ao triste quadro no período de matrícula escolar; centenas
de pessoas, na maioria mulheres, e na maioria negras e mestiças e, certamente, de classes
trabalhadoras de baixa renda, esperando e lutando para conseguir uma vaga para seus filhos na
escola pública. Esse movimento anual nos faz pensar que a escola pública; além de ser um
espaço plural, é um veículo (talvez o único), um espaço fundamental de educação para uma
faixa/camada da população, um veículo que acena para uma possibilidade de inclusão social, de
instrumentalização da apropriação de saberes que possam contribuir para o usufruir dos direitos
conferidos àqueles considerados cidadãos(ãs) melhoria de condição de vida.
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Isso nos faz refletir: se há uma demanda tão grande, a escola pública tem um papel social a
desempenhar e a população reconhece e exige isso. Se, apesar do sucatearnento da escola
pública, pessoas se aglomeram, dormem nas filas na esperança de uma escola, histórias
submersas estão sendo escritas e contadas pelos usuários e profissionais da educação. Histórias
que contrariam a impõem sublirninarmente propagada de que profissionais da educação o
pública e seus/suas usuário(as) são incompetentes. Histórias que mostram uma possibilidade de
aliança forte de contato produtivo é positivo entre usuários e profissionais. Histórias de força e
insurreição, histórias de vidas que são desconhecidas e/ou desqualificadas. Histórias que tornam
visíveis a proliferação de cursos de educação (extensão, pós-graduação lato sensu, mestrado,
doutorado…) como conseqüência, creio, de uma demanda de profissionais de educação ávidos
por aprender, por se qualificarem mais.
Existe sim, acomodação, a rotina alienante e a reprodução de desigualdades na escola, mas
existe, também, um fluxo fascinante promovido pela pluralidade de vidas, interesses, desejos
presentes no cotidiano escolar. Existe, sim, o sucateamento da escola pública, em função do
“cronificado” quadro, no nosso país, de produção e manutenção de desigualdades sociais, raciais,
culturais, de gênero etc. Mas há. também histórias de lutas contra esse quadro. Tem e sempre
teve muita gente querendo romper com o quadro de exclusão e legitimação da exclusão que
alguns querem colar à escola. Histórias submersas porque não ganharam a mídia, os cenários
oficiais e legitimados positivamente, e não foram fixadas na nossa memória coletiva, mas que
precisam ser contadas, ouvidas, lidas, sentidas, tocadas, recriadas, pois elas nos fazem
orgulhosos da nossa condição de profissionais de educação, não como aliados à exclusão social,
à reprodução das desigualdades étnicas, culturais, de gênero, sociais... — aliás, limiar ao qual
estamos cotidianamente sujeitos, mas não sujeitados —mas orgulhosos da nossa condição de
educadores(as) guerreiros, de uma pedagogia libertadora, promotora da vida, do ser humano, da
natureza.
Vamos fazer emergir essas histórias, as nossas histórias tantas vezes mencionadas.
Vamos.fazer emergir a nossa história com gestos, cantos, contos e encantos de liberdade.
Visibilidade, audibilidade das diferenças de gênero, cultura, cor, etnia, orientação sexual,
deficiências; emergir as histórias submersas de educadores(as), de alunos(as), da nossa
população, que nos diz de sujeição, mas também de insurreição, lutas, criatividade, busca de
alternativas. Tudo isso nos aponta para a construção e fortalecimento de uma certa prática
docente, não alienada do nosso- contexto sócio-histórico. Urna prática docente que valoriza não
só a razão, a linearidade da escrita, a letra, a tecnologia, mas outras fontes de saber, o coração, a
pele, o olfato etc. Uma prática docente que valorize uma aprendizagem que nos promova por
inteiro e que seja coletivamente insurgente. Coletiva porque não isolada, mas que mantenha com
outros um diálogo compartilhando as angústias, os erros, os acertos, as construções, as
teorizações e reflexões, os sonhos.
Uma prática docente que seja voltada para a diversidade étnica e cultural da nossa
população, sobretudo dessa população que, ao longo da história do Brasil, vem sendo alijada dos
direitos civis, sociais e humanos, dessa população que dorme nas filas por uma vaga na escola
pública. Uma prática docente política, ideológica e humanamente comprometida com nosso povo
mestiço, belo, forte, que luta, que surpreende, que ri, que chora, que cria que cotidianamente
saberes e estratégias, práticas que possibilite viver/sobreviver, num tempo em que a exclusão
social é vista como um valor positivo e como inevitável. Uma prática docente que tenha como
palavras-chave o diálogo, o estudo, a criação, o desejo e o compromisso com a transformação
social, com a construção mesmo de uma amorosa cidadania.
APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO
INTELECTUAL NA IDADE ESCOLAR
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L. S. Vygotsky
As teorias mais importantes referentes à relação entre desenvolvimento e aprendizagem na
criança podem agrupar-se esquematicamente em três categorias fundamentais, que
examinaremos separadamente para definir claramente os seus conceitos básicos.
O primeiro tipo de soluções propostas, parte do suposto da independência do processo de
desenvolvimento e do processo de aprendizagem. Segundo estas teorias, a aprendizagem é um
processo puramente exterior, paralelo em certa medida ao processo de desenvolvimento da
criança, mas que não participa ativamente neste e não o modifica em absoluto: a aprendizagem
utiliza os resultados do desenvolvimento, em vez de se adiantar ao seu curso e de mudar a sua
direção. Um típico exemplo desta teoria é a concepção — extremamente completa e interessante
— de Piaget, que estuda o desenvolvimento do pensamento da criança de forma completamente
independente do processo de aprendizagem.
Um fato surpreendente, e até hoje desprezado, é que as investigações sobre o
desenvolvimento do pensamento no estudante costumam partir justamente do princípio
fundamental desta teoria, ou seja, de que este processo de desenvolvimento é independente
daquele que a criança aprende realmente na escola. A capacidade de raciocínio e a inteligência
da criança, as suas idéias sobre o que a rodeia, as suas interpretações das causas físicas, o seu
domínio das formas lógicas do pensamento e da lógica abstrata são considerados pelos eruditos
como processos autônomos que não são influenciados de modo algum pela aprendizagem
escolar.
Para Piaget, trata-se de uma questão de método, e não de uma questão referente às técnicas
que se devem usar para estudar o desenvolvimento mental da criança. O seu método consiste em
atribuir tarefas que não apenas são completamente alheias à atividade escolar, mas que excluem
também toda a possibilidade de a criança ser capaz de dar a resposta exata. Um exemplo típico
que ilustra os aspectos positivos e negativos deste método são as perguntas utilizadas por Piaget
nas entrevistas clínicas com as crianças. Quando se pergunta a uma criança de cinco anos porque
não cai o sol, não só evidente que não pode conhecer a resposta certa, ou seria um gênio, mas
também não poderia imaginar uma respostas que se aproximasse da correta. Na realidade, a
finalidade de perguntas tão inacessíveis é precisamente excluir a possibilidade de recorrer as
experiências ou conhecimentos precedentes, ou seja, a de obrigar o espírito da criança a trabalhar
sobre problemas completamente novos e inacessíveis, para poder estudar as tendências do seu
pensamento de uma forma pura, absolutamente independente dos seus conhecimentos, da sua
experiência e da sua cultura.
É claro que esta teoria implica uma completa independência do processo de desenvolvimento
e do de aprendizagem, e chega até a postular uma nítida separação de ambos os processos no
tempo. O desenvolvimento deve atingir uma determinada etapa, com a conseqüente maturação
de determinadas funções, antes de a escola fazer adquirir à criança determinados conhecimentos
e hábitos. O curso do desenvolvimento precede sempre o da aprendizagem. A aprendizagem
segue sempre o desenvolvimento. Semelhante concepção não permite sequer colocar o problema
do papel que podem desempenhar no desenvolvimento a aprendizagem e a maturação das
funções ativadas no curso da aprendizagem: O desenvolvimento e a maturação destas funções
representam um suposto, e não um resultado da aprendizagem. A aprendizagem é uma
superestrutura do desenvolvimento, e essencialmente não existem intercâmbios entre os dois
momentos.
A segunda categoria de soluções propostas para o problema das relações entre aprendizagem
e desenvolvimento afirma, pelo contrário, que a aprendizagem é desenvolvimento. Trata-se,
como se vê, de uma tese inteiramente oposta à anterior. Esta fórmula expressa a substância deste
grupo de teorias, apesar de cada urna delas partir de premissas diferentes.
À primeira vista, esta teoria pode parecer mais avançada do que a precedente (baseada na
nítida separação dos dois processos), já que atribui à aprendizagem um valor de primeiro plano
no desenvolvimento da criança. Mas um exame mais profundo deste segundo grupo de soluções
demonstra que, apesar das suas aparentes contradições, os dois pontos de vista têm em comum
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muitos conceitos fundamentais e na realidade assemelham-se muito.
Segundo James, “a educação pode ser definida como a organização de hábitos de
comportamento e de inclinações para a ação”. Também o desenvolvimento se vê reduzido a urna
simples acumulação de reações. Toda a reação adquirida — diz James — é quase sempre uma
forma mais completa da reação inata que determinado objeto tendia inicialmente para suscitar,
ou então é um substituto desta reação inata. Segundo James, este é um princípio em que se
baseiam todos os processos de aquisição, ou seja, de desenvolvimento, e que orienta toda a
atividade do docente. Para James, o indivíduo é simplesmente um conjunto vivo de hábitos.
Para entender melhor este tipo de teoria é preciso ter em conta que ele considera as leis do
desenvolvimento como leis naturais que o ensino deve ter em conta, exatamente como a
tecnologia deve ter presentes as leis da física; o ensino não pode mudar estas leis, do mesmo
modo que a tecnologia não pode mudar as leis gerais da natureza.
Apesar das numerosas semelhanças entre esta teoria e a precedente, há uma diferença
essencial que diz respeito às relações temporais entre o processo de aprendizagem e o de
desenvolvi
mento. Como vimos, os adeptos da primeira teoria afirmam que o curso de
desenvolvimento precede o da aprendizagem, que a maturação precede a aprendizagem, que o
processo educativo pode apenas limitar-se a seguir a formação mental. A segunda teoria
considera, em contrapartida, que existe um desenvolvimento paralelo dos dois processos, de
modo que a cada etapa da aprendizagem corresponda urna etapa do desenvolvimento. O
desenvolvi
mento está para a aprendizagem como a sombra para o objeto que a
projeta.
Também esta comparação não é exata, porque esta segunda teoria parte de uma total
identificação entre desenvolvimento e aprendizagem e, portanto, levada ao extremo, não os
deferência em absoluto. O desenvolvimento e a aprendizagem sobrepõem-se constantemente,
como duas figuras geométricas perfeitamente iguais. O problema de saber qual é o processo que
precede e qual é o que segue carece de significado para esta teoria. O seu princípio fundamental
é a simultaneidade, a sincronização entre os dois processos.
