E S T R AT É G I A S PA R A A REGULAÇÃO ECONÔMICA DOS MEDICAMENTOS Federico Tobar “Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de odiar um e amar outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro” Mateus 6: 24 O objetivo desta apresentação e descreber de forma sintética e sistemática, as experiências que existem – ou, pelo menos parte delas – em relação à política de medicamentos para controle dos preços e gastos. Em primeiro lugar, serão analizadas algumas precisões conceituais e metodológicas. Políticas industriais versus política sociais A primeira questão refere-se à rivalidade entre a regulação com objetivos econômicos, gerais ou tradicionais, e os objetivos sanitários específicos. Como disse Mateus, é impossível server a dois senhores. Isto tem a ver com a questão que estamos vivendo na formulação e implementação de políticas de medicamentos na América latina, pois não se consegue servir a funções de acumulação, como as funções de produção no capitalismo, com funções sociais como a de garantir o acceso de à saúde com eqüidade. Se regulamos sem atentar para essa questão, podemos cair em alguns erros importantes. Um exemplo: a partir do objetivo da economia de mercado tradicional, pode ser recomendável facilitar o ingresso de novos medicamentos no mercado. A recita económica tradicional diría que quem tiver mais medicamentos o mais provável é que consiga com maior facilidade que os preços tendam ao preço de commodity. Ou seja, havendo maior concorrência, provavelmente os preços tenderiam a cair. Mas isto não é o que acontece. Quando se começa a estudar economia da saúde, vê-se que, em todas as áreas – mas nessa nossa área é muito pior ainda – há a questão da demanda induzida, da oferta que induz à 1 demanda . O que em um mercado tradicional poderia funcionar mais ou menos bem, nesse mercado de medicamentos há algumas limitações que devem ser consideradas. Desenho de estrategias para regulação dos medicamentos Há três premissas fundamentais que devem ser consideradas na hora de formular estrategias para o controle e regulação dos medicamentos: 1 Foi Kenneth Arrow quem primeiro e mais tem contribuido na explicação das particularidades e falhas dos mercados de saúde. Véjase: ARROW, Keneth. “Uncertainly and the Welfare Economics of Medical Care”. The American Economic Review, 5: 941-73. 1963. I. Quando se pensa em política de medicamentos, uma primeira pergunta que se deve fazer é quem implementa a medida. Há políticas de medicamentos que são implementadas por diferentes atores; elas não são feitas apenas pelo Estado. II. A segunda pergunta refere-se a quem utiliza essas ferramentas. III. E a terceira, aos seus objetivos. As políticas têm objetivos diferentes. Limitações na avaliação das estratégias Há algumas dificuldades para a avaliação das experiências em políticas de medicamentos. Em primeiro lugar, são raros os casos em que os preços dos medicamentos não continuam a subir. Na verdade são poucas as evidencias suficientes como para concluir que uma estratégia é verdadeiramente efetiva. Isto porque idenpendentemente do que se tehna fieto o gasto com medicmaentos sempre continuou a aumentar no mundo inteiro. Porém a questão é: o que aconteceria se não tivéssemos feito nada? Às vezes as políticas são boas, mas os preços podem continuar subindo porque são muitos os fatores envolvidos. Os preços sobem por causa da inovação permanente, por causa da dinâmica industrial, do aumento do consumo... Há muitos fatores em jogo e nem todos são controláveis. Em segundo lugar, também é difícil isolar uma política. Em geral elas se superpõem, faz-se mais de uma política ao mesmo tempo, tornando difícil a utilização do método experimental tradicional nessa área. Em terceiro lugar, quando se avaliam vários países em corte transversal, encontra-se um país que abandona uma medida quando um outro está começando a incorporá-la. Fazendo uma leitura no cenário mundial das políticas, é difícil identificar tendências contundentes. Um quarto ponto é que as políticas geralmente não permanecem o tempo necessário e, em geral, a indústria consegue reagir. E quando as indústrias reagem, os policy makers, os formuladores de políticas, têm que começar a reformulá-las. Às vezes é muito difícil encontrar uma política inteira implementada tal qual foi formulada, para que possa ser avaliada de acordo com as metas e objetivos originalmente planejados. Por outro lado, deve-se fazer uma distinção entre as políticas que apontam o controle dos preços dos medicamentos e aquelas que apontam a contenção do gasto. Não são a mesma coisa. Uma coisa é tentar controlar diretamente o preço do medicamento e outra é tentar gastar menos em medicamentos. Estratégias e Atores Uma outra limitação é que esses atores que são objeto da política tendem a reagir à mesma, são atores inteligentes. Aliás, deve-se ressaltar, ao menos no meu país, que a indústria farmacêutica geralmente emprega profissionais muito qualificados nas áreas de política e de economia, o que nem sempre acontece na área de saúde. Eles desenvolvem um pensamento de vanguarda e quando os governos e organismos reguladores começam um jogo de xadrez com eles, eles já estão quatro ou cinco jogadas à frente. É importante assumir que o componente estratégico é fundamental nessa área. Atores Distribuidoras Laboratorios Há Políticas que agem sobre cada ator $ Drogarías População ntos came i d e M Ainda sobre a questão dos atores, temos que distinguir os atores sobre os quais se formulam as políticas e aí temos um esquema que começa com a população, como usuário, consumidor, paciente. Há uma expressão muito conhecida que diz que o mercado de medicamentos é o único onde quem usa o medicamento, não decide a compra, e quem prescreve o medicamento, não o paga. É o médico quem prescreve. Quando o paciente compra, às vezes é ele quem paga, outras vezes há um financiamento institucional. Sobre o médico atua a propaganda médica. Os laboratórios geralmente tendem a dirigir toda, ou grande parte, da propaganda aos médicos. Os laboratórios entregam os medicamentos às distribuidoras, que os vendem para as farmácias. Nesse esquema teríamos que incluir, em muitos de nossos países, terceiros pagadores, ou seja, agências que financiam os