UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA WINDY RAPOSO GORGES DEPRESSÃO COMO FATOR DE RISCO AGRAVANTE NAS DOENÇAS CARDIOVASCULARES RIO DE JANEIRO 2012 WINDY RAPOSO GORGES DEPRESSÃO COMO FATOR DE RISCO AGRAVANTE NAS DOENÇAS CARDIOVASCULARES Dissertação apresentada ao Programa de Pósgraduação – Strictu sensu – Mestrado Profissional em Psicanálise, Saúde e Sociedade da Universidade Veiga de Almeida, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Psicanálise, Saúde e Sociedade. Área de concentração – Psicanálise e Saúde. Orientadora: Profª Drª Maria Anita Carneiro Ribeiro RIO DE JANEIRO 2012 DIRETORIA DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTU SENSU E DE PESQUISA Rua Ibituruna, 108 – Maracanã 20271-020 – Rio de Janeiro – RJ Tel.: (21) 2574-8871 - (21) 2574-8922 FICHA CATALOGRÁFICA G667d Gorges, Windy Raposo Depressão como fator de risco agravante nas doenças Cardiovasculares/ Windy Raposo Gorges, 2012. 55f.: iI ; 30 cm. Digitado (original). Dissertação (Mestrado) – Universidade Veiga de Almeida, Mestrado Profissional em Psicanálise, Saúde e Sociedade, Rio de Janeiro, 2012. Orientação: Profa. Dra Maria Anita Carneiro Ribeiro 1. Depressão. 2. Doenças Cardiovasculares. 3. Psicanálise I. Ribeiro, Maria Anita Carneiro. II. Universidade Veiga de Almeida, Mestrado Profissional em Psicanálise, Saúde e Sociedade. III. Título. . CDD – 616.89 DeCS Ficha Catalográfica elaborada pelo Sistema de Bibliotecas da UVA Biblioteca Maria Anunciação Almeida de Carvalho FOLHA DE APROVAÇÃO WINDY RAPOSO GORGES DEPRESSÃO COMO FATOR DE RISCO AGRAVANTE NAS DOENÇAS CARDIOVASCULARES Dissertação apresentada ao Programa de Pósgraduação – Strictu sensu – Mestrado Profissional em Psicanálise, Saúde e Sociedade da Universidade Veiga de Almeida, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Psicanálise, Saúde e Sociedade. Área de concentração – Psicanálise e Saúde. Aprovada em 15 de fevereiro de 2012 BANCA EXAMINADORA _____________________________________________________ Profª Drª. Maria Anita Carneiro Ribeiro - Orientadora - UVA _____________________________________________________ Profª Dra. Rosane Melo - UFRRJ _____________________________________________________ Profª Drª. Vera Pollo - UVA RIO DE JANEIRO 2012 Dedico esse trabalho ao único que é digno de receber toda honra, toda glória e todo louvor. O meu Senhor e Salvador Jesus Cristo. AGRADECIMENTOS A Deus por me amparar nos momentos difíceis, me dar força interior para superar as dificuldades, mostrar os caminho nas horas incertas e me suprir em todas as minhas necessidades. A meu esposo Leonardo que confiou e acreditou em mim, dando-me alento nos momentos mais difíceis da minha vida. A minha orientadora que me ajudou a chegar até aqui. Ao Dr. Mario Veiga de Almeida Junior que desde a primeira conversa acreditou no meu desejo de fazer o mestrado e me deu todos os incentivos e estímulos possíveis para que esse sonho fosse realizado. Muito obrigado!!! “A sabedoria de Deus é loucura para os homens” RESUMO O presente estudo visa contribuir de forma significativa no campo da saúde e da psicanálise, destacando a importância do tratamento psicanalítico para a depressão principalmente para os pacientes cardiopatas. A literatura indicou que as doenças cardiovasculares podem estar associadas à depressão ou melhor dizendo à angústia. Essa pesquisa teórica ao abordar a relação entre depressão, angústia, gozo específico e fenômeno psicossomático a partir das teorias de Freud e Lacan indicou a relação entre doenças do coração e FPS. Essa relação aponta para a necessidade de a depressão ser incluída como fator de risco para as doenças cardiovasculares. Palavras-chave: Depressão, doenças cardiovasculares, fenômeno psicossomático, gozo específico. ABSTRACT The present study aims to contribute significantly in health and psychoanalysis, highlighting the importance of psychoanalytic treatment for depression primarily for cardiac patients. The literature indicates that cardiovascular disease may be associated with depression or rather misery. This theoretical research to address the relationship between depression, anxiety, and psychosomatic phenomenon specific enjoyment from the theories of Freud and Lacan indicated the relationship between heart disease and FPS. This relationship points to the need to be included depression as a risk factor for cardiovascular disease. Keywords: Depression, cardiovascular disease, psychosomatic phenomenon, specific enjoyment. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO........................................................................................................10 2 DEPRESSÃO E AS DOENÇAS CARDIOVASCULARES......................................12 2.1 CONCEPÇÕES SOBRE SAÚDE E DOENÇA.............................................12 2.2 DEPRESSÃO E DOENÇAS CARDIOVASCULARES (DCV)......................14 2.3 DEPRESSÃO À LUZ DA MEDICINA...........................................................16 2.3.1 Conceitos de depressão.....................................................................16 2.3.2 Aspectos clínicos................................................................................17 2.4 DOENÇAS CARDIOVASCULARES ........................................................... 20 2.4.1 Sistema cardiovascular...................................................................... 21 2.4.2 Doença cardiovascular e seu aspecto epidemiológico.......................21 3 A PSICANÁLISE E O MAL ESTAR NO SÉCULO............... ................................. 25 3.1 DEPRESSÃO, TRISTEZA E MELANCOLIA ............................................... 25 3.2 NEUROSE DE ANGÚSTIA E AS DOENÇAS CARDIOVASCULARES ...... 28 3.3 MEDICINA PSICOSSOMÁTICA ................................................................. 31 3.3.1– Histórico........................................................................................... 31 3.3.2 – Freud e a psicossomática ............................................................... 34 3.3.3 – A psicossomática em Lacan ........................................................... 37 3.4 LACAN E AS TRÊS MODALIDADES DO GOZO ....................................... 40 3.4.1 Imaginário, Simbólico e Real..............................................................41 3.4.2 As três modalidades de gozo ............................................................ 42 3.4.3 O gozo específico (JA) e o fenômeno psicossomático ...................... 43 4 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 45 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA ........................................................................... 47 ANEXO A...................................................................................................................53 1 INTRODUÇÃO Sou enfermeira especialista em cardiologia, e meu interesse pelo tema surgiu após uma pesquisa realizada por mim sobre a prevalência dos fatores de risco cardiovasculares em um determinado grupo de pessoas. Pude observar através de dados bibliográficos que a depressão interfere diretamente no prognóstico do paciente portador de DCV, uma vez que diminui a aderência ao tratamento, diminui a taxa de variabilidade de frequência cardíaca, aumento a agregação plaquetária, altera a regulação do sistema nervoso autonômico, entre outros. No primeiro capítulo desta dissertação, serão abordados a depressão e as doenças cardiovasculares. Os transtornos depressivos estão associados ao aumento da morbidade e da mortalidade em doenças cardiovasculares. A depressão é reconhecida hoje como importante fator de risco para ocorrência de doença arterial coronariana, mesmo quando sob controle os fatores de risco clássicos, como hipertensão arterial, hipercolesterolemia e obesidade. A depressão é um dos mais prevalentes transtornos psiquiátricos, está associada a um declínio do bem-estar e do funcionamento diário, do aumento da morbidade, mortalidade e utilização de serviços de saúde. As doenças cardiovasculares são as doenças que alteram o funcionamento do sistema cardiovascular. Houve nos últimos anos um crescimento alarmante na sua incidência tornando-se um problema de saúde pública de primeira grandeza. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), no Brasil, em 2004, a mortalidade atribuível às doenças cardiovasculares foi de 286 por 100.000 pessoas. O segundo capítulo, intitulado “A psicanálise e o mal estar no século”, será trabalhado em três etapas. Na primeira, serão diferenciadas a depressão, a tristeza e a melancolia, à luz da psicanálise. Na segunda etapa, far-se-á a relação entre neurose de angústia e as doenças cardiovasculares. A angústia é apresentada por 11 Freud como um afeto que se estabelece na fronteira entre o somático e o psíquico, destacando sua função na fundação da subjetividade. Uma doença cardíaca pode surgir inclusive de um modo psicossomático, pois podem ocorrer fatores psíquicos agudos que provoquem a manifestação de alterações orgânicas que já existiam em estado latente. Freud, ao listar as formas de ataque de angústia, faz a seguinte menção: Ataque de angústia acompanhados por distúrbios da atividade cardíaca, tais como palpitação seja com arritmia transitória ou com taquicardia de duração mais longa, que pode terminar num grave enfraquecimento do coração e que nem sempre é facilmente diferenciável da afecção cardíaca orgânica; e ainda a pseudo-angina do peito – um assunto delicado em termos de diagnóstico(FREUD, 1895, p. 95). Na terceira e última etapa, será desenvolvido o tema do desenvolvimento da medicina psicossomática – surgida a partir do trabalho dos médicos do exército durante a Primeira Guerra Mundial, nos atendimentos aos civis e militares, quando se deparam com doenças não conhecidas pela medicina da época. Em seguida, abordar-se-á as principais teorias e correntes de pensamento na área da psicossomática, com destaque para Winnicott, McDougall, e Valas. Ainda na terceira etapa referirei a Freud que apesar de não desenvolver teorias a respeito do fenômeno psicossomático, deixou subsídios, através das neuroses atuais, para que outros autores desenvolvessem sobre o tema. Finalizando o segundo capítulo Lacan contribuirá com seus seminários e conferências a respeito dos fenômenos psicossomáticos. Em seguida, será apresentada a conclusão do trabalho de dissertação com bases nos capítulos apresentados anteriormente. Bem como a sugestão ao Ministério da Saúde a inclusão da depressão na classificação dos fatores de risco cardiovasculares. Assim sendo, espera-se que este estudo possa contribuir de forma significativa no campo da saúde e da psicanálise, destacando a importância do tratamento psicanalítico para a depressão principalmente para os pacientes cardiopatas. 2 DEPRESSÃO E AS DOENÇAS CARDIOVASCULARES Nos últimos anos, observou-se um crescimento dos estudos epidemiológicos de depressão e a investigação de sua associação com comorbidade cardiovascular. Embora a relação causal entre depressão e doença cardiovascular não seja claramente entendida, uma série de associações tem sido proposta para demonstrar a plausibilidade e coerência de tal relacionamento. Mas antes de entrarmos propriamente neste assunto, veremos a concepção sobre saúde e doença. 2.1 CONCEPÇÕES SOBRE SAÚDE E DOENÇA A vida se manifesta através da saúde e da doença, que são formas únicas, experiências subjetivas e que não podem ser manifestadas integralmente através de palavras. A Carta de Ottawa considera a saúde como um conceito positivo, para o qual se fazem necessários recursos pessoais, sociais e capacidade física. Assim, para se ter saúde, a responsabilidade vai além do setor saúde, pois exige estilo de vida saudável para atingir o bem estar. Sob este prisma, as comunidades e os indivíduos precisam aprender a cuidar da sua saúde, para então melhorá-la. Tal fato deve demandar dos indivíduos e dos grupos a capacidade de identificar os seus problemas, satisfazer as suas necessidades, modificar ou adaptar-se ao meio e, consequentemente, atingir o bem-estar. (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1986). A Organização Mundial da Saúde define a saúde como um completo bemestar físico, social e mental e não apenas ausência de doenças, conceito esse que evoluiu, pois saúde, em sua concepção ampliada, é o resultado das condições de alimentação, moradia, educação, meio ambiente, trabalho e renda, transporte, lazer, liberdade e, principalmente, acesso aos serviços de saúde, conforme a VIII Conferência Nacional de Saúde, realizada no Brasil, em 1986. (BRASIL, 1986). 