Carga Horária. Descumprimento. Acumulação de Cargos

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NOTA TÉCNICA Nº 003/2012
Objeto: Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde na Comarca de Juiz de
Fora.
Inquérito
Civil
Público.
Descumprimento
de
carga
horária
de
profissionais médicos vinculados ao Sistema Único de Saúde. Unimed Juiz de
Fora. Requisição de informações. Mandado de Segurança.
1. Relatório
Cuida-se de consulta, elaborada pela Promotoria de Justiça de
Defesa da Saúde da Comarca de Juiz de Fora, para a analise técnica jurídica
dos autos de Inquérito Civil Público nº MPMG 0145.09.000447-7, sob sua
presidência, que tem por escopo a realização de levantamento regionalizado
acerca da regularidade na acumulação de cargos públicos e privados por
profissionais de saúde, nível superior (dentistas, enfermeiros, fisioterapeutas,
médicos, etc), todos vinculados à Secretaria Municipal de Saúde de Juiz de
Fora.
Segundo o consulente, essa investigação se deve às várias
reclamações
de
usuários
quanto
à
falta
de
profissionais
de
saúde,
notadamente médicos, vinculados ao Sistema Único de Saúde (SUS), nos mais
diversos pontos de atenção (unidades de saúde) do município, contrariando as
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regras do sistema público, bem como contribuindo para o agravamento do
setor pela negativa de acesso dos usuários às ações e serviços de saúde.
Após as primeiras investigações, constatou-se que dos mais de
1000 (mil) profissionais médicos, vinculados ao Sistema Único de Saúde (SUS),
aproximadamente 250 (duzentos e cinquenta) acumulavam cargos públicos
indevidamente, sendo 90 (noventa) com três ou mais cargos públicos e/ou dois
cargos públicos com carga horária semanal superior a 40 (quarenta) horas
semanais e/ou dois cargos públicos e cinco ou mais vínculos particulares.
Com o objetivo de melhor aclarar essas acumulações de cargos
públicos e privados, de forma a averiguar sua regularidade ou não, em face
dos preceitos da Constituição Federal, das normas de Direito Administrativo,
bem como dos próprios normativos do SUS, foram expedidos diversos ofícios,
de natureza requisitória, na forma da lei, dentre eles, o dirigido para a Unimed
Juiz de Fora.
Segundo
a
Promotoria
de
Justiça,
a
prestação
dessas
informações, pela Unimed Juiz de Fora, em face de seus profissionais médicos
com vínculos ao Sistema Único de Saúde (SUS), alcançando o período de 2009
a 2011, circunscreveu-se aos seguintes pedidos: a) a data e horário de cada
um dos atendimentos realizados pelos profissionais avaliados, no período de
referência; b) o local de tais atendimentos (hospital, consultório, clínica, etc); c)
as iniciais dos nomes de cada um dos pacientes atendidos, no que se refere às
informações consignadas em item “a”.
2. Da carga horária dos profissionais de saúde vinculados ao SUS.
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A Constituição Federal, em seu artigo 37, XVI, “c”, dispõe sobre
a possibilidade da acumulação de dois cargos ou empregos (e funções), para os
profissionais médicos da seguinte forma:
XVI - é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto,
quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso
o disposto no inciso XI.
c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde,
com profissões regulamentadas.
Desta forma, o profissional médico pode manter 02 (dois)
vínculos com as seguintes variações:
- 02 cargos públicos (concursado) de médico;
- 01 cargo público (concursado) de médico e 01 contrato temporário
(função pública);
- 02 contratos temporários (função pública).
Essa regra vale tanto para estatutário, quanto para celetista
(empregado público).
Por sua vez, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), a
Portaria MS nº 2.488, de 21 de outubro de 20111, ao definir as
responsabilidades gerais das Secretarias Municipais de Saúde e do Distrito
Federal, particularmente quanto à fiscalização do cumprimento da jornada de
trabalho pelos profissionais de saúde, dentre outras, determina os seguintes:
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Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes e normas para a
organização da Atenção Básica, para a Estratégia Saúde da Família (ESF) e o Programa de Agentes
Comunitários de Saúde (PACS).
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a) selecionar, contratar e remunerar os profissionais que compõem as
equipes multiprofissionais de Atenção Básica, inclusive os da Saúde
da Família, em conformidade com a legislação vigente;
b) assegurar o cumprimento da carga horária de todos os
profissionais que compõem as equipes de atenção básica, de acordo
com as jornadas de trabalho especificadas no SCNES e a
modalidade de atenção.
