Sistematização da Assistência de Enfermagem para prevenção de

Propaganda
106
Saúde Coletiva em Debate, 2(1), 20-29, dez. 2012
Sistematização da Assistência de Enfermagem para prevenção de Insuficiência Renal
Aguda na Unidade de Terapia Intensiva
Systematization of nursing assistance to prevent Acute Renal Failure in Intensive Care
Unit
Deyne Jaciane dos Santos Gonçalves1; Loyane Gomes Alves1; Ângela Valéria Xavier de
França2; Breno Gusmão Ferraz1*
1
Faculdade de Integração do Sertão, Serra Talhada-PE; 2Universidade Estadual da Paraíba,
Campina Grande-PB.
Resumo: O comprometimento da função renal em pacientes criticamente enfermos é um
evento comum que resulta de um amplo espectro de etiologias e que ocorre em diferentes
situações clínicas, sendo um dos principais fatores de mau prognóstico em relação à evolução
assistencial, com dados na literatura enfatizando que o melhor tratamento é a prevenção. A
assistência de enfermagem contribui para a promoção, prevenção, recuperação e reabilitação
da saúde, por meio da identificação dos riscos e problemas de saúde a serem solucionados. O
objetivo desta pesquisa foi descrever a sistematização da assistência de enfermagem para a
prevenção da Insuficiência Renal Aguda nos pacientes em tratamento intensivo. Utilizando
um método de estudo de revisão de literatura, considerou-se vinte e três artigos nacionais e
originais do período compreendido entre 2003 e 2011. Conclui-se, portanto, que organizar e
sistematizar ações são inerentes ao ser humano para que metas/resultados possam ser
alcançados, especialmente quanto aos profissionais de enfermagem, para uma prática
sistematizada e voltada à prevenção e atenção aos pacientes potencialmente em risco.
Palavras-chave: Assistência. Prevenção. Insuficiência Renal. Terapia Intensiva.
Abstract: The loss of renal function in critical patients is a common event that results in a
large spectrum of etiologies, and occurs in different clinical situations, being one of the most
important causes of a poor prognosis considering the assistance evolution, and because of that
the better treatment is prevention. The nursing assistance contributes to health promotion,
prevention, recovery and rehabilitation, by the identification of health risks and problems that
need to be solved. The aim of this research was describe the systematization of nursing
assistance to prevent the acute renal failure on patients at intensive treatment. Using the
literature review method, were considered 23 articles, nationals and originals, from 2003 to
2011. So, it is possible to check that organize and systematize are activities associated to the
human being, to get goals in the future, especially nursing professionals, for a better practice
focused to prevention and attention to patients potentially in risk.
Key words: Assistance. Prevention. Renal Failure. Intensive Treatment.
*Autor para correspondência: Breno Gusmão Ferraz. João Luiz de Melo, 2110, Bairro: Tancredo Neves. CEP:
56909-205 Serra Talhada-PE. Brasil. E-mail: [email protected]
107
Saúde Coletiva em Debate, 2(1), 20-29, dez. 2012
INTRODUÇÃO
A Insuficiência Renal Aguda (IRA)
é definida como a redução aguda da função
renal em horas ou dias. Refere-se
principalmente a diminuição do ritmo de
filtração glomerular e/ou do volume
urinário,
porém,
ocorrem
também
distúrbios no controle do equilíbrio
hidroeletrolítico e ácido-básico. Causada
pela insuficiência da circulação renal e/ou
por disfunção glomerular e tubular a IRA
pode ocorrer em qualquer faixa etária e
sexo, assim como em todos os setores de
um hospital e principalmente nos pacientes
gravemente enfermos, que estão expostos a
inúmeras condições que podem resultar em
comprometimento renal, provenientes de
fatores hemodinâmicos e nefrotóxicos
(GARCIA et al., 2005; SMELTZER;
BARE,
2005;
SOCIEDADE
BRASILEIRA DE NEFROLOGIA, 2007).
As causas de Insuficiência Renal
Aguda são tradicionalmente classificadas
pela localização da anatomia renal que
afetam. Assim, IRA pode ser classificada
em pré-renal, intra-renal e pós-renal. A
pré-renal pode ocorrer por qualquer razão
seja traumática ou sepse, devido a uma
hipovolemia ou hipotensão resultando em
uma hipoperfusão, prejudicando assim a
filtração glomerular. A intra-renal, também
conhecida como Necrose Tubular Aguda
(NTA),
é
causada
por
doença