medicamentos para a população. Acho que será útil, então, vermos políticas dirigidas primeiro aos laboratórios, depois vamos ver políticas aos farmacêuticos, também aos médicos; a seguir vamos falar um pouco das políticas para as distribuidoras e, por último, políticas dirigidas à população. Não é só o Estado quem faz política de medicamento. No Estado, em geral, são agências dependentes dele, como o Ministério da Saúde e, cada vez mais, agências descentralizadas, autônomas. Temos exemplos interessantes como o dos Estados Unidos, em que as distribuidoras são muito ativas na regulação do preço dos medicamentos. As PBMC – Pharmacy Benefit Management Companies – são empresas que fazem distribuição de medicamentos e que, em geral, trabalham com as HMO [Health Maintenance Organizations], os planos de saúde deles e que fazem distribuição também nas farmácias. Por outro lado, em todos os países que têm seguros sociais e privados, os seguros muitas vezes dão cobertura para medicamentos atuando, então, como financiadores e, muitas vezes, formuladores de políticas, como as políticas de listas. As políticas orientadas a partir da demanda surgem, basicamente, dos seguros. Como último comentário, uma tendência. Na Europa, o Estado antigamente regulava a indústria pelo controle de preços e lucros, mas agora também são incluídas medidas dirigidas aos médicos e aos usuários. Embora seja difícil encontrar tendências, no que respeita aos atores podemse identificar três: I.A primeira refere-se ao surgimento, cada vez maior, de agências autônomas preocupadas e ocupadas com essa questão das políticas de regulação de medicamentos. II. Por outro lado, surgem cada vez mais políticas que não são dirigidas exclusivamente aos laboratórios, mas que são orientadas aos médicos, aos usuários e aos farmacêuticos. III. A terceira é que os outros financiadores (além do Estado) começam a assumir papeis importantes no controle do gasto em medicamentos. Começando com as ferramentas, podemos distinguir entre aquelas centradas na oferta de medicamentos e as ferramentas de políticas que estão centradas na sua demanda. As políticas centradas na oferta geralmente são implementadas a partir do Estado e, aqui, a diferença interessante é que nos países que são produtores de medicamentos – e o Brasil é um produtor de medicamentos, aliás acho que o maior da América Latina – as políticas nem sempre são iguais às dos países não-produtores. Aqui temos o problema dos dois amos, sobre o qual Mateus falava. Quando pensamos nas políticas relacionadas à demanda, a primeira pergunta a ser feita é se há um comprador único naqueles países, pois onde só há um comprador de medicamentos – o Estado, que fornece medicamentos para toda a população – é muito mais fácil controlar as políticas. Nós comparamos os preços dos medicamentos nos países do Mercosul em janeiro de 1999, já estando, portanto, um pouco desatualizados os dados. É muito difícil comparar preços de medicamentos, há muitas questões metodológicas e cuidados que temos que ter. Mas uma das formas mais simples, que ninguém pode criticar, é comparar as apresentações mais vendidas, que normalmente são similares na maioria dos países. Assim, nos 15 produtos de marca líderes em vendas nesses países, para todos eles a Argentina tem um preço muito alto, mas no Brasil há dois produtos cujos preços são maiores que na Argentina: o Lexotan – vocês deverão me explicar por que, acho que deve ser por conta dos hábitos de consumo – e o segundo é a Aspirina Bayer. Entre os instrumentos que atuam sobre a indústria, o primeiro que gostaria de comentar é a autorização do registro. Registro significa incorporação de medicamentos no mercado, a autorização à indústria para lançar um novo produto. Tradicionalmente os critérios utilizados aqui eram de qualidade, mas agora cresce a tendência à inclusão de critérios econômicos também. Ou seja, uma avaliação de custo-efetividade. Outra tendência é a de flexibilização das aprovações, ou seja, facilitar à indústria o registro de mais medicamentos. Tende-se a simplificar os trâmites, mas não a barateá-los. Nos Estados Unidos o registro é muito mais caro do que em nossos países. Mas há uma tendência, sim, a facilitar os trâmites, a fazer sistemas de controle de qualidade mais rápidos, mais transparentes, mais precisos e tem-se avançado muito nos últimos anos nesse sentido. Uma outra instância de seleção relacionada às seguradores, aos financiadores, é o financiamento seletivo. Ou seja, o terceiro pagador – aquele que paga o medicamento para o paciente – determina um nível de restrição um pouco maior para aqueles produtos que vai financiar, geralmente através de listas, que podem ser positivas ou negativas. Fazer lista negativa é mais simples. Trata-se apenas de identificar os produtos que apresentam menos vantagens em termos de custo-efetividade. Já a avaliação dos medicamentos para fazer listas positivas requer pesquisas permanentes. O mercado incorpora novos produtos incessantemente, as evidências científicas sobre sua eficácia também mudam constantemente. Então, para fazer listas positivas é preciso ter um sistema muito mais dinâmico. Para fazer listas negativas, não. Por isso o mais comum é que os seguros comecem com listas negativas e depois passem para positivas. Vamos ver também algumas experiências de países com relação a isso. Outro tema que estamos colocando nesse encontro são as compras consolidadas. Há muitas evidências de preços muito mais baixos nas compras institucionais. Isso também tem dificuldades, vocês, brasileiros, conhecem [FALHA NA GRAVAÇÃO] o resto dos latino-americanos, a quantidade de problemas que há na compra consolidada. Mas há uma verdade incontestável: quando se pega, por exemplo, um antibiótico de quarta geração, o preço direto ao público chega a ser dez vezes maior que o preço obtido nas compras institucionais, compras no atacado. Uma outra política é o controle da propaganda dos medicamentos. Uma das tendências com relação a isso é a fixação de uma porcentagem permitida para que os laboratórios invistam ou gastem em publicidade. Uma outra, que eu acho muito interessante, é a inclusão de um imposto na propaganda de medicamentos. Claro que essa é uma medida delicada, que requer alguns cuidados, porque