13 Entendemos que essa compreensão nos dará subsídios para sermos atores transformadores da nossa própria saúde e da saúde dos indivíduos, da família e da população atendida através da nossa prática profissional. O processo saúde-doença vem sendo descrito há muito tempo. Na Antiguidade, acreditava-se que as doenças poderiam ser causadas por elementos naturais ou sobrenaturais. Nesse período, a compreensão das doenças era através da filosofia religiosa. Na medicina hindu e chinesa, a doença é resultante do desequilíbrio do organismo humano (causas naturalizadas). As causas eram relacionadas ao ambiente físico, aos astros, ao clima, aos insetos e aos animais. Já para os gregos, fatores externos ocasionavam as doenças. Então, para alcançar a harmonia perfeita do corpo humano deveriam ser consideradas as estações do ano, as características do vento e da água. Inicia, nesse período, a ideia empírica do contágio. (BARATA, 1985) Na Idade Média, as causas das doenças retornam ao caráter religioso. No entanto, no final desse período, com as crescentes epidemias, retoma-se a ideia de contágio entre os homens, sendo as causas a conjugação dos astros, o envenenamento das águas pelos leprosos, judeus ou por bruxarias. No Renascimento, os estudos empíricos originam a formação das ciências básicas e com isto surge a necessidade de descobrir a origem das matérias que causavam os contágios. Assim, surge a teoria miasmática. (op. cit, 1985) Do fim do século XVIII ao início do século XX, a medicina social foi capaz de criar as condições de salubridade adequadas à nova sociedade e de abrir espaço para que a prática médica individual viesse gradativamente a ocupar o lugar central nas práticas de saúde. No século XIX, aparece a bacteriologia e a concepção de que para cada doença há um agente etiológico que poderia ser combatido com produtos químicos ou vacinas. (op. cit, 1985) A saúde e a doença na cultura ocidental apresentam diferentes realidades. O conhecimento sobre o corpo é fragmentado, com perspectivas teóricas redutoras do conhecimento biológico, psíquico e social. Nesse sentido, o conceito moderno de doença compreende a análise estrutural da matéria/corpo, fundamentada na anatomopatologia. (CZERESNIA, 2007) De acordo com Barata (1985) a multicausalidade aparece no século XX. Os fatores causadores das doenças eram relacionados ao agente etiológico, ao 14 hospedeiro e ao meio ambiente. Entretanto, as causas agiam separadamente. Ainda nesse século, passa-se a considerar os fatores psíquicos como causadores de doenças. O homem então começa a ser visto como ser biopsicossocial. No entanto, a saúde e a doença envolvem dimensões subjetivas e não apenas biologicamente científicas e objetivas, e a normatividade que define o normal e o patológico varia. As variações das doenças podem ser verificadas historicamente, em relação ao seu aparecimento e desaparecimento, aumento ou diminuição de sua frequência, da menor ou maior importância que adquirem em variadas formas de organização social. A promoção da saúde envolve escolhas relacionadas a valores e processos que não se expressam por conceitos precisos e mensuráveis. Nesse sentido, termos novos vêm sendo desenvolvidos atualmente, tais como: empowerment e vulnerabilidade, permitindo abordagens transdiciplinares, envolvendo outras áreas do conhecimento e muitos significados que se originam da consideração da diferença, da subjetividade e da singularidade do que acontece na esfera individual e coletiva (CZERESNIA, 1999). 2.2 DEPRESSÃO E DOENÇAS CARDIOVASCULARES (DCV) Os transtornos depressivos estão associados ao aumento da morbidade e da mortalidade em doenças cardiovasculares. A depressão é reconhecida hoje como importante fator de risco para ocorrência de doença arterial coronariana (DAC), mesmo quando estão sob controle fatores de risco clássicos, como hipertensão arterial, hipercolesterolemia e obesidade. De acordo com Alves et al (2009), estima-se que em torno de 18% a 20% dos pacientes após o infarto agudo do miocárdio ou pacientes com doença arterial coronariana possuam transtorno depressivo maior. Em doenças cardíacas mais graves, a taxa eleva-se para cerca de 50% quando se inclui o espectro da síndrome depressiva. Para Pinton et al (2006, p. 69) a depressão está associada ao risco para DCV, independente dos fatores de risco clássicos. Os pacientes que apresentam DAC e depressão, o risco de morte cardíaca é duas a quatro vezes maior. 15 A depressão pode acometer o sistema cardiovascular diminuindo a aderência ao tratamento, dificultando a interrupção do tabagismo e acarretando um maior sedentarismo. Além dessa associação indireta, alguns mecanismos tem sido propostos para explicar um acometimento direto da depressão no sistema cardiovascular. Algumas evidências indicam uma associação entre depressão e diminuição da taxa de variabilidade de freqüência cardíaca (TVFC), um marcador de morbidade cardiovascular (STEIN et al, 2000 apud CARNEY et al, 2002). Existem dois tipos de mecanismos que podem explicar a relação entre depressão e doenças cardiovascular, são eles: O psicossocial ou comportamental e o fisiopatológico propriamente dito, envolvendo aumento da agregação plaquetária, redução da variabilidade da freqüência cardíaca (FC) e alterações na regulação do sistema nervoso autonômico e do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA) (MANICA et al, 1999 p. 239). Outros dois possíveis fatores são relatados como podendo ter uma relação causal tanto com o transtorno depressivo e a doença cardiovascular, sendo eles a deficiência de Omega-3 e o elevado nível de Homocisteína, Omega-3 é um ácido graxo de um grupo de lípides polissaturados essenciais. Baixa concentração do ácido graxo Omega-3 nas células vermelhas do sangue é associada com aumento do risco de morte súbita e também tem sido relatado em pacientes com transtorno depressivo maior. A homocisteína é um aminoácido não essencial, e a sua elevação a nível plasmático está associada com aumento do risco de arteriosclerose e também tem sido relatada em pacientes depressivos. Vários estudos convergem para evidências que possibilitam o envolvimento em particular do Omega-3 com transtornos do humor. Níveis de homocisteína plasmática entre 9-10 mmol/L representam uma avaliação independente como fator de risco para arteriosclerose. Informações preliminares têm indicado que o elevado nível de homocisteína plasmático no momento da admissão hospitalar, pode ser um preditor de subseqüentes eventos cardíacos, incluindo morte súbita, em pacientes com DAC. Os níveis de homocisteína têm se mostrado estar mais aumentado em pacientes com transtorno depressivo maior do que em grupos de controle (SÁ JUNIOR et al, 2002) Formas típicas da depressão como a apatia, o desânimo, a intolerância à frustração e a alta de flexibilidade psíquica, peculiares ao humor deprimido, criam condições desfavoráveis levando à falta de motivação para a adesão ao tratamento medicamentoso e mudança de estilo de vida conforme salienta Perez et al (op. cit., p. 321). 16 A depressão é reconhecida hoje como importante fator de risco para ocorrência de doença arterial coronariana, Sá Junior (op. cit) relata que a depressão costuma ser manifestação freqüente e importante em pessoas que sofreram infarto do miocardio ou submeteram-se a revascularização miocárdica. Este quadro também é comum em quem nunca sofreu infarto ou qualquer outro evento coronariano significativo, mas é portador de DAC comprovada por cinecoronariografia. No caso de portadores de DAC, a presença de sintomas depressivos mais intensos é importante preditor de mortalidade entre os pacientes que sofreram infarto do miocárdio e pode exercer influência maior no estado funcional desses pacientes do que o número de artérias comprometidas. Os mecanismos patofisiológicos da depressão, as falhas de adesão ao tratamento e a mudança de estilo de vida influenciam negativamente no funcionamento cardíaco, aumentando consideravelmente a taxa de mortalidade entre os deprimidos. O tratamento de transtornos depressivos em pacientes cardiopatas deve ser o mais precoce possível. Quando identificada uma patologia cardíaca, torna-se necessária uma avaliação para possível identificação de sinais e sintomas depressivos. 2.3 DEPRESSÃO À LUZ DA MEDICINA A depressão e um dos mais prevalentes transtornos psiquiátricos, esta associada a um declínio do bem-estar e do funcionamento diário e a aumento da morbidade, mortalidade e utilização de serviços de saúde. 2.3.1 Conceitos de depressão A depressão é uma condição freqüente e crônica associada a níveis altos de incapacitação funcional. Está entre os transtornos psiquiátricos mais comuns dos adultos. Vejamos a seguir alguns conceitos dessa doença: Segundo Baikie (et al, 2006, p. 729) a depressão “é um distúrbio do humor que se caracteriza por sentimentos de tristeza, desespero e perda do interesse ou prazer nas atividades”. Já Davidoff vai além da definição de Baikie, ele ressalta que a depressão 17 é um estado mais intenso e persistente do que a tristeza. É típico do deprimido se sentir sem remédio e rejeitado. O tempo passa devagar, talvez porque não consiga ter prazer. Nem as pessoas queridas, comida, sexo, distrações, trabalho e recreação o atraem (1983, p. 606). Davidoff considera a depressão como o “resfriado comum” dos problemas psicológicos, porque é o mais recorrente de todos. Fleck em um artigo especial para revista brasileira de psiquiatria define depressão como “uma condição médica comum, crônica e recorrente. Está frequentemente associada a incapacitação funcional e comprometimento da saúde física” (et al, 2003, p. 115). De acordo com Smelzer e Bare (2004, p. 91), “a depressão é uma resposta comum aos problemas de saúde e com freqüência, é um problema subdiagnosticado na população de pacientes”. Silva em seu dicionário ilustrado de saúde define depressão como o “estado de prostração emocional e tristeza, com diminuição da atividade, da iniciativa e paralisação da decisão” (et al, 2005, p 279). O termo depressão tem sido usado para descrever tanto um estado afetivo normal, tal como uma tristeza aparente, como um sintoma ou transtornos associados (ANGERAMI-CAMON, 2001). 2.3.2 Aspectos clínicos “Os sintomas causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, ocupacional ou em outras áreas importantes da vida do individuo” (ANGERAMI-CAMON, op. cit, p. 149). Mendels (1972) relata que os sintomas centrais da depressão são a tristeza, pessimismo, baixa auto-estima junto à falta de energia, motivação e concentração. A freqüência de ocorrência destes sintomas e suas combinações são infinitamente variáveis, podendo existir outros sintomas freqüentes que possam dominar o quadro clínico. A pessoa deprimida aparenta desinteresse por si mesmo e pelas coisas que acontecem ao seu redor. Tem forte tendência a se isolar e tem dificuldade de se concentrar ou de tomar decisões. 18 A American Psychiatric Association (APA) elaborou o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders. Essa classificação é usada pela American Psychological Association e por outras organizações de profissionais para ajudar no diagnóstico da depressão. As categorias diagnósticas da APA sobre a depressão são: 1. Distúrbios Afetivos Graves (também descritas como psicoses maníacodepressivas) – este grupo de psicoses é caracterizado por um simples distúrbio de humor seja uma depressão profunda, seja elação que domina a vida mental do paciente e é responsável pela perda de contato com o seu ambiente. O distúrbio enfermidade maníaco-depressiva se dividem em três subtipos principais: enfermidade maníaco-depressiva, forma maníaca; enfermidade maníaco-depressiva, forma depressiva e enfermidade maníaco-depressiva, forma circular. Outro distúrbio é a Melancolia Involutiva que é um distúrbio que ocorre no período involutivo e que se caracteriza por preocupação, ansiedade, agitação e insônia grave. Sentimentos de culpa e queixas somáticas aparecem com freqüência e podem atingir proporções delirantes. 