parenquimatosa e se constitui no tipo mais
frequente, ocorrendo devido a lesões
recentes nos rins, que podem ser por
isquemias, por uso de anestésicos,
antibióticos, contrastes radiológicos e
nefrites. Já a pós-renal se desenvolve por
obstrução do fluxo urinário, podendo ser
causada por cálculos urinários, obstrução
bilateral de ureteres, tumores, hipertrofia
prostática,
coágulos
e
hemorragia
retroperitoneal, sendo uma das causas
menos frequentes da IRA (BERNARDINA
et al., 2008).
O diagnóstico precoce e a
instituição de medidas terapêuticas
adequadas a cada situação clínica podem
alterar o curso e a gravidade do
envolvimento
renal,
reduzindo
a
morbimortalidade
do
paciente.
O
enfermeiro
presta
sua
assistência,
melhorando a qualidade de vida,
identificando problemas de saúde e
subsidiando ações de assistência de
enfermagem que possam contribuir para a
promoção, prevenção, recuperação e
reabilitação da saúde, fornecendo um
cuidado integral e individualizado ao
paciente, priorizando as suas necessidades,
possibilitando assim a continuidade do
cuidado
(BORDINHAO,
2010;
BRESOLIN;
BANDEIRA;
TOPOROVSKI, 2008).
Muitos são os mecanismos
fisiopatológicos
envolvidos
no
desenvolvimento
e
progressão
do
comprometimento da função renal e seu
entendimento
pode,
em
várias
circunstâncias, ajudar a prevenir a
instalação da IRA. Existem inúmeras
definições para seu diagnóstico clínico e
bioquímico, o que tem sido motivo de
discussão, pois, sem padronização não é
possível
delinear
adequadamente
incidência, história natural, prevenção e
tratamento.
Vários
critérios
foram
utilizados para o diagnóstico da disfunção
renal, mas um dos mais aceitos é o sistema
RIFLE que propõe três categorias com
gravidade crescente: R (risco), I (injúria), F
(falência) e duas variáveis prognósticas: L
(do inglês Loss) para perda da função renal
e E (do inglês End stage) para insuficiência
renal terminal, em estágio crônico
(BRESOLIN;
BANDEIRA;
TOPOROVSKI, 2008; LAGE, 2005).
A
Sociedade
Brasileira
de
Nefrologia (2007) reforça a necessidade de
prevenção da IRA, como a opção
terapêutica mais eficaz e a atenção às
características da doença crítica como um
todo, ao invés da simples preocupação com
os aspectos exclusivamente nefrológicos
do tratamento. Desse modo, a Unidade de
Terapia Intensiva (UTI), área hospitalar
que
dispõe
de
atendimento
multiprofissional
e
interdisciplinar,
108
Saúde Coletiva em Debate, 2(1), 20-29, dez. 2012
destinada a receber e atender pacientes em
estado grave, também busca prevenir
situações indesejadas no decorrer da
assistência, no intuito de promover a
qualidade do cuidado intensivo desejado, a
todos os seus pacientes (SILVA, 2011).
De acordo com Pinto et al. (2009),
a ocorrência de Insuficiência Renal Aguda
em pacientes críticos é um dos principais
fatores de mau prognóstico em relação à
sua evolução, notadamente em Unidades
de Terapia Intensiva, a sua prevalência é,
em média, de 20% a 30% dos casos.
Dependendo
da
gravidade
do
acometimento renal, a doença pode evoluir
para severos estados de morbidade e, em
muitos casos, para óbito, podendo chegar a
80% nos pacientes críticos. Neste sentido,
a IRA é uma entidade de grande magnitude
no contexto médico atual, relacionada a
elevado consumo de recursos humanos e
financeiros, com importante impacto na
mortalidade dos pacientes (SILVA, 2007;
SOUZA et al., 2010).
Portanto, o objetivo desta pesquisa
foi descrever a sistematização da
assistência de enfermagem para a
prevenção da Insuficiência Renal Aguda
nos pacientes em tratamento intensivo,
bem como reconhecer os fatores que
interferem na qualidade desta assistência.
PROCEDIMENTO METODOLÓGICO
Tratou-se de um estudo de revisão
de literatura com fundamentação teórica
situando o trabalho dentro da grande área
de pesquisa da qual faz parte,
contextualizando-o, e tendo como critérios
de inclusão: a temática da sistematização
da assistência de enfermagem, prevenção
de Insuficiência Renal Aguda na Unidade
de Terapia Intensiva e Processo de
Enfermagem, adequados ao objetivo do
estudo, e como critérios de exclusão:
Insuficiência Renal Crônica, Tratamento
de diálise e hemodiálise, não foram
aplicados ao estudo.
Os dados foram coletados através
do site SciELO (Cientific Electronic
Library Online), LILACS (Literatura
Latino-americana e do Caribe em Ciências
da Saúde) e Jornal Brasileiro de