a publicidade de um medicamento também consegue reduzir assimetrias de informações. É uma faca de dois gumes: por um lado pode reduzir, por outro pode aumentar. Esse imposto teria que ser cobrado daquela propaganda que pode induzir mais a comprar produtos de marca e menos quando da compra de monodrogas e de genéricos. Então, teria que [FALHA NA GRAVAÇÃO]. Alguns países da nossa região têm – e é muito importante fortalecer isso – a literatura médica, a bula e os prospectos. Nesses casos, introduzir um imposto poderia ser contraproducente. Sobre a flexibilização de patentes, há países que conseguiram reduzir os prazos de vigência ou que conseguiram postergar o prazo do início da vigência da Lei de Patentes. Outra questão que está em discussão é a da autorização para importações paralelas, ou seja, para conseguir importar um medicamento patenteado de outro país, que às vezes chega a ter um preço 20 a 30% mais barato que o do produtor local. Agora vamos ver algumas experiências. Em relação ao registro, quem tem sido vanguarda, até onde eu sei – nós vamos ter muito mais informações com nossos colegas amanhã –, mas quem começou a avaliação farmacoeconômica foi a Austrália. Canadá e Inglaterra também têm avançado, nesse sentido. Aqui há uma discussão muito importante a respeito da exeqüibilidade da incorporação da avaliação farmacoeconômica em países em desenvolvimento como os nossos. A própria indústria vem tentando agora avançar nessa avaliação de custoefetividade. Novamente estamos diante de uma faca de dois gumes, porque essa avaliação pode funcionar como um instrumento para fixação de preços por parte da indústria e um instrumento de pressão por parte dos grandes laboratórios de capitais internacionais para desqualificar as firmas nacionais que ainda não fazem investimentos nessa área. Na Argentina, pelo menos, há vários laboratórios internacionais que já estão fazendo avaliação de custoefetividade dos medicamentos, mesmo que não seja exigido pela autoridade que concede o registro. Eu não sei que uso eles fazem disso, mas o que se discute é que justamente o ponto de inflexão onde o medicamento começa a ser menos custo-efetivo que a alternativa terapêutica, é sempre o preço vigente. Ou seja, eles sobem o preço até o extremo ou, pelo menos, suspeitamos disso. Os países têm avançado na flexibilizado da aprovação do registro dos medicamentos. Muitos conseguiram reduzir os tempos e melhorar os processos organizacionais e burocráticos. Eu gostaria de tomar a Argentina como exemplo, pois acho que foi um grande sucesso nos últimos anos. Criouse um organismo – a Administração Nacional de Medicamentos e Tecnologia Médica – que tem sistematizado e melhorado muito o registro dos medicamentos e o controle da sua qualidade. Em relação às listas, elas são utilizadas por quase todos os seguros ou, pelo menos por aqueles que financiam medicamentos para os usuários. Nem todo seguro de saúde financia esses produtos. Mas todos os países que têm seguridade social na Europa e, nos Estados Unidos, as distribuidoras também utilizam listas com critérios farmacoeconômicos, o que é interessante. A avaliação farmacoeconômica também é utilizada pelo próprio setor privado, não apenas pelos laboratórios, mas também pelos planos de saúde e distribuidoras. Quanto às compras consolidadas, também há casos muito interessantes. As PBMC, empresas norte-americanas sobre as quais lhes falei anteriormente, cobram dos fornecedores uma taxa de administração para incluir os medicamentos nas suas listas. Grandes compras institucionais já foram feitas no Brasil, com a CEME, e no México também se avançou muito. A Colômbia tem casos interessantes que são consórcios não-públicos, ou seja, consórcios autônomos de hospitais para fazer compras no atacado e conseguir, assim, reduzir muito os preços. Em relação ao controle da propaganda, na França, por exemplo, há um imposto de 9% sobre os gastos com publicidade, definidos em sentido amplo, além de restrições sobre determinadas práticas. A exceção é para a publicidade que não inclui o nome de marca ou a publicidade [FALHA NA GRAVAÇÃO] a bula, o prospecto médico. O sistema inglês é o mais sofisticado de todos os que conheço, exigindo prestação de contas por parte da indústria. É feito um controle para que a indústria não gaste em propaganda mais de 7% no caso das grandes empresas e 15%, no caso de pequenas e médias empresas. No que diz respeito à flexibilização de patentes, encontrei referências na literatura sobre três países que conseguiram prazos de vigência menores que os tradicionais 20 anos, a saber, Chile, Indonésia e China. Em relação às políticas de contenção de preços também há várias alternativas, como a fixação baseada nos custos e a fixação baseada nas margens de lucro dos laboratórios. Na fixação baseada nos custos, em geral distingue-se a fixação de um preço de venda ao público e a de um preço para o financiamento coletivo. Há países que não fixam um preço de venda ao público, mas estabelecem o limite máximo a ser pago pela seguridade social, que vale como preço de referência. Nos instrumentos baseados nos lucros e nos ganhos em geral, o que se controla é o nível de rentabilidade das empresas, o que exige um nível de informação muito complexo. Nesse sentido, a experiência inglesa é um exemplo: o preço é regulado com base na análise e controle da rentabilidade global das empresas, a partir de um relatório financeiro anual apresentado pelos laboratórios, junto com uma previsão anual de custos e ganhos. Em relação aos preços de referência, há muitos critérios. Um é comparar com alternativas terapêuticas no próprio mercado do país, outro é comparar com outros países. Vamos ver experiências relacionadas a cada caso. As estratégias que têm sido utilizadas nesse sentido são as seguintes: autorizar o registro dos medicamentos que não são inovadores – ou seja, que são repetidos – apenas com preço 10% menor que o dos produtos já existentes no mercado. Uma outra possibilidade é dar o registro do medicamento com fixação de um preço em relação, por exemplo, ao preço médio da região – nesse caso, dos países do Mercosul. Vocês, brasileiros, se se comparassem com a Argentina sairiam perdendo, à exceção do Lexotan e da Aspirina Bayer. Se