A carga horária corresponde ao equivalente temporal ao qual o
servidor deve exercer suas atividades para fazer jus à remuneração.
Importante ressaltar o fato da autonomia administrativa do
Município, conferida pelo inciso I do art. 30 da Constituição Federal, razão
pela qual não se encontra impedido de estipular cargas horárias diferenciadas,
desde que respeitados os limites constitucionais (jornada máxima) e
infraconstitucionais (profissões específicas).
A carga horária é requisito indissociável do cargo/função
pública e deve ser observada de forma compulsória pelo servidor. Existe uma
relação direta entre os dias de trabalho e remuneração, traduzindo no
cumprimento integral da carga horária.
Independentemente do cargo ou função, todo e qualquer
servidor (efetivo, função pública, contratado) deve fiel observância à sua carga
horária.
Diferente não poderia ser no tocante à carga horária dos
profissionais que fazem parte do Programa de Saúde da Família e de Agentes
Comunitários de Saúde. Estes programas, conforme ressaltamos, possuem
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carga horária pré-determinada pela referida Portaria GM nº 2.488, de 2011,
sendo de aplicação e cumprimento compulsório.
É de responsabilidade da Secretaria Municipal de Saúde a
fiscalização desses deveres, haja vista a possibilidade de suspensão dos
recursos de incentivos financeiros pelo Ministério da Saúde aos Programas de
Saúde da Família e de Agentes Comunitários de Saúde, o que, por obviedade,
levaria ao prejuízo dessas ações e serviços de saúde para a população em
geral.
Especificamente paa os profissionais da Estratégia Saúde da
Família, são itens necessários à observância da carga horária os seguintes:
...
V – carga horária de 40 (quarenta) horas semanais para todos os
profissionais de saúde membros da equipe de saúde da família, à
exceção dos profissionais médicos, cuja jornada é descrita no próximo
inciso. A jornada de 40 (quarenta) horas deve observar a necessidade
de dedicação mínima de 32 (trinta e duas) horas da carga horária para
atividades na equipe de saúde da família podendo, conforme decisão e
prévia autorização do gestor, dedicar até 08 (oito) horas do total da
carga horária para prestação de serviços na rede de urgência do
município ou para atividades de especialização em saúde da família,
residência multiprofissional e/ou de medicina de família e de
comunidade, bem como atividades de educação permanente e apoio
matricial.
E, restritivamente para os profissionais médicos, essa norma
administrativa também admite os seguintes:
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(...) Serão admitidas também, além da inserção integral (40h), as
seguintes
modalidades
de
inserção
dos
profissionais
médicos
generalistas ou especialistas em saúde da família ou médicos de família
e comunidade nas Equipes de Saúde da Família, com as respectivas
equivalências de incentivo federal:
I – 2 (dois) médicos integrados a uma única equipe em uma mesma
UBS, cumprindo individualmente carga horária semanal de 30 horas
(equivalente a 01 (um) médico com jornada de 40 horas semanais), com
repasse integral do incentivo financeiro referente a uma equipe de
saúde da família;
II – 3 (três) médicos integrados a uma equipe em uma mesma UBS,
cumprindo individualmente carga horária semanal de 30 horas
(equivalente a 02 (dois) médicos com jornada de 40 horas, de duas
equipes), com repasse integral do incentivo financeiro referente a duas
equipes de saúde da família;
III – 4 (quatro) médicos integrados a uma equipe em uma mesma UBS,
com carga horária semanal de 30 horas (equivalente a 03 (três) médicos
com jornada de 40 horas semanais, de três equipes), com repasse
integral do incentivo financeiro referente a três equipes de saúde da
família;
IV – 2 (dois) médicos integrados a uma equipe, cumprindo
individualmente jornada de 20 horas semanais, e demais profissionais
com jornada de 40 horas semanais, com repasse mensal equivalente a
85% do incentivo financeiro referente a uma equipe de saúde da
família; e
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V - 1 (um) médico cumprindo jornada de 20 horas semanais e demais
profissionais com jornada de 40 horas semanais, com repasse mensal
equivalente a 60% do incentivo financeiro referente a uma equipe de
saúde da família. Tendo em vista a presença do médico em horário
parcial, o gestor municipal deve organizar os protocolos de atuação da
equipe, os fluxos e a retaguarda assistencial, para atender a esta
especificidade.
Sendo assim, ao profissional médico é possível o cumprimento
da carga horária 32 h + 8 h, observando-se ainda a remuneração proporcional
ou pro rata em função dessa nova carga e a prévia autorização do gestor.