O terceiro grupo de teorias tenta conciliar os extremos dos dois primeiros pontos de vista,
fazendo com que coexistam. Por um lado, o processo de desenvolvimento está concebido como
um processo independente do de aprendizagem, mas por outro lado esta mesma aprendizagem —
no decurso da qual a criança adquire toda uma nova série de formas de comportamento —
considera-se coincidente com o desenvolvimento. Isto implica urna teoria dualista do
desenvolvimento. Um claro exemplo constitui a teoria de Koffka, segundo a qual o
desenvolvimento mental da criança se caracteriza por dois processos que, ainda que conexos, são
de natureza diferente e condicionam-se reciprocamente. Por um lado está a maturação, que
depende diretamente do desenvolvimento do sistema nervoso, e por outro a aprendizagem que,
segundo Koffka, é em si mesma o processo de desenvolvimento.
A novidade desta teoria pode resumir-se em três pontos. Antes de tudo, como dissemos,
conciliam-se nela dois pontos de vista anteriormente considerados contraditórios; os dois pontos
de vista não se excluem mutuamente, mas têm muito em comum. Em segundo lugar, considerase a questão da interdependência, quer dizer a tese segundo a qual o desenvolvimento é produto
da interação de dois processos fundamentais. É certo que o caráter desta interação não aparece
com clareza nas publicações de Koffka, onde apenas se encontram observações gerais sobre a
existência de uma conexão entre estes dois processos; mas estas observações sugerem que o
processo de maturação prepara e possibilita um determinado processo de aprendizagem,
enquanto o processo de aprendizagem estimula, por assim dizer, o processo de maturação e o faz
avançar até certo grau.
Por ultimo, o terceiro aspecto novo — e também o mais importante desta teoria — consiste
numa ampliação do papel da aprendizagem no desenvolvimento da criança. Este aspecto
especial deve ser examinado com mais atenção. Remete-nos diretamente a um velho problema
pedagógico, hoje manos atual, chamado tradicionalmente o problema da disciplina formal. Como
se sabe, o conceito de disciplina formal, que encontra a sua expressão mais clara no sistema de
Herbart, liga-se à idéia de que cada matéria ensinada tem uma concreta importância no
desenvolvimento mental geral da criança, e que as diversas matérias diferem no valor que
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representam para este desenvolvimento geral.
Se se aceita este ponto de vista, a escola terá que ensinar matemática: pelo fato de que
contêm uma disciplina de grande valor matérias tais como as línguas clássicas, a história antiga,
as matemáticas, pelo fato de que contem uma disciplina de grande valor para o desenvolvimento
mental geral, e isso prescindindo do seu valor real.
Como se sabe, a concepção da disciplina formal provocou uma orientação muito
conservadora na práxis educativa. Justamente como reação contra esta concepção surgiu o
segundo grupo de teorias que examinamos, as quais pretendem devolver à aprendizagem o seu
significado autônomo, em vez de o considerar simplesmente como um meio para o
desenvolvimento da criança, ou seja, como se o exercício e a disciplina formal fossem
necessários para o desenvolvimento das aptidões mentais.
O fracasso da teoria da disciplina formal foi demonstrado em diversas investigações que
revelaram que a aprendizagem em determinado campo tem urna influência mínima sobre o
desenvolvimento geral. Por exemplo, Woddworth e Thorndike demonstraram que os adultos,
depois de determinado período de exercício, podem de linhas breves, mas que é difícil que isso
aumente a sua capacidade de avaliação quando as linhas são maiores. Outros adultos, que
aprendem a definir com exatidão a área de determinada figura geométrica, enganam-se depois
mais de dois terços das vezes quando muda a figura geométrica. Gilbert, Fracker e Martín
demonstraram que aprender a reagir rapidamente perante determinado tipo de sinal influi
pouquíssimo sobre a capacidade de reagir rapidamente perante outro tipo de sinal.
Muitos estudos deste tipo conduziram a resultados idênticos, demonstrando que a
aprendizagem de uma forma particular de atividade tem muito pouco a ver com outras formas de
atividade, ainda que estas sejam muito semelhantes à primeira. Como afirma Thomdike, o grau
em que determinada reação, demonstrada todos os dias pelos estudantes, desenvolve as suas
faculdades mentais de conjunto dependeria do significado educativo geral das disciplinas
ensinadas ou, em poucas palavras, da disciplina formal.
A resposta que os psicólogos ou os pedagogos puramente teóricos costumam dar é que cada
aquisição particular, cada forma especifica de desenvolvimento, aumenta direta e uniformemente
as capacidades gerais. O docente deve pensar e agir na base da teoria de que o espírito é um
conjunto de capacidades — capacidade de observação, atenção, memória, raciocínio, etc. — e
que cada melhoramento de qualquer destas capacidades significa o melhoramento de todas as
capacidades ~em geral. Segundo esta teoria, concentrar a capacidade de atenção na gramática
latina significa melhorar a capacidade de atenção sobre qualquer outro tema. A idéia é que as
palavras “precisão”, “vivacidade”, “raciocínio”, “memória”, “observação”, “atenção”,
“concentração”, etc., significam faculdades reais e fundamentais que mudam segundo o material
sobre que trabalham, que as mudanças persistem quando estas faculdades se aplicam a outros
campos, e que portanto, se um homem aprende a fazer bem determinada coisa, em virtude de
uma misteriosa conexão, conseguirá fazer bem outras coisas que carecem de todo o nexo com a
primeira. As faculdades intelectuais atuariam independentemente da matéria sobre a qual operam
e o desenvolvimento de uma destas faculdades levaria necessariamente ao desenvolvimento das
outras.
Thorndike opôs-se a esta concepção baseando-se nas inumeráveis investigações que
demonstram que ela é insustentável. Sublinhou a dependência das diversas formas de atividade a
respeito do material específico sobre o qual se desenvolve a afetividade. O desenvolvimento de
uma faculdade particular raramente origina um análogo desenvolvimento das outras. Um exame
mais profundo demonstra — afirma — que a especialização das capacidade é maior do que
parece à primeira vista. Por exemplo, se entre uma centena de indivíduos se escolherem dez
especialmente hábeis em reconhecer erros ortográficos ou na avaliação de um comprimento,
estes dez não demonstram análoga aptidão para avaliar corretamente o peso de um objeto. Nem
tampouco a velocidade e a precisão ao fazer somas são acompanhadas por uma velocidade e uma
precisão análogas, quando se trata de encontrar os contrários de determinada série de vocábulos.
Estes estudos demonstram que o intelecto não é precisamente a reunião de determinado
número de capacidades gerais — observação, atenção, memória, juízo, etc. — mas sim a soma
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de muitas capacidades diferentes, cada uma das quais, em certa medida, é independente das
outras e portanto tem de ser desenvolvida independentemente mediante um exercício adequado.
A tarefa do docente consiste em desenvolver não uma única capacidade de pensar, mas muitas
capacidades particulares de pensar em campos deferentes; não em reforçar a nossa capacidade
geral de prestar atenção, mas em desenvolver diferentes faculdades de concentrar a atenção sobre
diferentes matérias.
Os métodos que permitem que a aprendizagem especializada influa sobre o desenvolvimento
geral funcionam apenas porque existem elementos comuns, materiais e processos comuns.
Somos governados pelos hábitos. Daqui resulta que desenvolver o intelecto significa desenvolver
muitas capacidades específicas e independentes e formar muitos hábitos específicos, já que a
atividade de cada capacidade depende do material sobre o qual essa capacidade opera. O
aperfeiçoamento de uma função ou de uma atividade especifica do intelecto influi sobre o
desenvolvimento das outras funções e atividades só quando estas têm elementos comuns.
Como já dissemos, o terceiro grupo de teorias examinadas opõe-se a esta concepção. As
teorias baseadas na psicologia estrutural hoje dominante — que afirma que o processo de
aprendizagem nunca pode atuar apenas para formar hábitos, mas que compreende uma atividade
de natureza intelectual que permite a transferência de princípios estruturais implícitos na
execução de uma tarefa para uma série de tarefas diversas — afirmam que a influencia da
aprendizagem nunca é específica. Ao aprender qualquer operação particular, o aluno adquire a
capacidade de constituir certa estrutura, independentemente da variação da matéria com que
trabalha e independentemente dos diferentes elementos que constituem essa estrutura.
Esta teoria considera, portanto, um momento novo e essencial, um novo modo de enfrentar o
problema da disciplina formal. Koffka adota a velha fórmula segundo a qual a aprendizagem é
desenvolvimento, mas ao mesmo tempo não considera a aprendizagem como um puro e simples
processo de aquisição de capacidades e hábitos específicos e não considera que aprendizagem e
desenvolvimento sejam processos idênticos; postula, pelo contrario, uma interação mais
completa. Se, para Thorndikc, aprendizagem e desenvolvimento se sobrepõem
permanentemente, como duas figuras geométricas que estejam uma sobre a outra, para Koffka o
desenvolvimento continua referindo-se a um âmbito mais amplo do que a aprendizagem. A
relação entre ambos os processos pode representar-se esquematicamente por maio de dois
círculos concêntricos; o mais pequeno representa o processo de aprendizagem e o maior, o do
desenvolvimento, que se estende para além da aprendizagem.
A criança aprende a realizar uma operação de determinado gênero, mas ao mesmo tempo
apodera-se de um princípio estrutural cuja esfera de ampliação é maior do que a da operação de
partida. Por conseguinte, ao dar um passo em frente no campo da aprendizagem, a criança dá
dois no campo do desenvolvimento; e por isso aprendizagem e desenvolvimento não são
coincidentes.
Dado que as três teorias que examinamos interpretam de maneira tão diferente as relações
entre aprendizagem e desenvolvimento, deixemo-las de lado e procuremos uma nova e melhor
solução para o problema. Tomamos como ponto de partida o fato de que a aprendizagem da
criança começa muito antes da aprendizagem escolar. A aprendizagem escolar nunca parte do
zero. Toda a aprendizagem da criança na escola tem uma pré-história. Por exemplo, a criança
começa a estudar aritmética, mas já muito antes de ir à escola adquiriu determinada experiência
referente à quantidade, encontrou já várias operações de divisão e adição, complexas e simples;
portanto a criança teve uma pré-escola de aritmética, e o psicólogo que ignorasse este fato estaria
cego.
Um exame atento demonstra que esta aritmética pré-escolar é extremamente complexa, que a
criança já passou por uma aprendizagem aritmética própria muito antes de se entregar na escola à
aprendizagem da aritmética. Mas a existência desta pré-história da aprendizagem escolar não
implica uma direta continuidade entre as duas etapas do desenvolvimento aritmético da criança.