2. Reação Depressiva Psicótica (Psicose Depressiva Reativa) – esta psicose se caracteriza por um distúrbio de humor atribuível a alguma experiência de vida. Em geral, o indivíduo não apresenta história clínica de depressões recorrentes ou alterações ciclotímicas de humor. 3. Neurose Depressiva – este distúrbio se manifesta por uma reação depressiva exacerbada devida a um conflito interno ou a um acontecimento identificável, tal como a perda de um objeto de amor. As depressões reativas ou reações depressivas se incluem neste grupo. De acordo com o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSMIV) os critérios diagnósticos para a depressão são: humor deprimido, perda de prazer ou interesse, ganho ou perda de peso, dificuldades no sono, agitação ou retardo psicomotor, fadiga, sensação de inutilidade, incapacidade de se concentrar e pensamentos suicidas ou de morte. O diagnóstico de depressão clínica é feito quando uma pessoa se apresenta com, pelo menos, cinco dos nove critérios diagnósticos para a depressão. 19 Os fatores de risco para a depressão são: história familiar, situações de estresse, sexo feminino, episódios prévios de depressão, início antes dos 40 anos, co-morbidade clínica, tentativas pregressas de suicídio, falta de sistemas de suporte, história de abuso físico ou sexual, dependência atual em drogas (SMELTZER E BARE, 2004). Dalgalarrondo apresenta a seguinte classificação psiquiátrica no que tange às síndromes depressivas: 1) episódio ou fase depressiva e transtorno depressivo recorrente; 2) distimia; 3) depressão atípica; 4) depressão tipo melancólica ou endógena; 5) depressão psicótica; 6) estupor depressivo; 7) depressão agitada ou ansiosa; e 8) depressão secundária. No episódio ou fase depressiva e transtorno depressivo recorrente, aparecem evidentes sintomas depressivos, tais como: “humor deprimido, anedonia (ausência de vontade), fadigabilidade, diminuição da concentração e da auto-estima, idéias de culpa, de inutilidade e transtornos do sono e do apetite”; os mesmos devem estar presentes por, pelo menos, duas semanas e não mais do que dois anos, de forma ininterrupta. Os episódios duram, geralmente, entre três a doze meses. O episódio depressivo também é classificado em leve, moderado ou grave, de acordo com o número, intensidade e importância clínica dos sintomas. Já o transtorno depressivo recorrente implicaria a apresentação de vários episódios depressivos, nunca intercalados por episódios maníacos. A distimia é uma forma de depressão crônica, geralmente de intensidade leve, muito duradoura, começando no início da vida adulta e durando vários anos. Seus sintomas mais comuns são diminuição da auto-estima, fadigabilidade aumentada, dificuldade em tomar decisões ou se concentrar, mau humor crônico, irritabilidade e sentimentos de desesperança. Tais sintomas devem estar presentes, de forma ininterrupta, por, pelo menos, dois anos. A depressão atípica é um subtipo de depressão, que pode ocorrer em episódios depressivos, de intensidade leve a grave, e no transtorno unipolar ou bipolar. Além dos sintomas depressivos gerais, ocorrem também: “aumento de apetite, hipersonia, sensação de corpo muito pesado,sensibilidade exacerbada a indicativos de rejeição, reatividade do humor aumentada, fobias e aspecto histriônico – teatralidade”. A depressão de tipo melancólica ou endógena é um subtipo de depressão, na qual predominam os sintomas classicamente endógenos, sendo natureza mais 20 “neurobiológica”, ou seja, mais independente dos fatores psicológicos. Os sintomas típicos são: “anedonia, hiporreatividade geral, tristeza vital, lentificação psicomotora, perda do apetite e de peso corporal, depressão pior pela manhã, insônia terminal, diminuição da latência do sono REM e ideação de culpa”. Já a depressão psicótica é uma depressão grave, na qual ocorrem, associados aos sintomas depressivos, sintomas psicóticos, como “delírio de ruína ou culpa, delírio hipocondríaco ou de negação de órgãos e alucinações com conteúdos depressivos”. O estupor depressivo é um estado depressivo grave, no qual o paciente permanece, durante dias, imóvel e rígido, apresentando um negativismo que se exprime pela ausência de respostas às solicitações ambientais, via de regra em estado de mutismo, recusando até mesmo o alimento. A depressão agitada ou ansiosa é uma depressão com forte componente de ansiedade e inquietação psicomotora, na qual o paciente pode se queixar de uma “angústia intensa” associada aos sintomas depressivos. Em tal quadro, há um sério risco de suicídio. E, por fim, a depressão secundária é definida como uma síndrome depressiva causada, ou fortemente associada, a uma doença ou quadro clínico somático, seja ele primariamente cerebral ou sistêmico. Acompanham, com relativa freqüência, síndromes e doenças como o hipo ou hipertireodismo, lúpus eritematoso sistêmico, doença de Parkinson e acidente vascular cerebral (AVC). A classificação das “síndromes depressivas”, acima brevemente retomada, é trazida por Dalgalarrondo, existindo, ainda, outras classificações psicopatológicas e psiquiátricas sobre a depressão – “transtorno afetivo bipolar, ciclotimia, mania mista (sintomas maníacos e depressivos)”. 2.4 DOENÇAS CARDIOVASCULARES As doenças cardiovasculares são as doenças que alteram o funcionamento do sistema cardiovascular. Houve nos últimos anos um crescimento alarmante na sua incidência tornando-se um problema de saúde pública de primeira grandeza. 2.4.1 Sistema cardiovascular 21 “O sistema cardiovascular é formado por coração e vasos sanguíneos que impulsionam e conduzem o sangue através do corpo, fornecendo oxigênio, nutrientes e hormônios para as células e removendo seus resíduos”, conforme define Moore (2007, p. 3). Batlouni (1999, p. 86) ressalta em seu livro que o “aparelho circulatório surgiu e evoluiu para, mediante um fluxo contínuo de sangue, levar principalmente oxigênio e depois nutrientes à vizinhança das células, de onde o ingresso nelas faz-se principalmente por difusão” O sistema circulatório ou cardiovascular, em termos funcionais, constitui-se de três componentes, os quais são: I- o coração como bomba, cuja atividade motora refaz a cada ciclo, por seus elementos contráteis, o gradiente de pressão necessário para propelir continuamente a coluna sanguinea; II- o reservatório venoso, cuja capacitância (capacidade de aceitar aumento de volume) dos vasos controla a velocidade do influxo de sangue para o órgão central; III- o setor arterial, cuja resistência, principalmente dos vasos arteriolares, oferece variável impedância (relação entre a tensão aplicada ao sistema e o fluxo que a percorre) à ejeção do sangue pela bomba muscular. Cada componente pode influenciar o outro, sendo as três partes do sistema controladas e interligadas pelo sistema nervoso autônomo, simpático e parassimpático (BATLOUNI et al, op. cit, p. 86). 2.4.2 Doença cardiovascular e seu aspecto epidemiológico A DCV é uma “ampla gama de distúrbios que afetam o coração e os vasos sanguíneos. As principais manifestações de DCV são as doenças arterial coronariana, a doença cerebrovascular e a doença vascular periférica”. Gava (2008, p. 8) Dentre os diversos problemas de saúde que temos no Brasil, as doenças cardiovasculares têm sido a principal causa de morbimortalidade. Segundo Viebig et. al (2006, p. 354) “as doenças cardiovasculares são a causa mais freqüente de morbimortalidade no Brasil 300.000 mortes por ano”. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS) no Brasil em 2004 a mortalidade atribuível às doenças cardiovasculares foi de 286 por 100.000 pessoas. Só é ultrapassada por alguns países sul-americanos como a Guiana e Suriname. A 22 taxa do Brasil foi maior que a relatada pela maioria dos países norte-americanos e europeus, por exemplo 179 por 100.000 para os Estados Unidos, 175 por 100.000 para o Reino Unido e 200 por 100.000 para Portugal. Apesar dos avanços científicos e tecnológicos registrados no país nas últimas décadas que resultaram na incorporação de novos recursos de diagnósticos e tratamento, não houve no Brasil nós últimos 50 anos, modificação significativa nos coeficientes de mortalidade por doenças cardiovasculares, ao contrário do que ocorreu nos Estados Unidos e em alguns países da Europa. (FERREIRA, 2000, p. 30) A carga de mortalidade atribuíveis a doenças cardiovasculares, afeta de maneira desproporcional a população pobre. Schmidt (2011) da o exemplo de Porto Alegre, uma cidade brasileira de grande porte, onde a mortalidade prematura (entre 45 e 64 anos de idade) por doenças cardiovasculares foi de 163% mais alta em bairros situados no pior quadril socioeconômico do que naqueles situados no melhor quadril. Um estudo pioneiro no Brasil conhecido como ELSA Brasil lançado pelo Ministério da Saúde e Ministério da Ciência e Tecnologia em 2005, informou em sua publicação que em 2003, 69% dos óbitos bem definidos no Brasil foram causados pelos seguintes grupos de doenças: doenças cardiovasculares (32%), neoplasias (15%), doenças respiratórias (11%), doenças endócrinas/metabólicas (6%) e doenças digestivas (5%). Ressalta-se também que o Brasil tem a maior taxa de mortalidade por doença cerebrovascular entre os países americanos e que o impacto da mortalidade por doenças cardiovasculares atinge estratos populacionais mais jovens (em idade laboral) de modo mais intenso do que em países como os Estados Unidos, Canadá, Japão e os da Europa Ocidental. Segundo a V Diretrizes Brasileira sobre Hipertensão Arterial (2007, p. 30), a principal causa de morte em todas as regiões do Brasil é o acidente vascular cerebral, acometendo as mulheres em maior proporção. Durante os últimos 30 anos foi possível identificar um declínio razoável da mortalidade por causas cardiovasculares em países desenvolvidos, [...] ao mesmo tempo em que elevações relativamente rápidas e substanciais têm ocorrido em países em desenvolvimento, como o Brasil, onde a maior parte da população não tem acesso a esses recursos. De acordo com as projeções da OMS, essa tendência de elevação na doença cardiovascular tende a persistir, agravando ainda mais o quadro de morbidade e mortalidade elevadas nos países em desenvolvimento. (GAVA, op. cit.) 23 As doenças cardiovasculares vem atingindo uma faixa etária cada vez mais jovem. A precocidade dessas doenças tem afetado principalmente a população economicamente ativa. No Brasil aproximadamente um terço dos óbitos por doenças cardiovasculares ocorrem precocemente em adultos na faixa etária de 35 a 64 anos. Nessa faixa etária, as principais causas de óbitos por doenças do aparelho circulatório são as doenças isquêmicas do coração, as cerebrovasculares e as doenças hipertensivas. (ISHITANI, 2006, p. 685). Um estudo realizado por Matos et. al. (2004, p.1) relata que as doenças cardiovasculares têm papel indiscutível na morbidade e mortalidade do mundo ocidental, tanto nos países desenvolvidos como nos em desenvolvimento. As cardiopatias isquêmicas e o acidente vascular cerebral são e serão, de acordo com as projeções para o ano de 2020, as principais causas de morte, de anos de vida perdidos e anos de vida com incapacitação ou seqüelas. O desenvolvimento de doenças cardiovasculares tem como parâmetro os seus fatores de risco que teve início com o estudo de Framingham( 1948). Antes desse estudo, a maioria dos médicos acreditava que aterosclerose era um processo de envelhecimento inevitável, a hipertensão arterial um resultante fisiológico deste processo que auxiliava o coração a bombear o sangue pelas artérias com lúmen reduzido, conforme descreveu Polaczyk (2005, p. 199). O termo fator de risco cardiovascular é usado para descrever qualquer situação existente, desenvolvimento ou evento, que predispõe um indivíduo à doença cardiovascular, conforme salientou Gava (op. cit). Os fatores de risco para doenças cardiovasculares são assim classificados de acordo com o caderno de Atenção Básica nº 