Parecer do Grupo Técnico de Auditoria em Saúde 2 8 /0 6 Tema: Plasmaférese terapêutica em doenças hematológicas. I – Data: 14/06//2006 II – Grupo de Estudo: Dra. Célia Maria da Silva Dra. Silvana Márcia Bruschi Kelles Dr. Lucas Barbosa da Silva Dra. Lélia Maria de Almeida Carvalho Bibliotecária: Mariza Cristina Torres Talim III – Tema: Uso do procedimento hemoterápico plasmaférese terapêutica em doenças hematológicas: púrpura trombocitopênica trombótica, púrpura póstransfusional e Síndrome de hiperviscosidade plasmática. IV – Especialidade(s) envolvida(s): Hemoterapia e Hematologia V – Questão Clínica / Mérito: Quais são as evidências científicas para o uso da plasmaférese terapêutica nas doenças hematológicas: púrpura trombótica trombocitopênica e púrpura aloimune pós-transfusional plasmática? Esta prática é custo-efetiva? e síndrome de hiperviscosidade VI – Enfoque: Tratamento VII – Introdução: Aférese é o procedimento caracterizado pela retirada do sangue total de um doador ou paciente, com separação dos seus componentes, por meio de centrifugação ou filtração e devolução do remanescente ao doador ou paciente. De acordo com o componente removido, a aférese pode ser classificada em plasmaférese (remoção de plasma), leucaférese (remoção de granulócitos e ou linfócitos), eritrocitaférese (remoção de eritrócitos) e plaquetaférese (remoção de plaquetas) (1). Na plasmaférese as células são reinfundidas ao mesmo tempo em que se faz a remoção do plasma. Soluções de reposição substituem o plasma removido, mantendo-se o equilíbrio volumétrico e oncótico. Conforme a patologia, pode ser usado o plasma fresco congelado (PFC), solução de albumina a 5%, soluções cristalinas, entre outras. A purificação extracorpórea do sangue é um procedimento complexo: exige tecnologia avançada, equipe técnica especializada, centros de referências habilitados para o procedimento, unidade de diálise ou banco de sangue. Acesso venoso calibroso é necessário. Não é isenta de riscos, mas de maneira geral, é um procedimento seguro e eficaz. Os eventos adversos mais comuns para o procedimento são a dificuldade de acesso, hipotensão, complicações quanto ao uso do citrato (anticoagulante), sangramentos e distúrbios hemodinâmicos. Há, ainda, que se considerar todos os efeitos adversos inerentes às transfusões de hemocomponentes e/ou derivados do sangue como a albumina (1, 2). As indicações para plasmaférese terapêutica são constituídas, na sua maioria, por doenças hematológicas e doenças neurológicas. Este parecer refere-se às plasmaféreses terapêuticas para doenças com Categoria I de indicação, de acordo com a Associação Americana de Bancos de Sangue (AABB) e Associação América de Aférese (ASFA) e serão estudadas a Púrpura Trombótica Trompocitopênica (PTT) e a Púrpura pós-transfusional, além da Síndrome de hiperviscosidade plasmática. A púrpura trombótica trombocitopênica (PTT) é uma síndrome clínica rara, caracterizada por anemia hemolítica microangiopática. Na forma clássica exibe uma péntade clínica com trombocitopenia, anemia hemolítica microangiopática, sinais neurológicos flutuantes, febre e comprometimento renal. Tem curso clínico insidioso, freqüentemente, mas pode apresentar-se de forma aguda com morte súbita ou levar à morte em 24-72 horas. É acompanhada por trombose microvascular que causa isquemia e infarto tecidual variáveis. Quando associada com câncer, certos tipos de drogas, infecções e transplantes de tecidos apresenta pior prognóstico. Os mecanismos fisiopatológicos ainda não estão totalmente elucidados, e recentemente a identificação da deficiência de uma metaloprotease denominada ADAMTS 13 mostrou ser a causa de muitos casos de PTT idiopática (3). O reconhecimento precoce com início imediato do tratamento é vital, havendo piora prognóstica se há