O curso da aprendizagem escolar da criança não é continuação direta do desenvolvimento
pré-escolar em todos os campos; o curso da aprendizagem pré-escolar pode ser desviado, de
determinada maneira, e a aprendizagem escolar pode também tomar uma direção contrária. Mas
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tanto se a escola continua a pré-escola como se a impugna, não podemos negar que a
aprendizagem escolar nunca começa no vácuo, mas é precedida sempre de uma etapa
perfeitamente definida de desenvolvimento, alcançado pela criança antes de entrar para a escola.
Os argumentos de investigadores como Stumpf e Koffka, que pretendem eliminar o salto
entre a aprendizagem na escola e a aprendizagem na idade pré-escolar, parecem-nos
extremamente convincentes. Pode demonstrar-se facilmente que a aprendizagem não começa na
idade escolar. Koffka, ao explicar ao doente as leis de aprendizagem infantil e a sua relação com
o desenvolvimento psicointelectual da criança, concentra toda a sua atenção nos processos mais
simples e primitivos de aprendizagem que aparecem precisamente na idade pré-escolar. Mas
ainda que saliente a semelhança entre aprendizagem escolar e pré-escolar, não consegue
identificar as diferenças existentes nem distinguir o que é especialmente novo na aprendizagem
escolar; tem tendência, na seqüência de Stumpf, para considerar que a única diferença entre os
dois processos reside no fato de que o primeiro não é sistemático, enquanto o segundo é uma
aprendizagem sistemática por parte da criança. Não é apenas uma questão de sistematicidade; a
aprendizagem escolar dá algo de completamente novo ao curso do desenvolvimento da criança.
Mas estes autores têm razão quando chamam a atenção para o fato, até agora desprezado, de que
a aprendizagem se produz antes da idade escolar. Acaso a criança não aprende a língua dos
adultos. Ao fazer perguntas e receber respostas, não adquire um conjunto de noções e
informações dadas pelos adultos? Através do adestramento que recebe dos adultos, aceitando a
sua condução nas suas ações, a própria criança adquire determinada gama de hábitos.
Pela sua importância este processo de aprendizagem, que se produz antes que a criança entre
na escola, difere de modo essencial do domínio de noções que se adquirem durante o ensino
escalar. Todavia, quando a criança, com as suas perguntas, consegue apoderar-se dos nomes dos
objetos que a rodeiam, já está inserida numa etapa especifica de aprendizagem. Aprendizagem e
desenvolvimento não entram em contato pela primeira vez na idade escolar, portanto, mas estão
ligados entre si desde os primeiros dias de vida da criança.
O problema que se nos apresenta é, por isso, duplamente complexo, e divide-se em dois
problemas separados. Antes de mais nada, devemos compreender a relação entre aprendizagem
e desenvolvimento em geral e depois as características espec(ficas desta inter-relação na idade
escolar.
Podemos começar com o segundo problema, dado que nos ajuda a esclarecer o primeiro.
Para o resolver, teremos que levar em consideração os resultados de algumas investigações que,
em nossa opinião, são de importância básica e que permitiram o desenvolvimento de uma nova
teoria, fundamental para a solução correta dos problemas examinados: a teoria da área de
desenvolvimento potencial(Zona blizliaisnego razvitiya.). É uma comprovação empírica,
freqüentemente verificada e indiscutível, que a aprendizagem deve ser coerente com o nível de
desenvolvimento da criança. Não é necessário, em absoluto, proceder a provas para demonstrar
que só em determinada idade se pode começar a ensinar a gramática, que só em determinada
idade o aluno é capaz de aprender álgebra. Portanto, podemos tomar tranqüilamente como ponto
de partida o fato fundamental e incontroverso de que existe uma relação entre determinado nível
de desenvolvimento e a capacidade potencial de aprendizagem.
Todavia, recentemente a atenção concentrou-se no fato de que quando se pretende definir a
efetiva relação entre processo de desenvolvimento e capacidade potencial de aprendizagem, não
podemos limitar-nos a um único nível de desenvolvimento. Tem de se determinar pelo manos
dota níveis de desenvolvimento de uma criança, já que, senão, não se conseguirá encontrar a
relação entre desenvolvimento e capacidade potencial de aprendizagem em cada caso específico.
Ao primeiro destes níveis chamamos nível do desenvolvimento efetivo da criança. Entendemos
por isso o
nível de desenvolvimento das funções psicointelectuais da criança que se
conseguiu como resultado de um específico processo de desenvolvimento, já realizado.
Quando se estabelece a idade mental da criança com o auxílio de testes, referimo-nos sempre
ao nível de desenvolvimento afetivo. Mas um simples controle demonstra que este nível de
desenvolvimento efetivo não indica completamente o estado de desenvolvimento da criança.
Suponhamos que submetemos a um teste duas crianças, e que estabelecemos para ambas uma
41
idade mental de sete anos. Mas quando submetemos as crianças a provas posteriores, sobressaem
diferenças substanciais entre elas. Com o auxílio de perguntas-guia, exemplos e demonstrações,
uma criança resolve facilmente os testes, superando em dois anos o seu nível de
desenvolvimento efetivo, enquanto a outra criança resolve testes que apenas superam em maio
ano o seu nível de desenvolvimento efetivo. Neste momento, entram diretamente em jogo os
conceitos fundamentais necessários para avaliar o âmbito de desenvolvimento potencial. Isto, por
sua vez, está ligado a uma reavaliação do problema da imitação na psicologia contemporânea.
O ponto de vista tradicional dá como certo que a única indicação possível do grau de
desenvolvimento psicointelectual da criança é a sua atividade independente, e não a imitação,
entendida de qualquer maneira. Todos os atuais métodos de medição refletem esta concepção. As
únicas provas tomadas em consideração para indicar o desenvolvimento psicointelectual são as
que a criança supera por si só, sem ajuda dos outros e sem perguntas-guia ou demonstrações.
Várias investigações demonstraram que este ponto de vista é insustentável. Experiências
realizadas com animais mostraram que um animal pode imitar ações que entram no campo da
sua efetiva capacidade potencial. Isto significa que um animal pode imitar apenas ações que, de
uma maneira ou de outra, se lhe tomam acessíveis; de modo que, como demonstraram as
investigações de Kõhler, a capacidade potencial de imitação do animal dificilmente supera os
limites da sua capacidade potencial de ação. Se um animal é capaz de imitar uma ação
intelectual, isso significa que, em determinadas condições, é capaz de realizar uma ação
análogana sua atividade independente. Por isso, a imitação está extremamente ligada à
capacidade de compreensão e só é possível no âmbito das ações acessíveis à compreensão do
animal.
A diferença substancial no caso da criança é que esta pode imitar um grande número de
ações — senão um número ilimitado —que superam os limites da sua capacidade atual. Com o
auxílio da imitação na atividade coletiva guiada pelos adultos, a criança pode fazer muito mais
do que com a sua capacidade de compreensão de modo independente. A diferença entre o nível
das tarefas realizáveis com o auxílio dos adultos e o nível das tarefas que podem desenvolver-se
com uma atividade independente define a área de desenvolvimento potencial da criança.
Voltemos por um momento ao exemplo dado antes. Estamos perante duas crianças com uma
idade mental de sete anos, mas uma, com um pouco de auxílio, pode superar testes até um nível
mental de nove anos e a outra apenas até um nível mental de sete anos e meio. O
desenvolvimento mental destas crianças é equivalente? A sua atividade independente é
equivalente, mas, sob o ponto de vista das futuras potencialidades de desenvolvimento, as duas
crianças são radicalmente diferentes. O que uma criança é capaz de fazer com o auxílio dos
adultos chama-se zona do seu desenvolvimento potencial. Isto significa que com o auxilio deste
método podemos medir não só o processo de desenvolvimento até ao momento presente e os
processos de maturação que já se produziram, mas também os processos que estio ocorrendo
ainda, que só agora estão amadurecendo e desenvolvendo-se.
O que a criança pode fazer hoje com o auxílio dos adultos, poderá fazê-lo amanhã por si só.
A área de desenvolvimento potencial permite-nos, pois, determinar os futuros passos da criança e
a dinâmica do seu desenvolvimento, e examinar não só o que o desenvolvimento já produziu,
mas também o que produzirá no processo de maturação. As duas crianças que tomamos como
exemplo demonstram uma idade mental equivalente a respeito do desenvolvimento já realizado,
mas a dinâmica do seu desenvolvimento é inteiramente diferente. Portanto, o estado do
desenvolvimento mental da criança só pode ser determinado referindo-se pelo manos a dois
níveis: o nível de desenvolvimento efetivo e a área de desenvolvimento potencial.
Este fato, que em si mesmo pode parecer pouco significativo, tem na realidade enorme
importância e põe em dúvida todas as teorias sobre a relação entre processos de aprendizagem e
desenvolvimento na criança. Em especial, altera a tradicional concepção da orientação
pedagógica desejável, uma vez diagnosticado o desenvolvimento. Até agora, a questão tinha se
apresentado do seguinte modo: com o auxílio dos testes pretendemos determinar o nível de
desenvolvimento psicointelectual da criança, que o educador deve considerar como um limite
não superável pela criança. Precisamente, este modo de apresentar o problema contém a idéia de
42
que o ensino deve orientar-se baseando-se no desenvolvimento já produzido, na etapa já
superada.
A parte negativa deste ponto de vista foi reconhecida na prática muito antes de se ter
compreendido claramente na teoria; pode demonstrar-se em relação ao ensino ministrado às
crianças mentalmente atrasadas. Como se sabe, a investigação estabeleceu que estas crianças têm
pouca capacidade de pensamento abstrato. Portanto, os docentes das escolas especiais, ao
adotarem o que parecia uma orientação correta, decidiram limitar todo o seu ensino aos meios
visuais. Depois de muitas experiências, esta orientação resultou profundamente insatisfatória.
Provou-se que um sistema de ensino baseado exclusivamente em meios visuais, e que excluísse
tudo quando respeita ao pensamento abstrato, não só não ajuda a criança a superar uma
capacidade natural, mas na realidade consolida tal incapacidade, dado que ao insistir sobre o
pensamento visual elimina os germes do pensamento abstrato nestas crianças. A criança
atrasada, abandonada a si mesma, não pode atingir nenhuma forma evolucionada de pensamento
abstrato; e precisamente por isso a tarefa concreta da escola consiste em fazer todos os esforços
para encaminhar a criança nesta direção, para desenvolver o que lhe falta. Nos atuais métodos
das escolas especiais pode se observar uma benéfica mudança a respeito do passado, que se
caracterizava por um emprego exclusivo de meios visuais no ensino. Acentuar os aspectos
visuais é necessário, e não acarreta nenhum risco se se considerar apenas como etapa do
desenvolvimento do pensamento abstrato, como meio e não como um fim em si.