14 do Ministério da Saúde: História familiar de DAC prematura (familiar de 1º grau, sexo masculino <55 anos e sexo feminino <65 anos); Homem >45 anos e mulher > 55 anos; tabagismo; hipercolesterolemia (LDL – elevado); Hipertensão Arterial Sistêmica; Diabetes Mellitus; obesidade (IMC > 30kg/m² ; gordura abdominal; sedentarismo; dieta pobre em frutas e vegetais; estresse psico-social. De acordo com a V Diretrizes Brasileira de Hipertensão Arterial a presença de fatores de risco cardiovascular ocorre mais comumente na forma combinada. “Além 24 da predisposição genética, fatores ambientais podem contribuir para uma agregação de fatores de risco cardiovascular em famílias com estilo de vida pouco saudável”. A doença cardiovascular não é apenas um transtorno para o paciente e seus familiares, mas um motivo de grande preocupação para o poder público de saúde, onde os gastos nessa área são elevadíssimos. Em 2004, o sistema público de saúde pagou R$ 1.139.363.988,84 pelas hospitalizações por DCV. Além disso, reembolsou separadamente, como procedimentos específicos, 35.076 cirurgias cardíacas, ao custo de R$ 243.937.076,36; 40.686 procedimentos intervencionistas e eletrofisiológicos, ao custo de R$ 202.563.413,43; 18.324 procedimentos relacionados a marca-passos, ao custo de R$ 149.871.335,09 (incluindo o implante de 515 desfibriladores/cardioversores e marca-passos multisítio, com custo total de R$ 17.326.073,35) e 12.930 cirurgias vasculares de grande porte que totalizaram R$ 26.610.405,45. O reembolso de todos estes procedimentos totalizou R$ 622.982.230,31. após ajustes pelo fator de correção os gastos públicos totais com saúde somaram R$ 2.050.855.179,91 em hospitalizações e R$ 3.309.072.335,90 em assistência ambulatorial. (AZAMBUJA et.al, 2008,p. 167). Em 2005 ocorreram 1.180.184 internações por doenças cardiovasculares, com o custo global de R$ 1.323.775.008,28. Dados extraído da V Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial (2007, p. 30). Segundo Gava op. cit. “as seqüelas das doenças cardiovasculares tem forte impacto sobre a qualidade de vida dos pacientes e cuidadores e representam um enorme prejuízo financeiro para os recursos de saúde e orçamento das nações”. De acordo com nossas estimativas, no ano de 2004, os casos de DCV grave, representaram uma despesa de R$ 11.2 bilhões para o sistema de saúde e de R$ 2.57 bilhões para o seguro social. [...] Aproximadamente 300.757 aposentadorias por incapacidade e 144.984 benefícios temporários por incapacidade decorrentes de DCV, representam 30% do número estimado de casos de DCV grave na faixa etária entre 35 e 64 anos de idade. (AZAMBUJA et. al, op. cit., p. 168). No próximo capítulo abordaremos sobre a depressão através de um outro olhar, o olhar psicanalítico. 3 A PSICANÁLISE E O MAL ESTAR NO SÉCULO “A depressão é a perda do brilho que ilumina o viver e que colore o mundo com as tintas do desejo; as trevas do sol negro de Gérard de Nerval são um sinal de seu eclipse.” (Quinet) 3.1 DEPRESSÃO, TRISTEZA E MELANCOLIA A depressão é vista neste século quase como uma epidemia. Os estados depressivos ocorrem em algum momento na vida de uma pessoa. A cada momento há algo que se pode perder provocando a dor. A dor provoca um recolhimento do sujeito que deixa de se interessar pelas coisas do mundo, enquanto sofre deixa de amar, ou pior, deixa de si amar. Alberti (2002) relata que “a depressão é um afeto que aparece no momento em que o eu evita a sua determinação inconsciente, cede de seu desejo, abre mão dele, não querendo saber daquilo que o determina”. Então a depressão surge quando o sujeito se acovarda frente ao seu desejo, dele abrindo mão. A depressão não é um sintoma, porém um estado caracterizado por dor, tristeza e falta de vontade. Conceitualizar a depressão como sintoma é medicalizála, ou seja, considerar que ela é um significante cujo significado é uma doença que acomete o indivíduo e que por isso deve ser eliminada (Quinet, 2006). A tristeza é o afeto da depressão, onde uma baixa de energia psíquica se deslibidiniza. Com isso o eu para não correr o risco de se deparar com a castração, entristece. A tristeza é situada por Lacan como a dor de existir, a expressão da dor própria à existência o que no âmbito da ética é considerada covardia moral. Em suas palavras, a tristeza é: (,,,) qualificada de depressão ao lhe conferir como suporte a alma; ou a tensão psicológica do filósofo Pierre Janet. Não se trata, porém, de um estado d’alma, é simplesmente uma falta moral, como se expressa Dante e até mesmo Espinosa: um pecado, o que quer dizer, covardia moral, que só se situa, em última instância, a partir do pensamento, ou seja, do dever de bem-dizer ou de orientar-se no inconsciente, na estrutura. (LACAN, 1974, p. 44). 26 A definição de Lacan da tristeza como falta moral reúne o afeto triste com a culpa. E o sentimento de culpa marca o retrocesso do sujeito diante do desejo, recuo equivalente à confrontação com o impossível do real do gozo. A tristeza como covardia moral, segundo a definição de Lacan, situa esse afeto como uma relação frouxa do sujeito com a cadeia de seu desejo. Essa relação frouxa, nos dois sentidos do termo, faz o sujeito abrir as portas para a auto-depreciação e para a autoacusação. Essa gama de afeto que faz o sujeito triste, covarde, sentir-se frouxo e daí culpado, nos permite inserir o afeto depressivo no âmbito da ética (QUINET, 1997). No texto “Luto e Melancolia”, 1917, Freud nos conduz, por meio da comparação entre os fenômenos análogos do luto e da melancolia, nos chamando a atenção para as características aparentemente comuns a ambas, como por exemplo: desânimo profundo, cessação de interesse pelo mundo externo, perda da capacidade de amar, inibição de toda e qualquer atividade, diminuição dos sentimentos de autoestima, etc. O luto profundo, a reação à perda de alguém que se ama, encerra o mesmo estado de espírito penoso, a mesma perda de interesse pelo mundo externo [...] a mesma perda da capacidade de adotar um novo objeto de amor e o mesmo afastamento de toda e qualquer atividade que não esteja ligada a pensamentos sobre ele. (FREUD, 1917[1915]/1996, p. 276). A única ressalva que Freud evidencia em termos de sensações aparentes às quais se refere um fator distintivo entre o trabalho de luto (normal) e a melancolia (patológico), diz respeito à perturbação da autoestima, que está ausente no luto. Esta “perturbação da autoestima” é o que se evidencia na fala do melancólico mediante suas autoacusações, expressões de sentimentos de desvalia, sentimentos de culpa e vergonha, um discurso que revela toda a ambivalência dos sentimentos envolvidos neste processo. No Manuscrito G, Freud (1895) considera a melancolia como a doença do afeto, por excelência. Inicia sua discussão a partir de uma consideração sobre o luto: “o afeto correspondente à melancolia é o do luto, quer dizer, da nostalgia por algo perdido”. No caso da melancolia, seria uma perda na vida pulsional. Ainda no início de seu percurso, Freud (1895) começa a estabelecer sua investigação sobre a melancolia, aproximando-a da esfera sexual. Afirma então que 27 há uma relação muito próxima entre melancolia e “anestesia sexual” – “perda de apetite sexual do melancólico”. Peres (2003) recorre a Hipócrates para indicar como a melancolia era vista antigamente. Na Idade Média, a melancolia decorreria de um excesso do elemento frio e seco no organismo, a bílis negra. A teoria dos humores (de Hipócrates), que predominava na época, dividia a humanidade em quatro humores: o melancólico (bílis negra), o colérico (bílis amarela), o sangüíneo (sangue) e o fleumático (água). A melancolia seria, portanto, decorrente de uma predisposição natural do organismo, não sendo vista como uma doença e sim inserida na própria natureza do sujeito. A concepção de saúde na visão hipocrática era associada à combinação da natureza com o sistema de humores e a doença era o desequilíbrio dessa combinação. A autora remete ainda a Aristóteles – Problemata 30 –, a quem foi atribuído o primeiro tratado sobre a melancolia, que prevalece por toda a Antiguidade. Este tratado fala da relação entre genialidade e loucura. A melancolia é considerada como condição de genialidade, concepção que alguns defendem até os dias atuais. Não é vista como doença, mas como a natureza dos filósofos e poetas (ethos); muitos poetas e homens ilustres eram melancólicos, entre estes Sócrates e Platão. Seria uma visão romântica da melancolia, atrelada à idéia de que “o homem triste é também o homem profundo”. Na visão aristotélica, a melancolia seria da própria da natureza do ser e da inquietação do homem. Caracterizada por um desânimo profundamente penoso, a melancolia também é marcada pela cessação de interesse pelo mundo externo, perda da capacidade de amar, inibição de toda a produtividade e diminuição da pulsão a ponto do sujeito se recriminar e se degradar, culminando com uma expectativa delirante de punição. Quando em sua exacerbada autocrítica, ele se descreve como mesquinho, egoísta, desonesto, carente de independência, alguém cujo único objetivo tem sido ocultar as fraquezas de sua própria natureza, pode ser, até onde sabemos, que tenha chegado bem perto de se compreender a si mesmo; ficamos imaginando, tão somente, por que um homem precisa adoecer para ter acesso a uma verdade dessa espécie (FREUD, op. Cit.). Na melancolia, a perda do objeto é de natureza mais ideal, desconhecida e inconsciente, ou seja, “sabe quem ele perdeu, mas não o que perdeu nesse alguém” 28 (FREUD, 1917). Freud observa que “o objeto talvez não tenha realmente morrido, mas tenha sido perdido enquanto objeto de amor” (FREUD, op.cit, 1917). A perda objetal transforma-se em uma perda relativa do eu. O eu é representado como sendo desprovido de valor, incapaz de qualquer realização e moralmente desprezível. Um dos fatores determinantes para o desenvolvimento da melancolia é o vínculo narcísico do sujeito com o objeto, o qual inevitavelmente refere-se ao registro do inconsciente. O processo melancólico se caracteriza por sua permanência indeterminada ao longo do tempo, um “mal-estar” que denuncia a “recusa” por parte do sujeito em aceitar/reconhecer a perda de determinado objeto libidinal. 3.2 NEUROSE DE ANGÚSTIA E AS DOENÇAS CARDIOVASCULARES A angústia é apresentada por Freud como um afeto que se estabelece na fronteira entre o somático e o psíquico, destacando sua função na fundação da subjetividade. A expressão “neurose atual” apareceu na obra de Freud, pela primeira vez, no artigo A sexualidade na etiologia das neuroses, de 1898. Neste trabalho, ele afirmava que a principal causa atuante na origem de toda neurose repousa sobre a vida sexual do paciente, afirmação que viria a constituir-se como pedra fundamental para toda a estruturação da psicanálise. Mas Freud alertava para o fato de que o papel desempenhado pela sexualidade pode ser bastante diferente de acordo com o caso. Deste modo, aparecia, neste artigo, a necessidade de se classificarem os casos de neurose - a partir do diagnóstico feito com base em um cuidadoso exame da sintomatologia - em dois grandes grupos: o da neurastenia e o da psiconeurose (histeria e obsessões), existindo ainda a ocorrência, muito frequente, de casos em que os sintomas de ambos os grupos aparecem combinados. Nos casos de neurastenia, era possível, segundo Freud, chegar-se, a partir da anamnese, à descoberta do fator etiológico, presente na vida sexual do paciente, que teria dado origem à doença. Embora o fator etiológico certamente se encontrasse vinculado à vida sexual, o paciente não seria capaz de conhecer tal vinculação: 29 Por um curioso trajeto circular (...) é possível chegar a um conhecimento dessa etiologia e compreender porque o paciente foi incapaz de falar-nos qualquer coisa a respeito. Pois os eventos e influências que estão na raiz de toda psiconeurose pertencem não ao momento presente, mas a uma época de vida há muito passada, que é como se fosse uma época pré histórica - à época da infância inicial; e eis porque o paciente nada sabe deles. Ele os esqueceu - embora apenas em um certo sentido. (FREUD, 1898, p.293-4). A observação da distinção