Toxoplasma gondii INIBE A EXPRESSÃO DA ÓXIDO NITRICO SINTASE INDUZIDA E A PRODUÇÃO DE ÓXIDO NITRICO NA LINHAGEM DE CÉLULA EPITELIAL INTESTINAL IEC-6 JULIANA COSTA DE AZEVEDO UNIVERSIDADE ESTADUAL DO NORTE FLUMINENSE – UENF CAMPOS DOS GOYTACAZES – RJ FEVEREIRO DE 2011 Toxoplasma gondii INIBE A EXPRESSÃO DA ÓXIDO NITRICO SINTASE INDUZIDA E A PRODUÇÃO DE ÓXIDO NITRICO NA LINHAGEM DE CÉLULA EPITELIAL INTESTINAL IEC-6 JULIANA COSTA DE AZEVEDO Dissertação apresentada ao Curso de PósGraduação em Biociências e Biotecnologia da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, como parte das exigências para obtenção do título de Mestre em Biociências e Biotecnologia. CAMPOS DOS GOYTACAZES – RJ FEVEREIRO DE 2011 Toxoplasma gondii INIBE A EXPRESSÃO DA ÓXIDO NITRICO SINTASE INDUZIDA E A PRODUÇÃO DE ÓXIDO NITRICO NA LINHAGEM DE CÉLULA EPITELIAL INTESTINAL IEC-6 JULIANA COSTA DE AZEVEDO Dissertação apresentada ao Curso de PósGraduação em Biociências e Biotecnologia da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, como parte das exigências para obtenção do título de Mestre em Biociências e Biotecnologia. Aprovada em 18 de fevereiro de 2011. Comissão examinadora: _________________________________________________________________ Prof. Sérgio Henrique Seabra (Doutor em Ciências) - UEZO _________________________________________________________________ Prof. Arthur Giraldi Guimarães (Doutor em Ciências) – UENF _________________________________________________________________ Prof. Clóvis de Paula Santos (Doutor em parasitologia Veterinária) – UENF _________________________________________________________________ Prof. Renato Augusto DaMatta (Doutor em Ciências) – LBCT/UENF Orientador Agradecimentos A Deus por me proteger, me dar força e sabedoria para desenvolver esse trabalho. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, à Fundação de Amparo à Pesquisa Carlos Chagas Filho do Estado do Rio de Janeiro – FAPERJ, à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, à Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro – UENF pelo apoio financeiro para realização deste trabalho. Ao Dr. Renato Augusto DaMatta pela orientação, por toda dedicação, atenção e ensinamentos ao longo desses seis anos de orientação. Ao LBR e ao setor de fisiologia vegetal onde foram realizadas todas as leituras de óxido nítrico. A todos os professores do LBCT. Ao meu revisor Dr. Clóvis de Paula Santos. A Banca examinadora. A todos os amigos do LBCT: Barbarella, Farlen Miranda, Fernanda, João Roberto, Letícia, Luciana Lemos, Juliana Padrão, Laura Motta e Thiago por toda ajuda alegria e amizade. Ao amigo João Cláudio pelo companheirismo, amizade, e muita ajuda principalmente nas leituras de NO e inúmeras imunofluorescências. Aos meus alunos emprestados Carolina Rath e Gabriel Rabelo. Ao corpo técnico do LBCT em especial ao técnico Fábio Oliveira e Adriana Martins. Aos amigos da UEZO Dr. Sergio Henrique Seabra, Juliana Portes, Thiago Alves e Francisco Medros por toda alegria, e conversas agradáveis sobre o Toxoplasma gondii. Aos meus pais Luiz Azevedo e Vera Azevedo e irmãos Vinícius Azevedo e Lívia Azevedo por todo amor e incentivo. Ao meu noivo Eurico Huziwara por toda ajudar e compreensão durante a realização desse trabalho. LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS BSA - Albumina sérica bovina CD - Cluster of diferention (marcador de superfície) DC - células Dendríticas DMEM- Meio de Eagle modificado por Dulbecco eNOS - Óxido nítrico sintase endotelial EDRF - fator relaxante derivado do endotélio GTPase- Enzima Guanosina trifosfato HIV - Vírus da imunodeficiência adquirida iNOS - Óxido nítrico sintase induzida IEC - Células epiteliais intestinais do inglês Intestinal Epithelial cells IFN-γ- Interferon gamma IL - 1 Interleucina I beta LPS - Lipopolissacarídeo MIP-1- proteínas inflamatórias de macrófagos MCP1- proteína quimiotática de monócitos NADPH - Nicotinamida adenina dinucleotídeo fosfato NF-κB - Fator de transcrição nuclear NO - Óxido nítrico NOS - Óxido nítrico sintase nNOS - Óxido nítrico sintase neuronal NK- natural Killer PBS - Solução salina tamponada de fosfato SFB - Soro fetal bovino SNC - Sistema nervoso central TNF-α - Fator de necrose tumoral α VP - Vacúolo parasitóforo LISTA DE FIGURAS E TABELAS Figura 1 – Ciclo de vida do Toxoplasma gondii (modificado de Ferguson, 2002)................................................................................................................ 13 Figura 2 – Reação molecular da produção de óxido nítrico envolvendo a óxido nítrico sintase.Óxido Nítrico Sintase (NOS) catalisa a reação entre arginina e oxigênio, com consumo de 1.5 mol de NADPH para 1 mol de NO produzido. Citrulina e água também são produzidas durante a reação (adaptado de Chokshi et al., 2008).................................................................. 21 Figura 3 – Microscopia de Fluorescência de IEC-6 residentes ou ativadas marcadas com anti-iNOS. (A) IEC-6 residente cultivada por 24 h. (B) IEC-6 ativada com interferon-gamma (IFN- ) e lipopolissacarídeo (LPS) por 24 h. (C) IEC-6 ativada com (IFN- ) por 24 h. Note a alta expressão de iNOS pelas IECs ativadas somente com IFN- ......................................................... 31 Figura 4 – Microscopia de fluorescência de células epiteliais ativadas marcadas com anti-iNOS (verde) e anti-Toxoplasma gondii (laranja). (A) IEC-6 não infectadas ativadas por 24 h. (B) IEC-6 ativadas infectadas por 24 h com T. gondii (cepa RH). (C) IEC-6 ativadas, infectadas for 24 h com T. gondii (ME-49). (D) IEC-6 não infectadas ativadas por 48 h. (E) IEC-6 ativadas infectadas por 48 h com T. gondii (cepa RH). (F) IEC-6 ativadas infectadas por 48 h com T. gondii (ME-49). Note a diminuição da expressão de iNOS após infecção com T. gondii de ambas as cepas, no entanto, após 48 h de infecção a IEC-6 infectada com ME-49 recuperou a expressão de iNOS................................................................................................................. 34 Tabela 1 – Desenvolvimento do Toxoplasma gondii em IEC-6 residentes.... 28 Tabela 2 – Efeito do Interferon-gamma no desenvolvimento do Toxoplasma gondii cepa RH em IEC-6................................................................................ 29 Tabela 3 – Dosagem de óxido nítrico em células epiteliais intestinais-6 após estimulação com IFN- e LPS......................................................................... 30 Tabela 4 – Dosagem de óxido nítrico em células epiteliais intestinais após estimulação com diferentes concentrações de IFN- ..................................... 32 Tabela 5 – Inibição da produção de óxido nítrico após infecção com Toxoplasma gondii em células epiteliais intestinais ativadas......................... 