MATÉRIA DE CAPA Leandro Rodriguez NOVOS DESAFIOS E CAMINHOS DO MARKETING CEOs do Grupo de Líderes da ABA e profissionais convidados apontam durante o ABA Summit 2014 as mudanças fundamentais do mercado que exigem uma nova atitude dos profissionais de marketing e o fortalecimento da relação das marcas com os consumidores O s consumidores mudaram seus hábitos, as mídias para anunciar são outras e a relação das pessoas com suas marcas preferidas é cada vez mais intensa e complexa. Esses sinais claros de novos tempos são também um aviso sonoro para as lideranças, os gestores e as equipes de marketing de que precisam se transformar. “Devemos combinar duas variáveis estratégicas: os resultados da gestão de curto prazo e a construção de marcas que sobrevivam a longo prazo. Quem vive o dia a dia do marketing sabe que deixamos a era do simples convencimento para entrar definitivamente na do engajamento”, disse João Campos, gerente-geral da Kibon, vice-presidente da Unilever e presidente da ABA, durante a abertura do ABA Summit 2014, realizado em 18 de novembro, em São Paulo. Os profissionais que participaram do encontro tiveram uma manhã de pura reflexão sobre os caminhos que devem tomar daqui para frente. Alguns são tortuosos, envolvendo o abandono do modus operandi nas organizações – leia-se, a repetição de ideias que, por tentativa e erro, aumentavam as vendas ou a falta de ousadia porque 28 Revista ABA - ed. 158 já não se via a necessidade de parar a fim de pensar como acontece agora. “Não basta comunicar bem ou oferecer o melhor produto ou serviço. É necessário um esforço maior na integração do curto com o longo prazo. São novos desafios para o marketing, mas também uma oportunidade de reposicionamento”, acrescentou Campos. O papel das empresas anunciantes é fazer com que o consumidor confie na mensagem de suas marcas. E o marketing tem as ferramentas e as disciplinas necessárias para isso, ou seja, há espaço para ampliá-lo e reforçá-lo. Grupo de Líderes As análises de quem está à frente das decisões foram o ponto alto do ABA Summit durante o painel do Grupo de Líderes da ABA, liderado FOTOS ANDRÉIA MACHADO Primeiro Painel de Presidentes do ABA Summit reuniu os membros do Grupo de Líderes da ABA Claudia Vassallo (à dir.), jornalista de negócios e economia e exsuperintendente da Exame, foi responsável pelo projeto editorial e pela criação do Guia EXAME de Sustentabilidade, em 2000, e pela Exame PME, em 2005. No ABA Summit 2014, mediou o debate no Painel de Presidentes, contribuindo para a discussão com perguntas da plateia e questionamentos aos CEOs do ponto de vista de quem está de fora das empresas. por Guilherme Loureiro, presidente do Walmart Brasil, e integrado por João Campos e os CEOs Juan Carlos Marroquin (Nestlé), Alberto Carvalho (P&G), Claudia Sender (TAM), Gino di Domenico (Brasil Kirin) e Luiz Carlos Dutra, vice-presidente da Votorantim. A conversa franca do grupo, mediada pela jornalista Claudia Vassallo, foi marcada por diversos insights e conclusões inspiradoras. Por cerca de uma hora e meia de diálogo, que não teve a participação de Claudia Sender, em viagem ao exterior, e de Juan Carlos Marroquin, entraram em pauta diversos pontos e contrapontos (leia págs. 30 e 31), como o papel cada vez mais significativo da marca institucional, a busca do equilíbrio entre atingir as metas mais imediatas sem desviar do foco amplo do negócio, o papel das agências na construção das estratégias de marketing e o que esperar de 2015, entre outros temas. Para quem acompanhou o debate, foi uma oportunidade única de ouvir informações de bastidores dos próprios CEOs. “Com o Grupo de Líderes, o João passa a ter o suporte das nossas opiniões independentes na sua gestão É necessário um esforço maior na integração do curto com o longo prazo João Campos da ABA. Vamos auxiliar a direção da entidade porque também estamos interessados no fortalecimento do marketing”, afirmou Loureiro, presidente do Walmart Brasil, ao destacar o pioneirismo da iniciativa. Por sua vez, Carvalho, da P&G, citou outras vantagens de os CEOs se reunirem por um mesmo interesse. “Em parte do mercado, o marketing está dissociado da liderança das empresas. E achamos que é muito importante que o líder esteja engajado nas estratégias da área e das marcas. Criamos este grupo para ajudar no processo de aproximar mais os executivos do marketing para juntos construírmos marcas fortes. Principalmente se levarmos em conta que vivemos um período que pode ser de menos consumo, o que deve levar muitas empresas a investir menos em ações de marketing”, avaliou Carvalho. >> Revista ABA - ed. 158 29 UR Com a palav ra, os CEOs O E IR Liderança para a gess estão preparada s tão do ma rketing? O CAMPO JOÃ S Z CARLOS LUI DU O DI DOM G IN EN ERTO CA A LB RV GU I L H E R ME LO MATÉRIA DE CAPA TR O IC AL “O marke ting está fragmenta dentro