compararem os preços brasileiros com os de países como o Chile, Uruguai ou Paraguai, eles têm preços muito menores. Outra questão muito interessante é o estabelecimento de preços diferenciados por volume de vendas. Estabelece-se um preço top [MÁXIMO?] até uma quantidade determinada de unidades de medicamento à venda. Quando o laboratório vende mais do que isso, ele é obrigado a fazer um abatimento nesse preço. Em geral são acordos negociados e não obrigações ou normas. Uma outra questão muito interessante e relacionada à Inglaterra é a exigência de desempenho. O setor dos medicamentos envolve, por um lado, uma área muito ativa da economia, com muito valor acrescido, que gera muitos empregos, muitos investimentos e exportações em alguns países. Assim, se esses fatos influem nos preços, a Inglaterra exige que o laboratório preste contas de seu desempenho e de sua contribuição para a economia do país em seu conjunto, em relação a exportações, níveis de emprego, investimentos em P&D, etc., para autorizar um preço determinado. Vamos ver agora países que fazem controle de preços. Os dados que estou apresentando são tirados da literatura e este é um problema que têm os pesquisadores: sempre temos que esperar a publicação que, em geral, demora a sair, cada vez menos, mas demora. Talvez nem todos estejam atualizados mas, como experiência concreta, são válidos. Bélgica, Espanha, França, Grécia, Irlanda, Itália e Portugal têm sistemas de controle total e, além disso, têm outra fase de aprovação do preço para financiamento público. A Inglaterra, como eu já disse, tem o sistema mais sofisticado, porque avalia a rentabilidade do setor e exige uma prestação de contas muito detalhada, fixando níveis de custo, níveis de rentabilidade e a estrutura de custos admitida para a produção de medicamentos. Como exemplos de países que adotaram preços de referência, temos a Alemanha, que desde 1989 os incorporou por categoria terapêutica. Até 1994, esses preços de referência abrangiam a metade do consumo dos medicamentos no país. A Holanda incorporou preços de referência para produtos substituíveis em 1991. Vamos ver, nesses dias, como vem evoluindo essa política, assim como a da Dinamarca, que considerava a média dos produtos mais baratos em cada grupo terapêutico, cobrindo, até 1993, 20% do total do consumo. O preço de referência também é utilizado na Austrália, Noruega e Suécia. Continuando com as experiências de controle de preços, a fixação de um preço menor para um medicamento não-inovador, ou seja, uma cópia, me parece interessante. Na França e na Suécia, por exemplo, adotou-se um preço 10% menor. São diversas as experiências em termos de fixação de preços por meio de comparações internacionais. Na Itália eram considerados os quatro maiores produtores da Europa. A Espanha escolhia o preço mais barato da Comunidade Econômica Européia. A negociação de um preço menor quando a indústria ultrapassa um determinado volume de vendas foi adotada pela França. Outra experiência muito interessante, feita na Argentina, foram os acordos com a indústria, pactos dentro da própria indústria para o congelamento de preços. São questões sempre muito duvidosas porque a indústria diz que mantém sempre o mesmo preço, mas se você considerar o gasto em medicamentos, ou seja, o faturamento dos laboratórios – que é o único que se pode medir facilmente –, em consultorias internacionais [FALHA NA GRAVAÇÃO] e a quantidade de unidades vendidas e você considera o quociente, ou seja, pega um preço médio [FALHA NA GRAVAÇÃO]. Por esse lado, observa-se que mesmo que a indústria diga que congelou os preços, eles continuam subindo porque, em primeiro lugar, há produtos novos. Na Argentina esses produtos novos são lançados com preços 260% acima do preço médio vigente no mercado. Em segundo lugar, há as pseudo-inovações, versões dos mesmos medicamentos, com pequenas modificações, como aquelas versões “plus”, “composto”, “forte”, etc. Embora o laboratório afirme que não é o mesmo produto, na verdade a variação é muito pequena. Uma outra questão que também afeta muito o consumo do medicamento é a variação nos tamanhos da embalagem. Na Argentina, é impressionante. O custo da dose unitária diminui, mas o gasto das pessoas tende a aumentar, porque embalagens com 30 unidades, por exemplo, são retiradas do mercado, obrigando o usuário a gastar mais dinheiro comprando um frasco com 90 unidades. Países que fazem exigência de desempenho às indústrias são a França, Bélgica, Espanha, Inglaterra e Itália. O controle mais forte é provavelmente o da Inglaterra, que considera variáveis como níveis de emprego, investimentos e níveis de exportação. No que diz respeito ao registro, tradicionalmente a autorização para que um produto possa ingressar no mercado é centrada em questões de qualidade e eficácia. Desde 1993 a Austrália vem exigindo avaliação do custo-efetividade dos produtos. O Canadá e a Inglaterra a seguiram na incorporação de critérios econômicos no registro dos medicamentos. Mas, como eu comentei antes, essa incorporação traz dificuldades. Houve um Congresso em Calcutá, no ano passado, para discutir a viabilidade da incorporação de ferramentas de farmacoeconomia nos países em desenvolvimento. A indústria tem avançado por sua própria conta, assim como também o setor privado financiador, as distribuidoras, os planos de saúde, etc. Outra forte tendência que eu gostaria de ressaltar é a da incorporação de novos órgãos de governo, órgãos mais ativos e com novos papéis na regulação. Na França, o relatório Webber propôs a criação do “Haut Comité de Médicament”. Na Inglaterra criou-se o “Pharmaceutical Price Regulation Scheme”, um comitê muito forte que chega a exigir prestações de contas dos laboratórios produtores. A Comunidade Econômica Européia criou uma comissão específica para coordenar a integração dos mercados de medicamentos. O Canadá também avançou muito neste sentido, com um organismo – “Patented Medicine Prices Review Board” – que usa ferramentas importantes, como a comparação do preço do produto com os preços internacionais, comparação com os preços nacionais de alternativas terapêuticas e avaliação do nível de apoio que o próprio governo deu à P&D, que pode ter beneficiado a indústria. Além disso, também