33 RESUMO Toxoplasma gondii, o agente da toxoplasmose, é protozoário intracelular obrigatório capaz de infectar vários tipos de células de vertebrados. A via natural de infecção do T. gondii é a oral. Durante essa infecção, o parasito atravessa as células do epitélio intestinal (IEC) e depois difunde para tecidos distantes. Tem sido demonstrado que IECs expressam a enzima óxido nítrico (NO) sintase induzida (iNOS) e são capazes de produzir NO, potente agente microbicida. Portanto, esse parasito tem que lidar com esse mecanismo microbicida. No presente trabalho analisou-se a possibilidade da linhagem de célula epitelial intestinal IEC-6 expressar iNOS e produzir NO e como a infecção pelo T. gondii alteraria nesses fenômenos. As IEC-6 foram cultivadas a 37ºC em atmosfera a 5% de CO2 semeadas sobre lamínulas e ativadas ou não com interferon-gamma (IFN- ) por 24 h. As IEC-6 ativadas foram infectadas com T. gondii (cepa RH e ME-49). Após 24 e 48 h as células foram fixadas, e foi feita imunolocalização do T. gondii e da iNOS; a produção de NO foi avaliada no sobrenadante da cultura através do reagente de Griess; o desenvolvimento do T. gondii também foi analisado. Toxoplasma gondii foi capaz de infectar e se multiplicar nas IEC-6; no entanto, a ativação dessas células com IFN-γ inibiu a replicação desse parasito. Além disso, a IEC-6 foi capaz de produzir NO e expressar iNOS após a ativação com IFN- .Infecção pelo T. gondii de ambas as cepas inibiram a expressão de iNOS e produção de NO pelas IEC-6 após 24 h de infecção. No entanto, após 48 h apenas a cepa RH manteve a inibição da expressão de iNOS e do NO. Nossos resultados sugerem que T. gondii inibe a expressão de iNOS e produção de NO em IEC-6 indicando que esse parasita é capaz de utilizar o mesmo mecanismo de evasão em diferentes tipos celulares que expressam iNOS. Palavras chaves: Enterócitos, Toxoplasma gondii, óxido nítrico, iNOS, mecanismo de evasão. ABSTRACT Toxoplasma gondii, the agent of toxoplasmosis, is obligate intracellular protozoan able to infect many types of vertebrate cells. The natural route of infection of T. gondii is oral. During infection, the parasite crossed the intestinal epithelial cells (IEC) and then spreads into deep tissues. It has been shown that IECs express inducible nitric oxide (NO) synthase (iNOS) and are able to produce NO powerfull microbicidal agent. Thus, this parasite has to deal with this microbicidal machanism. We analyzed the ability of an intestinal epithelial cell line (IEC-6) to express iNOS and produce NO and how infection with T. gondii alter this phenomenon.IEC-6 was cultured at 37ºC in a 5% CO2 atmosphere over coverslips and activated with interferon-gamma (IFN- ) for 24h. Activated IEC-6 was infected with T. gondii (RH and ME-49 strains). After 24 and 48 hs the cells were fixed, and iNOS and T. gondii immunolocalized; NO production was evaluated at the culture supernatant by the Griess reagent; the development of T.gondii was also analized. Toxoplasma. gondii was able to infect and multiply in IEC-6 and activation of these cells with IFN-γ inhibited the replication of the parasite . Moreover, IEC-6 was able to produce NO and express iNOS after interferon- activation. Infection by T. gondii of both strains at 24h was able to inhibit expression of iNOS and NO production of IEC-6. However, after 48h only the RH strains maintained NO inhibition and low expression of iNOS. Our studies sugest T. gondii inhibit expression of iNOS and NO production of IEC-6 indicating that this parasite is able to use the same escape mechanism in different cell type that express iNOS. Keywords:,Enterocytes, Toxoplasma gondii, nitric oxide, iNOS, evasion mechanism. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO .................................................................................................. 10 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA .............................................................................. 12 2.1. Toxoplasma gondii ................................................................................... 12 2.1.1. Taxonomia ........................................................................................ 12 2.1.2. Biologia Celular do Parasito .............................................................. 12 2.1.3. Resposta Imune ao Toxoplasma gondii e mecanismos de evasão da célula hospedeira .................................................................................................. 14 2.1.4. Toxoplasmose ................................................................................... 17 2.2. Célula epitelial intestinal como primeira linha de defesa .......................... 18 2.2.1. iNOS e NO ........................................................................................ 20 3. OBJETIVOS ...................................................................................................... 22 3.1. Objetivo geral ........................................................................................... 22 3.2. Objetivos específicos ............................................................................... 22 4. MATERIAL E MÉTODOS .................................................................................. 23 4.1. Manutenção da IEC-6 .............................................................................. 23 4.2. Obtenção de Toxoplasma gondii .............................................................. 23 4.2.1. Taquizoítos ........................................................................................ 23 4.2.2. Cistos teciduais ................................................................................. 24 4.3. Interação de IEC com Toxoplasma gondii................................................ 24 4.4. Expressão da iNOS revelada por imunofluorescência ............................. 24 4.5. Avaliação de nitrito ................................................................................... 25 4.6 Avaliação do crescimento do Toxoplasma gondii em IEC-6 ..................... 25 4.7 Estatística.................................................................................................. 26 5. RESULTADOS .................................................................................................. 27 5.1. Análise do desenvolvimento do Toxoplasma gondii em IEC-6 residentes e ativadas com IFN- ................................................................................................ 27 5.2. IEC-6 expressaram a enzima oxido nítrico sintase e produziram óxido nítrico .................................................................................................................... 29 6. DISCUSSÃO ..................................................................................................... 35 7. CONCLUSÃO ................................................................................................... 38 8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................. 39 10 1. INTRODUÇÃO Toxoplasma gondii é protozoário patogênico, do grupo dos coccídeos, membro do filo apicomplexa que engloba parasitos intracelulares caracterizados por uma estrutura de células polarizadas, organelas secretoras exclusivas (róptrias e micronemas), apicoplasto e complexo apical (Dubey et al., 1998). Esse Coccídio tem o gato como seu hospedeiro definitivo e outros animais homeotérmicos como hospedeiros intermediários, incluindo o homem (Ferguson, 2004). Esse parasito é o agente etiológico da toxoplasmose, zoonose de importância médica e veterinária (Tenter et al., 2000). A via natural de infecção do T. gondii é a oral que se dá através da ingestão de carne crua ou mal passada contendo cistos de T. gondii (Tenter et al., 2000) ou ainda através da ingestão de água contaminada com oocistos desse parasito (toxoplasmose adquirida) presente nas fezes de gato (Viggiano et al., 1991). A transmissão pela via oral implica em primeiro momento na invasão das células epiteliais intestinais (IEC).. Sua função é atuar como barreira fisiológica e imunológica, separando o conteúdo luminal, repleto de antígenos alimentares e microrganismo, das camadas de tecidos que compõem o ambiente interno (Pitman e Blumberg, 2000). As IECs revestem tanto o intestino delgado como intestino grosso e a manutenção