entre a psiconeurose e a neurastenia é de suma importância. Na neurastenia a etiologia seria contemporânea, e não infantil; ou seja, haveria uma outra relação de temporalidade entre causa e sintoma. Freud já alertara - antecipando a importância que isso viria a ter no futuro para as expansões da teoria e da clínica psicanalíticas - para o fato de que havia duas formas bastante diferentes de se processar a excitação psíquica: transformando-a diretamente em angústia - donde resultariam sintomas predominantemente somáticos ou não simbólicos - ou então procedendo-se à mediatização simbólica, donde resultariam sintomas eminentemente psíquicos. A distinção entre estas duas modalidades da neurose atual - a neurastenia e a neurose de angústia – já fora feita por Freud antes mesmo do aparecimento do próprio termo neurose atual. Já no ano de 1894, quando em seus trabalhos anteriores constava somente a figura da neurastenia, Freud publicou o artigo Sobre os critérios para destacar da neurastenia uma síndrome particular intitulada ‘neurose de angústia’, no qual descrevia esta nova possibilidade diagnóstica, caracterizando seus sintomas como “manifestações imediatas da angústia ou como rudimentos equivalentes dela” (Freud, 1897, p.277). De acordo com Freud, a diferença entre neurastenia e neurose de angústia não residia apenas na sintomatologia, mas seria resultante de uma etiologia diversa: (...) a neurastenia pode ser sempre reportada a um estado do sistema nervoso, tal como adquirido por masturbação excessiva ou tal como procedente espontaneamente de emissões frequentes; a neurose de angústia revela influências sexuais que têm em comum o fator da continência ou da satisfação incompleta - tal como o coito interrompido, a abstinência juntamente a uma libido viva, a chamada excitação não consumada e outros. (FREUD, 1898, p.294). A neurose de angústia se funda a partir de uma impossibilidade em se encontrar uma forma adequada de escoamento para a energia sexual a qual, 30 eclipsada e sem passar por uma inscrição psíquica, se faz presente como sintoma: a angústia. Nos textos da primeira tópica, a angústia aparece como um sucedâneo do mecanismo de recalcamento, relacionando-se intimamente ao caráter econômico do aparelho psíquico em sua eterna tarefa de dar conta das exigências de satisfação propostas pelas moções pulsionais. Tal concepção, contudo, é transformada a partir dos textos da segunda tópica, os quais irão inaugurar o que se conhece como a segunda teoria freudiana sobre o conceito de angústia. Nesse novo contexto, a angústia deixa de ser entendida como resultado do processo de recalcamento para se inscrever como um de seus elementos disparadores. Nessa sua nova tentativa de conceituação da angústia, Freud (1926/1980c) toma como paradigmático para sua manifestação o total estado de desamparo do bebê ao nascer. É esse total desamparo que coloca a necessidade de existência de um Outro que dele trate e satisfaça suas necessidades biológicas as quais vão, gradualmente, o inserindo no diferencial prazer/desprazer decorrente das primeiras experiências de satisfação. A excitação psíquica transformada em angústia é diretamente expressa no corpo sob a forma de sintoma físico. Os sintomas que surgem a partir de um ataque de angústia, acompanhados, por exemplo, por distúrbios da atividade cardíaca, podem gerar um enfraquecimento sério do coração. Na carta datada de 6 de outubro de 1893, endereçada à Fliess, Freud afirma que não consegue compreender a etiologia da angústia de um homem que sofreu um ataque cardíaco ao saber da morte do pai, por mais que saiba que se trate de um caso de neurose de angústia pura, acompanhada por sintomas cardíacos subseqüentes a uma pertubação emocional. Freud relaciona as manifestações de angústia, neste caso, a fatores de origem não sexual, acúmulo de excitação, e à eclosão da doença. As doenças cardiovasculares são a causa de grande número de falecimentos. Nessas doenças os fatores psíquicos participam de modo importante ou decisivo. Uma doença cardíaca pode surgir inclusive de um modo psicossomático pois podem ocorrer fatores psíquicos agudos que provoquem a manifestação de alterações orgânicas que já existiam em estado latente. Freud ao listar as formas de ataque de angústia faz a seguinte menção: 31 Ataque de angústia acompanhados por distúrbios da atividade cardíaca, tais como palpitação, seja com arritmia transitória ou com taquicardia de duração mais longa, que pode terminar num grave enfraquecimento do coração e que nem sempre é facilmente diferenciável da afecção cardíaca orgânica; e ainda a pseudo-angina do peito – um assunto delicado em termos de diagnóstico(FREUD, 1895, p. 95). O que está sendo falado nesse tópico mais na frente vai se chamar fenômeno psicossomático. 3.3 MEDICINA PSICOSSOMÁTICA 3.3.1– Histórico Na antiguidade o adoecer era considerado uma manifestação de forças sobrenaturais, onde a cura era buscada em rituais religiosos. A medicina psicossomática (do grego psique = alma, soma = corpo) é o estudo das relações entre as emoções e os males do corpo. A sabedoria antiga já tinha sólido conhecimento da integração corpo-mente. Segundo Aristóteles (384-322 a.C), uma mudança no estado da psique produz uma mudança na estrutura do corpo, como também, uma mudança na estrutura do corpo produz uma mudança na estrutura da psique. O corpo e a psique reagem complementariamente um com outro. A Primeira Grande Guerra Mundial, ocorrida em 1914, foi decisiva para que o horizonte da medicina psicossomática fosse amplamente alargado. Durante a guerra, houve um número expressivo de pacientes (soldados) com diversas doenças, em sua maior parte, perturbações motoras como tremores e paralisias sem causa aparente. Os médicos do exército não encontraram uma causa orgânica correspondente, alguns supunham que, em tais pacientes, tratava-se de uma questão de graves danos no sistema nervoso. Outros médicos afirmavam, que esses estados só podiam ser considerados perturbações funcionais e que o sistema nervoso permaneceria anatomicamente intacto. Independente de suas teorias, um método de tratamento terapêutico foi colocado em prática, a aplicação de choque elétrico, numa tentativa cruel de restabelecer a saúde, isto é, aptidão para o serviço ativo. Esse episódio reforçou a hipótese freudiana de que os fundamentos de muitos 32 males orgânicos são de ordem psíquica e que esses soldados sofriam de neurose de guerra. Em “Além do princípio do prazer” (1920), Freud ao falar das neuroses de guerra, alerta para o fato de uma doença orgânica advir para evitar um sofrimento psíquico insuportável. O trauma, por ser intolerável no psiquismo, atua no corpo, lesionando-o. Nestes casos, não há uma escolha da neurose, ou seja, não há outro caminho senão a instalação da doença física (CARNEIRO RIBEIRO, 2006, p.2). No texto “Introdução à psicanálise e as neuroses de guerra”, 1919, Freud relata que as neuroses de guerra eram inicialmente consideradas patologias decorrentes de graves danos ao Sistema Nervoso Central (SNC), como hemorragias ou inflamações, porém após investigação anatômica sem alterações nestes pacientes, passou-se a acreditar que ocorriam lesões delicadas nos tecidos e estas seriam as responsáveis pelos danos observados. A outra hipótese, que prevaleceu, foi a de perturbações funcionais, com o SNC intacto. Sendo assim, as neuroses de guerra assemelham-se às neuroses de paz, em que ocorrem perturbações da vida emocional, com conflitos mentais inconscientes. O termo psicossomático foi utilizado pela primeira vez em 1818 por Heinroth, psiquiatra alemão, ao fazer referência a insônia e a influência das paixões na tuberculose, epilepsia e cancro. Em 1828 ele usaria o termo “somatopsíquico” para indicar as influências dos processos físicos sobre o psiquismo, processos esses de natureza patológica. Em 1939, nos EUA, é fundada a primeira associação de psicossomática, com a presença marcante de Franz Alexander, que investigava a maneira como certos conflitos de natureza psicológica determinavam quadros orgânicos. Winnicott define transtorno psicossomático como a persistência de uma cisão na organização do ego do paciente, ou de dissociações múltiplas, que constituem a verdadeira enfermidade (1966/1969, p.82). Ele adverte que psicossomático não se refere ao estado clínico relativo à patologia somática ou funcionamento patológico. McDougall (1996) entendia que os fenômenos psicossomáticos tinham, sobretudo, uma função defensiva, levando-os a um estágio de desenvolvimento no qual a distinção entre sujeito e objeto ainda não era estável. Valas (2003), em seu texto sobre Horizontes da psicossomática, ao falar das teorias psicossomáticas faz menção a três grandes correntes. A primeira corrente relata que os fenômenos psicossomáticos têm um sentido. Ou seja, o sintoma 33 psicossomático, como o neurótico, teria um sentido. Para todos os autores seguidores desta orientação, a doença pode se referir a uma causalidade psíquica original. Temos como exemplo os autores Dunbar que fala de neurose de órgão; em outro lugar, evoca-se a psicose de órgão. E Alexander que introduz a noção de neurose vegetativa, onde a doença é a conseqüência de emoções, impulsões não satisfeitas, desviadas e reprimidas. Esses dois autores, Dunbar e Alexander, dirigiam seus trabalhos no sentido de buscar estabelecer relações entre conflitos emocionais específicos e estruturas da personalidade com alguns tipos de doenças somáticas, como úlceras, enxaquecas, alergias, asma e distúrbios digestivos. A segunda corrente impõe que os fenômenos psicossomáticos não tem sentido. A Escola psicossomática da Sociedade psicanalítica de Paris acredita que “o estado psicossomático cria-se bem cedo na vida, antes da aparição da linguagem que, entretanto, é condicionada pelo seu meio afeto”. Pierre Marty um dos líderes dessa Escola, junto com um grupo de psicanalistas liderados por ele, ampliou de maneira significativa a teoria e a clínica psicossomática, introduzindo uma continuidade conceitual e clínica entre a abordagem médica e psicanalítica da sintomatologia, tanto psíquica quanto somática. A terceira e última corrente nos diz que os fenômenos psicossomáticos têm sentido próximo da conversão histérica, mas não “totalmente”. Valas em relação a essa corrente faz referência a Valabrega, conhecido pela agilidade de seu pensamento. Para ele o fantasma psicossomático é diferente do fantasma do neurótico. Ele estaria no corpo do sujeito que pode chegar a não reconhecê-lo, e a nos fazer partilhar esse desconhecimento, como se a manifestação psicossomática fosse estranha à vida do sujeito, que pode nunca falar dela. Esses fantasmas estariam portanto inscritos na “corporeidade do doente”. Para ilustrar sua diferença essencial em relação à neurose e a especificidade desses mesmos fantasmas, Jacques Caïen dá o seguinte exemplo: enquanto no neurótico, o fantasma seria “ser sodomizado pelo pai” o fantasma de efração corporal no psicossomático seria “ser penetrado”. A ação está ai presente, mas não o agente. Estes fantasmas se formariam “num momento quando a relação simbólica com o meio vivencial não foi elaborada”. Para Mello Filho (1992), a evolução da psicossomática ocorreu em fases. A primeira, denominada de fase inicial ou psicanalítica, sob a influência das teorias psicanalíticas, teve seu interesse voltado para os estudos da origem inconsciente 34 das doenças, das teorias da regressão e dos ganhos secundários da doença. A segunda, também chamada de fase intermediária, influenciada pelo modelo Behaviorista, valorizou as pesquisas tanto em homens como em animais, deixando assim grande legado aos estudos do stress. A terceira fase, denominada de atual ou multidisciplinar, valorizou o social, a interação e interconexão entre os profissionais das várias áreas da saúde. 