Considerações análogas são igualmente válidas para o desenvolvimento da criança normal.
Um ensino orientado até uma etapa de desenvolvimento já realizado é ineficaz sob o ponto de
vista do desenvolvimento geral da criança, não é capaz de dirigir o processo de desenvolvimento,
mas vai atrás dele. A teoria do âmbito do desenvolvimento potencial origina uma fórmula que
contradiz exatamente a orientação tradicional: o único bom ensino é o que se adianta ao
desenvolvimento.
Sabemos por urna grande quantidade de investigações — a que apenas podemos aludir por
falta de espaço — que o desenvolvimento das funções psicointelectuais superiores na criança,
dessas funções especificamente humanas formadas no decurso da história do gênero humano, é
um processo absolutamente único. De outro modo formulamos a lei fundamental deste
desenvolvimento da seguinte maneira: Todas as funções psicointelectuais superiores aparecem
duas vezes no decurso do desenvolvimento da criança: a primeira vez nas atividades coletivas,
nas atividades sociais, ou seja, como funções interpsiquicas; a segunda, nas atividades
individuais, como propriedades internas do pensamento da criança, ou seja, como funções
intrapsiquicas.
O desenvolvimento da linguagem serve como paradigma de todo o problema examinado. A
linguagem origina-se em primeiro lugar como maio de comunicação entre a criança e as pessoas
que a rodeiam. Só depois, convertido em linguagem interna, se transforma em função mental
interna que fornece os meios fundamentais ao pensamento da criança. As investigações de
Bolduina, Rignano e Piaget demonstraram que a necessidade de verificar o pensamento nasce
pela primeira vez quando há uma discussão entre crianças, e só depois disso o pensamento se
apresenta na criança como atividade interna, cuja característica é o fato de a criança começar a
conhecer e a verificar os fundamento do seu próprio pensamento. Cremos facilmente na palavra
— diz Piaget —mas só no processo de comunicação surge a possibilidade de verificar e
confirmar o pensamento.
Como a linguagem interior e o pensamento nascem do complexo de inter-relações entre a
criança e as pessoas que a rodeiam, assim estas inter-relações são também a origem dos processo
volitivos da criança. No seu último trabalho, Piaget demonstrou que a cooperação favorece o
desenvolvimento do sentido moral na criança. Investigações precedentes estabeleceram que a
capacidade da criança para controlar o seu próprio comportamento surge antes de tudo no jogo
coletivo, e que só depois se desenvolve como força interna o controle voluntário do comportamento.
Os exemplos diferentes que apresentamos aqui indicam um esquema de regulação geral no
desenvolvimento das funções psico-intelectuais superiores na infância, que, sob nosso ponto de
43
vista, se referem ao processo de aprendizagem da criança no seu conjunto. Assim, não é
necessário sublinhar que a característica essencial da aprendizagem é que engedra a área de
desenvolvimento potencial, ou seja, que faz nascer, estimula e ativa na criança um grupo de
processos internos de desenvolvimento dentro do âmbito das inter-relações com outros, que na
continuação são absorvidos pelo curso interior de desenvolvimento e se convertem em
aquisições internas da criança.
Considerada sob este ponto de vista, a aprendizagem não é em si mesma desenvolvimento,
mas uma correta organização da aprendizagem da criança conduz ao desenvolvimento mental,
ativa todo um grupo de processos de desenvolvimento, e esta ativação não poderia produzir-se
sem a aprendizagem. Por isso, a aprendizagem é um momento intrinsecamente necessário e
universal para que se desenvolvam na criança essas características humanas não naturais, mas
formadas historicamente.
Tal como um filho de surdos-mudos, que não ouve falar à sua volta, continua mudo apesar
de todos os requisitos inatos precisos para o desenvolvimento da linguagem, e não desenvolve as
funções mentais superiores ligadas à linguagem, assim todo o processo de aprendizagem 6 uma
fonte de desenvolvimento que ativa numerosos processos, que não poderiam desenvolver-se por
si mesmos sem a aprendizagem.
O papel da aprendizagem como fonte de desenvolvimento —zona de desenvolvimento
potencial — pode ilustrar-se ainda mais comparando os processos de aprendizagem da criança e
do adulto. Até agora se atribuiu pouco relevo às diferenças entre a aprendizagem da criança e do
adulto. Os adultos, como bem se sabe, dispõem de uma grande capacidade de aprendizagem.
Recentes investigações experimentais contradizem a afirmação de James de que os adultos não
podem adquirir conceitos novos depois dos vinte e cinco anos. Mas até agora não se descreveu
adequadamente o que diferencia de forma substancial a aprendizagem do adulto da
aprendizagem da criança.
À luz das teorias de Thorndike, James e outros, a que se aludiu antes — teorias que reduzem
o processo de aprendizagem à formação de hábitos — não pode haver diferença essencial entre a
aprendizagem do adulto e a da criança. Á afirmação é superficial. Segundo esta concepção, um
mesmo mecanismo caracteriza a formação de hábitos tanto no adulto como na criança; no
primeiro, o processo ocorre mais veloz e facilmente do que na segunda, e reside aí toda a
diferença.
Coloca-se um problema: o que diferencia aprender a escrever à máquina, a andar de
bicicleta, a jogar tênis em idade adulta, do processo que se dá na idade escolar quando se
aprendem a língua escrita, a aritmética e as ciências naturais? Cremos que a diferença essencial
consiste nas diversas relações destas aprendizagens com o processo de desenvolvimento.
Aprender a usar uma máquina de escrever significa, na realidade, estabelecer um certo
número de hábitos que por si só não alteram em absoluto as características psicointelectuais do
homem. Uma aprendizagem deste gênero aproveita um desenvolvimento já elaborado e
completo, e justamente por isso contribui cm muito pouco para o desenvolvimento geral.
O processo de aprender a escrever é muito diferente. Algumas investigações demonstraram
que este processo ativa uma fase de desenvolvimento dos processos psicointelectuais
inteiramente nova e muito complexa, e que o aparecimento destes processos origina uma
mudança radical das características gerais, psicointelectuais da criança; da mesma forma,
aprender a falar marca uma etapa fundamental na passagem da infância para a puberdade.
Podemos agora resumir o que dissemos e fazer uma formulação geral da relação entre os
processos de aprendizagem e desenvolvimento. Antes de o fazer, salientaremos que todas as
investigações experimentais sobre a natureza psicológica dos processos de aprendizagem da
aritmética, da escrita, das ciências naturais e de outras matérias na escola elementar, demonstram
que o seu fundamento, o eixo em torno do qual se montam, é uma nova formação que se produz
em idade escolar. Estes processos estio todos ligados, ao desenvolvimento do sistema nervoso
central. A aprendizagem escolar orienta e estimula processos internos de desenvolvimento. A
tarefa real de uma análise do processo educativo consiste em descobrir o aparecimento e o
desaparecimento destas linhas internas de desenvolvimento no momento em que se verificam,
44
durante a aprendizagem escolar.
Esta hipótese pressupõe necessariamente que o processo de desenvolvimento quando
coincide com o da aprendizagem, o processo de desenvolvimento segue o da aprendizagem, que
cria a área de desenvolvimento potencial.
O segundo momento essencial desta hipótese é a afirmação de que aprendizagem e
desenvolvimento da criança, ainda que diretamente ligados, nunca se produzem de modo
simétrico e paralelo. O desenvolvimento da criança não acompanha nunca a aprendizagem
escolar, como uma sombra acompanha o objeto que a projeta. Os testes que comprovam os
progressos escolares não podem, portanto, refletir o curso real do desenvolvimento da criança.
Existe uma dependência recíproca, extremamente complexa e dinâmica, entre o processo de
desenvolvimento e o da aprendizagem, dependência que não pode ser explicada por uma única
fórmula especulativa apriorística.
Cada matéria escolar tem uma relação própria com o curso do desenvolvimento da criança,
relação que muda com a passagem da criança de uma etapa para outra. Isto obriga a examinar de
novo todo o problema das disciplinas formais, ou seja, do papel e da importância de cada matéria
no posterior desenvolvimento psico-intelectual geral da criança. Semelhante questão não pode
esquematizar-se numa fórmula única, mas permite compreender melhor como são vastos os
objetivos de uma investigação experimental extensiva e variada.
ALGUNS ASPECTOS DA RELAÇÃO RECÍPROCA
ENTRE EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
DA PERSONALIDADE
G. S. Kostiuk
A exposição inicia-se salientando a urgência de esclarecer as relações recíprocas entre ação
educativa e desenvolvimento da personalidade numa época de rápido progresso educativo. A
psicologia soviética reconheceu há tempo a decisiva influência da educação sobre o
desenvolvimento psicointelectual. Todavia, não se explicitaram todas as implicações desta
influência, como salientou a imprensa especializada e também a imprensa em geral. Investigouse pouco sobre a influência da educação no desenvolvimento da personalidade ou sobre os
modos mais eficazes para conduzir o desenvolvimento da criança. Trata-se de um problema
amplo e complexo; esta exposição se limitará em considerar os resultados das investigações
experimentais mais recentes, com a finalidade de apresentar alguns dos problemas relacionados
com o assunto e de chamar a atenção para a necessidade de sucessivas investigações.
O desenvolvimento psicointelectual da criança realiza-se no processo de interação com o
ambiente natural e social. Conduzir o desenvolvimento através da educação significa organizar
esta interação, dirigir a atividade da criança para o conhecimento da realidade e para o domínio
— por meio da palavra — do saber e da cultura da humanidade, desenvolver concepções sociais,
convicções e normas de comportamento moral. O problema mais importante a este respeito é o
da relação recíproca entre aprendizagem, educação e desenvolvimento psicointelectual.
Sabe-se que os psicólogos de outros países tiveram e têm opiniões diferentes sobre este
problema. Para alguns, desenvolvimento e aprendizagem são processos independentes e não têm
conexões internas; para outros, os dois processos identificam-se.
Um exemplo do primeiro ponto de vista é o da posição de A. Gesell; este autor afirma que as
formas fundamentais do comportamento da criança, as suas recíprocas conexões e as
conseqüentes mudanças são determinadas pelo processo de maturação do organismo. Pelo
contrario, o ponto de vista característico dos bebaviounistas baseia-se na identificação do
desenvolvimento e aprendizagem; a passagem do primeiro para o segundo produzir-se-ia
45
mediante um processo de formação de hábitos.
L. S. Vygotsky opôs-se a ambas as concepções, tentando demonstrar a unidade e a
diversidade entre aprendizagem e desenvolvimento, bem como de salientar o papel fundamental
da ação educativa neste processo. S. L. Rubinstein afirmou que a criança se desenvolve enquanto
recebe educação e intuição.