atraso na instituição da terapêutica. O tratamento padrão ouro para a PTT ainda é a plasmaférese com nível de indicação I pela AABB e ASFA. Antes da sua instituição, o índice de mortalidade era acima de 90%, com queda para 20% a 30% o uso da plasmaférese terapêutica (4,5). A púrpura pós-transfusional é caracterizada por trombocitopenia aguda que ocorre aproximadamente uma semana após a transfusão de hemácias, plasma contendo plaquetas ou concentrado de plaquetas. A trombocitopenia resulta da destruição das plaquetas por aloanticorpos específicos contra antígenos plaquetários, geralmente do grupo HPA-1a. A AABB e ASFA colocam a plasmaférese terapêutica como indicação nível I para o tratamento da púrpura pós-transfusional. Entretanto, o uso da imunoglobulina IV é altamente efetiva, ficando a plasmaférese como opção para os raros casos refratários (6). Categoria I para indicações de aférese terapêutica, segundo AABB e ASFA Patologia Procedimento Categoria Polineuropatia inflamatória crônica desmielinizante Plasmaférese I Polineuropatia inflamatória aguda (Guillain-Barré) Plasmaférese I Polineuropatia desmielinizante com IgG e IgA Plasmaférese I Miastenia gravis Plasmaférese I Citaférese I Púrpura trombocitopênica trombótica Plasmaférese I Púrpura pós-transfusional Plasmaférese I Anemia falciforme (STA, AVC) EST I Doença hemolítica do RN EST I Adsorção seletiva I Plasmaférese I Fotoaférese I Leucocitose e trombocitose Hipercolesterolemia familiar Doença do ac anti-membrana basal glomerular Linfoma de célula T cutâneo Categoria de indicação para aférese terapêutica I: Terapia padrão e aceitável tanto como terapia primária quanto de primeira linha em adjuvância com outras terapias iniciais. Eficácia baseada em ensaios clínicos controlados estudos bem desenhados ou em ampla base de experiência publicada (4). VIII – Registro ANVISA: RDC no. 153 – ANVISA/MS http://www.anvisa.gov.br/sangue/legis/sangue_componentes.htm#resolucoes IX – Metodologia 1. Bases de dados pesquisadas: Bireme, Cochrane Library, Pub Med, Medline, Lilacs. 2. Palavras-chave utilizadas: plasmaférese, aférese terapêutica, Púrpura trombocitopênica trombótica, púrpura pós-transfusional. 3. Desenhos de estudos procurados: revisão sistemática de ensaios clínicos controlados e randomizados, metanálises, estudos prospectivos, série de casos, artigos de revisão, guidelines. 4. A pesquisa bibliográfica foi realizada no período 1995 a 2006. 5. Resultados encontrados e selecionados: 1 revisão sistemática, 1 ensaio clínico randomizado, 10 artigos de revisão, 3 séries de casos, 1 livro texto, 1 norma técnica Anvisa, 2 guidelines. 6. População incluída: pacientes com púrpura trombótica trombocitopênica, pacientes com púrpura pós-transfusional e pacientes com hiperviscosidade plasmática. X – Revisão Bibliográfica: Plasmaférese em doenças hematológicas 1) Púrpura trombocitopênica trombótica Em 1924 Moschcowitz relatou o caso de uma paciente de 16 anos que desenvolveu anemia hemolítica, plaquetopenia, distúrbios neurológicos e comprometimento renal, que faleceu de infarto cerebral e insuficiência cardíaca. À autópsia foram encontrados trombos disseminados na microcirculação, principalmente nas arteríolas terminais. Casos similares estudados até 1935 foram denominados de síndrome de Moschcowitz. Mais tarde, o nome púrpura trombocitopênica trombótica (PTT) foi usado para designar a síndrome clínica que compreende cinco achados clínicos principais: anemia hemolítica, plaquetopenia, febre, insuficiência renal e distúrbios neurológicos. O quadro clássico completo, exibindo os cinco aspectos clínicos, porém, ocorre somente em 40% dos casos: a) Anemia hemolítica intravascular: com Coombs direto negativo, levando à redução da haptoglobina e, às vezes, produzindo hemoglobinúria. O esfregaço