dessa barreira é essencial para controlar seletivamente o movimento de componentes entre o lúmen e o ambiente interno e para restringir a passagem de microrganismos potencialmente perigosos através do trato intestinal para o tecido subjacente (Pitman e Blumberg, 2000). Em razão da sua localização, podese dizer que as IECs representam a primeira linha de defesa contra agentes patogênicos presentes no ambiente do lúmen intestinal (Pitman e Blumberg, 2000). Como consequência a exposiçãoa diferentes patógenos, as IECs desenvolveram mecanismos complementares a barreira fisiológica, as quais atuam reduzindo os riscos de invasão por microrganismos (Pitman e Blumberg, 2000). A expressão da enzima oxido nítrico sintase induzida (iNOS) é um mecanismo regulador de defesa contra patógenos invasores (Oswald et al.,1994). Essa enzima catalisa a conversão de arginina e oxigênio em NO e citrulina (Chokshi et al., 2008). A iNOS não é expressa constitutivamente nas vilosidades 11 do epitélio intestinal in vivo (Gookin et al., 2002). Esse epitélio também é capaz de rapidamente expressar iNOS e produzir NO após injúria intestinal aguda (Banan et al., 2001). A maior vulnerabilidade das vilosidades do epitélio sofrerem injúrias e infecções acoplada a habilidade de rapidamente produzir NO sugerem que a iNOS teria importante papel na defesa do epitélio (Gookin et al., 2006). Apesar de estudos in vivo demonstrarem que as IECs são capazes de expressar iNOS e produzir NO (Hoffman et al., 1997), pouco se sabe sobre os mecanismos microbicidas utilizados por essas células in vitro. Estudos feitos por Dimier e Bout (1993) demonstraram que a IEC-6 (linhagem celular epitelial intestinal) é capaz de inibir a proliferação do T. gondii quando ativadas por IFN- . Estudos posteriores demonstraram que a inibição do T. gondii pelas IEC-6 ocorre devido a diminuição do ferro intracelular (Dimier e Bout, 1998), porém nesses estudos não foram analisados a capacidade das IEC-6 em expressar iNOS e produzir NO. Estudos feitos com macrófagos demonstram que T. gondii é capaz de inibir a expressão de iNOS e produção de NO nos macrófagos (Seabra et al., 2002; 2004; Guillermo e DaMatta, 2004). Esse mecanismo é utilizado pelos parasitos como mecanismo de evasão frente a célula hospedeira. O presente estudo, verificou a capacidade da IEC-6 em expressar iNOS e produzir NO in vitro. Além disso, analisou o desenvolvimento do T. gondii nessas células e se esse parasito também seria capaz de inibir a expressão de iNOS e produção de NO pelas IEC6. 12 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1. Toxoplasma gondii 2.1.1. Taxonomia Toxoplasma gondii pertence ao reino Protista, subreino Protozoa, filo Apicomplexa, classe Sporozoae, subclasse Coccidia, ordem Eucocciicida, subordem Eimeriida, família Sarcocystidae, gênero Toxoplasma (Montoya e Liensenfeld, 2004). 2.1.2. Biologia Celular do Parasito Estudo com T. gondii é importante por inúmeras razões. Podemos dizer primeiramente pelo T. gondii causar a toxoplasmose, doença severa que apresenta risco de vida através de manifestações clínicas como encefalites, retinites e miocardites no desenvolvimento de fetos e em pacientes imunossuprimidos (Baatz et al., 2006). E em segundo lugar T. gondii é usado como modelo de estudo para outras doenças causadas por parasitos apicomplexas que incluem o gênero Plasmodium causador da malária, Eimeria causador da coccidiose em aves e mamíferos e cryptosporidium que é também classificada como infecção oportunista em pacientes com AIDS (Dubey, 1993; Kim e Weiss, 2004). Toxoplasma gondii é o mais bem sucedido protozoário parasito intracelular obrigatório capaz de infectar ampla quantidade de hospedeiros vertebrados homeotérmicos, incluindo os seres humanos e animais de importância econômica (Denkers e Gazzinelli, 1998; Dubey, 1998; Sibley, 2003). Esse protozoário é também um dos mais abundantes parasitos eucarióticos em seres humanos (Tenter et al., 2000) apresentando soroprevalência mínima de 30% podendo chegar a 80% em certas populações como em Campos dos Goytacazes, município do Estado do Rio de Janeiro, onde foi detectado alta soroprevalência em grupos de baixo status socioeconômico (Bahia-Oliveira et al., 2003). Existem diferentes cepas de toxoplasma gondii, essas cepas são classificadas como virulentas ou avirulentas, com base em sua patogenicidade e/ou antigenicidade usando camundongos como modelo ( Bohne et al.,1993). 13 As cepas podem ser do tipo I, que são classificadas como patogênicas que provocam morte em camundongos, seu protótipo é a cepa RH (Howe e Sibley, 1995). As cepas do tipo II são as cistogênicas, essas induzem infecção crônica em camundongos com a formação de cistos, cujo protótipo é ME-49 (Lunde e jacobs, 1983). As cepas podem ainda possuir patogenicidade intermediária como as cepas do tipo III, cujo protótipo é a cepa VEG. O ciclo de vida do T. gondii foi completamente elucidado 60 anos após a descoberta desse parasito (Ferguson, 2009). Seu ciclo de vida é complexo e constituído de uma fase sexuada que ocorre somente nas IECs de felinos, o hospedeiro definitivo, e um ciclo assexuado que ocorre nas células de diferentes tecidos dos hospedeiros intermediários e definitivos (Dubey, 2004). Os hospedeiros intermediários, incluindo os humanos, podem ser infectados pela ingestão de oocistos esporulados que darão origem a esporozitos, que invadem as céluas epiteliais transformando-se em taquizoitos (Dubey et al,1998). Diferentemente dos outros parasitos apicomplexas, T. gondii pode ser transmitido entre os hospedeiros intermediários por transmissão vertical (mãe-feto) ou horizontal (carnivorismo) (Blader e Saeij, 2009). Seu ciclo se sustenta na capacidade do parasito estabelecer infecção crônica de longa duração em hospedeiros intermediários imunocompetentes a fim de maximizar a probabilidade de transferência ao hospedeiro definitivo, que pertence à família dos felídeos (figura 1). Figura 1 – Ciclo de vida do Toxoplasma gondii (modificado de Ferguson, 2002). 14 Toxoplasma gondii existe, nos hospedeiros intermediários, em duas formas que se interconvertem em bradizoítos e taquizoitos. Os bradizoitos possuem crescimento lento, e se encontram nos cistos teciduais (Tenter et al., 2000). Infecções com cistos contendo bradizoítos ocorrem após a ingestão de carne crua ou mal passada. Após a ingestão, a parede dos cistos é digerida no estomago e os bradizoítos resistentes a peptidases gástricas serão liberados e invadem as IECs do intestino delgado (Blader e Saeij, 2009). Dentro das IECs, os bradizoítos se convertem em taquizoitos, que possui rápido crescimento e podem infectar muitas células nucleadas, se replicando no interior do vacúolo parasitóforo (VP) de onde irá sair e infectar células vizinhas. Esses taquizoitas ativam respostas imunes no hospedeiro que pode eliminar a maioria dos parasitos. Alguns taquizoítos, porém, escapam da destruição se interconvertendo novamente a bradizoítos em tecidos distantes do intestino e imunoprevilegiados (Blader e Saeij, 2009). 2.1.3. Resposta Imune ao Toxoplasma gondii e mecanismos de evasão da célula hospedeira A resposta imune ao T. gondii é individual, complexa e compartimentada. A invasão da célula hospedeira acontece em menos de 30 segundos (Sibley e Andrews, 2000) reduzindo dramaticamente o tempo para a ação de anticorpos ou proteínas do complemento. Um grau de complexidade da infecção pelo T. gondii é alcançado devido à possibilidade recorrente de infecção com diferentes cepas deste parasito com virulência variável. Em indivíduos imunocompetentes, a infecção com T. gondii é predominantemente controlada por imunidade mediada por células (revisado por Denkers e Gazzinelli, 1998). Após ingestão do T. gondii, há a passagem do parasito pelo trato gastrointestinal. Nesse momento ocorre o contato do parasito com barreira física composta por uma única camada de células do epitélio, as IECs. Contato do T. gondii com as IECs é necessário para que ocorra a indução de resposta imune (Buzoni-Gatel et al., 2006). 