Ainda que existam pouquíssimas investigações experimentais dedicadas em
particular ao esclarecimento das relações recíprocas entre desenvolvimento e
aprendizagem, da análise e da generalização de numerosas investigações recentes
sobre a psicologia da aprendizagem (aquisição e domínio de variados tipos de
noções, aptidões e hábitos) podem-se tirar algumas conclusões que se referem às
recíprocas relações e às características particulares dos processos de aprendizagem e
desenvolvimento. Estes dados descrevem a aquisição de experiências sociais pelas
crianças, o papel essencial desempenhado neste processo pela condução que a
educação exerce sobre a atividade autônoma da criança, sobre as modalidades de
elaboração de novas ações e sobre as conexões entre o primeiro e o segundo sistema
de sinais subjacentes a elas. Tudo isto possibilita uma explicação mais pontual de
como o processo de aprendizagem estabelece as condições necessárias para o
desenvolvimento psicointelectual da criança; permite uma compreensão mais
profunda da sua condicíonabilidade social; ajuda-nos a entender como, no decorrer
do processo de interação da criança com o ambiente, o objetivo — ou seja, o social
— se converte em subjetivo — ou seja, individual —; como aquele que a criança
adquire nas relações com os adultos e com os seus contemporâneos o leva
sucessivamente à organização da sua própria atividade, ao aparecimento de novas
características psicointelectuais.
A este respeito oferecem especial interesse as observações sobre o efeito que o
domínio da linguagem tem no desenvolvimento psico-intelectual da primeira
infância. Como demonstraram e as investigações, os processos verbais adquiridos e
dominados primeiro pela criança como atos sociais imediatamente tendentes à
satisfação de determinada necessidade se convertem, com a continuação, na sua
forma interior e exterior, em fatores importantes do desenvolvimento da percepção e
imaginação, em instrumentos do seu pensamento e de toda a organização e regulação
do seu comportamento.
Outras observações experimentais permitem compreender que as ações mentais, formadas na
criança de idade pré-escolar como atos “interindividuais” da atividade cognoscitiva derivada de
comunicações verbais com os adultos (pergunta e resposta, agrupamento de objetos e
determinação da igualdade quantitativa de grupos, a sua composição, enumeração, etc.), se
convertem depois em atos “intra-individuais” que a criança realiza até à margem de uma
especifica situação de ensino.
Enquanto na idade pré-escolar há uma assimilação espontânea, não voluntária, de
conhecimentos, as crianças em idade escoar estão incluídas em várias formas de atividade
educativa intencional As investigações demonstram que a aquisição da leitura, da escrita, do
léxico da língua nativa, da gramática, da aritmética, da física, da geometria não deve considerarse como uma simples aquisição, mas sim como um aperfeiçoamento da atividade cognoscitiva
dos discípulos e da sua capacidade para assimilar conhecimento.
O domínio de um vocabulário novo e de outros aspectos da língua melhora a expressão
verbal das crianças, faz surgir nelas necessidades novas, novas atitudes perante os processos
verbais. Ao assimilar o conteúdo dos textos, os alunos aprendem ao mesmo tempo a usar formas
de análise e de síntese (descoberta das idéias mais importantes, a sua coordenação, estrutura da
obra, etc.). Os métodos para a elaboração de material verbal, e em espacial de textos escritos,
desenvolvidos sob a condução do professor, generalizam-se posteriormente, com a passagem a
uma nova etapa de atividade escolar, e convertem-se para o aluno em um instrumento de
pensamento, de memória voluntária e de recvocação. O domínio de conceitos cada vez mais
complexos favorece o desenvolvimento da abstração e da generalização, conduz à formação e ao
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aperfeiçoamento de operações lógicas, ao desenvolvimento da curiosidade, à iniciativa e à
independência na assimilação de conhecimentos.
Este não é o lugar para uma análise detalhada dos resultados destas experiências; pode
salientar-se apenas que, consideradas em conjunto, revelam com clareza a dependência do ensino
a respeito do desenvolvimento psicointelectual da criança, e dão um conteúdo novo à idéia de
que o ensino exerce um papel ativo no desenvolvimento. Ao colocar os alunos perante tarefas de
caráter cognoscitivo, o professor não se limita a organizar as ações encaminhadas para a
execução destas tarefas, mas proporciona aos alunos os métodos necessários, cujo domínio leva
ao aparecimento de novas atividades e ao desenvolvimento das potencialidades mentais.
Sob o ponto de vista fisiológico, Pavlov observou que “toda a aprendizagem consiste na
formação de conexões temporais”. O desenvolvimento produz-se mediante a formação destas
conexões.
Sem a formação de conexões nervosas temporais não pode nascer nem nasce nada novo no
comportamento da criança, nas suas ações, na sua atitude perante a realidade que a rodem, e,
portanto, não pode haver desenvolvimento. As conexões formadas no processo de aprendizagem
constituem — como observou A. N. Leontiev— laços entre os complexos mecanismos
fisiológicos em que se baseia a formação das qualidades mentais da criança. Os dados
experimentais referentes ao melhoramento dos processos mentais que se produzem durante a
aprendizagem permitem-nos estabelecer de modo definitivo que o desenvolvimento mental não
consiste na diferenciação de formas complexas de atividade psíquica inatas na criança; estas
formas de atividade são elaboradas, pelo contrário, no decorrer do processo de assimilação da
experiência social. À falta desta assimilação não pode existir aquela “humana, história individual
do desenvolvimento da sensação, imaginação, pensamento, sensibilidade, etc.”, cujo estudo
Sechenov considerava como tarefa fundamental da psicologia.
Estas observações confirmam, além disso, que a passagem da aquisição para o
desenvolvimento não E um processo simples, mas complexo. Em primeiro lugar o processo pelo
qual de fato as crianças conseguem dominar conhecimentos, capacidades ou hábitos específicos,
não se produz de repente, como demonstraram muitas experiências; passa através de unia série
de etapas cujo caráter depende da complexidade do conteúdo que tem de ser dominado, e da
receptividade do estudante. Em segundo lugar, o domínio de um material perfeitamente
determinado não leva sempre e imediatamente a um progresso no desenvolvimento mental do
aluno, ao aparecimento de novas características qualitativas, ou seja, a um desenvolvimento real.
Tudo isto depende do que se adquire e de como se adquire. Entram aqui em jogo as
características individuais dos alunos, ou seja, as características da atividade nervosa superior.
Em terceiro lugar., a passagem da aquisição ao desenvolvimento daí-se de diferentes modos,
segundo os diversos aspectos do processo de desenvolvimento. Deve ter-se presente que existem,
no desenvolvimento, aspectos diferentes, ainda que ligados: desenvolvimento do conhecimento,
da atividade cognoscitiva, desenvolvimento das qualidades mentais (simples e compostas,
particulares e gerais) que entram neste processo, e das propriedades funcionais do cérebro que
subexistem nelas.
Os dados experimentais demonstram, por exemplo, que o domínio pela criança pequena
destas ou daquelas palavras da linguagem dos adultos não traz mudanças imediatas à sua
atividade nem lhe confere uma nova capacidade para organizar as suas próprias ações. A criança
adquire esta função progressivamente, através de uma série de microintervalos cuja soma
provoca mudanças qualitativas mais evidentes. Existem investigações que demonstram que
quando uma criança em idade pré-escolar adquire uma nova palavra de um texto literário ou
cientifico, esta não faz de imediato parte do seu vocabulário ativo; freqüentemente o aluno, ao
escrever ou conversar, esquece-a e utiliza outros vocábulos conhecidos anteriormente, mais
“familiares” e de significação mais geral.
Averiguou-se, além disso, que os alunos que já alcançaram a capacidade de preparar um
esquema expositivo não recorrem a ele para organizar a sua própria exposição, mas, pelo
contrário, preparam um esquema só depois de terem realizado a tarefa (fixada pelo mestre); em
vez de utilizarem essa capacidade para escrever os temas, preferem fazer um esquema depois de
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os terem escrito.
As investigações demonstraram que é necessário um período de tempo considerável, um
adequado nível de domínio dos métodos de análise e de síntese e da sua generalização, para que
os alunos desenvolvam a capacidade de melhorar a compreensão, a memorização voluntária e a
repetição do conteúdo de um texto. Isto também é válido no que diz respeito à aquisição de
conceitos novos das diversas disciplinas, à mudança qualitativa do pensamento do aluno sobre a
explicação dos diversos fenômenos da realidade, à solução de problemas práticos que exigem a
aplicação destes conceitos.
O ensino nas nossas escolas não pode limitar-se apenas a transmitir ao discípulo
determinados conhecimentos, a formar um mínimo de aptidões e de hábitos. A sua tarefa é
desenvolver o pensamento dos alunos, a sua capacidade de analisar e generalizar os fenômenos
da realidade, de raciocinar corretamente; numa palavra, desenvolver “no todo” as suas
faculdades mentais. Se se pretende alcançar esta meta, tem de se encontrar uma solução
satisfatória para os problemas mais urgentes do ensino. O desenvolvimento do pensamento
lógico é um dos fatores mais importantes do sucesso escolar. Todavia, isto não significa que
qualquer ensino contribua para garantir esse desenvolvimento.
P. N. Gruzdev sublinhou que “freqüentemente o ensino está a tal nível que, em vez de
contribuir para o desenvolvimento das capacidades intelectuais, na realidade sufoca-as”. Isto
ocorre quando se aplicam métodos de ensino errados, quando prevalecem o dogmatismo e o
formalismo.
As afirmações tranqüilizadoras sobre a capacidade educativa do ensino em geral são,
portanto, insatisfatórias; devemos estudar as condições em que o ensino assume efetivamente
essa capacidade e devemos tratar de ajudar os professores a criar estas conclusões na prática. Isto
conduz-nos à necessidade de esclarece como influi o ensino sobre o desenvolvimento intelectual
e sobre o desenvolvimento das características psíquicas, e à necessidade de encontrai maneiras
de valorizar a eficácia dos diversos métodos de ensino sob o ponto de vista da sua influencia no
desenvolvimento do pensamento, da memória e dos demais processos mentais.
Tem havido poucas investigações deste tipo; limitamo-nos a analisar a aquisição de
conhecimentos particulares, aptidões e hábitos. No máximo, verificaram-se melhoramentos
elementares atividade cognoscitiva, mas não se seguiu a dinâmica sucessiva destes progressos,
que são o resultado do domínio dos conhecimentos transmitidos. A verdade é que o processo de
desenvolvimento se inicia apenas com o domínio do material escolar. Os processos de
aprendizagem e desenvolvimento diferenciam-se em todas as suas variadas conexões, como
justamente observou Vygotsky e posteriormente outros autores. Isto coloca o problema das
relações recíprocas entre aprendizagem, aquisição e desenvolvimento.