sangüíneo característico exibe esquisócitos com policromasia e freqüentemente presença de eritroblastos. Aumento dos níveis da desidrogenase lática (LDH), presente no início da doença, é conseqüência da hemólise e principalmente da isquemia tecidual, secundária à obstrução da micro-circulação pelos trombos. b) Plaquetopenia: chega a níveis abaixo de 50.000 plaquetas/mm3, na maioria dos pacientes. Entretanto, a púrpura é pouco significativa, podendo ocorrer hemorragias retinianas, contudo sangramento ativo não é comum. c) Sintomas neurológicos: são comuns, ocorrendo em até 90% dos pacientes, durante o curso da doença. As manifestações neurológicas mais comuns são dor de cabeça, paralisia de nervos cranianos, afasia, hemiparesia, disartria, confusão, estupor e coma. Podem ser multifocais, transitórias, mas recorrentes. Embora o coma ou semicoma sejam preditivos de má resposta à terapêutica, os pacientes podem recuperar-se totalmente, sem apresentar seqüelas neurológicas. Apesar disso, mais da metade dos pacientes com alterações neurológicas podem manter disfunções residuais. d) Insuficiência renal: parece ser menos comum do que relatada inicialmente, tendo sido detectada até um ano após o diagnóstico em 25% de uma série de casos estudados. e) Febre baixa: pode ocorrer em um quarto dos pacientes no início da doença e pode também ser conseqüência da plasmaférese, terapia padrão para a PTT. A síndrome pode apresentar-se, menos comumente, como patologia abdominal, seja como pancreatite ou abdome agudo, além de obstrução intestinal, ou ainda se manifestar por morte súbita ou dentro de 24 a 72 horas, sem aparecimento de quaisquer sinais. Tais eventos podem ser devidos à obstrução de vasos por microtrombos do miocárdio ou afetar o sistema de condução elétrica. Alguns dos aspectos clínicos podem exigir o diagnóstico diferencial com síndrome hemolítico-urêmica (SHU) ou coagulação intravascular disseminada (CIVD). Entretanto, tanto a PTT como a SHU não mostram alterações nos exames de coagulação presentes na CIVD. Além disso, aspectos epidemiológicos são importantes no diagnóstico da SHU, que acomete mais crianças, geralmente após curso de diarréia relacionada à toxina produzida pela Escherichia coli e tem a insuficiência renal como principal complicação. A PTT é rara, com ocorrência de 3 a 7casos/ano/1.000.000 indivíduos. A faixa etária predominante está entre 30 e 40 anos de idade, com predomínio no sexo feminino (2:1). A maioria dos casos é idiopática e somente 15% têm fatores etiológicos identificados como gravidez, transplante de medula óssea (TMO), drogas como ticlopidine, infecções como HIV ou Bartonella, ou doenças malignas, mais comumente adenocarcinoma gástrico. Provavelmente, estes casos secundários, apresentam fisiopatologia diferente da PTT idiopática. Existe, ainda, uma rara forma familiar. Pode-se apresentar de forma aguda, intermitente e crônica recidivante. O encontro de depósito hialino nas paredes capilares, entre a face subendotelial e camadas musculares das arteríolas, são achados histopatológicos característicos na PTT. Supõe-se que estas lesões sejam derivadas dos trombos de plaquetas incorporados à parede vascular e recobertos por células endotelias neoformadas. Aceita-se, que a PTT resulta da combinação de lesão endotelial mais agregação plaquetária (8). A compreensão da fisiopatologia da PTT vem apresentando progressos e foi identificada uma protease que cliva as grandes moléculas do fator de von Willebrand (FvW). Esta protease foi isolada, seqüenciada e denominada ADAMTS 13 (a disintegrin-like and metalloprotease with thrombospondin type1). Existe a hipótese de que os multímeros anormalmente grandes de FvW, induzam à adesão plaquetária na microcirculação, em presença de turbilhonamento do fluxo sangüíneo. Em 33% a 