considera a estrutura de custos de produção na autorização para o registro. Nos Estados Unidos, em 1993, foi enviada ao Congresso a proposta de criação de um novo organismo inspirado no modelo canadense, o “Prescription Drugs Review Board”. No Brasil foi criada a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, em 1998, com objetivos semelhantes. Na Argentina o novo organismo criado, que já mencionei, não avançou muito nos critérios econômicos mas, sim, nos mecanismos de controle de qualidade. No que diz respeito ao financiamento seletivo, a seletividade tende a crescer, passando das listas negativas às positivas. As negativas dizem quais os produtos que não vão ser financiados; as positivas, o contrário: os produtos que serão financiados. Há muitos avanços nos países da Comunidade Econômica Européia, nesse sentido, com adoção de listas positivas e/ou negativas. Cada vez se utilizam mais instrumentos de avaliação farmacoeconômica na formulação de listas. Nos países da América Latina, a maioria dos planos de seguridade social que financia, utiliza listas. Na Argentina todas as obras sociais e os seguros privados têm listas negativas e apenas as duas maiores obras sociais – o PAMI e o IOMA – têm listas positivas. Também aqui ocorre muito o efeito de demonstração: quando um faz, os outros copiam. Então, o custo de incorporar essa inovação na gestão [FALHA NA GRAVAÇÃO] No que diz respeito ao controle direto de preços, tende-se à fixação baseada nos custos, mas, na verdade, utiliza-se principalmente a fixação de preços para o financiamento coletivo. Ou seja, não se fixam preços de venda ao público mas, apenas os preços para compras institucionais, por seguros de saúde ou pelo Estado. São poucos os países que ainda controlam preços, ou pelo menos são muito menos os países que controlam diretamente os preços de venda ao público. A tendência forte é abandonar a regulamentação dos preços e avançar na negociação. São muitos os países que conseguiram negociar com a indústria reduções ou congelamento de preços, abatimentos a partir de um determinado volume, etc., como já vimos. As políticas dirigidas aos farmacêuticos estão basicamente vinculadas à questão do incentivo econômico que o farmacêutico recebe com a venda do produto. Então, o que determina em grande parte a performance e o gasto em medicamentos é a forma de pagamento ao farmacêutico. A tradicional é uma percentagem fixa sobre o preço, ou seja, o farmacêutico tem uma margem entre 10 e 30% do preço de venda ao público, que é o ganho dele. Esta é a forma mais perversa, porque obviamente leva à substituição de produtos pelos mais caros, já que o farmacêutico não tem incentivo algum para vender o medicamento mais barato. Quando o pagamento é um valor fixo por receita, ou seja, uma quantia fixa independentemente do preço do medicamento, o incentivo para vender o produto mais caro talvez não desapareça, mas pelo menos se reduz. Também há países que adotam percentagens inversamente proporcionais ao preço. Deste modo, o farmacêutico tem uma margem maior, se vender um produto mais barato. Em outros países incorporam-se incentivos diretos do tipo bônus, contribuições à venda de genéricos e de substitutos importados, ou seja, importações paralelas para reduzir o gasto em um determinado produto específico ou numa determinada classe terapêutica de medicamentos. Os planos de saúde americanos adotaram um modelo de incentivos muito eficiente, do tipo “torneio”, em que os farmacêuticos concorrem para ver quem consegue vender mais genéricos ou os medicamentos mais baratos. Fixa-se uma meta e escolhe-se “o farmacêutico do mês”, como faz o McDonald’s com o empregado do mês. Aquele que conseguir vender mais genéricos ou as alternativas mais baratas recebe uma quantia fixa como prêmio. Não é para todos, mas apenas para quem ganhou o concurso do mês, do semestre, do trimestre, etc. Outro esquema muito interessante, pelo menos nos países que têm um sistema de seguro, é o pagamento por capitação, ou seja, por paciente inscrito na farmácia. É o que ocorre, por exemplo, na Holanda, onde há também um adicional pago por receita.. O farmacêutico tem que se preocupar com a assistência farmacêutica ao paciente, porque o paciente pode mudar para uma outra farmácia, fazendo com que o farmacêutico perca esse dinheiro que ele recebe per capita. Há também o pagamento por volume de trabalho. Uma questão importante refere-se à autorização que os farmacêuticos têm para substituir produtos. Não sei como é no Brasil, mas essa é uma autorização muito heterogênea conforme os diversos países. Em alguns, a autorização é limitada, ou seja, o farmacêutico pode substituir em determinados casos; em outros países é necessária a aprovação do médico. Há aqueles que só permitem a substituição em casos de emergência e outros que não permitem nunca. Na Argentina, uma federação de províncias, cada uma delas tem a sua própria legislação. Portanto, quatro províncias permitem a substituição pelo farmacêutico, que pode procurar uma alternativa terapêutica, mais cara ou mais barata, esse é o problema. Mas nas 21 províncias restantes, os farmacêuticos não podem substituir. As estratégias utilizadas para controlar os gastos abrangem, também, o controle das margens de lucro, os ganhos em rentabilidade das drogarias. Alguns países estabelecem um valor fixo por medicamento que os farmacêuticos podem ganhar como a Inglaterra, por exemplo, que tem um valor fixo, mais um valor por cada receita, além de uma percentagem única em alguns medicamentos. Ou seja, existe algum incentivo para indenizar o farmacêutico, em alguns casos. Na Holanda, havia o pagamento de um valor fixo por usuário, como eu falei, um pagamento per capita, mais um valor fixo por medicamento. Na França, as percentagens são decrescentes, ou seja, inversamente proporcionais ao preço do medicamento. A Alemanha também tem esse sistema, em uma faixa determinada. Outras ferramentas são a dispensação fracionada ou fracionamento – em que o farmacêutico é autorizado a vender doses ou quantidades de medicamentos diferentes da embalagem original – e a venda por correio, a qual tem crescido muito com a Internet. Na Bélgica há um esquema muito interessante para evitar que os farmacêuticos fiquem com