Nefrologia, sendo encontrados 47 artigos
científicos, além de 5 livros. A pesquisa
considerou artigos nacionais e originais do
período de 2003 a 2011, onde foram
utilizados 23 artigos e 2 livros que se
identificaram com os critérios de inclusão
e com o objetivo do estudo.
Com os artigos em mãos, deu-se
início a um processo de análise e síntese
dos mesmos, com leitura exploratória para
reconhecimento
dos
artigos
que
interessavam à pesquisa, realizado uma
leitura seletiva dos que seriam utilizados
no
estudo,
leitura
analítica
dos
selecionados e, por último, uma leitura
interpretativa com o intuito de conferir o
significado mais amplo aos resultados
obtidos com a leitura analítica.
RESULTADOS
E
DISCUSSÃO
APRIMORADA NA LITERATURA
Fatores de risco da Insuficiência Renal
Aguda
De acordo com Domingos e Serra
(2004), o surgimento da nefrologia
confunde-se com a história da humanidade,
onde complicações renais já foram
identificadas em múmias do antigo Egito e
podem ter contribuído para óbitos desses
indivíduos. Atualmente, existem mais de
35 definições na literatura sobre IRA. Na
tentativa de normatização da definição e
classificação da IRA a Acute Dialysis
Quality Initiative (ADQI) desenvolveu o
critério de RIFLE (NUNES et al., 2010).
O envolvimento de múltiplos
fatores de risco resulta na inabilidade dos
rins em exercer suas funções básicas de
excreção e manutenção da homeostase
hidroeletrolítica
do
organismo
(OLIVEIRA; ALVES; BEZERRA, 2009).
A presença de alguns fatores de
risco contribui para o desenvolvimento da
disfunção renal após o uso de drogas
nefrotóxicas. São eles: idade do paciente,
presença de Hipertensão Arterial Sistêmica
109
Saúde Coletiva em Debate, 2(1), 20-29, dez. 2012
(HAS), Diabetes Mellitus (DM), doenças
cardiovasculares, hepatopatias, neoplasias,
sepse e falência de órgãos. A chance de
sobrevida de um paciente com IRA é muito
variável. Isso depende também de fatores
que não estão relacionados à doença renal.
É importante salientar que a falência de
múltiplos
órgãos
determina
pior
prognóstico à medida que aumenta o
número de órgãos envolvidos (PINTO et
al., 2009; PIRES, 2003; SOUZA et al.,
2010).
Epidemiologia da Insuficiência Renal
Aguda na UTI
Realizar
levantamentos
epidemiológicos
com
respeito
à
prevalência das principais complicações
nefrológicas
que
necessitem
de
acompanhamento nas UTIs e também das
mais relevantes doenças de base que
podem evoluir para Insuficiência Renal
pode trazer benefícios tanto às unidades
hospitalares, assim como aos pacientes
acometidos. E dessa forma, permitirá a
criação de programas de sistematização do
atendimento, o que contribuirá para
redução de custos, tempo, e muitas vezes,
da deterioração irreversível das funções
renais (SOUZA et al., 2010).
Estudos demonstram que a
prevalência de IRA em UTI é maior em
indivíduos do sexo masculino e em idosos,
tendo como fatores predisponentes a
hipertensão arterial, cardiopatias e em
alguns casos sepse e choque séptico
(BORDINHÃO, 2010).
Pinto et al. (2009), revela que a
média de idade geralmente é de 56,9 ±
17,3 anos, variando entre 12 e 96 anos, e
que 54% da população é composta por
homens.
As
comorbidades
mais
prevalentes são: Hipertensão em 40%,
hepatopatias em 18%, neoplasia maligna
em
15%,
Insuficiência
Cardíaca
Congestiva (ICC) em 14% e Diabetes
Mellitus em 12%. Um percentual elevado
para sepse (36,5%) e grande parte dos
pacientes apresentam, falência de órgãos
concomitantemente,
sendo:
31%
cardiovascular; 23,5%, respiratória; 11%,
neurológica; 21%, hepática; e 5%,
hematológica.
Pacientes idosos representam 40%
da população e apresentam maior
mortalidade,
maior
número
de
comorbidades e maior tempo de internação
na UTI (antes do diagnóstico de IRA).
Esses
pacientes
apresentam
maior
incidência de IRA em consequência da
diminuição
da
reserva
funcional,
resultando em maior vulnerabilidade a
variações hemodinâmicas e insultos
isquêmicos bem como à agressão por
agentes nefrotóxicos (SILVA, 2007).
Em UTI, 90% dos episódios de
IRA, ocorrem devido à Necrose Tubular
Aguda (NTA) resultante de isquemia renal,
agentes tóxicos ou ambos, constituindo-se
na causa mais comum de IRA nesses
pacientes.
Apesar
da
grande
disponibilidade da evolução da tecnologia,
a mortalidade dos pacientes com IRA em
UTI continua elevada, podendo exceder a
80%, quando coexistir falências de órgãos.