100% dos pacientes com PTT idiopática observa-se acentuada redução desta protease (<5%), bem como a presença de anticorpos dirigidos a ela. Esta redução ocorre também nos casos de PTT familiar, recidivante (9). Em estudo controlado, multicêntrico com 111 pacientes com anemia microangiopática trombótica, Veyradier e colaboradores relataram aumento dos níveis do Ag FvW, com distribuição heterogênea dos multímeros e defeito naqueles de alto peso molecular, além de formas anormalmente grandes. Mostraram que a deficiência da protease clivadora dos multímeros do FvW estava associada com a gravidade da plaquetopenia. E enfatizou que a deficiência da protease, especificamente, corresponde a um subgrupo de anemia microangiopática trombótica, a entidade púrpura trombocitopênica trombótica (10). O tratamento da PTT está baseado na plasmaterapia, sendo que antes dela a mortalidade excedia 90% dos casos. Com a instituição desta modalidade terapêutica, o índice de mortalidade fica em torno de 10% a 20%. A partir de 1991 a plasmaférese tornou-se a terapia de escolha. O uso empírico disseminado da plasmaférese originou da hipótese fisiopatológica da existência de uma substância tóxica circulante e/ou deficiência de um fator plasmático para esta doença, passíveis de serem removidos ou repostos pela plasmaférese. Os recentes conhecimentos sobre a deficiência da metaloprotease plasmática ADAMTS 13 e auto-anticorpos a ela dirigidos explicam a eficácia da infusão plasmática (reposição da protease deficitária) e remoção plasmática (retirada dos auto-anticorpos) e dos multímeros anormalmente grandes do FvW. Apesar de a plasmaférese constituir-se em importante pilar para o tratamento da PTT, ainda existem questões a serem respondidas para os vários aspectos de sua aplicação (9). Tratamento da PTT com esquema de plasmaférese: A plasmaférese deve ser iniciada dentro 24 horas após apresentação do quadro, principalmente nos casos mais graves. Se a plasmaférese não estiver disponível, deve-se usar a infusão de plasma na dose de 25ml/kg por dia, que é superior a nenhuma terapêutica plasmática. Em vários centros atualmente, inicia-se com uma troca na apresentação da doença, reservando esquemas mais intensivos para os casos resistentes. Tratamento intensivo exige trocas de 1,5 vezes a volemia do paciente ou duas trocas diárias de 1,0 a 1,5 vezes do volume plasmático. É consenso que as sessões devam ser mantidas até 2 dias após a remissão. Esta, geralmente, definida como normalização dos sinais neurológicos, normalização do número de plaquetas (≥150.000) e dos níveis de LDH e aumento do nível de hemoglobina. O número de sessões para se alcançar a remissão clínica é extremamente variável. Não há nenhum parâmetro clínico preditivo da duração da plasmaférese. A diversidade de resposta pode refletir a heterogeneidade das condições clínicas classificadas como PTT. Em alguns pacientes, o rebote de inibidores da ADAMTS 13 durante o tratamento, com deterioração clínico-laboratorial, pode ser observado. Assim a monitorizarão, após a suspensão da terapêutica, deve ser cuidadosa, pois em 18 a 86% dos casos de PTT pode ocorrer a recaída. Mesmo assim, não está indicada a redução progressiva das sessões (9). Fluído de troca: O plasma fresco congelado (PFC) é o fluído padrão para reposição na PTT aguda. Advogou-se que o uso do crio-sobrenadante plasmático seria superior, pois não contém os grandes multímeros do FvW e contém quantidade normal da protease ADAMTS 13. Entretanto, os estudos disponíveis falharam em identificar diferença significativa nos desfechos clínicos com o uso do criosobrenadante quando comparado com o PFC. O plasma de quarentena, plasma tratado com azul de metileno ou plasma tratado com solventedetergente (S/D) e o plasma tratado fotoquimicamente preservaram a