15 Embora seja adquirida por via oral e invadir as IECs, T. gondii não é considerado como parasito intestinal. Entretanto, esse parasito atravessa as IECs para se disseminar para tecidos distantes (Buzoni-Gatel et al., 2006). Toxoplasma gondii pode diretamente induzir a produção de citocinas (IL-1; IL-6 e GM-CSF) pelas células epiteliais (Buzoni-Gatel et al., 2006). Essas moléculas serão fundamentais para iniciar o processo inflamatório na mucosa, aumentando a atração de vários tipos de células do sistema imunológico. As células infectadas começam a secretar moléculas como NO e quimiocinas em particular a proteína quimiotática de monócitos (MCP1), proteínas inflamatórias de macrófagos (MIP-1a; CCL3) e MIP (CCL4) os quais atraem células do sistema imune como neutrófilos, células dendríticas (DC), macrófagos e monócitos (Mennechet et al., 2002). Essas células, por sua vez, secretam citocinas como IL-12, que estimula a resposta imune adaptativa pelas células TCD4. As DC da lamina própria são responsáveis por capturar antígenos de parasitos e processá-lo para serem apresentados as células T. Além disso, as DC da lamina própria induzem uma potente resposta imune dependente de IL-12 capaz de evitar o crescimento de taquizoítos na fase replicativa (Buzoni-Gatel et al., 2006). A IL-12 induz resposta do tipo Th1(Buzoni-Gatel et al., 2006), sendo a principal citocina que desencadeia a síntese de IFN-γ pelas células natural killer (NK) e linfócitos T durante a infecção pelo T. gondii. A indução dessa citocina é um importante sinal de iniciação de resistência do hospedeiro contra o parasito (Buzoni-Gatel et al., 2006). A atividade de linfócitos T é crucial para o controle da fase aguda e crônica da toxoplasmose. Especialmente as células TCD8+ ligam o principal papel efetor de linfócitos contra T. gondii, que incluem atividades citotóxicas, secreção de citocinas como modulação da morte e regeneração das células epiteliais (Suzuki e Remington, 1988; Buzoni-Gatel et al., 2006). Porém as células TCD4+ também possuem papel crucial na regulação da resposta imune contra T. gondii, como por exemplo, maior produção de IFN-γ (Gazzinelli et al., 1991). Após a infecção de células do epitélio intestinal, na lâmina própria, o parasito infecta e se multiplica em leucócitos (Barragan e Sibley, 2002). Neste ambiente além da multiplicação T. gondii se dissemina para tecidos distantes através do sangue via leucócitos CD11b+ (Courret et al., 2005). 16 Uma vez dentro de um hospedeiro o parasito desenvolve ferramentas poderosas para modular a célula hospedeira e se transformar em uma doença com infecção crônica podendo escapar do sistema imune do hospedeiro bem como de drogas conhecidas como anti-toxoplasmáticas (Blader e Saeij, 2009). O sucesso do T. gondii é resultado de um equilíbrio entre o parasito e a resposta imune do hospedeiro, na qual o hospedeiro tenta eliminá-lo, enquanto o parasito desenvolve estratégias de evasão e imunomodulação, permitindo a sobrevivência tanto do hospedeiro como do parasito (Blader e Saeij, 2009). O ambiente de hidrolases ácidas dos lisossomos representa a maquinaria de defesa de muitas células nucleadas, porém a habilidade do parasito em modificar esse ambiente é uma das chaves para sua sobrevivência (Sacks e Sher, 2003). Toxoplasma gondii reside em um vacúolo restringindo a sua fusão com lisossomos. Nesse processo o parasito estabelece um compartimento não fusogênico conhecido como vacúolo parasitóforo (VP) que possui repertório de proteínas integrais de membrana da célula hospedeira consideravelmente modificado por proteínas secretadas pelo parasito (Mordue et al.,1999; Lingelbach e Joiner, 1998). Esse remodelamento é crucial para inibição da acidificação do VP e fusão com o lisossomo que levaria a morte do parasito. Inúmeros estudos sugerem mecanismos pelos quais T. gondii pode interferir na imunidade inata dos macrófagos. Um dos mais consistentes é a disfunção observada em macrófagos infectados, que perdem a habilidade de produzir IL-12 que é essencial para indução de IFN-γ que levará a diferenciação das células T no tipo Th1. O mecanismo de indução de IL-12 é essencial para o desenvolvimento e aquisição de resistência contra patógenos intracelulares (Sacks e Sher, 2003). A família de fatores de transcrição NF-kB é um grupo conservado de proteínas importantes na regulação de numerosos genes envolvidos na imunidade inata e adaptativa que inclui a codificação de IL-12, IFN- , TNF- , iNOS e moléculas de adesão. Estudos com T. gondii tem demonstrado a habilidade desse parasito para interferir na ativação da via NF-kB em macrófagos (Sacks e Sher, 2003). Seabra et al. (2002) demonstraram a capacidade do T. gondii em inibir a produção de NO por macrófagos ativados e que essa inibição aumenta em razão 17 ao aumento na quantidade de parasitos por macrófagos. Além disso, a inibição de NO independe do tempo de ativação dos macrófagos (Seabra et al., 2002). A inibição da produção de NO em macrófago provocada pela infecção do T. gondii é mencionada como mecanismo de evasão celular utilizado pelo T. gondii (Seabra et al., 2002; Seabra et al., 2004). Esse mecanismo de inibição de NO por patógenos foi demonstrado também em Giardia lamblia em infecções de IECs (Eckmann et al.,2000). Esse patógeno consome arginina que é o substrato essencial para enzima iNOS (Buzoni-Gatel et al., 2006). 2.1.4. Toxoplasmose A toxoplasmose é a zoonose causada pelo T. gondii. Essa doença foi descoberta em 1908 por Splendore no Brasil e por Nicolle e Manceaux no instituto Pasteur na Tunísia. A toxoplasmose possui distribuição mundial acometendo um bilhão de pessoas em todo o mundo (Tedesco et al., 2007). No Brasil, a prevalência da infecção tem sido determinada entre 50 e 80% da população (Cantos, 2000). A toxoplasmose pode se apresentar de diversas formas no organismo humano, porém, estudos sorológicos indicam que mais de 80% das infecções primárias por T. gondii são assintomáticas (Wong e Remington, 1994). A toxoplasmose pode ser congênita ou adquirida. Para que a toxoplasmose congênita ocorra é necessário que a infecção primária aconteça durante a gravidez (Weiss e Kim, 2007). Toxoplasma gondii possui a capacidade de migrar através da placenta e se replicar nas células do sistema mononuclear fagocítico, podendo infectar qualquer célula de diferentes tecidos de vários órgãos, principalmente o sistema nervoso central (SNC) e os olhos, os quais o parasito possui tropismo (Ferguson, 2009). A toxoplasmose adquirida ocorre por meio de consumo de leite in natura (cabra e vaca) (Dressen 1990; Dubey, 1993), ingestão de carne crua ou mal cozida (pombos, suínos, bovinos, ovinos, equinos) (Tenter et al., 2000), ingestão de frutas e legumes contaminados (Tenter et al., 2000), ingestão de água contaminada em lugares onde não há saneamento básico (Bahia Oliveira et al., 2003). A infecção com T. gondii em pacientes imunocompetentes é geralmente assintomática, tendo um curso benigno e auto limitado. Nesses indivíduos a resposta imune atua restringindo a replicação do parasito, evitando a evolução 18 para a doença, porém o sistema imune é incapaz de eliminar o agente infeccioso. Ao contrário disto, T. gondii é um patógeno oportunista em indivíduos imunocomprometidos, como portadores de HIV, transplantados ou com câncer. Sob essas condições, o parasito pode oferecer perigo de vida com toxoplasmose, encefalites, lesões neurológicas no SNC, ou retinocoroidites (Ambroise-Thomas e Pelloux, 1993; Ferreira e Borges, 2002). 