OMBRO Diagnósticos, Tratamentos e Patologias SUMÁRIO 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. Introdução Definição Anatomia Muscular Avaliação Inicial Avaliações Complementares Diagnóstico Afecções e Patologias Diagnósticos por Imagem Ultrassonografia Intervenções com Fisioterapia Exercícios Domiciliares Tratamento Conservador Tratamentos de mecanismo Agradecimentos Bibliografias Introdução O ombro é a articulação com maior amplitude de movimentos do corpo humano, responsável por permitir a utilização do membro superior nas mais diversas atividades cotidianas. Toda essa mobilidade implica em necessidade de um sistema osteomuscular complexo, frequentemente sede de processos dolorosos. A dor no ombro é uma queixa muito comum na prática médica, tanto em consultas clínicas iniciais como na prática ortopédica especializada, geralmente relacionada com o movimento, com piora noturna e irradiação para a face lateral do braço (Figura 1). Durante muito tempo os termos "tendinite" e "bursite" foram usados para justificar as dores da cintura escapular. O entendimento atual é muito mais abrangente do que tal visão simplista, com a diferenciação das diversas patologias que têm a dor como uma de suas apresentações. Figura 1 - A dor no ombro é muito prevalente e causa desconforto e prejuízo para as atividades profissionais e de lazer. Figura 2 - Estrutura óssea da cintura escapular. Figura 3 - Anatomia muscular. Os tendões dos músculos supraespinal, infraespinal, subescapular e redondo menor se inserem no úmero proximal, formando o manguito rotador. Anatomia Como etapa inicial, o estudo das dores do ombro passa necessariamente por um bom conhecimento anatômico. A grande amplitude de movimentos do ombro se estabelece nas articulações glenoumeral ou escápulo-umeral, acromioclavicular, esternoclavicular e escápulo-torácica (Figura 2). Todas elas podem ser sede de distúrbios dolorosos, em especial a glenoumeral, que é responsável pela maior parte do movimento do ombro. Músculos A articulação entre a escápula e o úmero tem superfícies em formas pouco congruentes. Sendo assim, a musculatura local, além de promover o movimento, tem também função de estabilização, juntamente com os ligamentos articulares. Figura 4 - Atividades profissionais e esportivas podem sobrecarregar as estruturas do ombro e ser causa de dor. Fig ura 5 - Impacto entre o tendão supraespinal no espaço subacromial durante movimento de elevação do ombro. Figura 6 - Teste de Neer para avaliar o impacto subacromial - o paciente relata dor ao movimento de elevação com rotação interna do braço. O músculo deltoide, com suas porções anterior, lateral e posterior, está envolvido na elevação do ombro. Subjacente ao deltoide, os tendões dos músculos subescapular, supraespinal, infraespinal e redondo menor formam o chamado manguito rotador (MR). Tal estrutura é origem frequente de afecções que se podem manifestar como processo doloroso e limitação de movimento (Figura 3). O tendão da cabeça longa do bíceps (CBL) está em íntimo contato com o MR. Posicionado no sulco entre as tuberosidades maior e menor do úmero e entre os tendões do supraespinal e supescapular, a CLB também é sede de patologias muito prevalentes. As bursas têm função de lubrificar e facilitar o movimento de músculos e tendões. No ombro as principais são subdeltoidea, subacromial e subescapular. Avaliação inicial A caracterização da dor no ombro é a etapa inicial para o diagnóstico. Geralmente as dores são mallocalizadas, a não ser em condições específicas como a artrite da articulação acromioclavicular, quando o paciente aponta com maior precisão o local. A dor aguda remete a processos inflamatórios recentes, como tendinite calcárea, tendinopatias do CLB a rupturas do MR, parciais ou totais. A dor crônica com piora gradual é comum nos processos de artrose glenoumeral. Deve-se questionar possível associação com atividades de trabalho, principalmente as de repetição, bem como traumatismos locais, recentes ou antigos (Figura 4). Queixa comum é a de limitação para atividades com o membro superior elevado, posições nas quais os tendões são submetidos ao impacto contra estruturas mais resistentes, caracterizando o impacto subacromial (Figura 5). A palpação do ombro em toda sua extensão tenta evidenciar pontos de dor mais intensa. A amplitude de movimento deve ser testada ativa e passivamente para elevação, rotação externa e interna, principalmente. A região cervical merece atenção especial, uma vez que patologias nessa região podem ter sintomas dolorosos direcionados à cintura escapular. As hérnias cervicais muitas vezes cursam com dor irradiada ao ombro, mas caracteristicamente têm acometimento ainda mais distal, com parestesias e déficits de força nas mãos e nos dedos. A degeneração das articulações intervertebrais (artrose cervical) também é diagnóstico diferencial das dores do ombro (Figura 7) Exames complementares A avaliação radiográfica simples podem diagnosticar facilmente condições como artrose e tendinite calcárea. (Figura 8). Fig ura 7 - Artrose cervical, com osteófito anterior, diminuição do espaço intervertebral. Figura 8 - Incidências radiográficas padronizadas do ombro - ântero-posterior, perfil escapular e perfil axilar A ultrassonografia pode ser um exame muito útil, desde que seja feito por profissional acostumado com patologias do ombro. Tem como vantagens a possibilidade do exame ser dinâmico e de menor custo, sendo possível identificar processos inflamatórios e rupturas