É interessante considerar que estes
pacientes morrem com IRA e não da IRA.
O conceito é importante, pois nos pacientes
críticos as situações adversas representam
fatores de gravidade somados e não a IRA
isolada (LAGE, 2005; PIRES, 2003).
A mortalidade por Insuficiência
Renal é 10 a 20 vezes maior que a da
população geral, mesmo quando ajustada
por idade, sexo, raça e presença de
Diabetes Mellitus, sendo que a doença
cardiovascular é a causa mais comum de
óbito. A IRA também é considerada a
principal causa de morte no mundo, às
quais foram atribuídas 35 milhões de
óbitos em 2005, quase 60% da mortalidade
mundial e 45,9% da carga global de
doenças. Segundo a Organização Mundial
da Saúde, se essa tendência for mantida,
elas deverão responder por 73% dos óbitos
e 60% da carga de doenças crônicas no ano
2020 (OLIVEIRA; ALVES; BEZERRA,
2009).
110
Saúde Coletiva em Debate, 2(1), 20-29, dez. 2012
A importância da Prevenção da IRA
Para a redução do alto índice de
mortalidade, mostra-se necessária a criação
de programas eficazes de prevenção de
IRA, com monitorização clínica cuidadosa,
observando-se adequadamente o controle
do balanço hidroeletrolítico, em especial o
relativo à hipercalemia e hiponatremia,
além da correção de alguns fatores
contribuintes para a piora clínica como, por
exemplo,
presença
de
HAS
ou
hipovolemia.
Assim,
de
forma
simplificada, a prevenção de IRA no
paciente crítico deve considerar: reposição
de fluidos e/ou drogas vasoativas para
evitar hipovolemia e hipotensão arterial;
dose e veículo adequado de antibióticos e
antifúngicos potencialmente nefrotóxicos,
tomando as precauções adequadas com
respeito às prescrições, dosagem e
administração dessas drogas; agentes de
contraste não-iônicos quando indicados,
especialmente no que se refere aos exames
diagnósticos em pacientes de risco (LAGE,
2005; SOUZA et al., 2010).
Medidas
preventivas
também
devem
ser
adotadas
quanto
a
procedimentos de risco, atentando sempre
para manutenção da Pressão Arterial
Média (PAM) acima de 80 mmHg,
oxigenação adequada e não utilização de
diuréticos de alça. A prevenção dos fatores
como: problemas respiratórios, estados de
choque, sepse, uso de drogas nefrotóxicas,
combinado com uma monitorização diária
da função renal no paciente crítico, uma
detecção precoce do risco renal, evitar a
exposição do paciente a fatores como
descompensação
diabética
e/ou
hipertensiva, e uma maior atenção dos
profissionais da saúde a esses pacientes é a
melhor
opção
para
diminuir
as
complicações da IRA e consequentemente
sua mortalidade. A prevenção da lesão
renal começa a partir da identificação dos
pacientes de risco e eliminação, sempre
que possível, dos fatores predisponentes
(BALDI et al., 2005; BRESOLIN;
BANDEIRA; TOPOROVSKI, 2008).
É
necessário
evitar
a
hiperhidratação, pois a IRA é um processo
hipercatabólico e um paciente que não
estiver perdendo cerca de 300 gramas de
peso corporal por dia, quase certamente
está em balanço positivo de água. O
melhor parâmetro para diagnosticar
precocemente a hiperhidratação é a
monitorização
do
peso
diário
(SOCIEDADE
BRASILEIRA
DE
NEFROLOGIA, 2007).
O
acompanhamento
clíniconefrológico, laboratorial e nutricional
desses indivíduos acometidos com
potencial iminência de prognóstico ruim
reduziria os custos dos tratamentos, além
de propiciar melhor qualidade de vida a
esse grupo de pacientes em especial
(SOUZA et al., 2010).
Os pacientes com creatinina
elevada têm maior possibilidade de
desenvolver IRA. A prevenção deve então
considerar a dosagem de creatinina sérica,
já que bioquimicamente, esta doença é
caracterizada
pela
elevação
da
concentração de uréia sanguínea e pelo
aumento da concentração da creatinina
sérica acima de 1,8 mg/dl. Infelizmente,
apesar dos esforços preventivos é comum
que a IRA se instale, especialmente nos
pacientes críticos. Quando isso ocorre é
muito importante estar atento para a piora
progressiva e tentar minimizar sua
evolução (BALDI et al., 2005; LAGE,
2005).
Processo de Enfermagem necessário aos
pacientes
A enfermagem, por meio dos seus
profissionais, pratica os seus cuidados
apoiada num referencial metodológico
denominado Processo de Enfermagem
(PE) que, por sua vez, apoia-se num
modelo científico. Organizar e sistematizar
ações são inerentes ao ser humano para que
metas/resultados possam ser alcançados. A