Os índices significativos destes processos são diferentes. São, por exemplo, no que diz
respeito ao desenvolvimento, as mudanças na atividade intelectual dos alunos, mudanças que
assumem formas novas com a passagem de uma etapa inferior da atividade do pensamento para
uma superior, de métodos de raciocínio menos evoluídos para métodos mais desenvolvidos.
Certamente, quando se escolhe o material educativo e se consegue assegurar resultados de bom
nível, conduz-se com ele o desenvolvimento das capacidades de pensamento dos estudantes. Mas
não terminam aí as tarefas de uma correta orientação do desenvolvimento. Esta deve ter muito
em conta as metas especificas e as vias a seguir para as alcançar. Se o professor as esquece e
centra a sua atenção apenas no que os alunos assimilam, não será capaz de lhes garantir um
efetivo domínio do saber.
Se se pretendem encontrar métodos corretos para uma condução efetiva do desenvolvimento
mental, é necessário estudar as relações recíprocas especificas entre aprendizagem e
desenvolvimento nas diversas etapas do trabalho escolar sobro as diferentes matérias. Os
resultados de recentes experiências de psicologia do ensino demonstram que esse estudo tem
fundamental importância não só no que diz respeito ao conteúdo, mas também para a utilização
de métodos de ensino que garantam o caráter ativo da aquisição de conhecimentos e a efetiva
formação das necessárias ações mentais.
Condição necessária para a passagem da aquisição ao desenvolvimento é uma programação
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do ensino, uma sistematização dos conhecimentos que se tem de adquirir, que sirva de base à
formação de sistemas de conexões temporais. O ensino pode conduzir a um verdadeiro
desenvolvimento mental só quando está encaminhado para a formação destes sistemas. A
sistematização das conexões é essencial não só para uma aquisição de conhecimentos duradoura
e profunda, mas também para o desenvolvimento da atividade cognoscitiva, para a formação de
novas operações lógicas e de novas características mentais. Como sublinhou juntamente Piaget,
uma operação lógica generalizada existe e funciona apenas como parte de um sistema de
operações. Demonstrou-se o papel da sistematização na formação de aptidões mentais, e umas
investigações experimentais realizadas em Leningrado demonstram que os sistemas formados no
processo de aprendizagem das diversas matérias escolares têm razoável importância para
explicar as relações entre aprendizagem e desenvolvimento.
Na base destas investigações é preciso chegar a uma definição de “sistematização”; esta
definição pode alcançar-se obviamente baseando-se apenas numa generalização dos resultados
experimentais. Por vezes, quando este conceito se emprega para esclarecer a relação entre
aprendizagem e desenvolvimento, sistematização entende-se apenas no sentido de estereótipo.
Este último conceito tem, sem dúvida, muita importância no desenvolvimento mental, dado que
a formação do novo se produz sempre na base do velho, de quanto já se completou e reforçou.
Mas o estereotipo por si só não é um conceito adequado para compreender o aparecimento
dessas novas formações que caracterizam o verdadeiro desenvolvimento.
Para compreender, por exemplo, o aparecimento de novos modos de raciocínio abstrato e
generalizado no processo de aprendizagem, é necessário estudar as mudanças que se produzem
em sistemas já estruturados quando se formam sistemas novos, de que modo se reorganizam,
incluídos em uma nova totalidade mais ampla; é preciso estudar, além disso, o seu agrupamento,
a sua
generalização e a sua coordenação; é preciso estudar a formação de uma hierarquia específica e a
dinâmica da organização. Além disso, é necessário estudar as forças sob cuja influência se
produz a passagem de níveis inferiores de organização a outros superiores. Tudo isto coloca
importantes problemas, cujo estudo experimental apenas se iniciou.
Para esclarecer o problema das relações recíprocas entre educação e desenvolvimento é
necessário também estudar as componentes motivacionais da atividade mental. O
desenvolvimento das características intelectuais do aluno não poderá discutir-se de modo
adequado se se prescindir do desenvolvimento das outras características (emotivas, volitivas, do
caráter), quer dizer, da formação unitária da personalidade em desenvolvimento. Este processo é
unitário, e não simplesmente a soma de mudanças parciais que se produzem em conseqüência de
ações educativas separadas.
Entre as demais condições, há de se ter em conta as atitudes até do ambiente circunstante,
recentemente estudadas com êxito por V. N. Miasishchev, atitudes que caracterizam tanto a
posição individual de cada personalidade como as condições internas das ações. Outras
investigações demonstraram o importante papel que assumem as motivações subjetivas do aluno,
para o trabalho escolar na assimilação de conhecimentos.
Algumas destas atitudes formam-se no decurso do próprio processo de aprendizagem. São
elas, por exemplo, os interesses cognoscitivos e escolares dos alunos, o seu interesse pelo
conhecimento, etc. Os resultados de algumas experiências mostram que estas atitudes são o
resultado de uma atividade cognoscitiva ativa dos alunos, organizada de um modo perfeitamente
determinado que lhes permite resolver por si só problemas acessíveis, e capaz de conduzir ao
conhecimento e à realização dos resultados obtidos. Outras atitudes subjetivas são conseqüência
não tanto de métodos como de ações educativas “ambientais” que conduzem a uma mudança nas
relações entre personalidade e ambiente social; a uma mudança do comportamento prático e dos
modos de vida.
Aprendizagem e educação têm, obviamente, muito em comum. Por um lado, instruindo os
alunos, dando-lhes conhecimentos, exercemos sobre eles uma notável ação educativa; por outro,
durante todo o curso da educação, dá-se sempre no educando a aquisição de determinados
elementos da experiência social (opiniões, juízos de valor, normas, regras de comportamento
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moral, etc.). Além destes aspectos comuns, estes processos têm, todavia, particularidades
especificas que é necessário ter em conta quando se examina o problema da recíproca conexão
entre ação educativa (nas suas diversas formas) e desenvolvimento mental.
Recentes experiências no campo da psicopedagogia demonstraram que no decorrer do
processo educativo se desenvolvem as
atitudes das crianças perante a realidade circunstante; que se formam novas atitudes sob a
influência das tarefas propostas, e quais são os métodos educativos mais eficazes — e quais os
menos eficazes — para este fim. Já na idade pré-escolar se definem algumas destas atitudes, sob
a influência de formas especiais de educação. Assim, já na idade pré-escolar começam a formarse na criança tendências gerais de comportamento em formas simples (por exemplo, o desejo de
fazer algo útil às pessoas próximas, uma altitude positiva perante o trabalho, etc.). Na formação
destas tendências desempenha um importante papel não só a consciência que as crianças têm do
significado das tarefas fixadas, mas também a organização das suas atividades coletivas, no
sentido de satisfazer as necessidades da coletividade e de unia análise coletiva dos resultados.
Como demonstram os resultados de algumas experiências, a formação de uma atitude positiva
perante o trabalho escolar passa por uma série de etapas. Ao princípio, esta atitude desenvolve-se
como conseqüência das instruções do professor e das exigências da coletividade; depois, como
resultado da experiência acumulada, a criança começa a realizar os seus deveres sem ajuda.
Desenvolveu-se assim uma atitude interior positiva perante o trabalho, que se manifesta ao
princípio dentro de limites muito restritos e que adquire com a continuação um caráter de
generalidade.
Os resultados de outra série de experiências definem as condições e os métodos da formação
no aluno de outros valores e altitudes: gosto pelo trabalho, comportamento auto-regulado,
responsabilidade, etc. Estes resultados indicam que as normas morais que regulam o
comportamento se formam — como observa V. N. Miasishchev — sob a influência de
determinadas exigências saciais externas aceitas e assimiladas, que depois se transformam em
exigências internas que o mesmo aluno faz suas. A consciência destas exigências por parte da
criança não se converte de i.mediato em um elemento regulador do comportamento, mas adquire
esta função apenas por graus. A norma de regulação (valor) começa a desenvolver-se em
colaboração direta com os adultos e com as outras crianças e é reforçada continuamente por
estas. Com a continuação, transforma-se em regulador interno do comportamento e atua mesmo
sem estímulo e reforço dos outros, sem auxílio alheio, por própria iniciativa do aluno.
Outras investigações demonstraram que este processo produz de modo diferente, segundo os
indivíduos. Depende dos impulsos causais da ação, da situação subjetiva, das características das
atitudes desenvolvidas pelo estudante nas etapas precedentes perante o docente, a escola e o
trabalho escolar, a família. Perante um terreno subjetivo favorável, estas exigências são
absorvidas imediatamente e dão logo um resultado ativo. Pelo contrário, se entram em conflito
com atitudes subjetivas já formadas e mais ou menos estabilizadas perante o mundo circunstante,
são compreendidas apenas formalmente, não “se fixam” por inteiro e, portanto, não assumem
nenhuma função reguladora. Ocorre com freqüência que um estudante compreende estas
exigências no que diz respeito aos outros, mas não as relaciona com o seu próprio
comportamento.
Os fatos demonstram que as exigências feitas ao estudante, e compreendidas por este, não
produzem o efeito desejado se entram em conflito com os impulsos causais da sua atividade; isto
acontece quando o estudante descobre nessas exigências um atentado contra os seus esforços
feitos na direção da independência, da auto-afirmação, da satisfação dos seus próprios interesses,
quando as considera uma ameaça para a sua própria dignidade (freqüentemente mal entendida)
ou para a sua própria posição no coletivo, etc. Perante tais condições subjetivas, as influências
educativas não podem determinar uma resposta adequada, as tarefas propostas ao aluno não
representam para este uma necessidade real. Os alunos, de maneira evidente ou oculta, opõem
uma resistência. É costume acontecer que exortações e advertências infinitas não dão um
resultado determinado e estável, não estimulam na criança a devida atitude perante a situação em
questão, não mudam o seu comportamento real.
50
O que foi dito é Importante para descobrir as condições para uma atitude educativa eficaz
no desenvolvimento da personalidade; e em particular no desenvolvimento das tendências do
comportamento, das atitudes perante outras pessoas e determinadas obrigações. A eficácia desta
condução depende do grau de correspondência entre métodos e tarefas da educação, da
identidade e constância das diferentes exigências educativas (por parte da escola e do ambiente
doméstico), da unidade de palavra e ação na educação, de como na realidade está organizada e
conduzida a vida do aluno.
A educação influi de maneira diferente (com um ritmo deferente e um resultado variável) nas
tendências de comportamento de uma personalidade e nas suas maneiras de regulação interna, ao
ponto de tomar em consideração, utilizar e mudar na direção necessária, tanto as atitudes
subjetivas que se formaram durante o desenvolvimento precedente, como as tendências de
comportamento realmente operantes.
A educação alcança o seu objetivo imediato (particular) e definitivo (geral) quando põem em
ação as capacidades potenciais do aluno, e, em conformidade, dirige a sua utilização. A interação
dos diferentes aspectos da educação (intelectual, moral, estética, prática e física) desempenha
aqui um papel importante, assegurando a participação da criança nas diversas atividades
necessárias para um desenvolvimento das suas potencialidades em todas as direções.