da do s organiz ações, o q repercute ue nas agên cias e em outras áre as. Dividim os a área tantas co em isas, que sinto falta cumprir a de ela sua impo rtância, a de termo pesar s profissio nais muit o capacitad os” HO “Na P&G, adotamos o conceito brand ma de na ver com m gement, que tem a arketing, comunica etc. O perfi ção l de ser outr do profissional tem o, mais an alítico e c competên om cias para o desenh de estraté o gias. E ac redito que mercado tenha pro o fissionais deste tipo no m ercado” A “Os lídere s devem s e envolve mais e pre r cisam ter entendim um ento do m erc além do c onsumido ado que vá r, do clien te e do fornec edor” “Os profis sionais de marca sã gestores o atualmen te. A gestã é feita com o o um neg ócio, com uma cara e um pon to de vista além de v , alores. Iss o demand consistên a cia, temp o e lideran ça” 30 Revista ABA - ed. 158 Estratégia de m arketing na prática “Tem que ser um a decorrência da estratégia da empresa. Mas se esquecem os o DNA das marcas, elas acabam perdendo merca do. É muito fácil sair do trilh o” “A estratégia de marketing é a do negócio. Nó s nos cansamos mais rápido de nossas campanh as do que o consumidor, e as marcas exitosas têm um a mesma campanha por anos. Se mudamos muito , o consumidor não sabe quem somos” “Há três anos, de finimos a estratégia de no s posicionar como uma empr esa de bebidas, e não um a cervejaria. O marketing no s ajuda a estabelecer um a conexão de A a Z na compa nhia com o que estamos fazend o” “A liderança da s marcas tem que ficar ca da vez mais concentrada em uma pessoa. O que acontece , no entanto, é que muitas veze s temos um grupo grande de profissionais liderando vária s atividades. Às vezes, a visã o do todo se perde. O consum idor, no fim do dia, é um só” O papel da marca institucional “Há alguns anos, as pessoa s não sabiam o que era a Procter & Gamble, mas hoje nove em cada dez brasileiros conhecem a P&G. Com isso, muitos consumido res que usavam Pantene pensam também em Oral-B. Isso tev e impacto na aceleração do nosso negócio” “Foi extremamente importa nte para nós dar um novo significa do para a nova marca institucion al, interna e externamente. O endosso para as marcas, no nosso caso, vai acontecer mais à fren te” “O consumidor hoje é um cida dão. A marca, isoladamente, não consegue entregar tudo, com o sustentabilidade, governanç ae transparência. Isso deve vir da marca corporativa. Essa sin ergia é mandatória e sua gestão dev e vir do líder. Uma imagem corpor ativa legítima endossa as marcas” “O consumidor tem hoje a opção de se engajar ou não com propostas. Saímos de uma era de convencimento, para term os atualmente uma conversa de igual para igual com as pes soas. Daí a importância de integra rmos o que fazemos e apresenta rmos um ponto de vista único” presas m e s a n arketing m o r a ç r fo tam como re n o p a s te n ge r e nv Opiniões co Investimento nas marcas X a ditadura dos resultados trimestrais “Precisamos ser capazes de controlar a ansiedade do curto prazo. O longo prazo também é feito de curto prazo, desde que m você saiba para onde quer ir. Alé toda ’ izar cron disso, é preciso ‘sin a empresa com o que foi definido como foco, diminuindo a pressão sobre todos” “A estratégia está clara? As pessoas sabem o que vamos de fazer? Temos que ter a habilida e as cois das de desapegar reorientar o negócio naquilo que de for necessário. Isso, sem perder ia” vista a estratég os “Seremos cobrados por resultad .A ente elm itav inev a cada trimestre ão, igaç obr é o praz to cur gestão de r mas ela isoladamente é enxuga dá o praz gelo. Entregar o curto O liberdade para construir o longo. de além , para irar insp isa líder prec entregar resultados, construir seu legado ao longo dos anos” gências na O papel das a estratégias e construção d perar O que es 15 de 20 vidade, a produti r a c s u b ue ador “Temos q plano é conserv a o s imento d e e o nos em cresc qu S . o d 15 0 is 2 r ma para ciso corre mais anos re p , ia m econo u tenho rência. E rreira do a concor ica na ca m ô n ades o c e s dificuld de crise idade, e a as il b m ta a s ir e imped que de a c n u n s ” ís ica econôm cer no Pa s de cres empresa om 015 até c lhando 2 mos fazendo o u to s E “ sta lhando mo mismo. E mais oti escolhas e traba duzir as agências co ss no as os e s “Vem melhore produtividade. R s é um sso negócio. A parceiras do no rca em a a o it su m u a: s a ng m lo n s elas é o, perde timento parceria com os inves ro. Quem faz iss m mais é nos trazer a ud aj l r e pa ci e e prin ado te grand ores o no merc perar quando a ã e os consumid ç br a so ip ts c gh ti si in os par recu ra que possam mada” de de se e o mercado pa dificulda ia tem uma reto eu E s. ca ar m nossas econom as” diferenciar as nidades mente com el ta re di o lv vo s oportu osso a it me en u m “Existem tor de bebidas. N or e para o se nto