atividade da ADAMTS 13. O plasma S/D contém menores quantidades dos grandes multímeros de FvW do que o PFC ou MBP (plasma/azul de metileno) e foi usado com segurança na plasmaférese para PTT. Porém, também não há nenhum estudo controlado disponível comparando o desfecho clínico dos pacientes (9). Um pequeno estudo retrospectivo do Grupo de PTT Americano sugeriu que o uso de solução de albumina a 5% como fluído de troca para a primeira metade inicial da plasmaférese (fase de lavagem) e PFC para a segunda metade (fase de reposição) pode ser equivalente, ou até mesmo melhor do que o uso do PFC sozinho (11). Finalmente, não há nenhuma evidência convincente de que quaisquer alternativas de fluídos sejam superiores ao PFC para a plasmaférese na PTT (9). Efeitos adversos da plasmaférese na PTT: Os efeitos adversos associados à plasmaférese ocorrem em aproximadamente 10% dos procedimentos. O risco é maior para os pacientes que recebem plasma ao invés de soluções coloidais como fluído de troca. Como a maioria dos pacientes com PTT são submetidos a várias sessões, os eventos adversos giram em torno de 40%. A maioria dos eventos consiste de reações alérgicas e anafilactóides e reações febris. Foram relatadas em 0% a 4% para mais de 70.000 procedimentos. Os casos fatais foram devido a lesões intrapulmonares relacionados à transfusão (TRALI) não reconhecida, complicações com cateter venoso central. Podem ocorrer, ainda, sangramentos e infecções (12). Tratamento suportivo da PTT: O tratamento de suporte inclui transfusão de concentrado de hemácias, ou plaquetas (em raras e criteriosas condições) e drogas inibidoras da agregação plaquetária. O conceito de doença com base fisiopatológica imune poderia apontar para uso de drogas imunomoduladoras como drogas imunosupressoras, esplenctomia ou imunoglobulinas. Entretanto, não há, no momento, evidências seguras para o uso de tratamentos, além dos produtos sangüíneos, como alternativa ou adjuvância à plasmaterapia (9). Transfusões de concentrado de hemácias devem ser indicadas com base em parâmetros clínicos. Não há estudo específico conduzido para as transfusões de concentrados de hemácias (CHM) em pacientes com PTT. Entretanto, um estudo multicêntrico, randomizado e controlado sobre a necessidade transfusional em pacientes gravemente enfermos mostrou que o uso dos CHM seria melhor indicado para pacientes com níveis de hemoglobina <7 g/dl, e que os níveis de hemoglobina devem ser mantidos entre 7g/dl e 9g/dl, salvo em pacientes com síndromes coronarianas isquêmicas agudas (13). Transfusões de concentrado de plaquetas (CP) não estão indicadas em pacientes com PTT e vários autores relatam piora no desfecho clínico com o seu uso. Assim, as transfusões de CP devem ser reservadas aos pacientes com níveis muito baixos de plaquetas e que apresentam sangramento ativo ou que se submeterão a procedimentos cirúrgicos (9). Antiagregantes plaquetários não parecem adicionar benefícios e se forem usados, devem ser evitados até que os pacientes se recuperem de plaquetopenia acentuada (<50.000) (9). Outras medidas como profilaxia de fenômenos trombo-embólicos devem ser iniciadas em pacientes imobilizados, com heparina de baixo peso molecular, logo que o paciente diminua os riscos de sangramento, principalmente na presença de outros fatores de risco para eventos tromboembólicos venosos. Ácido fólico deve ser suplementado para cobrir a demanda pela eritropoiese e megacariopoiese aumentadas (9). Casos refratários e recaída: 10% a 20% dos pacientes apresentarão resposta incompleta à plasmaférese diária, ou se tornarão refratários. A refratariedade é definida como ausência de resposta à plasmaférese diária durante 7 dias. Embora a média de duração da plasmaférese, até que se alcance a remissão, seja de 7 a 20 dias, nos