padronização da assistência prestada por
uma equipe através de normas facilita o
trabalho de forma segura, a qual, por não
111
Saúde Coletiva em Debate, 2(1), 20-29, dez. 2012
poder ser violada, evita maiores exposições
de riscos à saúde do cliente (BARROS,
2009; SILVA, 2011).
O Processo de Enfermagem (PE)
caracteriza-se em três gerações, a primeira
geração é àquela em que o raciocínio
clínico dar-se-á pela identificação de
problemas; a segunda geração do PE está
atrelada ao uso de Classificações de
Diagnósticos (NANDA - North American
Nursing Diagnosis Association), a
utilização
de
Classificações
de
Intervenções (NIC - Nursing Interventions
Classification) pode, ou não, ser adotada
nesta geração; e na terceira geração do PE,
as três classificações necessariamente são
utilizadas:
Diagnósticos,
Resultados
(NOC-Nursing Outcomes Classification) e
Intervenções. Desse modo, conhecer as
classificações, utiliza-las, pesquisa-las e
divulga-las torna-se imperioso no mundo
globalizado, onde evidências científicas
ditam condutas aos profissionais na área de
saúde (BARROS, 2009).
O comprometimento da função
renal em pacientes criticamente enfermos é
um evento comum que resulta de um
amplo espectro de etiologias, e que ocorre
em diferentes situações clínicas. Os sinais
e sintomas desse comprometimento são, na
maioria das vezes, inespecíficos e,
portanto, faz-se necessário alto grau de
suspeita para seu diagnóstico. O
diagnóstico precoce e a instituição
imediata
de
medidas
terapêuticas
adequadas a cada situação clínica podem
alterar o curso e a gravidade do
envolvimento renal e influenciar na
morbimortalidade do paciente. Não há
tratamento específico quando a IRA já está
instalada e um manejo deve ser feito como
em outras causas de Necrose Tubular
Aguda (NTA), visando manter o equilíbrio
hidroeletrolítico e a volemia. O melhor
tratamento é a prevenção, onde hidratação
é a principal ferramenta de prevenção
(BRESOLIN;
BANDEIRA;
TOPOROVSKI, 2008).
O enfermeiro tem um papel
importante no cuidado do paciente com
IRA. Além de direcionar a atenção para o
distúrbio primário do paciente (que pode
ser um fator do desenvolvimento da IRA),
o enfermeiro monitora as possíveis
complicações, participa no tratamento de
emergência, desequilíbrio hidroeletrolítico,
avalia a evolução e a resposta ao
tratamento e fornece apoio físico e
emocional. Além disso, mantém os
familiares informados sob a condição do
paciente, ajuda-os a compreender os
tratamentos e fornece apoio psicológico.
Embora o desenvolvimento da IRA possa
ser o problema mais grave, o enfermeiro
deve continuar a incluir no plano de
cuidado as medidas de enfermagem
indicadas para o distúrbio primário (por
exemplo, queimaduras, choque, trauma,
obstrução do trato urinário) (SMELTZER;
BARE, 2005).
Para Silva (2011), no cotidiano das
atividades práticas nem sempre o
atendimento ocorre com qualidade, de
forma segura, isenta de falhas, quer
justificado pela gravidade das situações,
quer por realizar-se, sem que as condições
necessárias de infraestrutura e de
treinamento sejam adequadas, colocando
em risco o sucesso do atendimento, e
consequentemente, a vida do paciente. Tal
constatação leva a pressupor que a falta de
conhecimento
e
habilidade
dos
profissionais, a falha na organização do
atendimento, assim como a provisão
insuficiente de materiais e equipamentos
necessários para a realização do cuidado
compromete a qualidade da assistência à
saúde dos pacientes que necessitam destes
serviços. De acordo com a OMS Organização Mundial de Saúde (OMS
apud SILVA, 2011) a qualidade é definida
como um conjunto de atributos que inclui
um alto nível de excelência profissional, o
uso eficiente de recursos, o mínimo de
riscos ao paciente e um alto grau de
satisfação por parte dos usuários.
Sistematização da Assistência de
Enfermagem para prevenção de IRA na
UTI
112
Saúde Coletiva em Debate, 2(1), 20-29, dez. 2012
Com intuito de colaborar com
estudos e avaliar a qualidade da assistência
de enfermagem na prevenção da IRA nos
pacientes em tratamento intensivo, é
proposto uma sistematização da assistência
de enfermagem como uma importante
medida da qualidade para que o cuidado do
paciente obtenha um “resultado renal”
(com redução da morbimortalidade)
(PINTO et al., 2009).
Recomenda-se de acordo com as
literaturas um planejamento de ações no
cuidado de enfermagem:

Conscientizar os profissionais de
enfermagem quanto à importância da
qualificação continuada para aumentar os
resultados dos pacientes, através de um
cuidado, baseado no julgamento e
conhecimentos clínicos (SILVA; THOMÉ
2009).

A equipe de enfermagem deve estar
sensibilizada para iniciar um processo de
humanização no atendimento, promovendo
uma interligação técnico-humanista nas
relações enfermeiro-paciente (BEDIN;
RIBEIRO; BARRETO, 2004);

O enfermeiro deve transmitir e
zelar pelo cumprimento de normas
estabelecidas
ou
implantadas
pela
instituição (GAÍVA; SCOCHI, 2004);

Revisar ou até mesmo reformular a
assistência de enfermagem de forma
padronizada aos pacientes, com aplicação
de princípios científicos e abordagens
teóricas, enfatizando o seu aspecto
qualitativo, e seguindo uma metodologia
de assistência, a fim de reduzir as
complicações nos quadros clínicos
(CARVALHO et al., 2008);

Formulação
de
hipóteses
diagnósticas, que serão afirmadas ou
refutadas se as metas/objetivos declarados
forem, ou não, alcançados (BARROS,
2009);

Estar pronto para participar do
tratamento em caso de emergência
(SMELTZER; BARE, 2005);

Observar sinais vitais e parâmetros
(GAÍVA; SCOCHI, 2004);

Diminuir
a
ansiedade,
o
desconforto e a insegurança sentida pelos
pacientes críticos (INABA; SILVA;
TELLES, 2005);

Realizar assepsia, cuidado cutâneo
meticuloso e uma avaliação clínica
criteriosa e regular, orientando sobre a
necessidade de
prevenir processos
infecciosos, pesquisando cuidadosamente a
presença de focos (SMELTZER; BARE,
2005; SOCIEDADE BRASILEIRA DE
NEFROLOGIA, 2007);

Atentar para o período que o
paciente permanece internado, por ser um
fator diretamente relacionado com um
melhor ou pior prognóstico. Períodos
maiores de internações em UTI podem
refletir em atrasos na monitorização e
suporte
hemodinâmicos
adequados,
conferindo
maior
risco
para
desenvolvimento de disfunção de órgãos
(MARTINS, 2008; SOUZA et al., 2010);

Avaliar peso diário, a fim de evitar
hiperhidratação
(SOCIEDADE
BRASILEIRA DE NEFROLOGIA, 2007);

Monitorar os níveis de eletrólitos
séricos dos pacientes e os indicadores
físicos dessas complicações durante todas
as fases do distúrbio (SMELTZER; BARE,
2005);

Monitorar o balanço hídrico com
observação constante do Débito Urinário
(DU) (BALDI et al., 2005);

Reportar imediatamente para o
médico, quando houver indicadores de
deterioração do estado hidroeletrolítico
(SMELTZER; BARE, 2005);

Realizar medidas complementares
de prevenção como: otimização das
condições clínicas do paciente, Pressão
Venosa Central (PVC) e Saturação Venosa
Central de Oxigênio (SvO2), Pressão
Arterial Média (PAM) e oxigenação
tecidual
adequada
(SOCIEDADE
BRASILEIRA DE NEFROLOGIA, 2007);