2.2. Célula epitelial intestinal como primeira linha de defesa O principal tipo de célula diferenciada encontrada no intestino delgado é o enterócito. Os enterócitos são células altamente polarizadas geradas pelo seu contato com a membrana basal e com células adjacentes (Simon-Assmann et al., 2007). A parte apical da célula é composta por microvilosidades ricas em transportadores e hidrolases, responsáveis por funções de absorção e digestão. Expressão de hidrolases como lactase, sacarase, isomaltase e dipeptidilpeptase IV são indicadores de diferenciação celular intestinal in vitro (Neutra e Louvard, 1989). As células epiteliais da mucosa intestinal desempenham papel na homeostase dos organismos (Bloushtain-Qimron et al., 2009; Mastrogiannaki et al., 2009). Dependendo de sua localização no trato intestinal, elas não só desempenham papel central em funções como absorção e secreção, mas também possuem a capacidade de proteger o organismo de vários patógenos e toxinas encontradas em condições normais do intestino, proporcionando uma barreira eficaz aos antígenos do conteúdo intestinal (Podolsky et al., 2009). A função de barreira epitelial depende de um grau bastante elevado de organização intracelular e intercelular (Madara, 1995). A integridade estrutural do interior de cada célula epitelial é mantida pela presença de complexa rede de microfilamentos de citoesqueleto (Pitman e Blumberg,2000). Esses filamentos variam na sua composição e localização. Os filamentos de actina, por exemplo, formam anel na parte apical e basolateral dos pólos das células, enquanto que filamentos intermediários estão no citoplasma e fazem a ancoragem em pontos da membrana plasmática (Goldman et al.,1996; Rodriguez-Boulan et al., 1992). Essas estruturas são essenciais para a manutenção da polaridade e no suporte 19 dos pontos de contato célula-célula (Pitman e Blumberg, 2000) As junções intercelulares são compostas pelas junções do tipo tight ou junções de oclusão. Essas junções garantem a interação células-célula fazendo parte da barreira física contra a penetração de microrganismos intestinais (Buzoni-Gatel et al., 2006). A adesão célula-célula dessas junções é mediada por interações ocludinas (Pitman e Blumberg, 2000). A monocamada de célula epitelial é suportada por uma lâmina basal, uma membrana não lipídica contínua cujos constituintes primários incluem laminina, proteoglicanos de sufato de heparina, e colágeno do tipo IV (Timpl, 1989). Devido a complexidade celular do intestino, com a possibilidade de interação entre os diferentes tipos celulares, existe grande dificuldade para estudos dessas células in vivo. A capacidade para cultura de células epiteliais in vitro foi de grande importância para investigar as propriedades dessas células (Quaroni et al., 1979). Quaroni et al. (1979) reportou o estabelecimento por longo tempo de culturas de células epiteliais intestinais de rato, os quais foram nomeados IEC. Essas células foram derivadas de diferentes níveis do trato intestinal obtidos de explantes mantidos em meio contendo colagenases para redução do crescimento de células mesenquimais. Essas linhagens de células foram exclusivamente caracterizadas e tornaram-se modelo amplamente utilizado para células da cripta em cultura de célula (Quaroni et al., 1999). Pouco se sabe a respeito dos mecanismos microbicidas dessas células, pois esses mecanismos não foram completamente elucidados. Porém sabe-se que essas células não desempenham apenas papel de barreira, e em razão disso, inúmeros estudos com essas células tem sido realizados (Pitman e Blumberg, 2000). Uma série de mecanismos de defesa amplamente específicos está envolvida na defesa contra ataques de microrganismos (Pitman e Blumberg, 2000). Estudos demostram que as IECs expressam iNOS e produzem NO quando estimuladas por IFN-γ e grandes quantidades de lipopolissacarídeo (LPS) (Stempelj et al.,2007; Forsythe et al., 2002). iNOS pode exercer importante papel na defesa do epitélio. A infecção de células epiteliais com Cryptosporidium parvum induziu a expressão de iNOS e o uso de inibidor da produção de NO resultou em aumentos significativos da taxa de crescimento do parasito, 20 mostrando que essa enzima medeia a defesa contra esse parasito em enterócito (Gookin et al., 2006). Sabe-se que as IECs in vivo, quando imunoestimuladas, expressam iNOS, gerando amostras significantes de NO (Morin et al., 1998; Salzman et al.,1998). Estudos in cito realizados em crianças infectadas com G. lamblia mostram através da analise de imunohistoquímica a presença de iNOS no citoplasma das células epiteliais intestinais (Mokrzycka et al., 2010). 2.2.1. iNOS e NO A estrutura molecular do NO é composta por oxigênio e nitrogênio, ligados por uma ligação dupla (Kroncke et al., 1997). NO é uma molécula de meia vida curta que tem importante papel em muitos processos fisiológicos e patofisiológicos (Keklikoglu et al., 2008). NO foi primeiramente descrito como fator relaxante derivado do endotélio (do inglês EDRF): um potente vasodilatador de curta duração. Estudos subsequentes revelaram seu papel como regulador de fluxo sanguíneo, capaz de induzir variedade de processos fisiológicos, incluindo homeostase tecidual, como neurotransmissor e em processos inflamatórios (Chang et al., 2004). NO é um produto da conversão do amino ácido L-arginina em L-citrulina pela enzima NOS (Óxido Nítrico Sintase) na presença de nicotinamida adenina dinucleotídeo fosfato (NADPH) (Fig. 2) (Chokshi et al., 2008). Existem três isoformas de NOS, cada uma codificada por diferentes genes. Duas dessas isoformas, NOS endotelial (eNOS/NOS 3) e neuronal (nNOS/ NOS 1) são expressas constitutivamente em dois níveis, possuem domínios de ligação a calmodulina em uma forma cálcio dependente e produzem concentrações picomolares de NO (Mayer, 1998). 21 Figura 2 – Reação molecular da produção de óxido nítrico envolvendo a óxido nítrico sintase. Óxido Nítrico Sintase (NOS) catalisa a reação entre arginina e oxigênio, com consumo de 1.5 mol de NADPH para 1 mol de NO produzido. Citrulina e água também são produzidas durante a reação (adaptado de Chokshi et al., 2008). A terceira isoforma, NOS induzida (iNOS/NOS 2) é cálcio independente, se liga com alta afinidade a calmodulina independente da presença do cálcio (Spratt et al., 2007). Em contraste a iNOS não é expressa sob condições normais, mais é induzida durante a inflamação. Essa isoforma produz grandes quantidades de NO (micromolar) por um limitado período de tempo. A iNOS foi originalmente descrita como uma enzima expressa por macrófagos ativados, gerando NO a partir do L-arginina, e assim contribuindo para controle da replicação ou eliminação dos patógenos microbianos intracelulares (Bogdan et al., 2000). Porém, sabe-se que a geração de NO é uma característica genuína de células do sistema imune como DC, NK, mastócitos e células fagocíticas que incluem monócitos, macrófagos, microglia, células de Kuppfer, eosinófilos e neutrófilos. Além disso, o NO também é sintetizado por células que estão envolvidas em reações imunes como as células endoteliais, células