estoques de medicamentos muito maiores: há uma regulamentação que exige que na venda das doses, eles possam incorporar quantidades maiores. Na maioria dos países que tem o fracionamento, ele é muito restrito. Os Estados Unidos são um caso paradigmático, nesse sentido, pois em geral é muito difícil comprar na farmácia uma quantidade de medicamentos superior à prescrição médica. Na maioria dos países da América Latina não existe esse instrumento e, quando existe, é sem controle nenhum. A questão da venda de medicamentos por correio obviamente reduziu custos, porém prejudicando os farmacêuticos, um dos elos intermediários. Há casos em que os pacientes – especialmente de doenças crônicas – compram os produtos diretamente dos laboratórios ou das distribuidoras. São muitos os países que permitem a importação direta por portadores de doenças crônicas e a Internet vem facilitando muito essa compra direta por parte do paciente, ao permitir reduzir um pouco a assimetria de informações. Nós estamos estimando agora qual seria o custo de um seguro de saúde para doenças catastróficas – doenças que têm muito baixa prevalência, mas um custo muito alto. Quando avaliamos o custo do tratamento dessas doenças, vemos uma diferença importantíssima entre o custo da droga comprada no mercado local e a importação direta do produtor, que geralmente é americano ou europeu. Por outro lado, – e a OMS e a OPAS estão muito ativas nesse sentido –, a Internet também introduz um conjunto de riscos grandes e precisa de alguma regulação e um controle muito maior. Nos Estados Unidos, os doentes crônicos podem comprar pelo correio medicamentos para três meses com uma única receita. A Holanda também incorporou a venda pelo correio e incentiva essa prática. Vejamos, agora, os instrumentos de políticas dirigidas aos médicos. É fundamental conseguir aliados na classe médica, para qualquer política de medicamentos. O que se tem feito geralmente é o controle das prescrições, que na Argentina chamamos auditoria, e fixação de limites. Os avanços com maior potencial, mas ainda tímidos, são relativos à informação e à formação profissional. No que diz respeito ao controle de prescrição, um dos modelos é estabelecer um limite global para o gasto em medicamentos no país, no setor, médico ou região. Outro modelo, muito mais rigoroso, é o das referências médicas. É quando se fazem protocolos, guias de atendimento para cada patologia e se incluem critérios com alguma avaliação farmacoeconômica para a prescrição, de modo que se tente começar o tratamento pelos medicamentos mais baratos. Uma metodologia que tem crescido muito nos últimos anos é a DUR, Drug Utilization Research, mecanismos de monitoramento da utilização de medicamentos muito interessantes. É um sistema de informações que permite fazer o registro de cada receita que o médico faz e que chega à farmácia. Na farmácia, então, são registrados o paciente, a receita, o medicamento vendido e o preço de venda. Assim, o financiador institucional – no caso, os seguros – tem uma base de dados muito interessante para saber se esse paciente consome demais, se esse médico prescreve mais desse medicamento do que outro, etc. Facilmente se pode comparar pela média, detectando-se e controlando rapidamente desvios e erros. Em alguns países, além de falar com os médicos, há medidas punitivas rigorosas. Na América Latina, eu me inteirei recentemente – através de uma publicação da Fundação Oswaldo Cruz –, que a Costa Rica avançou muito na utilização desse sistema, apenas com informações. Ou seja, são detectados os casos dos médicos que se afastam muito da utilização média de medicamentos e eles são notificados por uma carta muito simpática, muito respeitosa e sem castigos. A estratégia de informação busca basicamente desenvolver mecanismos de informações aos médicos, alternativas às já existentes, que são as da indústria. Consistem basicamente em não apenas sensibilizar, mas também informar diretamente na faculdade, ao médico, sobre a importância de se considerar critérios de epidemiologia e farmacoeconomia na utilização e na prescrição dos medicamentos. Vejamos alguns exemplos concretos. Entre os países que estabelecem limite global, o mais interessante é provavelmente a Alemanha, que tem um sistema de seguro social que dá cobertura à população e que faz contratos de risco com associações de médicos, estabelecendo um orçamento global para ser gasto em medicamentos em cada região. Se a associação, ou seja, os prestadores referidos a essa associação, prescrever acima do orçamento global, a diferença a mais é deduzida do pagamento dos médicos. Portanto, há um incentivo forte para eles não ultrapassarem o orçamento. Na Inglaterra, com a reforma da década passada, quando se adotou um sistema de concorrência dentro do setor público, e alguns GPs – médicos generalistas – passaram a ser administradores de fundos e compradores de serviços, eles passaram também a ser responsáveis pela compra de medicamentos. Isso retrocedeu um pouco agora. Na Irlanda, quando há sobras em relação ao limite de gastos estabelecido por região, o valor excedente é distribuído entre os médicos; ou seja, há um incentivo econômico para não ultrapassar o limite. Mas o mais interessante nesse sistema é que o incentivo é coletivo. Na Holanda existe também um mecanismo similar àquele da Alemanha. São fixados orçamentos anuais e quando são ultrapassados, o excedente é deduzido dos pagamentos dos profissionais. O sistema de protocolos, procedimentos e atendimentos mudou muito nos últimos anos. A França incorporou esse sistema de referências médicas, associando-o a mecanismos de incentivos econômicos. O médico que se afasta muito da média ou que não segue o protocolo – o procedimento médico previamente estabelecido –, pode até ser descredenciado da seguridade social. Nos Estados Unidos, as próprias distribuidoras fazem os protocolos, estabelecendo os medicamentos de 1ª, 2ª e 3ª escolha para os tratamentos, utilizando critérios de custo. Esse sistema de pesquisa e supervisão na utilização dos medicamentos existe em outros países da Europa, como Dinamarca e Inglaterra, além do caso da Costa Rica, que já mencionei. No que diz respeito aos médicos, a Espanha também controla. Eles têm um sistema de