Obter e implantar práticas que
reduzam as complicações e melhorem o
estado do paciente, como evitar ou tratar
de imediato à febre e a infecção, que
aumentam
a taxa metabólica, o
113
Saúde Coletiva em Debate, 2(1), 20-29, dez. 2012
catabolismo e subsequentemente a
liberação de potássio e acúmulo de
produtos residuais endógenos (uréia e
creatinina) (SMELTZER; BARE, 2005);

Verificar o uso correto das
medicações utilizadas no tratamento
clínico, para evitar doses e medicações
desnecessárias (SOUZA et al., 2010);

Acompanhar e tratar as doenças de
base, como
Insuficiência Cardíaca
descompensada, choque cardiogênico ou
sepse, disfunção hepática, entre outros
(SOUZA et al., 2010);

Oferecer seguimentos psicológicos
para dar aporte no enfrentamento de
doenças ligadas ao estado emocional do
paciente (INABA; SILVA; TELLES,
2005);

Avaliação
da
eficácia
dos
protocolos implantados nos serviços de
saúde, com estudos, pesquisas e
atualizações, na busca de reduzir o risco de
óbito (SILVA, 2006).
Embora muitas das funções dos
enfermeiros sejam devotadas aos aspectos
técnicos do procedimento, as necessidades
psicológicas e as preocupações do paciente
e da família não podem ser ignoradas. É
essencial a avaliação continuada do
paciente para as complicações da IRA e de
sua causa precipitante (SMELTZER;
BARE, 2005).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nessa análise vimos que segundo
os autores, a IRA acomete grande
quantidade de pacientes internados na UTI
e isso poderá ser minimizado a partir da
qualidade da assistência prestada pelos
profissionais de saúde, especialmente os
profissionais de enfermagem com uma
prática sistematizada e voltada para a
prevenção e atenção ao paciente
potencialmente em risco.
Embora o número de estudos
nacionais em relação aos pacientes renais
agudos nas UTIs seja pequeno, essa
revisão pôde demonstrar tanto a incidência
de casos de IRA em UTI que é cada vez
maior, quanto como à qualidade na
assistência de enfermagem pode prevenir o
acometimento de sequelas e riscos para os
pacientes.
É necessário que a utilização da
assistência de enfermagem e da prática
profissional, contribua na aplicação de
ações e de informações científicas com o
objetivo da prevenção, para um processo
que envolve o aprendizado individual e
coletivo, motivador para o estabelecimento
de novas estratégias fundamentadas na
prática e no conhecimento.
REFERÊNCIAS
BALDI, A. L. et al. Mortalidade e
prognóstico específico em pacientes com
Insuficiência Renal Aguada. Revista da
Associação Médica Brasileira, v. 51, n. 6,
p. 318-322, 2005.
BARROS, A. L. B. L. Classificações de
diagnóstico e intervenção de enfermagem:
NANDA-NIC. Revista Acta Paulista de
Enfermagem, n. 22, especial – 70 anos, p.
864-867, 2009.
BEDIN, E.; RIBEIRO, L. B. M.;
BARRETO, R. A. S. S. Humanização da
assistência de enfermagem em centro
cirúrgico.
Revista
Eletrônica
de
Enfermagem, v. 06, n. 03, p. 400-409,
2004. Disponível em: <www.fen.ufg.br>.
Acesso em: 19 out. 2001.
BERNARDINA, L. D. et al. Evolução
clínica de pacientes com insuficiência renal
aguda em unidade de terapia intensiva.
Revista Acta Paulista de Enfermagem,
São Paulo, n. 21, p. 174-178, 2008.
BORDINHÃO, R. C. Processo de
enfermagem em uma Unidade de
Tratamento Intensivo à luz da teoria das
necessidades humanas. 2010. 148p.
Dissertação de Mestrado de PósGraduação em Enfermagem – Escola de
Enfermagem, Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, Porto Alegre.
114
Saúde Coletiva em Debate, 2(1), 20-29, dez. 2012
BRESOLIN, N. L.; BANDEIRA, M. F. S.;
TOPOROVSKI, J. Monitorização da
função renal na Insuficiência Renal Aguda.
In: CRUZ, J.; CRUZ, H. M. M.;
KIRSZTAJN, G. M.; BARROS, R. T.
Atualidades em Nefrologia 10. São