casos refratários deve-se, inicialmente, intensificar as sessões e, se não for suficiente, o tratamento imunossupressor ou imunomodulador deve ser considerado. As recaídas ocorrem em 21% a 64% dos pacientes e são mais freqüentes em pacientes com deficiência grave de ADAMTS 13. Para as recaídas, o tratamento de escolha é a reintrodução da plasmaférese, reservando-se o tratamento imunossupressivo adicional para os casos não responsivos (9). A plasmaférese permite que 80 a 90% dos pacientes com PTT sobrevivam a um episódio, geralmente sem lesão orgânica evidente ou persistente. Baixos títulos de Ac anti-ADAMTS 13 estão associados com melhor resposta à plasmaférese. A produção dos Ac antiADAMTS 13 pode ser suprimida por altas doses de corticóides, 4 a 8 doses de rituximab (anticorpo monoclonal anti-CD20 dos linfócitos B), usado semanalmente, ou remoção da produção dos auto-anticorpos por meio da esplenectomia (3). A PTT congênita (menos de 50 casos relatados na literatura) apresenta absoluta deficiência da protease ADAMTS 13 (<5% de atividade). Para estes casos o uso da infusão de plasma constitui tratamento efetivo e a plasmaférese não é necessária (5). Os cuidados suportivos, para os pacientes com PTT que se apresentam gravemente enfermos, incluem atenção ao estado neurológico, prevenção de convulsões, proteção de vias aéreas se comatosos, monitorização hemodinâmica, cuidadosa avaliação metabólica, fluidoterapia e adequação de parâmetros eletrolíticos, cuidadosa manutenção de cateteres e suporte hemoterápico, em geral (14). 2) Trombocitopenias aloimunes: A aloimunização contra antígenos plaquetários pode ocorrer durante a gravidez e após transfusão ou transplante. Os anticorpos resultantes da aloimunização se ligam aos antígenos plaquetários e pode levar à rápida captação das plaquetas incompatíveis pelo sistema retículo-endotelial. As trombocitopenias aloimunes são classificadas em trombocitopenia aloimune neonatal, púrpura pós-transfusional, trombocitopenia aloimune transplanteassociada, trombocitopenia aloimune passiva e refratariedade plaquetária transfusional. Mais de 20 antígenos plaquetários já foram descritos. Além disso, as plaquetas expressam os antígenos classe I dos leucócitos (HLA) e os antígenos ABH dos grupos sangüíneos. A trombocitopenia neonatal ocorre em 1:1000 nascimentos. Ainda não há consenso para o tratamento da trombocitopenia neonatal durante a gravidez (6). Revisão sistemática realizada pela Biblioteca Cochrane concluiu que não há estudos clínicos controlados e randomizados determinando o melhor tratamento antenatal para a púrpura feto-materna aloimune. Estudos futuros deverão determinar doses intravenosas de imunoglobulina, momento de início do tratamento, monitorizarão da resposta terapêutica por coleta de amostras de sangue fetal, medidas laboratoriais para definição de gestação de alto risco para hemorragia intracraniana fetal, tratamento dos não respondedores e follow-up de longo prazo das crianças (15). Após o nascimento o tratamento mais rapidamente efetivo é a transfusão de plaquetas compatíveis. A púrpura pós-transfusional é doença caracterizada por púrpura trombocitopênica aguda que ocorre em aproximadamente uma semana após transfusão de concentrado de hemácias ou plasma contendo plaquetas. A trombocitopenia é causada por aloanticorpos específicos para os antígenos plaquetários. Os antígenos mais comumente responsáveis pela maioria dos casos são do sistema HPA-1a (PLA1). Permanece obscuro porque os aloanticorpos destroem as plaquetas infundidas e também as autólogas. A maioria dos pacientes presumivelmente, acometidos aloimunizadas são mulheres durante que gravidezes tenham sido, passadas. A plaquetopenia, geralmente, é acentuada e pode permanecer por várias semanas. O diagnóstico é confirmado pela demonstração de anticorpos para antígenos plaquetários específicos no soro do paciente. A grande maioria dos anticorpos é dirigida contra o sistema HPA-1a. O tratamento com altas doses de imunoglobulina intravenosa é altamente eficaz em quase todos os casos. Alguns pacientes podem recair com clínica menos grave e podem ser retratados com gamaglobulina intravenosa. O curso clínico de pacientes não tratados pode resultar em hemorragias fatais (6). Casos refratários podem ser tratados com plasmaférese, categoria I de indicação pela AABB e ASFA (4). 