3.3.2 – Freud e a psicossomática Sigismund Schlomo Freud nasceu em Freiberg, na Moravia (ou Pribor, na República Tcheca), em 6 de maio de 1856. Em 1877 abreviou seu nome para Sigmund Freud. Durante toda a sua obra Freud apresenta uma reflexão entre o psíquico e o somático. A etiologia da histeria (Freud, 1896) e da neurose atual (Freud, 1905) constituem as primeiras referências da psicanálise para pensar a relação entre fatores psíquicos e doenças orgânicas. Com seu interesse voltado para os aspectos psicológicos das doenças nervosas, Freud dedicou-se ao estudo da histeria, que era classificada por Charcot como uma doença nervosa, hereditária, autônoma, funcional e sem lesão. Freud aproximou-se de Josef Breuer para estudar os sintomas da histeria, utilizando o método catártico. Juntos desenvolveram várias pesquisas e publicaram entre 1893 a 1895 os “Estudos sobre a Histeria” (SILVA, 2009, p. 19). Freud com base nos postulados de Breuer diz que “os sintomas da histeria são determinados por experiências traumáticas que se reproduzem na vida psíquica do paciente sob a forma de símbolos mnêmicos” (FREUD, 1896, p. 190). Em um de seus casos clínicos, Freud ao trabalhar o caso da Srª. Emmy von N. (Freud, 1891), questiona sobre a dor de origem reumática e inclui as dores no sintoma somático, porém não descarta a hipótese de as dores serem símbolos mnêmicos, lembranças de dores. As câimbras no pescoço, Freud as considera como distúrbio orgânico. Diz que é somático, mas que a Srª. Von N. as utilizava para fins histéricos. Em uma carta datada de 1932 e dirigida a Dr. Victor Von Weizsaker, neurologista da Universidade de Heidelberg, professor de Neurologia e Psicoterapia, 35 Freud faz pela primeira vez referência à psicossomática, não fazendo mais referência em nenhuma outra obra sua. A outra parte de seu artigo, na qual se trata de determinar seu trabalho com enfermidades psíquicas e orgânicas, chamou-nos a atenção justamente porque temos nos aproximado, através de observações casuais, deste campo não explorado (FREUD, 1932, p. 46). Apesar de não desenvolver teorias a respeito do fenômeno psicossomático, Freud deixou subsídios, através das neuroses atuais, para que outros autores desenvolvessem sobre o tema. No texto Sobre os critérios para destacar da neurastenia uma síndrome particular intitulada neurose de angústia (FREUD, 1893/1899), Freud mencionou um grupo de neuroses distintas das neuroses de transferência, que se assemelham às afecções ditas psicossomáticas, denominando-as de Neuroses Atuais e dividindo-as em neurastenia e neurose de angústia. Teixeira (2006) relata que Freud em 1895, ao abrir as portas da investigação clínica ao corpo doente, interroga as convicções dualistas soma-psique, ao afirmar que os sintomas psíquicos exercem função na economia subjetiva manifestando-se no substrato corporal. Aliás, ele fez mais que isso, instituindo o conceito de pulsão entre o somático e o psíquico, como operador da organização e dinâmica subjetivas. Ao formular o conceito de pulsão, Freud destaca seu caráter energético, vinculado às excitações do organismo (FREUD, 1915). A pulsão constitui-se como um “conceito limite entre o psíquico e o somático. É ressaltado o substrato somático da fonte pulsional, e a possibilidade de ela encontrar satisfação não apenas no nível da experiência corporal, mas também por meio da experiência psíquica (RIBEIRO, 2004, p. 26). A complacência somática é um conceito freudiano considerado como base para futuras postulações no campo da psicossomática. A complacência somática remete a um real do corpo além do significante. No texto Caso Dora, 1901, Freud enuncia, a propósito da afonia de sua paciente Dora, a “complacência somática”. Dora, na idade de oito anos começara a apresentar sintomas neuróticos. Ela começa a apresentar uma dispnéia crônica, 36 com acessos ocasionais – crise de asma, falta de ar. O distúrbio foi diagnosticado já na época como distúrbio nervoso. Com doze anos, ela começa a ter dores de cabeça, enxaquecas e acessos de tosse nervosa. O sintoma mais incômodo era uma afonia, uma perda completa da voz. A causa da afonia de Dora oferece a Freud a oportunidade de pronunciar-se, novamente, a respeito da origem da histeria, alegando que todo sintoma, na histeria, não pode produzir-se sem certa complacência somática que se efetua sobre um órgão do corpo. Freud em seu artigo intitulado Fragmento da análise de um caso de histeria, 1905, afirma que: “Um sintoma histérico não pode ocorrer sem a presença de certa complacência somática fornecida por algum processo normal ou patológico no interior de um órgão do corpo ou com ele relacionado”. Em 1910, no artigo sobre a perturbação psicogênica da visão, Freud também fala de complacência somática. Carneiro Ribeiro (2004) relata que: De acordo com esse texto, na histeria uma parte do corpo ou um órgão aceita a carga psíquica e a condensa numa somatização. No entanto, se tomarmos uma metáfora utilizada por Freud em 1912 para explicar esta complacência ou submissão somática, poderemos verificar que é o núcleo real do sintoma que está em questão: “as duas neuroses atuais [...] fornecem às psiconeuroses a necessária submissão somática; elas fornecem o material excitativo que é então psiquicamente selecionado e recebe um revestimento psíquico, de maneira que [...] o núcleo do sintoma psiconeurótico – o grão de areia no centro da pérola – é formado de uma manifestação sexual somática”. Na Nova Conferência Introdutória Sobre Angústia e Vida Pulsional (Freud 1933b), Freud abandona a teoria da angústia pelo excesso de excitação sexual, mantendo contudo a posição de que a angústia é conseqüência direta de um momento traumático. Ele se desloca então para a discussão dos impulsos sexuais e agressivos, e afirma a tendência do homem à autodestruição. A pulsão de morte se funde às pulsões sexuais ou se manifesta como agressividade, que se não pode ser dirigida ao mundo externo, retorna sobre o eu e implica inclusive danos orgânicos. Essa tese, na verdade, já havia sido apresentada em “O mal-estar da civilização” (1930a), quando destacou o trabalho silencioso da pulsão de morte no organismo tentando destruí-lo (CARNEIRO RIBEIRO, 2004, p. 52). 37 3.3.3 – A psicossomática em Lacan Jacques-Marie-Émile Lacan, nasceu em Paris, em 13 de abril de 1901, em uma família burguesa de origem provinciana e de sólida tradição católica. Jacques Lacan não renega a cultura religiosa que recebeu, mas abandona toda a crença em Deus e toda participação na prática cristã. Isso fica marcado pela decisão de não mais usar o prenome Marie ligado a Jacques. Lacan estudou no Colégio Stanislas, dirigido por jesuítas. Sempre foi um aluno brilhante. Em 1919 Lacan matricula-se na faculdade de medicina, no ano seguinte começou o curso e a partir de 1926 especializou-se em psiquiatria. Teve contato com a psicanálise através do surrealismo e a partir de 1951, afirmando que os pós-freudianos haviam se desviado, propõe um retorno a Freud. Para isso, utiliza-se da lingüística de Saussure (e posteriormente de Jakobson e Benveniste) e da antropologia estrutural de LéviStrauss, tornando-se importante figura do Estruturalismo. Posteriormente encaminha-se para a Lógica e para a Topologia. Seu ensino é primordialmente oral, dando-se através de seminários e conferências. Em 1966 foi publicada uma coletânea de 34 artigos e conferências, os Écrits (Escritos). A partir de 1973 inicia-se a publicação de seus 26 seminários, sob o título Le Séminaire (O Seminário). A contribuição de Lacan para a abordagem do fenômeno psicossomático surge a partir de certas referências a estes em seus seminários e conferências. A problemática dos fenômenos psicossomáticos apresenta-se nos seguintes termos: se há uma indução significante em seu determinismo, podem esses fenômenos ser qualificados de sintomas? Haveria um sujeito da psicossomática? Lacan marca o fenômeno psicossomático dizendo que não há o sujeito psicossomático como estrutura, mas há o sofrimento no corpo como lesão. No seminário II, O eu na teoria de Freud e na técnica da psicanálise (19541955), no capítulo intitulado “Introdução ao Entwurf”, Lacan (1954-1955) faz algumas considerações sobre as reações psicossomáticas. Dialogando com o Dr. Perrier, o qual ao finalizar sua exposição menciona os distúrbios psicossomáticos e as relações de objeto, Lacan deixa bem evidente que na tentativa de buscar uma explicação teórica com relação aos órgãos envolvidos no processo psicossomático propriamente dito, a colocação de Perrier é equivocada. Sua explicação se aplica 38 aos órgãos de relação, que estão em contato com o exterior, e também àqueles que estão envolvidos nos investimentos pulsionais. Lacan, nesse caso, diz estar referindo-se aos órgãos envolvidos na relação narcísica, que estrutura a relação do eu ao outro e a constituição do mundo objetal. Valas (2003), ao escrever sobre o Seminário II, expõe que não se sabe como funciona o fenômeno psicossomático, mas o investimento da libido se faz sobre o órgão próprio e não sobre o objeto. Quando Lacan acrescenta que não se pode distinguir a fonte do objeto, isso indica uma espécie de curto-circuito na montagem pulsional. O que concorre para que os fenômenos psicossomáticos ocorram na vizinhança da pulsão. Carneiro Ribeiro (1995), em seu artigo “O fenômeno psicossomático”, ressalta a importância do imaginário na constituição dos fenômenos psicossomáticos. No ensino de Lacan o imaginário é concebido a partir do texto “O Estádio do Espelho”, e ele menciona que é por intermédio do imaginário que percebemos a forma, a imagem e a gestalt. Por essa razão, o corpo seria concebido em duas vertentes. A primeira seria como superfície de inscrição dos significantes deixados pelo o Outro da linguagem e ao mesmo tempo onde o próprio sujeito poderia colocar questões em relação ao Outro. O corpo seria uma via para receber e expressar mensagens. É dessa maneira que o corpo “fala”, utilizando a via do sintoma. A segunda vertente é descrita como forma cativante e alienante que captura a identificação imaginária do sujeito pela promessa de completude que acena. Através do imaginário, ocorrem dois processos importantes na esfera psíquica: a identificação do eu à imagem especular e seu isolamento como instância narcísica, destacando-o como sede da alienação do sujeito que lhe dirige um certo investimento libidinal e identifica-se a ele. No seminário III, As psicoses, Lacan ao comentar o caso clínico de uma psicose, na qual havia sintomas hipocondríacos, relaciona o sintoma psicótico ao fenômeno psicossomático apontando-os como estruturados de uma forma diferente, uma inscrição direta, sem intermediário e, portanto, impossível de interpretação relativa à história do sujeito (LACAN [1995-1956] 2002, p. 352). 39 Lacan distingue, uma vez mais, os fenômenos psicossomáticos dos sintomas, os quais correspondem à definição, muito precisa, de serem estruturados pelo significante, segundo a duplicidade significante/significado e suas voláteis correlações até a intervenção do ponto-de-basta. Nota-se ai a antecipação do aspecto holofrásico (RIBEIRO, 2004, p. 79). Em outro caso, no Seminário III, Lacan se refere a uma erupção da pele como impressão ou inscrição direta no corpo que representaria um conflito. Em 1965, Lacan parece se inclinar para uma cifragem virada para significação, para a letra. Há, portanto, inscrição sobre o que se pode chamar de material apresentado pelo sujeito enquanto “ser corporal”. No seminário XI, “Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise”, Lacan (1964) retoma a questão do fenômeno psicossomático, agora por um outro viés, pelo significante, colocando-o em série com a debilidade mental e a psicose, e então declara: Chegaria até a formular que, quando não há intervalo entre S1 e S2, quando a primeira dupla de significante se solidifica, se holofraseia temos um modelo de toda uma série de casos ainda que, em cada um o sujeito não ocupe o mesmo lugar (LACAN, 1998, p. 225). No fenômeno psicossomático existe uma prevalência do imaginário, já sinalizada por Lacan desde o início de seu percurso, uma vez que o significante, ao se holofrasear, perde seu valor simbólico, tornando-se um signo. O fracasso nas operações de alienação e separação implica numa ausência de afânise do sujeito, não se falando em sujeito no que diz respeito ao fenômeno psicossomático. Carneiro Ribeiro (1995) nos diz que “a holófrase do par S1 – S2 aponta para um gel do significante, para um S1 gelificado que não representa o sujeito”. A distinção entre fenômeno psicossomático e sintoma fica claramente estabelecida a partir da holófrase S1 – S2, onde no sintoma neurótico a metáfora paterna opera resultando no esvaziamento do gozo do corpo, limitando-se ao que Freud chamou de zonas erógenas. 