auditoria e os médicos que ficam em 25% acima da média de prescrição têm seus pagamentos reduzidos. Nos Estados Unidos também se adotou esse sistema e, em alguns casos, os próprios pacientes são notificados de que estão fazendo uma utilização acima da média ou não indicada. Sistemas assim exigem um sistema de informações que permita informatizar cada receita e capturá-la na farmácia. É um sistema sofisticado. Na Argentina já há uma rede de farmácias que faz isso e vende serviços, ou seja, há uma consultora que trabalha com uma rede de farmácias e vende os serviços às obras sociais, nossos seguros sociais de saúde. Queria lhes falar também das experiências sobre informações. Vários países começaram a desenvolver, a partir do setor público ou das seguradoras de saúde, fichas de informações médicas sobre utilização de medicamentos, que são distribuídas entre os médicos. Já falei do caso da Costa Rica, que também tem um sistema de controle. Na Argentina estamos tentando incorporar mecanismos para reduzir a assimetria de informações no mercado de saúde e, em particular, nesse mercado de medicamentos. Fizemos algumas pesquisas com os médicos e, por exemplo, numa amostra de 500 médicos de diferentes especialidades muito concentrada – não uma amostra probabilística bem calculada – observamos que eles prescrevem, em média, entre 15 e 30 medicamentos apenas e só conhecem os preços dos medicamentos que estão prescrevendo em 3% dos casos. Portanto, o simples fato de informar ao médico o preço do tratamento que ele está prescrevendo, não apenas o preço do medicamento, já é importante. A Confederação Médica da República da Argentina avaliou o custo de algumas doenças e a sua variação segundo as diferentes alternativas terapêuticas, uma informação muito interessante. Agora, a Secretaria de Indústria e Comércio incluiu no seu website a comparação dos preços, ou seja, a listagem dos preços dos medicamentos por grupo, por classe, por diferentes categorias, para que as pessoas possam fazer sua própria comparação. No Wall Street Journal norte-americano são publicados, de vez em quando, suplementos especiais dedicados aos mercados de saúde, com pesquisas muito interessantes sobre o custo do tratamento de uma mesma doença com diferentes alternativas terapêuticas, os preços de um mesmo medicamento em diferentes farmácias, mecanismos alternativos existentes, etc. Ou seja, eles dão orientação diretamente ao usuário sobre como reduzir o custo do seu próprio tratamento. Nesse campo de informação, também é muito importante a experiência com os pacientes, como vamos ver a seguir. Não conheço casos inovadores no que diz respeito à formação dos médicos, pode ser que existam, mas eu não encontrei na bibliografia. O mecanismo mais tradicional e mais utilizado com os usuários é o co-pagamento, ou seja, o estabelecimento de uma margem, um volume ou uma percentagem do custo ou do preço do medicamento a ser pago pelo paciente. Em alguns países, o paciente paga tudo. Em outros, muitos pacientes contam com alguma cobertura ou financiamento de um seguro. Em geral, tratamentos hospitalares não são pagos pelo paciente, mas no nível ambulatorial o problema de acesso é grande, porque está relacionado diretamente ao pagamento por parte do paciente. Nesse caso, também, a questão é muito similar àquela do farmacêutico: há um incentivo econômico, uma porcentagem fixa. O mecanismo mais comum e o mais simples de adotar é o paciente pagar uma porcentagem que é, em média, 60% do preço. Mas, existem casos em que se estabelece um preço de referência e este é pago pelo financiador institucional. Se o paciente exigir ou preferir uma alternativa terapêutica mais cara, ou se comprar o produto por um preço maior em uma drogaria, ele deverá complementar aquele valor. Também há políticas mais ativas que estabelecem diferenças nos níveis do copagamento. Por exemplo, se se busca estimular a substituição por genéricos ou por alternativas mais baratas, para estas a cobertura do financiamento institucional é muito maior. Por outro lado, em muitos países e em alguns casos, a população não tem acesso à cobertura em geral; há casos também, até em países que têm seguridade social, em que o paciente paga tudo. Em geral, os medicamentos de venda livre não são financiados, como infelizmente é o caso dos medicamentos contra a queda de cabelos. Voltando à informação, há também a intenção de gerar mecanismos de informação alternativos aos gerados pela indústria, ou seja, a propaganda ou publicidade médica. Muita coisa tem sido lançada, mas até agora o impacto não me parece ser significativo. Há publicações como aquela que já comentei com vocês [do Wall Street Journal], há muitos websites das HMO – que são os planos de saúde americanos –, que fornecem ao paciente informações sobre custo de medicamentos. Muitas ONGs têm desenvolvido guias para auxiliar os usuários na avaliação das alternativas terapêuticas prescritas. Na Argentina estamos tentando agora fazer um manual do usuário de medicamentos, aliás, um manual do usuário dos serviços de saúde e dos bens de saúde em geral, como medicamentos e tecnologia médica. Para surpresa nossa, nós que achávamos que o mercado dos medicamentos seria um dos mercados mais fechados e mais difíceis, ao compararmos com o resto dos mercados da saúde, vimos que é a transparência e a competitividade absolutas. Não sei como é no Brasil, mas para nós é impossível saber quanto paga cada plano de saúde por uma simples consulta médica. Mas, sim, sabemos quanto eles pagam pelo medicamento. Ou seja, o mercado dos medicamentos ainda é mais transparente e tem menos assimetria de informações que os mercados do serviços médicos em geral. Também é interessante ver, no caso dos co-pagamentos, os níveis de pagamento existentes em diferentes países. Vejamos experiências concretas. Na Inglaterra existe uma quantia fixa, por quadrimestre ou por ano. Ou seja, o paciente tem autorização para ter um determinado gasto; acima desse gasto, ele tem que pagar. Se ele ficar abaixo desse nível, não paga nada. Na Irlanda, há casos particulares onde para níveis inferiores de receita, há uma margem maior, ou seja, o financiamento dos medicamentos é utilizado como um mecanismo de redistribuição muito mais ativo. No meu