Toda a educação determina, de uma maneira ou de outra, o desenvolvimento da
personalidade da criança, deixando nela um vestígio. Todavia, nem toda a educação dirige
ativamente o desenvolvimento para fins específicos. Existem casos (bastante freqüentes, na
nossa opinião) em que o resultado da educação é exatamente o contrário do desejado. Por isso é
impossível contentarmo-nos com afirmações acomodatícias sobre o papel proeminente da
educação no desenvolvimento da personalidade; é necessário descobrir em que condições a
educação satisfaz realmente estes objetivos e contribuir por este meio, praticamente, para a
previsão dos fenômenos negativos no desenvolvimento dessas qualidades (morais e outras) da
personalidade adolescente, que interessam diretamente à nossa sociedade.
A educação que separa as palavras dos atos é um fracasso; a instrução pedagógica verbal,
que a criança não põe em prática, não traz nenhuma mudança real à sua vida, à sua posição no
coletivo. A educação fracassa se não toma em consideração as deveras interconexões da criança
com o ambiente, se está alienada da sua vida real, das condições subjetivas (apenas através das
quais pode atuar), da precedente história do desenvolvimento de cada aluno, da sua idade e das
suas características individuais, das suas capacidades, interesses, exigências e outras atitudes
perante a realidade. Se a educação considera a criança “apenas como um objeto e não como um
ser vivo” (Makaxenko), ignora a sua atividade autônoma e mina a sua independência, não efetua
o que se propõe (apesar das muitas e importantes “medidas” educativas exteriores), de modo que
o trabalho resulta, na realidade, absolutamente estéril.
Tudo o que se disse leva a concluir que há uma inter-relação complexa entre educação e
desenvolvimento. Por outro lado, o desenvolvimento da personalidade depende da educação, que
cria as condições necessárias para que aquele se realize; o desenvolvimento é determinado pela
educação. O processo educativo, ao colocar a criança perante novos fins e novas tarefas, ao
colocar novas perguntas e procurar os meios necessários, conduz o desenvolvimento. Por outro
lado, a própria educação depende do desenvolvimento da criança, da sua idade e das suas
características individuais. Não pode haver desenvolvimento da personalidade sem que estejam
presentes as exigências da sociedade; mas estas exigências só são realistas quando se criam no
decurso do desenvolvimento da criança as capacidades para as satisfazer.
O desenvolvimento produz-se através daquilo que a criança se faz no seu processo de
aprendizagem e educação, mas freqüentemente os seus resultados vão mais longe, em certos
aspectos, daquilo que aprendeu diretamente. Durante a vida e a atividade da criança, organizada
pela educação, apresentam-se não só novos conhecimentos que refletem a realidade objetiva,
mas também novas necessidades, exigências, interesses, aspirações (em especial a aspiração a
aperfeiçoar-se), meios gerais para as ações intelectuais e práticas, novas formas de pensamento,
novas sensações, novos aspectos de caráter, novas aptidões. Estas qualidades não se afirmam
imediatamente, mas desenvolvem-se no decorrer da atividade da criança (na escola, no trabalho,
51
etc.), sob a condução da educação. A sua formação está ligada ao desenvolvimento global da
vida, no qual entra em jogo a maturação do organismo. Portanto, do desenvolvimento surgem
novas possibilidades de educação.
Atualmente, a inter-relação destes processos costuma simplificar-se e explicar-se de modo
unilateral. Determinadas afirmações sobre este problema costumam insistir apenas sobre o fato
de que o desenvolvimento depende da educação. O desenvolvimento psíquico do aluno é
representado como uma simples secessão de diferentes influências educativas, como se as
qualidades próprias da criança não exercessem a menor influência sobre o processo educativo.
Interpretações deste gênero devem-se à confusão entre aprendizagem, educação e
desenvolvimento.
Estes processos, ainda que estreitamente ligados entre si, na realidade são diferentes; do que
se disse anteriormente, deriva que as diferenças não são absolutas, mas relativas, mas apesar de
tudo existem. Reconhecer estas diferenças, estudar as características especificas da
aprendizagem, da educação e do desenvolvimento, é de enorme importância para esclarecer
depois as interconexões entre esses processos e preparar uma sólida base psicológicas para uma
eficaz condução educativa do desenvolvimento da personalidade; assumir uma atitude negativa
perante este periblema e não fazer o menor esforço para o estudar, equivale a simplificar
excessivamente a tarefa de conduzir o desenvolvimento da criança. Esta simplificação tem um
efeito nocivo na prática: ao pôr em relevo apenas as ilimitadas possibilidades da educação, de
fato limita, porque restringe e desarma a pedagogia.
A história do desenvolvimento psíquico da criança, da for-inação da consciência e da
autoconsciência realiza-se através do processo de aprendizagem e de ensino. Mas este
desenvolvimento tem características próprias, leis próprias ligadas a leis que regulam a
aprendizagem e a educação, mas que não se identificam com estas; além disso, dispõem de uma
força motriz própria.
O desenvolvimento psíquico não é uma simples réplica das influências educativas a que uma
criança está sujeita, não é uma simples acumulação quantitativa estratificada daquilo que a
criança adquire nos diferentes atos da atividade escolar ou de outro gênero. Há uma seleção, uma
transformação interna, uma reorganização, uma amálgama, uma interação, em conseqüência do
que uma característica pode desaparecer quando aparece e se desenvolve outra. Este processo é
determinado durante toda a vida da criança pela sociedade, que, com a sua influência, inibe ou
extingue um sistema de conexões, faz surgir outro e consolida-o, e assim sucessivamente. Assim
pode entrar em ação as leis que regem a passagem do desenvolvimento de uma etapa inferior a
uma superior. Na sua forma geral, as leis que regulam o desenvolvimento refletem as conexões e
as relações em que se baseia a constituição da personalidade consciente, a formação de diversas
qualidades, a passagem de formas inferiores de reflexão sobre a realidade para outras superiores,
de formas inferiores a formas superiores de relação com o ambiente, a formas superiores de autoregulação.
Como sublinhou Lênin, “condição para o conhecimento de todos os processos do mundo no
seu “automovimento”, no seu desenvolvimento espontâneo, na sua vida real, é o seu
conhecimento como unidade dos opostos”, das tendências contraditórias no seu interior.
Isto é igualmente válido para a psicologia do desenvolvimento da criança. A força motriz
deste desenvolvimento ver-se-á antes de tudo nas contradições internas entre as novas exigências
feitas à criança e a sua satisfação; nas contradições entre os seus problemas, as suas aspirações e
os objetivos reais e o nível de desenvolvimento por ela alcançado; entre novas tarefas e modos
de pensamento e de comportamento já estereotipados; entre as possibilidades desenvolvidas
internamente, subjetivamente, e as relações objetivas com o ambiente. Tarefa nossa é descobrir
estas contradições e as condições em que nascem, descobrir como se desenvolvem nos diversos
níveis de idade e de que modo podem resolver-se; o mesmo é dizer, chegar a compreenda o
desenvolvimento da personalidade como um “movimento espontâneo internamente necessário”.
Pensou-se por vezes que a aceitação do caráter espontâneo do desenvolvimento mental 6
incompatível com o principio determinista, segundo o qual o desenvolvimento está condicionado
socialmente e a educação desempenha um papel importante. Esta concepção apóia-se por um
52
lado em interpretações idealistas da espontaneidade do desenvolvimento, e por outro em uma
confederação simplista e mecanicista da forma como está condicionado o desenvolvimento.
Observam-se aqui as repercussões daquela concepção “epigenética” que considerava o
desenvolvimento mental da criança como uma conseqüência passiva da educação; no
desenvolvimento faltava todo o “automovimento”, toda a lei especifica. Quando se parte deste
ponto de vista, ignora-se a importância destas leis na prática educativa. Isto é tanto demonstrado
pela escassa atenção prestada ao estudo da idade e das características individuais no
desenvolvimento psíquico, como pela aplicação dos resultados experimentais na prática
educativa das escolas.
A consideração materialista dialética, que na realidade deriva do determinismo, vê pelo
contrário o caráter “espontâneo” do desenvolvimento como conseqüência do seu
automovimento. O desenvolvimento de todo o ser, incluindo a criança, o seu “próprio
movimento”, a sua “própria vida”, é condicionado pela “tonalidade das múltiplas relações” com
a realidade circundante. Como se observou em outra situação, uma concepção do
desenvolvimento como “automovimento” não limita em absoluto a tarefa de uma condução
pedagógica, mas indica melhor como empreendê-la com êxito. E a chave para compreender
como nasce o novo na vida da criança, como esta se torna independente, como desenvolve a
iniciativa, a atividade criadora, a capacidade consciente de regular o seu próprio comportamento;
e, portanto, serve para descobrir as direções em que podem ser melhorados os métodos
educativos. Só uma educação eficiente leva ao desenvolvimento da personalidade da criança, e a
educação apenas é eficiente quando toma em consideração as leis e as características do processo
de desenvolvimento. Quanto mais conduzida por estas leis é a educação, quanto mais consciente
está delas, mais capaz será de guiar com êxito o desenvolvimento da personalidade de acordo
com as metas educativas. É necessário reconhecer a natureza específica do desenvolvimento
mental, a fim de que os psicólogos dediquem grande atenção ao estudo deste processo, consigam
que a pedagogia conheça as suas características, e proporcionem assim os fundamentos
psicológicos de métodos ativos para conduzir a educação das novas gerações de modo que
assegurem o desenvolvimento global da personalidade.
INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS
Segundo Gardner, existem distintas formas de inteligência que cada indivíduo possui em graus
variados. As sete formas primárias
Palavras – poetas, roteiristas,
Novelistas e oradores
Figuras & imagens – pintores,
Escultores, designers-gráficos
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Números & lógica –
matemáticos, advogados,
banqueiros e programadores
de computador
Todo o corpo & as mãos –
Atletas, mímicos, dançarinos,
cantores e inventores
Compreensão social –
conselheiros, consultores,
professores, terapeutas,
ministros
Tom & ritmo –
compositores,
instrumentalistas, maestros,
arranjadores musicais e
professores de música
Auto-conhecimento –
psiquiatras, filósofos e gurus
Inteligências Múltiplas
Segundo o dicionário enciclopédico inteligência é a faculdade de conhecer de compreender: a
inteligência distingue o homem do animal. / Compreensão; conhecimento profundo: ter
inteligência para os negócios./ Destreza, habilidade:
cumprir com inteligência uma missão./ Boa convivência, união de sentimentos:
viver em perfeita inteligência com...! Ajuste, conluio, relações secretas: ter
inteligência com os inimigos.