epiteliais, células vasculares da musculatura lisa, fibroblastos, queratinócitos, condrócitos, hepatócitos, células mesangliais e células de Schwann (Bogdan, 2001). A isoforma de iNOS é positivamente ou negativamente regulada pelo contato célula-célula (via adesão e moléculas coestimulatórias), citocinas, complexos imune e produtos microbianos e virais (MacMicking et al., 1997; Bogdan, 2000). Embora o IFN- e LPS sejam os mais estudados e descritos como mediadores regulatórios de iNOS, novos mediadores estão sendo descobertos, como a combinação de IL-12 e IL-18 que induzem iNOS em várias populações de 22 macrófagos através de mecanismo mediado por produção autócrina de IFN(Frucht et al., 2001). O papel efetor como antiparasitário do NO e da iNOS in vivo e in vitro foi demonstrado contra um grande número de parasitos que incluem Plasmodium sp., Leishimania sp., Schistosoma sp., T. gondii e Trypanosoma brucei (Motard et al., 1993; Clark et al., 1996). A produção de NO é comumente associada como agente microbicida que regula infecções provocadas por protozoários (Brunet, 2001). O NO pode exercer citotoxidade através de um número diferente de mecanismos (Lyons, 1995), podendo matar diretamente taquizoítos de T. gondii por inibição de enzimas mitocondriais e enzimas nucleares essenciais (Brunet, 2001). Os parasitos podem fazer com que células do sistema imunológico induzam citocinas como: IFN-γ, Fator de Necrose Tumoral alfa (TNFInterleucina I beta (IL-1 e e produtos de patógenos como glicosilfosfatidilinositol podem estimular a expressão de iNOS em células hospedeiras infectadas (Almeida et al., 2000; Tachado et al., 1997). Uma vez realizada a tradução de iNOS, ocorrerá a produção de NO. 3. OBJETIVOS 3.1. Objetivo geral Caracterizar mecanismos microbicidas e o mecanismo de evasão do Toxoplasma gondii em células IEC-6. 3.2. Objetivos específicos - Analisar o desenvolvimento do T. gondii nas IEC-6 residentes e ativadas; - Verificar se a ativação das IEC-6 com IFN- e LPS induzem a expressão de iNOS e produção de NO; - Verificar se ocorre inibição na expressão de iNOS e produção de NO após a infecção do parasito. 23 4. MATERIAL E MÉTODOS 4.1. Manutenção da IEC-6 A linhagem de epitélio intestinal de rato (IEC-6) (Quaroni et al., 1979) foi mantida em garrafas de 25 cm2 com meio Dulbecco’s modified Eagle medium (DMEM) suplementado com 10% de soro fetal bovino (SFB) e 1U/ml de insulina. Essas células foram mantidas a 37º C em atmosfera umidificada de 5% de CO 2. Atingindo confluência, as células foram removidas da garrafa utilizando 1 ml de tripsina a 2% e 0,02% de versene por poucos segundos seguida da adição de 4 ml de DMEM suplementado com 10% de SFB. As células liberadas foram centrifugadas a 500g, 10 min, 4º C, ressuspensas em 1 ml de DMEM, contadas na câmara de Neubauer e 105 (para ensaio de imunofluorescência e crescimento do parasito) ou 106 (leitura de NO) células foram plaqueadas sobre lamínulas redondas em placa de 24 poços. As células foram ativadas após 1 h de plaqueamento inicialmente com diferentes concentrações de IFN- recombinante murino (50, 100, 200, 400, 800, 1600 U/ml) por 24 hs de cultivo sem ou com LPS (0,2 μg/ml). 4.2. Obtenção de Toxoplasma gondii 4.2.1. Taquizoítos Taquizoítos de T. gondii, cepa RH (Sabin e Feldman, 1948), foram mantidos por passagens sucessivas na cavidade peritoneal de camundongos suíços com idade entre três e quatro semanas. Após 48 h o lavado peritoneal foi realizado com DMEM para obtenção dos parasitos (Trembicki et al., 1984), centrifguação 100 g e a quantificação foi feita em câmera de Neubauer. Taquizoítos de T. gondii, cepa ME-49 foram mantidas no meio intracelular de culturas de fibroblastos (célula VERO). Essas células foram mantidas em garrafa de cultura de 25 cm2 usando DMEM suplementado com 10% de SFB a 37º C em atmosfera umidificada de 5% de CO2. Após a liberação dos taquizoitas, o sobrenadante da garrafa (aproximadamente 5 mL) foi transferido para um tubo de 15 mL; 5 mL de DMEM sem soro foram adicionados a garrafa que foi 24 brevemente lavada. Esse meio de cultura contendo mais parasitos foi transferido para o mesmo tubo de 15 mL, totalizando 10 mL aproximadamente. O sobrenadante foi centrifugado a 50 g por 5 min na centrifuga não refrigerada para descarte de restos celulares. O sobrenadante foi centrifugado a 500g por 10 min, homogeneizado com 1 mL de DMEM sem soro e o número de parasitos foi quantificado conforme a cepa RH. 4.2.2. Cistos teciduais A cepa ME-49 foi mantida em camundongo em banco de parasitos localizado no infectório do LBCT. A manutenção do banco foi realizada da seguinte maneira: camundongos suíços foram inoculados via peritoneal com 20 cistos de ME-49, em 0,2 mL de PBS. Quando estes camundongos atingiram o estágio crônico da doença (3 meses após a inoculação) foram eutanasiados com CO2, os cérebros removidos e homogenizados em 1 ml de PBS. Em seguida, foi realizada a contagem dos cistos, em alíquotas de 20μl entre lamina e lamínula. A utilização de parasitos provenientes deste banco em experimentos anteriores demonstra uma padronização dos cistos utilizados, tanto em tamanho quanto em quantidade. Esta metodologia foi adaptada de Liesenfeld et al. (1996). 4.3. Interação de IEC com Toxoplasma gondii As interações das IEC com taquizoítos das cepas RH e ME-49 de T. gondii foram realizadas a 37ºC, atmosfera de 5% de CO2 utilizando a proporção de 5:1 e 10:1 protozoários por IEC respectivamente para verificar o crescimento do parasito e para ensaio de imunofluorescência (item 4.4) após 24 e 48 h de infecção e 1:1 protozoários por IEC para dosagem de NO no sobrenadante (item 4.5). 4.4. Expressão da iNOS revelada por imunofluorescência As lamínulas com células aderidas obtidas conforme o item 4.3 foram coletadas e fixadas por 30 min com 3% de formaldeído recém preparado em PBS, lavadas 3 vezes com PBS, permeabilizadas com 0,5 % de triton em PBS, 25 incubadas por 30 min em 50mM de cloreto de amônio em PBS e 10 min em PBS contendo 3% de albumina sérica bovina (BSA-PBS). As células foram incubadas por 40 min com anticorpo policlonal anti-iNOS de coelho (Santa Cruz, sc-8310) diluído 1:50 em PBS-BSA e anti- T. gondii (soro de camundongos cronicamente infectados com T. gondii) diluído 1:5000 em PBS-BSA. As células foram lavadas 2 vezes com PBS e 1 vez com PBS-BSA; incubadas por 30 min com anticorpo antiIgG de coelho marcado com Alexa 488 (invitrogen), para revelar iNOS, diluído 1:200 em PBS-BSA e anti-mouse IgG conjugado com TRITC (sigma) diluído 1:200 em PBS-BSA, para revelar taquizoitos. As células foram lavadas 8 vezes com PBS, montadas em Prolongold com DAPI (Molecular Probes) e as Imagens capturadas com câmera AxioCam Mrc5 no sistema Axiovision da Zeiss. 4.5. Avaliação de nitrito NO foi indiretamente avaliado medindo-se o nitrito nos sobrenadantes das culturas coletados após 24 e 48 h de ativação (Green et al., 1982). Brevemente, 50µl do sobrenadante de cada poço foi colocado com um mesmo volume do reagente de Griess (1:1, de 0,1% N-1-nafeti-etilanadiamina, Sigma – N-5889, em água destilada e 1% de sulfanilamida, Sigma – S-9251 em 5% de ácido fosfórico, Sigma – P5811) em placas de 96 poços. Após 10 min, a concentração de nitrito foi avaliada através da leitura da absorbância em 540 nm. A concentração de nitrito foi calculada a partir de uma curva padrão pré-calibrada usando nitrito de sódio diluído em DMEM. 4.6 Avaliação do crescimento do Toxoplasma gondii em IEC-6 Após interação de IEC-6 com T. gondii (RH) em diferentes tempos (2, 24 e 48 h), as lamínulas foram recolhidas, fixadas em metanol, e coradas com solução de Giemsa (diluído em água destilada na proporção de 1:10), desidratadas numa série de soluções acetona-xilol, montadas sobre Entellan e observadas em microscópio óptico Axioplan - ZEISS. As células coradas foram quantificadas da seguinte forma: a) porcentagem de IEC-6 com parasitos, b) número médio de parasitos aderidos nas IEC-6, c) número médio de parasitos interiorizados. Essas 26 contagens foram utilizadas para analisar o desenvolvimento do T. gondii nas IEC6 residentes e ativadas com IFN-γ. 4.7 Estatística Foram realizados Testes T Student para observar a significância dos resultados utilizando p<0,05 e teste Tukey a 5% de probabilidade. 