é conservad á uma e H planejam certo otimismo. a dos d n m o re c e , ção d realista de migra o que está nos ia c n ê d ten ercados veis para bens durá dos, e nichos e m ar com a u rc tin superme s tendem a con o o” específic imento acelerad cresc ting ção do marke “A fragmenta as ências, e el chegou às ag repensar seu m ve também de o as maiores papel, pois sã arcas. atégicas das m parceiras estr a um m integração to Mas a falta de do an qu de reação tempo grande isa. co a m gu al corrigir você precisa a” ci é uma tendên A integração lo foco utada pe a p é o ã ento vis “A nossa vidade e investim de ti u ortfólio em prod em um p o z is ra p o do. O ma de long iversifica e que, pela d s a s re d emp nvicção nte é a co a e relevância no importa c fi o geográ omia não dimensã nacional, a econ ” r te sua rota cenário in o Brasil seguirá e vai parar do m merca s. ndo de u oa la s fa s e s p o e “Estam hões d il m 0 0 2 á ntr rio, o de r, pelo co dinâmic ra a p e à d ra ai voltar Não é ho ercado v tro m a o u e q u porq ximos e nos pró e talvez não d a d li a norm ade, qu s, portunid anteriore anos. A o e d anos a s a m s m e u de alg seja a m hora até ” o É d i. n u q ra a acele está tinuarem n o c s a áre Revista ABA - ed. 158 31 MATÉRIA DE CAPA Sentimento do consumidor E o que o mercado tem a dizer que reforça as opiniões dos CEOs do Grupo de Líderes? Muito, segundo a pesquisa Prosumer Report – O novo consumidor e a economia colaborativa, realizada em 29 países com mais de 10 mil participantes e apresentada na palestra de Mauricio Kato, CEO da Havas Worldwide São Paulo. Em conjunto, os resultados refletem os anseios de consumidores de maior nível de educação (os chamados prosumers) e que estão cada vez mais preocupados em consumir menos e melhor. “O objetivo não é ter um fundo estatístico, mas olhar para frente e entender quais são as tendências que estão surgindo. A primeira delas é que o consumo associado à felicidade chegou a um limite. Ou seja, ninguém precisa de um refrigerante de um litro ou de snacks de batata de um quilo. A crença de que mais é melhor está se enfraquecendo porque existem pessoas procurando outro modelo de consumo”, observou Kato. Para 76% dos prosumers, por exemplo, o consumo exagerado está colocando a sociedade e o planeta em risco. Além disso, 52% disseram que poderiam viver bem sem os itens que compram, outra indicação de que muitas pessoas começam a pensar duas vezes antes de simplesmente ir às lojas, um comportamento que obriga os times de marketing das marcas a reconsiderar uma série de coisas. “Nossa outra pesquisa Meaningful brands, com 134 mil consumidores de 23 países e que envolveu 700 marcas, revela que para os participantes 73% das marcas não fariam falta se desaparecessem amanhã. Nosso papel, como Kato: crença do “mais é melhor”está enfraquecendo 32 Revista ABA - ed. 158 REPOSICIONAR PARA REFORÇAR Simon Clift, chairman da Touch Branding em Londres e ex-CMO da Unilever, encerrou o ABA Summit 2014 com uma apresentação sobre o posicionamento adequado das marcas que dê propósito à sua existência – e um maior sentido de identificação por parte dos consumidores. Uma das maiores dificuldades atuais, disse Clift, é a enorme quantidade de dados disponíveis sobre o mercado, obtidos pelas empresas por meio de ferramentas cada vez mais sofisticadas e potentes. Não se deve cair na falsa ideia de que as informações, ainda que revelem novos aspectos sobre hábitos de consumo, são suficientes para o entendimento de todos os fatores que influenciam nas escolhas das pessoas. Habituado a trabalhar com a Unilever, Clift citou alguns exemplos de marcas que conseguiram alinhar o diferencial dos seus produtos com a demonstração clara de um propósito, como é o caso de OMO com a campanha “Porque se sujar faz bem”. Além de comentar outros exemplos, Clift reforçou a percepção de que as marcas corporativas têm cada vez mais peso para o reposicionamento de produtos. E não deixou de dar um aviso aos gestores antes de se despedir: as marcas têm muito poder, valor (que precisa ser continuamente protegido) e devem ser muito cuidadas. profissionais do marketing, é devolver às pessoas o sentido de realização quando compram algo, encontrando soluções para diminuir o desperdício, para dar um significado maior aos produtos e para dar tempo às iniciativas das marcas”, detalhou Kato, que também apresentou cases de empresas que, com iniciativas diferenciadas e ousadas, estão se adequando às novas expectativas dos seus clientes. No fim das contas, ele e os CEOs dividiram com a plateia qualificada do ABA Summit a mesma reflexão de que o marketing, com o seu poder de transformar, oferece todos elementos necessários para um maior envolvimento com o consumidor, faltando apenas um ajuste fino que os novos tempos demandam. o Evento teve plateia qualificada de profissionais do marketing