Aqui trataremos da inteligência como faculdade de compreender e conhecer. Alguns psicólogos
vêem a inteligência como uma capacidade geral para a compreensão e raciocínio que se
manifesta de variadas maneiras. Disse Binet, “Parece-nos que, na inteligência, existe uma
faculdade fundamental, cuja alteração ou ausência é da mais extrema importância para a vida
prática. Esta faculdade é o julgamento, também chamado de bom senso, iniciativa, faculdade de
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adaptação de si mesmo às circunstâncias. Para o bom julgamento, a boa compreensão e bom
raciocínio, essas são atividades essenciais da inteligência”. (Binet & Simon, 1905)
David Wechsler define inteligência como “uma capacidade agregada ou global do indivíduo para
agir objetivamente, para pensar racionalmente, e para lidar efetivamente com seu ambiente”.
(Wechsler, 1958)
A partir de todas estas definições, uma nova teoria vem surgindo, a Teoria das Inteligências
Múltiplas. Esta foi elaborada a partir dos anos 80 por pesquisadores da Universidade norteamericana de Harvard, liderados pelo psicólogo Howard Gardner. A origem da teoria é
interessante. Acompanhando o desempenho de alunos fracos, Gardner se surpreendeu com o
sucesso obtido por eles.
O pesquisador passou então a questionar a avaliação escolar, cujos critérios não incluem a
análise de capacidades que, no entanto, são importantes na vida das pessoas. Concluiu que as
formas convencionais de avaliação apenas traduzem a concepção de inteligência vigente na
escola, limitada à valorização da competência lógico-matemática e lingüística.
Gardner demonstrou, porem, que as demais faculdades também são produtos de processos
mentais e que não há motivo para diferenciá-las do que geralmente se considera inteligência.
Assim, ele ampliou o conceito de inteligência única para o de um feixe de capacidades e
conceituou inteligência como “a capacidade de resolver problemas ou elaborar produtos
valorizados em um ambiente cultural ou comunitário”.
Assim, percebemos que foi observando crianças que o psicólogo americano Howard Gardner
percebeu o que hoje parece óbvio: nossa inteligência é complexa de mais para que os testes
escolares comuns sejam capazes de medi-la. Diziam-se que a base desses teste é uma só e varia
de nível de pessoa para pessoa. Gardner se contrapõe a isso.
Em 1983, no livro Estruturas da Mente, ele definiu sete inteligência: a lógico-matemática, a
lingüística, a espacial, a corporal-cinestésica, a interpessoal, a intrapessoal e a musical.
Atualmente o psicólogo americano descobriu mais uma, a naturalista.
A inteligência lógico-matemática é a inteligência que determina a habilidade para o raciocínio
dedutivo, para a compreensão de cadeias de raciocínios, além da capacidade para solucionar
problemas envolvendo números e demais elementos matemáticos E a competência mais
diretamente associada ao pensamento científico e à idéia tradicional de inteligência. O inglês
Stephen Hawking, 55 anos, é um gênio do tipo lógico-matemático. Doutor em Cosmologia ocupa
a cadeira de lsaac Newton como professor de Matemática da Universidade de Cambridge.
Preso a uma cadeira de rodas por causa de uma doença degenerativa, é considerado o mais
brilhante astrofísica desde Albert Einstein.
A inteligência musical permite a alguém organizar sons de maneira criativa, a partir da
discriminação de elementos como tons, timbres e temas. As pessoas dotadas desse tipo de
inteligência geralmente não precisam de aprendizado formal para exercê-la, como é o caso de
muitos famosos da música popular brasileira. Aos 49 anos, a paulista Rita Lee é um exemplo de
fértil inteligência musical: além de cantora e compositora, toca guitarra, flauta e harpa. Aos 18
anos formou um conjunto só de garotas. Pouco depois, integrou o grupo Os Mutantes, e, a partir
daí a partir dos anos 70, lançou-se com grande sucesso na carreira solo.
A lingüística manifesta-se na habilidade para lidar com as palavras nos diferentes níveis da
linguagem (semântica, sintaxe), tanto na forma oral como na escrita, no caso de sociedades
letradas. Particularmente notável nos poetas e escritores, é desenvolvida também por oradores,
jornalistas, publicitários e vendedores, por exemplo. O romancista baiano Jorge Amado, 78
anos, é dotado de excepcional inteligência lingüística. Cria textos de valor artístico universal. E
o mais traduzido dos escritores brasileiros.
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A inteligência espacial é representada como a capacidade de formar um modelo mental preciso
de uma situação espacial e utilizar esse modelo para orientar-se entre objetos ou transformar
características de um determinado espaço. Ela é especialmente desenvolvida, por exemplo, em
arquitetos, navegadores, pilotos, cirurgiões, engenheiros e escultores. Imagina como o arquiteto
carioca Oscar Niemeyer, 80 anos, projetou Brasília. Onde nada havia, ele “viu” construções
com formas e volumes variados, definindo uma nova percepção do espaço urbano. Sua
inteligência espacial tornou-o capaz de prever e solucionar problemas, liberando seu potencial
criativo.
A corporal-cinestésica é uma inteligência que se revela como uma especial habilidade para
utilizar o próprio corpo de diversas maneiras. Envolve tanto o autocontrole corporal quanto a
destreza para manipular objetos (cinestesia é o sentido pelo qual percebemos os movimentos
musculares, o peso e a posição dos membros). Atletas, dançarmos, malabaristas e mímicos têm
essa inteligência altamente desenvolvida. Pense no quanto o cérebro de Paula Silva, a Paula do
basquete, trabalha para que os músculos e nervos realizem movimentos precisos e com força
necessária às suas jogadas. Não é à toa que, aos 34 anos, campeã mundial e medalha de prata
nas Olimpíadas de Atlanta, a jogadora paulista é considerada uma das melhores atletas do
mundo.
Ter empatia, é ter sensibilidade para perceber as emoções do outro e colocar-se no lugar dele.
Esse sentimento, básico nas manifestações de solidariedade, relaciona-se com comportamentos
de fundo ético. A empatia deixa claro o quanto é doloroso ser injustiçado ou agredido. Assim, as
pessoas compreendem que os outros têm sentimentos semelhantes aos seus e se esforçam para
não cometer injustiças ou agressões.
Capacidade de se relacionar é a habilidade de lidar com as emoções dos outros de maneira
adequada. Em qualquer relacionamento, as pessoas enviam sinais verbais e não verbais que
afetam os demais. O controle adequado dessa sinalização permite elevar o grau de bem estar que
se causa aos outros. Essa bagagem humana é básica nos líderes e nas chamadas “estrelas
sociais”, pessoas que todos consideram encantadoras.
Um outro teórico defende a idéia de que o estudante deve ser visto como um indivíduo pleno, e
não apenas como um intelecto vestido de uniforme escolar. E o professor Celso Antunes, que há
mais de vinte anos desenvolve experiências semelhantes à de Daniel Goleman. Consultor de
escolas paulistas que estão criando projetos pedagógicos a partir da tese da Inteligência
Emocional, Antunes é também autor do livro Alfabetização Emocional. Na publicação, ele
defende uma escola mais atenta aos aspectos emocionais dos alunos e alinha sugestões de como
desenvolver esse objetivo pedagogicamente.
Para ele, tanto a preparação do professor quanto o planejamento das atividades e da avaliação
são essenciais ao desenvolvimento de um curso de inteligência emocional. Dentre seus alertas,
estão quanto à metodologia de ensino, sistema de avaliação, conteúdo e preparação do professor.
Quanto à metodologia de ensino, esqueça as aulas expositivas convencionais. Se o objetivo é
levas as crianças a refletir sobre si mesmas e sobre suas relações com os outros, elas não vão
funcionar. Pense em técnicas que estimulem debates, como teatros, jogos e brincadeiras. O
interesse do aluno deve ser respeitado num tal nível que ele possa compreender o problema e se
expressar sobre o que está sendo discutido.
No sistema de avaliação, deve-se abandonar o modelo de avaliações tradicionais baseadas em
notas. Não há uma nota mínima ou média que o aluno deva alcançar. A avaliação precisa levar
em conta qual o grau “ótimo” de cada um. Começar a falar mais em grupo é ótimo para uma
criança muito tímida, mas faz pouca diferença para outra já extrovertida. Observe como os
alunos se desenvolvem e adapte as estratégias aos seus objetivos.
Quanto ao conteúdo, o programa de um curso desse tipo deve corresponder às cinco habilidades
que compõem a inteligência emocional: autoconsciência, lidar com emoções, automotivação,
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empatia e capacidade de se relacionar. O que muda é a forma de abordagem, que precisa se
adequar à faixa etária ou ao grau de amadurecimento das crianças. Alunos que freqüentam a
segunda série, por exemplo, terão perspectivas bem diferentes sobre suas emoções se
comparados a adolescentes prestes a concluir o primeiro grau.
E, quanto à preparação do professor, para trabalhar com inteligência emocional, deve-se estar
preparado para aceitar inovações e sentir-se à vontade para falar de seus sentimentos e dos
demais, O ideal de cada professor é que receba treinamento específico envolvendo técnicas de
sensibilização de grupo e mediação de discussões. Seja observador para avaliar o que se passa
com os alunos e flexível para buscar as adequações necessárias.
Assim, como pudemos perceber, todos os autores relatados entram no mesmo ponto, de que
existem diferentes formas de inteligência e de que deve-se ver o indivíduo como um todo, uma
pessoa que tem habilidades diferentes que podem ser estimuladas, desenvolvidas, dotadas de
carga genética para habilidades específicas, pessoas estas que possuem mais de uma habilidade,
mas uma que predomina. E dotada também de uma carga emocional que influi diretamente em
toda sua vida.
Portanto, o mundo deve se preparar para esta nova realidade, e entender que o ensino deve
mudar, que os professores devem ser reciclados, que os alunos devem ser melhor preparados,
para que gostem daquilo que está sendo ensinado, e sintam prazer de estudar. O mercado hoje é
uma guerra, e as pessoas devem estar preparadas para enfrentá-la, e entendendo o indivíduo
como um todo e aproveitando suas habilidades, todos podem enfrentar o mercado de trabalho
com segurança e melhorar, assim, toda a nossa sociedade.
Bibliografia:
- LAROUSSE, Koogan. Pequeno Dicionário Enciclopédico. (1985) São Paulo:
Editora Antônio Houaiss.
-Reportagem Ria das Inteligências Múltiplas. Revista Nova Escola. Abril/1997.
- Reportagem Lidar com as Emoções é Sinal de Inteligência. Revista Nova
Escola. Março11 998.
Reportagem O Guru das Inteligências Múltiplas: uma Entrevista com Howard Gardner.
Revista Nova Escola. Setembro / 1997.
<fim do trabalho>
57
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