27 5. RESULTADOS 5.1. Análise do desenvolvimento do Toxoplasma gondii em IEC-6 residentes e ativadas com IFN- As IEC-6 foram infectadas com diferentes concentrações de T. gondii e o seu crescimento analisado. As IEC-6 não ativadas são susceptíveis a infecção, pois taquizoítos se multiplicaram nestas células. IEC-6 resistiu por até 48 h de infecção pelo t. gondii (Tabela 1). 28 Tabela 1. Desenvolvimento do Toxoplasma gondii (cepa RH) em IEC-6 residentes Tempo / Quantidade de parasitos por poço Células 2h 1x105 2h 5x105 2h 1x106 24 h 1x105 24 h 5x105 24 h 1x106 48 h 1x105 11,65±2,63 15,7±10,0 30,87±7,7 12,85±2,74 25,11±8,8 18,9±6,92 9,3±2,59 Ader 1,5±0,17 1,47±0,32 1,2±0,14 1,1±0,12 1,15±0,43 0,7±0,42 1,0±0,15 1,0±0,24 0,34±0,32 Int 0,08±0,12 0,029±0,1 0,1±0,56 0,05±0,10 3,14±0,78 2,3±0,88 0,4±0,15 7,0±0,9 5,97±0,8 IEC c/ IEC-6 c/- Células epiteliais intestinais infectadas com toxoplasma gondii (cepa RH) Ader -Número médio de parasitos aderidos Int- Número médio de parasitos interiorizados 48 h 5x105 48 h 1x106 20,9±11,11 27,32±7,02 29 Foi analisada a capacidade microbicida da IEC-6 ativadas com IFN-γ frente ao T. gondii. Houve diminuição do número de células infectadas com T. gondii após 2, 24 e 48 h de infecção nas células ativadas com 800 U/ml de IFN(Tabela 2). Quando as células foram ativadas com o dobro da quantidade de IFN(1600 U/ml) não houve diminuição de células infectadas. Tabela 2. Efeito do Interferon-gamma (IFN- ) no desenvolvimento do Toxoplasma gondii, cepa RH, em IEC-6. Cepa RH % de células infectadas Tempo após infecção com T. gondii 2h 24 h 48 h Controle 25,4 ± 3,33 44,84 ± 4,54 51,48 ± 2,35 Células com 800 U IFN- 7,16 ± 3,63* 9,99 ± 7,79* 27,39 ± 7,77* Células com 1600 U IFN- 26,79 ± 8,35 ns 9,71 ± 0,98 ns 41,45 ± 5,32 ns n=3 P<0,05 *Significativamente diferentes em relação ao valor de IEC-6 infectadas não ativadas (controle) ns= não significativo. 5.2. IEC-6 expressaram a enzima oxido nítrico sintase e produziram óxido nítrico Primeiramente foi avaliado se havia capacidade de produção de NO in vitro pelas IEC-6. As células foram primeiramente estimuladas com LPS (0,2 μg/ml) e IFN- (200, 400, 800U/ml). Os resultados da leitura de NO (Tabela 3) mostraram que as IEC-6 produziram NO em maior quantidade quando estimuladas somente com IFN- . Esses resultados estão de acordo com os de imunofluorescência no qual a maior quantidade de expressão de iNOS pelas IEC-6 foi verificado em células ativadas somente com IFN- (Figura 3). 30 Tabela 3. Dosagem de óxido nítrico em células epiteliais intestinais-6 após estimulação com Interferon-gamma (IFN- ) e Lipopolissacarídeo (LPS). Produção de Nitrito (µM) 24 h IEC-6 Ativado 200 U/ml IFN- e LPSa 3,09 ± 1,43 Ativado 200 U/ml IFN- 6,38 ± 1,38* Ativado 400 U/ml IFN- e LPSa 4,97± 0,94 Ativado 400 U/ml IFN- 9,99 ± 1,82* Ativado 800 U/ml IFN- e LPSa 4,29 ± 3,16 Ativado 800 U/ml IFN- 9,84 ± 0,90* a Concentração LPS = 0.2 ug/ml n=3 P<0,05 *Significativamente diferentes em relação ao valor de IEC-6 ativadas com IFN- (200, 400, 800) e LPS. 31 Figura 3. Microscopia de Fluorescência de IEC-6 residentes ou ativadas marcadas com anti-iNOS. (A) IEC-6 residente cultivada por 24 h. (B) IEC-6 ativada com interferon-gamma (IFN- ) e lipopolissacarídeo (LPS) por 24 h. (C) IEC-6 ativada com (IFN- ) por 24 h. Note a alta expressão de iNOS pelas IECs ativadas somente com IFN- .Barra: 20 μm 32 Em razão das IEC-6 apresentarem maior expressão de iNOS quando estimuladas somente com IFN- . Nós estimulamos essas células com diferentes concentrações de IFN- que variavam de 50 à 1.600 U/ml. Foi verificado que a medida que aumentava-se a concentração de IFN- aumentava-se também a produção de NO por essas células (Tabela 4). Porém, quando as células foram ativadas com 800 U/ml IFN- houve maior produção de NO pelas IEC-6 de acordo com o teste Tukey a 5% de probabilidade. Tabela 4. Dosagem de óxido nítrico em células epiteliais intestinais após estimulação com diferentes concentrações de Interferon-gamma (IFN- ). Concentrações Interferon-gamma Produção de NO ( M) IEC-6 Residente 14,65 e 50 U 17,5 b 100U 17,5 b 200U 17,28 c 400U 17,59 b 800U 18,68 a 1250U 16,45 d 1600U 17,54 b Médias seguidas de mesma letra, na mesma coluna, não diferem estatisticamente entre si pelo Teste de Tukey a 5% de probabilidade. Após confirmação da concentração ideal para estimulação da expressão de iNOS e produção de NO pelas IEC-6 foi analisada a capacidade da infecção do T. gondii em inibir a expressão dessa enzima e consequentemente a produção de NO. As IEC-6 foram ativadas com 800U/ml de IFN- por 24 h e em seguida infectadas com duas diferentes cepas de T. gondii (RH ou ME-49) por 24 e 48 h. Ambas as cepas inibiram a expressão de iNOS e a produção de NO. No entanto, a cepa ME-49 foi menos eficiente na manutenção da inibição após 48 h de infecção (Tabela 5). Para confirmação dos resultados foi feito ensaio de imunofluorescência. Ambas as cepas inibiram a expressão de iNOS após 24 h de infecção (compare Figura 4a com 4b e 4c). A baixa expressão de iNOS foi mantida após infecção 33 com a cepa RH por 48 h (compare Figura 4d com figura 4e). Porém, IEC-6 infectada com a cepa ME-49 recuperaram a expressão de iNOS após 48 h de infecção (Figura 4f). Tabela 5. Inibição da produção de óxido nítrico após infecção com Toxoplasma gondii em células epiteliais intestinais (IEC-6) ativadas. IEC-6 Produção de Nitrito ( M) 24 h % inibição 24 h 48 h % inibição 48 h Não infectada 16,5 ± 3,52 - 17,0 ± 3,08 - T. gondii RH 8,3 ± 0,26* 49,7 7,4 ± 1,16* 56,5 T. gondii ME-49 9,5 ± 0,20* 42,4 15,2 ± 0,46ns 10,6 n=3 P<0,05 *Significativamente diferentes em relação ao valor de IEC-6 ativadas com IFN- não infectadas. ns= não significativo 34 Figura 4. Microscopia de fluorescência de células epiteliais ativadas marcadas com anti-iNOS (verde) e anti-Toxoplasma gondii (laranja). (A) IEC-6 não infectadas ativadas por 24 h. (B) IEC-6 ativadas infectadas por 24 h com T. gondii (cepa RH). (C) IEC-6 ativadas, infectadas for 24 h com T. gondii (ME-49). (D) IEC6 não infectadas ativadas por 48 h. (E) IEC-6 ativadas infectadas por 48 h com T. gondii (cepa RH). (F) IEC-6 ativadas infectadas por 48 h com T. gondii (ME-49). Note a diminuição da expressão de iNOS após infecção com T. gondii de ambas as cepas, no entanto, após 48 h de infecção a IEC-6 infectada com ME-49 recuperou a expressão de iNOS Barra: 20 μm 35 6. DISCUSSÃO Durante a infecção oral com T. gondii as IEC-6 são as células que primeiramente tem o contato com o parasito (Buzoni-Gatel et al., 2006). T. gondii atravessa essas células sem se multiplicar (Speer e Dubey, 1998) e irá se desenvolver nas células da lamina própria incluindo macrófagos e neutrófilos (Speer e Dubey, 1998; Dunay et al., 2008). Durante esse processo pode ocorrer extensa necrose no intestino, especialmente no íleo, que