país, pelo menos entre os bens que compõem a cesta básica, os medicamentos são os que têm financiamentos mais agressivos. Não sei se ocorre o mesmo em todos os países, mas nós conseguimos comprovar isso através de uma pesquisa por amostragem domiciliar feita em 97. Outra particularidade que há na Argentina – e que eu já vi também em uma pesquisa similar da Comunidade Econômica Européia – é que o medicamento é o bem que tem maior dispersão de preços, ou seja, numa mesma classe terapêutica, há uma grande variedade de preços. Nenhum outro bem apresenta uma variação tão grande de preços entre produtos relativamente comparáveis. Uma porcentagem fixa de co-pagamento quase todos os sistemas de seguros sociais tradicionais adotam. A Alemanha tem, a Argentina também. Nós incorporamos preço de referência dos países que avançaram nesse sentido, ou seja, estabelecemos um limite do que o seguro vai cobrir para o paciente. Holanda, Dinamarca, Austrália, Noruega e Suécia também o fazem. Vários países, tais como a Dinamarca, França Grécia, Itália, Portugal e Bélgica, pagam quantias variáveis, ou seja, estabeleceram não um modelo igual para todos, e não dependendo do tipo de medicamento. Os casos em que o paciente paga o custo total, como já mencionei, são basicamente relativos aos medicamentos de venda livre e alguns medicamentos com eficácia terapêutica não comprovada de forma rigorosa ou pelo menos não muito alta, como os medicamentos contra queda de cabelos. Queria lhes mostrar, simplesmente a título de ilustração, para o ano de 94, os modos de co-pagamento existentes em um conjunto grande de países da Comunidade Econômica Européia. Na Bélgica há diferentes níveis, de acordo com os tipos de medicamentos. Na Alemanha há uma taxa fixa, depois a maioria tem uma margem diferente. O caso mais interessante, a meu ver, foi o da Irlanda, em que se tem uma quantia determinada por trimestre e um subsídio para as famílias que têm renda familiar inferior à média, em um nível determinado pelo governo. Em geral, a porcentagem do preço do medicamento paga pelo paciente é muito pequena, principalmente se comparada à situação da América Latina. Como eu disse no início, é muito difícil avaliar o impacto dessas medidas no controle dos preços e no controle dos gastos dos medicamentos. Mas, para encerrar a apresentação, eu gostaria de mostrar os resultados de uma oficina de trabalho que a OPAS convocou no mês de fevereiro, aqui em Brasília, para avaliar diferentes alternativas. Um grupo de especialistas avaliou o impacto para cada alternativa, em três aspectos: gastos e preços, no uso racional e na qualidade dos medicamentos. Antes, porém, eu gostaria de fazer um comentário. Eu organizei essa apresentação com ênfase nas ferramentas, nos instrumentos concretos. Há duas políticas de medicamentos que são muito mais do que ferramentas concretas e que, portanto, não são comparáveis com essas que eu mencionei. A primeira é a política de genéricos, porque abrange todos os atores ao mesmo tempo. Não há política de genéricos efetiva que não toque de alguma forma nos laboratórios, ou seja, na produção, e na demanda – financiadores, prescritores, médicos e pacientes. Portanto, o genérico e a estratégia do uso racional em geral, é muito mais do que uma política, é uma consignação maior abrangendo muitas dessas políticas. Todas as ferramentas podem se combinar para apoiar as políticas, mas, nessa avaliação nós consideramos obviamente em primeiro lugar a política de genéricos, porque é a mais abrangente de todas. Consideramos também o financiamento seletivo dos medicamentos e, a seguir, a política de compra consolidada, que é agregar as compras para obter preços menores. O controle da prescrição dos médicos, os mecanismos de informação alternativos, ou seja, aos médicos e aos pacientes, mecanismos alternativos aos fornecidos pela indústria. A formação dos profissionais – médicos e farmacêuticos – e o controle direto de preços. Através da avaliação feita por esse grupo de especialistas que trabalhou aqui na OPAS em fevereiro, vemos o impacto que essas diferentes políticas teriam. Eu já tinha feito uma pesquisa em relação à Argentina e aqui referendamos de alguma maneira o caso brasileiro. Para os genéricos, esperaríamos no mínimo um impacto alto; as listas, de médio para alto; as compras consolidadas e o controle da prescrição também de médio a alto impacto. A seguir, com impacto médio, itens como a informação e controle direto dos preços. No uso racional, é claro que os genéricos têm que ter um impacto alto, como também a qualidade e as listas. As compras consolidadas causam impacto um pouco menor. O controle da prescrição talvez cause impacto um pouco maior que as compras consolidadas, porque sempre abrange o prescritor e, provavelmente, se se implementa um sistema mais sofisticado, o próprio paciente. Obviamente, o uso racional é muito apoiado pela informação e pela formação, mas não pelo controle de preços. No que diz respeito à qualidade, os genéricos e as listas têm impacto alto. É difícil avaliar esse impacto no caso das compras consolidadas, assim como no controle de prescrição. Quanto mais informação e quanto melhor a formação dos profissionais, mais fácil é avançar também na qualidade, pelo menos, do tratamento. Quanto ao controle direto dos preços, é mais difícil ter um impacto positivo sobre a qualidade. Também vimos umas outras políticas com um impacto um pouco menor, que eu quero lhes apresentar, para concluir. Em primeiro lugar, os níveis de co-pagamento. Em segundo, os controles das margens de lucros, que podem referir-se aos laboratórios e até aos farmacêuticos. O fracionamento, ou seja, a possibilidade do farmacêutico dispensar o medicamento em doses ou em quantidades diferentes das que vêm na embalagem original. O controle da publicidade e o controle do registro. No que diz respeito aos gastos e preços, esses estudos têm um impacto provavelmente menor. Já no uso racional, o controle da qualidade, o controle do registro e o fracionamento permitiriam avançar muito. Na qualidade, não vemos como o copagamento e o controle das margens possam ter impacto significativo. A dispensação fracionada pode até facilitar, mas o controle do registro é, sem dúvida, a medida de maior impacto.