40 A Conferência de Genebra intitulada “O Sintoma” pronunciada em 4 de outubro de 1975 no centro Raymond de Saussure, é uma das principais referências sobre o fenômeno psicossomático no ensino de Lacan. Carneiro Ribeiro (1995), faz um breve resumo dos principais pontos dos avanços teóricos de Lacan, que nos permite discutir suas colocações sobre o fenômeno psicossomático: O imaginário aqui não é mais concebido somente no que diz respeito à imagem. Nos três registros, o imaginário é a consistência. O simbólico é concebido côo furo e Lacan tira todas as conseqüências do matema S (A). No final do Seminário XX (1973) ele já havia proposto o conceito de alíngua. Ao propor que “há o Um”, Lacan aponta que o gozo e a alíngua são prévios à estrutura da linguagem. A pluralização dos Nomes-do-Pai aponta para que a metáfora paterna é apenas uma das suplências possíveis à falha que é de estrutura. É a suplência que encontramos na neurose. A foraclusão é de estrutura e, na neurose, o complexo de Édipo cumpre a função do quarto nó que mantém juntos R. S. I. O sintoma será elaborado ao longo deste ano como estando do lado da letra, letra que fixa o gozo. Lacan indica que as lesões psicossomáticas são traços escritos no corpo, não porém da ordem do signum e sim, antes, da signatura. 3.4 LACAN E AS TRÊS MODALIDADES DO GOZO Jacques Lacan empreendeu um retorno aos textos freudianos, procurando dar um status científico à psicanálise. Para isso, lançou mão de recursos da matemática e da lógica (da teoria dos conjuntos à topologia). Para transmitir seu ensino, ele propôs “matemas” para elaborar e desenvolver tanto os conceitos freudianos quanto para os que ele foi produzindo ao longo de seu ensino (grande Outro, sujeito barrado, objeto a etc.). Nos anos 1950, Lacan inaugura seus seminários. Depois de superar diversas contrariedades com a Escola Freudiana de Paris, nos anos 1960, e já tornando parte da história do movimento psicanalítico, ele funda sua Escola. Nos anos 1970, Lacan vai fazer novas articulações dos conceitos fundamentais da psicanálise, retomados sob um outro ponto de vista. Se nos anos 1950, no ensino lacaniano, havia a prevalência do Imaginário e do objeto, do Simbólico e do objeto a, nos anos 1960, em seu seminário sobre a ética, Lacan introduz o conceito de A Coisa (objeto maisde-gozar), dando prevalência ao Real. No final dos anos 1960 e durante os anos 41 1970, Lacan inaugura o campo lacaniano, o campo do gozo: o objeto a é o produto do aparelho psíquico e a linguagem é um aparelho de gozo (ROUDINESCO, 1998). O gozo abrange o prazer e o desprazer, apontando que eles estão em continuidade; ele não se deixa apreender completamente, está sempre escapando, transbordando. Não há limite para o gozo. O que força a via do gozo é o significante, ou seja, o significante é a causa do gozo, transforma o outro em um objeto de gozo, o que o torna um bom candidato a ser sintoma (LACAN, 1974/1975). 3.4.1 Imaginário, Simbólico e Real No seminário R.S.I., de 1974/1975, Lacan vai dizer que a ordem não é por acaso: o Real é prevalente aos outros dois registros, ao Simbólico e ao Imaginário. Para escrevê-lo, Lacan propõe o nó borromeano como escrita, como a materialização do Real. Única forma encontrada por Lacan a dar a estes três termos uma medida comum, enlaçando-os (LACAN, 1974-1975). O nó borromeano é a figura de um nó com três consistências, o qual foi utilizado por uma família italiana do século XVI, a família Borromeo. Sua característica é a de que rompendo qualquer um dos anéis o nó se desfaz. Entre o Real, o Simbólico e o Imaginário há uma relação, mas o que cada um dessas instâncias quer dizer? O Imaginário é consistência, imagem, onde o Eu e o corpo se alocam, onde se dá a especularidade e sentido. O Simbólico é a linguagem, o significante, a Lei. O inconsciente, estruturado como uma linguagem se sustenta no Simbólico. É o equívoco do qual está fadada a linguagem. 42 Tomado como ponto de partida, o Real é estritamente impensável. Nele está a morte, A Coisa, o indizível, o que é impossível de escrever e representar, a angústia, o gozo, a pulsão, o trauma. A novidade introduzida pelo nó borromeano estaria na possibilidade de mostrar a inter-relação dos registros e situar o objeto a que é o único a pertencer a todos eles. 3.4.2 As três modalidades de gozo O conceito de gozo em Lacan tem correspondência com o que Freud descreveu como o para-além do princípio do prazer, a segunda tópica freudiana, e seus conceitos relativos à pulsão de morte, como repetição, angústia, pulsão de destruição. O campo lacaniano é um campo aberto a tudo que diz respeito ao gozo (QUINET, 1992). Lacan, no seu ensino, classificou em três os tipos de gozo: o gozo fálico, o gozo do sentido e o gozo do Outro. (A Terceira) Quando o Imaginário se esparrama sobre o Simbólico, temos o gozo do sentido, forma de nomear a inibição, manifestação clínica freudiana. Na inibição ou gozo do sentido, há uma fixação no passado. O sujeito quando sofre de inibição vive um congelamento de sentidos, congelamento de algumas cadeias significantes. Gozo que imaginariza o Simbólico e impede que algo novo aconteça. 43 A partir do Seminário XX, Lacan vai propor o sintoma como letra, letra que fixa o gozo. “Lacan aponta que o gozo e a alíngua são prévios à estrutura da linguagem.” (CARNEIRO RIBEIRO, 1995, p.279). O gozo do Outro (JA), o Real se esparramando sobre o Imaginário, é pura angústia, sendo, sabe-se com Lacan, a angústia é sempre angústia de morte. (LACAN, Sem X) O gozo do Outro não pode ser simbolizado, não há palavras que deem conta de representá-lo. Aqui, o Simbólico está fora e o corpo é tomado pelo Real irrepresentável. 3.4.3 O gozo específico (JA) e o fenômeno psicossomático Em 1975, na “Conferência de Genebra sobre o sintoma”, Lacan vai falar do fenômeno psicossomático (FPS), onde postula que este é da ordem da escrita, como se “algo estivesse escrito no corpo, algo que nos é dado como enigma” e o qual não teríamos a capacidade de ler. (CARNEIRO RIBEIRO, 1995, p.280). Lacan prossegue afirmando que é pela via do gozo específico que há a fixação do FPS. Em suas palavras: “O psicossomático é algo que, de todas as maneiras, está em seu fundamento profundamente enraizado no imaginário” (LACAN, 1988, p.125). Estas contribuições teóricas de Lacan nos permitem relacionar as doenças cardiovasculares e os fenômenos psicossomáticos. Conforme visto, as doenças cardíacas podem surgir, inclusive, por repetidos ataques de angústia, ou seja, aquilo que não pode ser simbolizado é escrito no corpo através de manifestações de intensa atividade cardíaca, como arritmia ou taquicardia de duração longa, ocasionando enfraquecimento do coração. (FREUD, 1895). Observa-se neste caso um gozo específico, o corpo reagindo àquilo que é da ordem do irrepresentável. A depressão, forma médica de nomear o que a psicanálise chama de angústia, é tema de estudos e pesquisa desde a Antiguidade. Com a invenção da psicanálise, desde seus primeiros postulados, Freud interessa-se pelo tema. Já em 1894, a neurose de angústia é elaborada em diversos trabalhos, sendo distinguida de diversas outras formas de adoecimento psíquico, como a histeria e a neurastenia. Podemos pensar com Lacan que a neurose de angústia é também uma forma de gozo do Outro, pois é a impossibilidade de encontrar uma forma adequada de realizar a energia sexual, fazendo-se então presente como angústia. 44 Conforme vimos, as doenças cardiovasculares podem estar associadas à angústia, a qual com crises agudas e repetidas podem ocasionar o aparecimento de doenças coronarianas. Sendo a angústia um dos nomes do gozo específico e este estar associado aos FPS, podemos assim pensar que as doenças do coração podem, em muitos casos, ser fenômenos psicossomáticos. Longe de esgotar a pesquisa sobre o tema, pensamos que com esta dissertação, na verdade, abrimos a possibilidade de novas pesquisas serem feitas relacionando o FPS com as doenças cardiovasculares. 4 CONCLUSÃO Este trabalho teve como ponto de partida minha monografia da pós graduação em Cardiologia onde eu comecei uma pesquisa sobre as doenças cardiovasculares, bem como seus fatores de risco. No primeiro capítulo dessa dissertação comecei falando sobre as concepções de saúde e doença onde consegui ter uma compreensão melhor do que é saúde e doença. Prossegui falando da depressão e das doenças cardiovasculares que nos últimos anos observou-se um crescimento dos estudos epidemiológicos da depressão e a investigação da associação com comorbidade cardiovascular. Uma serie de associações têm sido propostas para demonstrar a plausibilidade e coerência de tal relacionamento. Com essa pesquisa confirmo que a depressão é reconhecida hoje como importante fator de risco para ocorrência de doença arterial coronariana, mesmo quando sob controle fatores de risco clássicos, como hipertensão arterial, hipercolesterolêmica e obesidade. Outro achado importante é a influência negativa que a depressão causa nos cardiopatas, diminuindo sua aderência ao tratamento, dificultando a interrupção do tabagismo, acarretando um maior sedentarismo, bem como desestimulando uma mudança no estilo de vida para uma vida mais saudável. No segundo capítulo a depressão na visão psicanálitica foi o foco principal. Segundo Quinet “a depressão é a perda do brilho que ilumina o viver e que colore o mundo com as tintas do desejo”. Para compreender melhor a depressão descrevi um pouco sobre tristeza e melancolia. Também relacionei a neurose de angustia com as doenças cardiovasculares o que resultou numa ponte entre a depressão, doenças cardiovasculares e os fenômenos psicossomáticos. Diante de tantas definições a respeito da depressão, concluo minha dissertação fazendo a seguinte consideração: a depressão como fator de risco 46 agravante nas doenças cardiovasculares é um excesso de pulsão de morte presente no psiquismo do sujeito que pode ser minimizada num tratamento analítico. Conforme vimos, as doenças cardiovasculares podem estar associadas à angústia, a qual com crises agudas e repetidas podem ocasionar o aparecimento de doenças coronarianas. Sendo a angústia um dos nomes do gozo específico e este estar associado aos FPS, podemos assim pensar que as doenças do coração podem em muitos casos ser fenômenos psicossomáticos. Longe de esgotar a pesquisa sobre o tema, pensamos que com esta dissertação, na verdade, abrimos a possibilidade de novas pesquisas serem feitas relacionando o FPS com as doenças cardiovasculares. Para finalizar pretendo com esse trabalho sugerir ao Ministério da Saúde a inclusão da depressão na classificação dos fatores de risco cardiovasculares. REFERÊNCIA ALBERTI, S. “Os quadros nosológicos: depressão, melancolia e neurose obsessiva” In: Extravios do desejo: depressão e melancolia. Rio de Janeiro: Rios Ambiciosos, 2002. p. 217-227. ANGERAMI-CAMON, V. A. et al. Depressão e psicossomática. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2001. 177p. AZAMBUJA, M. I. R.; FOPPA, M.; MARANHÃO, M. F. C.; ACHUTTI, A., C. Impacto Econômico dos casos de doença cardiovascular grave no Brasil: uma estimativa em dados secundários. Arquivos Brasileiros de Cardiologia. V.91, n.3, 2008. BAIKIE, P. Sinais e Sintomas. Trad. Carlos Henrique Cosedey. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006. BARATA, R. C. B. A historicidade do conceito de causa: epidemiologia. Rio de Janeiro:FIOCRUZ/ABRASCO; 1985. BATLOUNI, M.; CANTARELLI, E.; RAMIRES, J. A. F.; LUNA, R. L.; FEITOSA, G. S. Cardiologia – Princípios e Prática. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção a Saúde. Departamento de Atenção Básica. Prevenção clínica de doenças cardiovasculares, cerebrovasculares e renais. Caderno de Atenção Básica, nº 14. Brasília: Ministério da Saúde, 2006. BRASIL. Ministério da Saúde . Anais da VIII Conferência Nacional de Saúde. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 1986. BRASIL. Ministério da Saúde. ELSA Brasil: maior estudo epidemiológico da América Latina. Revista Saúde Pública. Brasília, V.43, n.1, 2009. CANGUIHEM, G. O normal e o patológico. 4ª ed. ampliada. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 1995. 48 CARNEIRO RIBEIRO, M. A. O fenômeno psicossomático. In: Imagem Rainha: as formas do imaginário nas estruturas clínicas e na prática psicanalítica. Escola Brasileira de Psicanálise. Rio de Janeiro: Sette Letras, 1995. ______. O traço que fere o corpo. In: ALBERTI, S & RIBEIRO, M. A. C. (Org.). Retorno do Exílio: o corpo entre a psicanálise e a ciência. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria, 2004. ______. O mal-estar no século XXI: a falha epistemo-somática. Congresso Internacional em Psicopatologia, 2006. CARNEY, R. M., et al. Depressão, taxa de variabilidade de frequência cardíaca e Infarto Agudo do Miocárdio. Revista Brasileira de Psiquiatria Clinica. São Paulo, n. 29, ano 3, p. 158-159, 2002. Czeresnia D. The concept of health and the difference between prevention and promotion. Cad Saúde Pública. 1999; 15(4): 701-9. _______. Interfaces do corpo: integração da alteridade no conceito de doença. Rev Bras Epidemiol. 2007; 10(1): 19-29. DALGALARRONDO, P. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. 2ª Ed. Porto Alegre: Artmed, 2008. 440p. DAVIDOFF, L. Introdução a psicologia. Trad. Pedro Tamen. São Paulo: Martins Fontes, 1992. 552p. ELAEL, C. C. B. O fenômeno psicossomático: a falta de sentido que fere o corpo. Dissertação apresentada ao programa de Pós Graduação em Psicanálise, Saúde e Sociedade da Universidade Veiga de Almeida. Orientadora: Profª. Drª. Maria Anita C. Ribeiro. Rio de Janeiro, 2008. FERREIRA, Beatriz Almeida. Considerações sobre fatores de risco. Revista Técnica de Enfermagem. São Paulo, n.24, ano 3.p.30-34, maio. 2000. FREUD, S. (1891). Publicações pré-Psicanalíticas e esboços inéditos. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. I. Rio de Janeiro: Imago, 1996. 49 ______. (1893). Sobre os critérios para destacar da neurastenia uma síndrome particular intitulada “neurose de angústia”.In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. III. Rio de Janeiro: Imago, 1996. ______. (1895). “Rascunho G, Melancolia”. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. I. Rio de Janeiro: Imago, 1996. ______. (1896). A etiologia da histeria. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. III. Rio de Janeiro: Imago, 1996. ______. (1897). Sobre os fundamentos para destacar da neurastenia uma síndrome especifica denominada neurose de angustia. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. III. Rio de Janeiro: Imago, 1996. ______. (1898). A etiologia das neuroses. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. III. Rio de Janeiro: Imago, 1996. ______. (1905). Fragmento da análise de um caso de histeria. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. VII. Rio de Janeiro: Imago, 1996. ______. (1910). A concepção psicanalítica da perturbação psicogênica da visão. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. XI. Rio de Janeiro: Imago, 1996. ______. (1915). Repressão. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. XIV. Rio de Janeiro: Imago, 1996. ______. (1917[1915]). Luto e Melancolia. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. XIV. Rio de Janeiro: Imago, 1996. ______. (1919). Introdução à psicanálise e as neuroses de guerra. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. XVII. Rio de Janeiro: Imago, 1996. ______. (1920). Além do princípio do prazer. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. XVIII. Rio de Janeiro: Imago, 1996. 50 ______. (1932). Cartas a Von Weizsäecker. In: GORALI, V. (Org.). Estudios de Psicosomática. Círculo Analítico de Psicossomática. 2ª ed. Buenos Aires: Atuel Cap, 1994, vol I. ______. (1932-1936). Novas conferências introdutórias sobre psicanálise e outros trabalhos. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. XXII. Rio de Janeiro: Imago, 1996. GAVA, F. G. S. Risco Cardiovascular em indivíduos segurados por planos de saúde privados. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Enfermagem na Saúde do Adulto da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Orientadora Profª Drª Sonia Aurora Alves Grossi, 2008. ISHITANI, L. H.; FRANCO, C. G.; PERPETUO, I.H. O.; FRANÇA, E. Desigualdade social e mortalidade precoce por doenças cardiovasculares no Brasil. Revista Saúde Pública. V.40, n.4, 2006. LACAN, J. (1954-1955). O Seminário, livro 2: O eu na teoria de Freud e na técnica da psicanálise. Rio de janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985. ______. (1955-1956). O Seminário, livro 3: As Psicoses. Rio de janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985. ______. (1964). O Seminário, livro 11: Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985. ______. (1974). Televisão; versão brasileira de Antonio Quinet. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1993. ______. (1975) "La conferencia en Ginebra sobre el síntoma", Intervenciones y Textos, Argentina: Manancial, n.2, 1988. MATOS, M. F. D.; SILVA, N. A. S.; PIMENTA, A. J. M.; CUNHA, A. J. L. A. Prevalência dos fatores de risco para doença cardiovascular em funcionários do centro de pesquisas da Petrobras. Arquivos Brasileiros de Cardiologia. Rio de Janeiro, V. 82, n.1, 2004. MCDOUGALL, J. (1996). Teatros do Corpo: o psicossoma em psicanálise. São Paulo: Martins Fontes. 51 MELLO FILHO, J. Psicossomática Hoje. Porto Alegre:Artes Médicas,1992. MENDELS, J. Conceitos de depressão. Trad. Claudia Moraes. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos Editora LTDA, 1972, 109p. MOORE, K. L. Anatomia orientada para a clínica. Trad. Claúdia Lúcia Caetano de Araujo. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2007. MORAIS, J. L.; NICOLAU, R. F.; REI, V. A. F. Os fenômenos psicossomáticos: um substituto para a neurose? Grupo de Pesquisa: O sintoma do corpo. Para, 2008. NICOLAU, R. F. A psicossomática e a escrita do real. Revista Mal-Estar e Subjetividade. Fortaleza. V. 8, n. 4, dezembro 2008. PERES, U. T. Depressão e melancolia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003. PERES, G. H., et al. Depressão e síndrome isquêmicas miocárdicas instáveis: diferenças entre homens e mulheres. Arquivos Brasileiros de Cardiologia. V. 85, n.5, p. 319-322, 2005. POLANCZYK, C. A. Fatores de risco cardiovascular no Brasil: os próximos 50 anos! Arquivos Brasileiros de Cardiologia. Porto Alegre, V. 84, n.3, março 2005. PORTO, C. C. Exame Clinico – Bases para prática médica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1996. QUINET, A. Teoria e Clínica das Psicoses. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. RIBEIRO, I. D. F. Um corpo à deriva: indagações sobre a psicossomática. Dissertação apresentada ao Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora. Orientadora: Profª. Drª. Maria Anita Carneiro Ribeiro. Juiz de Fora, 2004. ROUDINESCO, E PLON, M; Dicionário de Psicanálise, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998. 52 SÁ JUNIOR, A. R; VIDAL, C. E. Depressão, ansiedade e doenças cardiovasculares. Arquivos Brasileiros de Psiquiatria, Neurologia e Medicina Legal. 2002, out/dez, nº 96 (32-35). SILVA, L. B. G. A depressão essencial e o gozo específico. Dissertação apresentada ao programa de Pós Graduação em Psicanálise, Saúde e Sociedade da Universidade Veiga de Almeida. Orientadora: Profª. Drª. Maria Anita C. Ribeiro. Rio de Janeiro, 2009. SILVA, C. R. L.; VIANA, D. L. P. Dicionário Ilustrado de Saúde. São Caetano do Sul: Yendis Editora, 2005. SMELTZER, S. C.; BARE, B. G. Tratado de Enfermagem Médico-Cirurgica. Trad. Brunner e Suddarth. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002. TEIXEIRA, L. C. Um corpo que dói: considerações sobre a clínica psicanalítica dos fenômenos psicossomáticos. Latin-American Journal of Fundamental Psychopathology on Line. Ano VI, n. 1, maio/ 2006. VIEBIG, R. F.; VALERO, M. P.; ARAUJO, F.; YAMADA, A. T.; MANSUR, A. J. Arquivos Brasileiros de Cardiologia. São Paulo, V. 86, n. 5, maio 2006. WALTER, R. Psicossomática e Psicanálise.In: VALAS, P. Horizontes da psicossomática. Rio de Janeiro: Zahar, 2003. WINNICOTT, D. W. (1966/1969). Transtorno Psicossomático. In: WINNICOTT, C.; SHEPHERD, R; DAVIS, M. (org). Explorações Psicanalíticas. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1994. World Health Organization. Carta de Ottawa. In: Ministério da Saúde (Br). Promoção da saúde:cartas de Ottawa, Adelaide, Sundsvall e Santa Fé de Bogotá. Brasília (DF): Ministério da Saúde/FIOCRUZ; 1986. V Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial. Arquivos Brasileiros de Cardiologia. V. 89, n.3, 2007. ANEXO A - PRODUTO DA DISSERTAÇÃO UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA – UVA PRÓ-REITORIA ACADÊMICA CURSO INSTITUTO ENFERMAGEM CCBS PRÉ-REQUISITOS DISCIPLINA ENFERMAGEM E OS FUNDAMENTOS DA - PSICANÁLISE AULAS/SEMANA CRÉDITOS 3 HORAS PERÍODO 3 6º EMENTA Expor para os alunos uma possibilidade de compreensão do corpo que não se restrinja ao corpo somático. Mas sim uma aproximação do corpo somático ao corpo psíquico utilizando a psicanálise como base teórica. OBJETIVOS 1. Reconhecer os fundamentos da Psicanálise e sua aplicabilidade no campo das ciências da saúde. 2. Relacionar os conhecimentos da Psicanálise com a Enfermagem 3. Utilizar a escuta como estratégia para o desenvolvimento do cuidado clinico em enfermagem. 4. Refletir sobre a identidade profissional do enfermeiro e seu papel como agente promotor de saúde. 5. Possibilitar ao aluno entrar em contato com algumas discussões e conceitos que o auxiliem em sua reflexão futura como profissional de enfermagem. 6. Relacionar a importância do toque e o conceito de transferência. PROGRAMA DETALHADO 54 UNIDADE I – Introdução a Psicanálise. Introdução ao estudo das estruturas clínicas. Noções básicas sobre a psicopatologia psicanalítica. UNIDADE II – A técnica psicanalítica. Os escritos técnicos de Freud. Transferência e Interpretação. UNIDADE III - Conceitos fundamentais da Psicanálise. A metapsicologia freudiana. Psicossomática. A contribuição da psicanálise às ciências da saúde. METODOLOGIA DE ENSINO Aulas expositivas Atividades individuais ou em grupos AVALIAÇÃO Trabalhos individuais ou de grupo Prova escrita REFERÊNCIAS FREUD, S. (1893). Primeiras publicações psicanalíticas. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. III. Rio de Janeiro: Imago, 1996. ------------ (1900). A interpretação dos sonhos. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. IV. Rio de Janeiro: Imago, 1996. ------------ (1901). Sobre a psicologia da vida cotidiana. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. VI. Rio de Janeiro: Imago, 1996. ------------ (1911). O caso Schever, artigos sobre técnicas e outros trabalhos. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. XII. Rio de Janeiro: Imago, 1996. 55 ------------ (1914). A historia do movimento psicanalítico, artigos sobre metapsicologia e outros trabalhos. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. XIV. Rio de Janeiro: Imago, 1996. ------------ (1915). Conferências introdutórias sobre psicanálise. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. XXII. Rio de Janeiro: Imago, 1996. ------------ (1919). Introdução à psicanálise e as neuroses de guerra. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. XVII. Rio de Janeiro: Imago, 1996. ------------ (1920) Além do princípio do prazer. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. XVIII. Rio de Janeiro: Imago, 1996. ------------ (1930 [1929]) O mal estar na civilização. In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas, vol. XXI. Rio de Janeiro: Imago, 1996. CARNEIRO RIBEIRO, M. A. O fenômeno psicossomático. In: Imagem Rainha: as formas do imaginário nas estruturas clínicas e na prática psicanalítica. Escola Brasileira de Psicanálise. Rio de Janeiro: Sette Letras, 1995. ------------. O traço que fere o corpo. In: ALBERTI, S & RIBEIRO, M. A. C. (Org.). Retorno do Exílio: o corpo entre a psicanálise e a ciência. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria, 2004.