irá variar dependendo da cepa do parasito e da linhagem do camundongo (Liesenfeld, 2002). Porém as IECs são uma das células mais resistentes a infecção com T. gondii presentes no íleo (Dunay et al., 2008). No presente trabalho, demonstramos que T. gondii foi capaz de se multiplicar nas IEC-6 e que a ativação dessas células com IFN-γ leva a diminuição da replicação do parasito. Também foi demonstrado que essas células expressam iNOS e produzem NO. Porém, a infecção com T. gondii inibe a expressão dessa enzima e a produção de NO por essas células. Primeiramente foi analisado o desenvolvimento do T. gondii nas IEC-6. As IEC-6 residentes são susceptíveis a infecção, pois taquizoítos se multiplicaram nestas células. IEC-6 resistiu por até 48 h de infecção. (Tabela 1). Trabalhos anteriores (Meng et al., 2009) nos quais foram realizadas analise do crescimento do T. gondii nas IEC-6 também demonstraram a suscetibilidade dessas células a infecção e proliferação do parasito (Meng et al., 2009). Nossos dados (Tabela 2) confirmam que as IEC-6 quando ativadas com IFN- , inibem a replicação do parasito. Esses resultados confirmam dados publicados em trabalhos anteriores nos quais foi demonstrada a capacidade de inibição da replicação do parasito pelas IECs ativadas (Dimier e Bout, 1993; Dimier e Bout, 1998). Contudo, no trabalho de Dimier e Bout, (1993 e 1998) foi demonstrado que o desenvolvimento do T. gondii é inibido em razão da diminuição do ferro intracelular. No entanto, existem outros mecanismos que podem levar a inibição do T. gondii. Dois desses mecanismos já foram previamente demonstrados em macrófagos, como o envolvimento da autofagia (Subauste, 2009) e produção de NO (Brunet, 2001). Sabe-se que após a entrada do T. gondii na célula hospedeira há a formação do VP. Esse vacúolo, que até então era caracterizado como não fusogênico com o lisossomo, passa a ser visto como alvo de degradação 36 lisossomal (Subauste, 2009). Isso ocorre quando as células são ativadas com IFN- que induz a formação de um vacúolo autofagossomico ao redor do VP que leva o vacúolo a fusão com o lisossomo e degradação do T. gondii (Ling et al.,2006). O mecanismo de autofagia ocorre em todos os tipos celulares, de leveduras até mamíferos (Deretic, 2006). Portanto, a inibição do T. gondii mediada por autofagia induzida pela ativação do IFN-γ também pode estar ocorrendo nas IECs. Novos estudos são necessários para se verificar essa possibilidade. Além disso, no estudo realizado por Dimier e Bout, a produção de NO não foi detectada. Todavia, a produção de NO pelas IEC-6 foram demonstradas em outros estudos (Stempelj et al., 2007; Forsythe et al., 2002). Estudos mostram o potencial das células epiteliais na produção de NO como molécula efetora contra a proliferação de G. lamblia (Eckmann, 2003). Para verificar a capacidade das IEC-6 de expressar iNOS e produzir NO estimulamos essas células com IFN- e LPS. A adição de LPS resultou em baixa expressão de iNOS e baixa produção de NO provavelmente em função da concentração utilizada. O LPS induz produção de NO pelas IEC-6 como demonstrado por Stempelj et al. (2007) e Forsythe et al. (2002). Entretanto as concentrações utilizadas por esses autores foram respectivamente maiores (25 μg/ml e 50 μg/ml) as empregadas aqui. Desta forma, é possível que não tenha havido estímulo suficiente do LPS contido na cultura para sinergizar com IFN- e aumentar a expressão de iNOS e a produção de NO pelas IEC-6. Além disso, a pequena quantidade de LPS utilizado em nosso trabalho possivelmente exerceu efeito inibitório na expressão de iNOS pelas IEC-6 por mecanismo ainda não conhecido. Após resultados que demonstraram efeito inibitório na produção de NO pelo LPS, as células passaram a ser ativadas somente com IFN- . Diferentes concentrações que variavam de 50 a 1600U/ml foram testadas (Dimier e Bout, 1998). De acordo com os resultados a concentração de 800U/ml de IFNproporcionou maior produção de NO pelas IEC-6. Os resultados do desenvolvimento do parasito demonstraram que o efeito inibitório da replicação do T. gondii é dose dependente. Em nosso modelo, maior concentração de IFN-γ induziu maior produção de NO pelas IECs, indicando que a produção de NO por essas células também é dose dependente, podendo ser esse um mecanismo 37 também utilizado pelas IEC com ação microbicida capaz de inibir a replicação do T. gondii nessas células (Brunet, 2001). Os níveis de NO produzidos pelas IEC-6 detectados neste trabalho foram menores quando comparados com a produção de NO por macrófagos (Seabra et al., 2002). Isso mostra que as IEC-6 podem produzir NO. Porém, não são tão eficientes como os macrófagos. iNOS é extremamente presente nas células da lâmina própria do íleo de camundongos C57Bl/6 após infecção oral pelo T. gondii (Dunay et al., 2008). Além disso, a baixa resistência dos camundongos knockout para o receptor da proteina MCP1 infectados apresentaram baixa expressão de iNOS nas células da lamina própria. Entretanto, as IEC-6 desses camundongos eram extremamente positivas para iNOS (Dunay et al., 2008). Embora essas células sejam positivas para iNOS, a baixa produção de NO demonstrada em nosso trabalho sugerem que a produção de NO não contribuiu muito para controle do T. gondii por essas células. Ambas as cepas de T. gondii inibiram a expressão de iNOS e a produção de NO após 24 h de infecção. Esse mecanismo de evasão é similar a um dos mecanismos descritos em macrófagos ativados (Guillermo e DaMatta, 2004; Seabra et al., 2002; Seabra et al., 2004). Embora o NO seja caracterizado como agente microbicida contra T. gondii (Adams et al, 1990) a similaridade na inibição da produção de NO entre macrófagos e IEC-6 indicam que a capacidade do T. gondii de evadir a produção de NO é semelhante. O exato mecanismo molecular pelo qual o T. gondii inibe a produção de NO será estudado. O fato da cepa ME-49 não inibir a expressão de iNOS após 48 h indica que a baixa virulência dessa cepa não possui requisitos suficientes para evadir da atividade microbicida da célula. Além disso, essa cepa pode ser destruída por outros mecanismos microbicidas como destruição vacuolar dependente das IRG que tem sido demonstrado em macrófagos ativados (Zhao et al., 2009) ou por mecanismos que envolvem autofagia (Zhao et al., 2009; Andrade et al.,2006; Subauste, 2009). 38 7. CONCLUSÃO Toxoplasma gondii invade e se multiplicar nas IEC-6 in vitro. Essas células quando ativadas inibem o desenvolvimento do T. gondii, expressam iNOS e produzem NO. Toxoplasma. gondii inibe esse mecanismo microbicida. Entretanto, somente a cepa mais virulenta (RH) mantem a inibição por 48 h. Novos estudos são necessários para melhor entendimento dos mecanismos moleculares que controlam a inibição de NO como mecanismo microbicida nas IEC-6 e se existe envolvimento de autofagia no processo. 39 8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Adams, L.B., Hibbs, J.B., Taintor, R.R., Krahenbuhl, J.L. (1990) Microbiostatic effect of murine-activated macrophages for - Toxoplasma gondii: Role for synthesis of inorganic nitrogen oxides from L-arginine. J. Immunol. 144: 27252729. Almeida, I.C., Camargo, M.M., Procopio, D.O., Silva, L.S., Mehlert, A., Travassos, L.R (2000) Highly purified glycosylphosphatidylinositols from Trapanosoma cruzi are potent proinflammatory agents. EMBO J. 19:1476–1485. Ambroise-Thomas, P., Pelloux, H (1993) Toxoplasmosis congenital and in immunocompromised patients: a parallel. Parasitol Today. 2:61–63. 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