Conforme comentamos, a Portaria MS nº 2.488 determina que
para o cumprimento de jornada de 40 (quarenta) horas deve observar a
necessidade de dedicação mínima de 32 (trinta e duas) horas da carga
horária para atividades na equipe de saúde da família podendo, conforme
decisão e prévia autorização do gestor, dedicar até 08 (oito) horas do total
da carga horária para prestação de serviços na rede de urgência do
município ou para atividades de especialização em saúde da família,
residência multiprofissional e/ou de medicina de família e de comunidade,
bem como atividades de educação permanente e apoio matricial.
3. Da Requisição de informações versus sigilo médico.
Importante ressaltar que, nos termos do artigo 8º, da lei federal nº
7.347/85, o Ministério Público poderá instaurar, sob sua presidência,
inquérito civil, ou requisitar, de qualquer organismo público ou particular,
certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não
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poderá ser inferior a 10 (dez) dias úteis. Somente nos casos em que a lei
impuser sigilo, poderá ser negada certidão ou informação, hipótese em que a
ação poderá ser proposta desacompanhada daqueles documentos, cabendo ao
juiz requisitá-los.
Desta forma, a questão do sigilo médico foi regulamentada pela
Resolução CFM nº 1.605/2000, norma administrativa e não lei, estabelecendo
em seu artigo 1º que o médico não pode, sem o consentimento do paciente,
revelar o conteúdo do prontuário ou ficha médica.
Não obstante o reconhecimento do esforço da autarquia federal na
proteção dos dados sigilosos, patente a ilegalidade de algumas suas
disposições, em dissintonia com a ordem jurídica constitucional. A esse
respeito, o artigo 4º que impõe ao Juiz, nos processos criminais, a vedação da
remessa de cópia do prontuário ou da ficha médica para os autos do processo,
limitando-se a permitir sua consulta pelo perito nomeado, restrita aos fatos
em questionamento.
A Lei Complementar nº 34, de 12 de setembro de 19942, no seu
artigo 67, dispõe que o Ministério Público, no exercício de suas funções, será
responsável pelo uso indevido das informações e dos documentos que
requisitar, inclusive nas hipóteses legais de sigilo.
Contudo, sem embargo dessa discussão, vê-se que, no caso
concreto, a requisição do Ministério Público, imprescindível para elucidação da
regularidade ou não dos vínculos laborais dos profissionais médicos,
prestadores de serviços ao SUS, também lotados na UNIMED Juiz de Fora,
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Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Minas Gerais.
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circunscreveu-se aos seguintes pedidos: a) data e horário de cada um dos
atendimentos
realizados
pelos
profissionais
avaliados,
no
período
de
referência; b) o local de tais atendimentos (hospital, consultório, clínica, etc); c)
as iniciais dos nomes de cada um dos pacientes atendidos.
Evidentemente que não há qualquer quebra de sigilo médico
nesses pedidos, por não se tratar de requisição de cópia de prontuário médico
ou ficha médica.
Segundo
definição3,
prontuário
médico
é
o
conjunto
de
documentos e informações referentes a um paciente e geralmente contêm:
diagnóstico provisório; estudo social; adendo de internação, contendo
informações como origem da doença e histórico do paciente; tratamento e
medicação; evolução médica; evolução e anotações de enfermagem; cirurgias
realizadas,
fichas
de
anestesiologia,
descrição
da
operação;
exames
subsidiários, externos e complementares; epícrise; diagnóstico definitivo com
CID do diagnóstico.
4. Conclusão.
A requisição procedida pelo Ministério Público, com atuação na
defesa da saúde, da comarca de Juiz de Fora, nos autos de Inquérito Civil
Público nº MPMG 0145.09.000447-7, para os fins de averiguar a regularidade
dos vínculos laborais de profissionais de saúde, notadamente de médicos,
prestadores de serviços no Sistema Único de Saúde (SUS) e, também, lotados
na UNIMED Juiz de Fora, fora feita com espeque na Constituição Federal, lei
federal nº 7.347/85 e na Lei Complementar Estadual nº 34/94, não havendo
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http://pt.wikipedia.org/wiki/Prontu%C3%A1rio_m%C3%A9dico
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qualquer violação ao preceito do sigilo médico, por não se tratar de cópia de
prontuário médico ou ficha médica.
É a presente nota.
Belo Horizonte, 17 de julho de 2012.
Gilmar de Assis
Promotor de Justiça
Coordenador do Centro de Apoio Operacional
das Promotorias de Justiça de Defesa da Saúde
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