Paulo: Sarvier, 2008. p 77-85
MARTINS, A. F. Avaliação de
marcadores de inflamação em pacientes
com Lesão Renal Aguda em Unidade de
Terapia Intensiva. 2008. 115p. Tese de
Doutor em Ciências – Faculdade de
Medicina, Universidade de São Paulo, São
Paulo.
CARVALHO, E. C. et al. Relação entre a
coleta de dados, diagnóstico e
prescrições de enfermagem a pacientes
adultos de uma Unidade de Terapia
Intensiva. 2008. 12p. Projeto para o
Desenvolvimento
da
Pesquisa
em
Enfermagem – Escola de Enfermagem de
Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo,
São Paulo.
NUNES, T. F. et al. Insuficiência renal
aguda. Revista Medicina - Ribeirão
Preto, v. 43, n. 03, p. 272-282, 2010.
DOMINGOS, F.; SERRA, A. História da
litíase urinária – os primórdios da
nefrologia. Revista Portuguesa de
Nefrologia e Hipertensão, v. 18, n.03, p.
143-153, 2004.
GAÍVA, M. A. M.; SCOCHI, C. G. S.
Processo de trabalho em saúde e
enfermagem em UTI Neonatal. Revista
Latino-americana de Enfermagem, v.
12, n.03, p. 469-476, 2004.
GARCIA, T. P. R. et al. Principais motivos
de
internação
do
paciente
com
Insuficiência Renal Aguda na Unidade de
Terapia Intensiva. Revista Arquivos de
Ciências da Saúde, v. 12, n. 03, p. 146150, 2005.
INABA, L. C.; SILVA, M. J. P.; TELLES,
S. C. R. Paciente crítico e comunicação:
visão de familiares sobre sua adequação
pela equipe de enfermagem. Revista da
Escola de Enfermagem da USP, v. 39, n.
04, p. 423-429, 2005.
LAGE, S. G. Prevenção da Insuficiência
Renal Aguda em Pacientes Críticos.
Revista Prática Hospitalar. São Paulo:
Office Editora e Publicidade Ltda., ano
VII, n. 38, 2005.
OLIVEIRA, F. C.; ALVES. M. D. S.;
BEZERRA, A. P. Co-morbidades e
mortalidade de pacientes com doença
renal:
atendimento
terceirizado
de
nefrologia. Revista Acta Paulista de
Enfermagem, n. 22, p. 476-80, 2009.
PINTO, P. S. et al. Insuficiência Renal
Aguda Nefrotóxica: prevalência, evolução
clínica e desfecho. Jornal Brasileiro de
Nefrologia: Elsevier Editora Ltda, v. 31, n.
03, p. 183-189, 2009.
PIRES, A. C. Influência do Diabete
Melito na morbidade e mortalidade da
Insuficiência Renal Aguda em Unidade
de Terapia Intensiva. 2003. 74p. Tese de
Doutor em Ciências da Saúde - Faculdade
de Medicina de São José do Rio Preto, São
José do Rio Preto.
SILVA, E. Surviving Sepsis Campaign:
Um esforço Mundial para Mudar a
Trajetória da Sepse Grave. Revista
Brasileira de Terapia Intensiva, v. 18, n.
4, 2006.
SILVA, V. T. C. Insuficiência renal
aguda em unidade de tratamento
intensivo: perfil epidemiológico e
validação de índices prognósticos. 2007.
113p. Tese de Doutor em Ciências Faculdade de Medicina, Universidade de
São Paulo, São Paulo.
SILVA, G. L. D. F.; THOMÉ, E. G. R.
Complicações
no
procedimento
hemodialítico
em
pacientes
com
115
Saúde Coletiva em Debate, 2(1), 20-29, dez. 2012
Insuficiência renal Aguda. Revista
Gaúcha Enfermagem, v. 30, n. 01, p. 3339, 2009.
SILVA, S. C. Gestão da Qualidade nos
Serviços de Saúde. Revista Nursing, v. 13,
n. 155, p. 219-226, 2011.
SMELTZER, S. C.; BARE, B. G. Brunner
& Suddarth, Tratado de Enfermagem
Médico-Cirúrgica.
Tradução
José
Eduardo Ferreira de Figueredo. 10 ed. Rio
de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005. v. 3.
p. 1398-1402. Tradução de: Brunner &
Suddarth’s textbook of medical-surgical
nursing.
SOCIEDADE
BRASILEIRA
DE
NEFROLOGIA. Diretrizes da AMB.
Insuficiência Renal Aguda. São Paulo,
2007.
Disponível
em:
<www.nefrologiaonline.com.br/Diretrizes/
DiretrizesIRAnovo.doc>. Acesso em: 13
maio 2011.
SOUZA, M. L. et al. Incidência de
insuficiência renal aguda e crônica como
complicações de pacientes internados em
uma unidade de terapia intensiva. Revista
ConScientiae Saúde. São Paulo, v. 09, n.
03, p. 456-461, 2010.
Download