3) Síndromes de hiperviscosidade plasmática: A hiperviscosidade sérica resulta de uma série de patologias que têm como traço comum a produção excessiva de paraproteínas anormais e que levam ao aumento da viscosidade plasmática. Gamopatias monoclonais: o aumento de imunoglobulinas séricas é a causa mais comum de síndrome de hiperviscosidade e pode ser vista nas discrasias de células plasmáticas, especialmente Macroglobulinemia de Waldenstrom (MW) e Mieloma Múltiplo (MM). A hiperviscosidade sintomática é mais comum na MW (10% a 30%) que no MM (2% a 6%). A hiperviscosidade resulta da combinação do aumento da concentração e das formas assimétricas, elevado peso molecular e polimerização anormal das moléculas de imunoglobulinas. Clinicamente a síndrome é caracterizada por sangramento, distúrbios visuais e distúrbios neurológicos. Os pacientes podem também se apresentar com ICC. Os distúrbios hemorrágicos geralmente se iniciam com epistaxes, equimoses e sangramentos em mucosas. Alterações retinianas com distensão tortuosa dos vasos “sausage-like” são achados patognomônicos da síndrome. Hemorragias, exsudatos e papiledema podem ocorrer quando há progressão da síndrome. As alterações neurológicas incluem vertigem, perda de audição, parestesias, ataxia, cefaléia, convulsões e sonolência, progredindo para estupor e coma. As manifestações clínicas dependem da oclusão de pequenos vasos. Podem também ocorrer fenômeno de Raynaud, livedo reticular, erupções tipo aranhas vasculares, infartos digitais e gangrena periférica. (17). O tratamento imediato para síndrome de hiperviscosidade é o uso da plasmaférese e o manejo clínico da doença de base para reduzir a produção das proteínas monoclonais (18,19). No MW a proteína anormal é IgM que tem alto peso molecular e a plasmaférese apresenta boa eficácia com remoção de 70% a 80% do conteúdo da proteína anômala no espaço intravascular. A plasmaférese é adequada ao tratamento da hiperviscosidade no MM, embora esta síndrome e suas manifestações clínicas sejam mais raras no mieloma. O uso concomitante da plasmaférese com a quimioterapia e indução do aumento do fluxo urinário têm sido mais efetivos na redução da paraproteína e tratamento da insuficiência renal dos pacientes com MM (17). A Aférese terapêutica, em todas as suas indicações, deve seguir a normas técnicas e regulamentação da RDC 153/Anvisa/MS: “H.7.1 - Seleção de pacientes A aférese terapêutica só deve ser efetuada mediante solicitação escrita do médico do paciente e com a concordância do hemoterapeuta. O médico hemoterapeuta responsável pelo procedimento deve determinar o volume de sangue a ser processado, a freqüência do procedimento e a necessidade de cuidados especiais. Deve existir um protocolo escrito, descrevendo a metodologia empregada nos procedimentos de aférese terapêutica. H.7.2 – Registros: “Devem ser mantidos registros que incluam as seguintes informações: identificação do paciente, diagnóstico, tipo de procedimento terapêutico, método empregado, volume sanguíneo extra-corpóreo, qualidade e quantidade do componente removido, qualidade e quantidade dos líquidos utilizados, qualquer reação adversa ocorrida e medicação administrada”(7). XI - Análise de Custo: A análise de custos inclui: honorários do médico e enfermeiras, custos dos fluídos de reposição. Simulação do custo de plasmaférese para uma paciente com PTT – 60 kg c/ hematócrito de 35% - Volemia total = 3.900 ml e 2.535 ml de plasma (se troco 3000 ml/por sessão diária, 7dias) Custos do plasmaférese para PTT Aférese terapêutica Plasmaférese terapêutica 1 unidade de plasma (200 ml) Kit e soluções necessárias para máquina Fluído de troca (PFC) Por sessão Total por sessão *15 x 32,16 482,40 1 x 256,00 256,00 15 x 11,38 170,70 15x116,25 1.743,75 Operação de processadora automática aférese 96,48 96,48 Transfusão (honorários pelo acompanhamento) 15 x 7,20 108,00 Testes sorológicos Total por sessão 2.857,33 Total (7 sessões) 20.001,31 XII - Considerações finais: A prática atual é fazer a indicação terapêutica baseada em evidência científica, determinada por ensaios clínicos controlados, se possível. Muitas das doenças, para as quais há forte indicação para a plasmaférese, são entidades raras e a realização de estudos controlados é dificultada. Assim, é importante a atuação conjunta dos especialistas que prestam assistência ao doente, junto ao hemoterapeuta na avaliação e indicação da plasmaférese. Sabendo tratar-se de um procedimento de alta tecnologia e custo elevado, praticado em centros especializados (hospitais com cuidados terciários e clínicas com recursos hemoterápicos especializados), de disponibilização escassa mesmo nos maiores centros urbanos de Minas Gerais, faz-se necessário o levantamento do problema e a adequação da oferta à demanda, com remuneração adequada aos prestadores, mantendo-se a viabilidade econômica das operadoras de saúde. Embora as indicações terapêuticas sejam bem definidas em algumas doenças e, inclusive com o respaldo da AABB e ASFA, para algumas delas com categoria I de indicação, já se dispõe de tratamento alternativo com mesma eficácia terapêutica, como o uso de imunoglobulinas. Estas apresentam custo elevado, porém, se comparado aos preços cotados junto a nossos prestadores, a plasmaférese exibe valores mais altos. Poderíamos alcançar objetivos interessantes estabelecendo-se hospitais de complexidade compatível como referência, nos quais este serviço pudesse ser oferecido de forma a racionalizar gastos e a propiciar o tratamento mais adequado ao cliente. XIII - Parecer do GTAS: 1. O GTAS é favorável ao uso da plasmaférese terapêutica no tratamento da PTT. Serão liberadas 7 (sete) sessões, através do Unidisk (call center). 2. O GTAS é favorável ao uso da plasmaférese terapêutica no tratamento da síndrome de hiperviscosidade sintomática, secundária a Macroglobulinemia de Waldenstrom. Serão liberada 3 (três) sessões. Se houver necessidade de mais sessões, deve ser enviado relatório circunstanciado com o quadro clínico do paciente, para pré-auditoria para a liberação de mais sessões. 3. Todas as indicações para plasmaférese terapêutica devem ser validadas por consenso entre o médico assistente e o hematologista (hemoterapeuta). Todos os procedimentos de plasmaférese devem seguir as normas e protocolos definidos pela RDC 153/Anvisa/MS. XIV – Referências Bibliográficas: 1. Mendrone Junior A, Tatsui NH. Aféreses Terapêuticas. In Chamone DAF, Novaretti MCZ, Dorlhiac-Llacer PE. Manual de Transfusão Sangüíneo. Cap. 21, p. 257-271. São Paulo: Roca, 2001. 288 p. 2. Bosch T. Therapeutic Apheresis – Statre of The Art in the Year 2005. Ther Apher Dial 2005; 9(6):459-468. 3. Sadler JE, Moake JL, Miyata T and George JN. Recent Advances in Thrombotic Thrombocytopenic Purpura. ASH Hematology 2004; 407423. 4. Smith JW, Weinstein R, Hillyer KL. Therapeutic apheresis: a summary of current indication categories endorsed by the AABB and the American Society for Apheresis. Transfusion 2003;43:820-822. 5. 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