tendinosas (Figura 9). A ressonância magnética é o exame mais confiável para o estudo das patologias com acometimento de partes moles.O exame tem grande sensibilidade para diagnóstico de degenerações, lesões parciais e totais dos tendões, assim como calcificações em seu interior. A utilização de contraste (artrorressonância) aumenta ainda mais a sensibilidade (Figura 10). Afecções dolorosas do ombro O Quadro 1 lista diversas patologias que podem estar relacionadas com a dor no ombro. O manguito rotador Os tendões que compõem o manguito rotador são a principal sede das dores do ombro, existindo um espectro de patologias relacionadas, desde a inflamação dos tendões até a rupturas completas. O espaço entre o acrômio e a cabeça do úmero é onde se situa o manguito rotador. A associação entre o espaço anatômico estreito, a grande amplitude de movimento e exigências das atividades cotidianas expõe o MR a situações de sobrecarga que se podem acumular durante a vida. O tendão supraespinal é o mais acometido nas patologias do manguito rotador. O processo inflamatório agudo dos tendões geralmente se associa a irritações do tecido bursal (tendinite/bursite). Tal condição pode estar relacionada com trauma local ou mesmo atividades com movimentos repetidos dos ombros com o membro superior erguido. A dor tem início bem definido, com piora noturna e melhora com repouso. Fig ura 9 - Ultrassonografia mostrando lesão no tendão do manguito rotador. Figura 10 - Imagens de ressonância magnética mostrando rupturas do tendão supraespinal. É o exame mais sensível para o diagnóstico das lesões do MR. Figura 11 - Exercícios para melhora do padrão de movimento. São indicados para programas domésticos e/ou assistidos por fisioterapeutas. Muitos pacientes têm evolução para um quadro crônico, com o processo inflamatório associado à degeneração tendinosa (tendinose). Tal condição tende a enfraquecer a estrutura dos tendões, propiciando o surgimento de rupturas das suas fibras. Essas lesões podem acometer apenas uma parte da espessura dos tendões (lesões parciais) ou toda ela (lesões totais). Essas lesões têm grande prevalência na população, principalmente de mais idade. Nem todos os pacientes são sintomáticos. Há trabalhos mostrando até grande porcentagem de pessoas assintomáticas acima de 60 anos. Os momentos em que as lesões surgem ou quando elas aumentam em tamanho estão relacionados com períodos de piora nos sintomas. Fig ura 12 - Imagem artroscópica de lesão do manguito rotador. Fig ura 13 - Calcificação na região do tendão supraespinal. Pode ser apenas um achado radiográfico quando não relacionado com sintomas. O tratamento conservador é a rotina inicial para as patologias do manguito rotador (Quadro 2). Além das medicações analgésicas e anti-inflamatórias e do repouso relativo, deve-se indicar um programa de fisioterapia baseado em medidas analgésicas (ultrassom, gelo, TENS) ganho de movimento e fortalecimento da cintura escapular (Figura 11). Não existe consenso a respeito do tempo exato do tratamento fisioterápico, porém não deve ser menor que três meses para se considerar o tratamento cirúrgico. Os pacientes que não respondem a essas condutas iniciais passam a ser candidatos ao tratamento cirúrgico. Este se baseia no reparo dos tendões e na descompressão subacromial, ou seja, o aumento do espaço do trajeto dos tendões e retirada do tecido bursal proliferado. O desenvolvimento da artroscopia vem trazendo menor morbidade ao tratamento cirúrgico. Mesmo os pacientes submetidos a este tratamento precisam de um período prolongado de reabilitação fisioterápica. Tendinite calcárea A dor no ombro pode também estar relacionada com um processo patológico de acúmulo de cálcio no interior dos tendões do manguito rotador, conhecido como tendinite calcárea. Trata-se de uma condição bastante dolorosa e limitante, acometendo principalmente mulheres entre a quarta e quinta década de vida. Os sintomas são bastante semelhantes aos das lesões do MR, com aumento da dor aos movimentos de elevação do ombro, padrão noturno e sem associação com trauma (Figura 12). O achado radiográfico de calcificação na região dos tendões do manguito rotador deve ser sempre correlacionado com quadro clínico, uma vez que é comum encontrarmos tais condições em paciente assintomáticos (Figura 13). O tratamento se inicia sempre com medicações de controle da dor (analgésicos, anti-inflamatórios) e medidas fisioterápicas. A grande maioria dos casos tem regressão do quadro álgico. Alguns pacientes não têm evolução satisfatória e passam a ser candidatos ao tratamento cirúrgico. Este se baseia na perfuração do tendão no local da calcificação para a saída do conteúdo calcificado, o que geralmente traz alívio importante já nos primeiros dias após a cirurgia. Figura 14 - Artrose glenoumeral - diminuição do espaço articular, formação de osteóficos, esclerose, com perda de contornos normais da articulação. Artroplastia total do ombro. Capsulite adesiva Também conhecida como "ombro congelado", a capsulite adesiva é uma doença de etiologia desconhecida, que cursa com dor e limitação passiva de movimentos da articulação glenoumeral (elevação, rotações interna e externa e abdução). Há associação com diabetes mellitus, hipotiroidismo, uso de fenobarbitúricos e medicação quimioterápica. Pacientes que sofreram traumatismos no ombro ou aqueles que usaram algum tipo de imobilização por tempo prolongado podem apresentar o quadro em questão. Além disso, é comum a sobreposição a patologias intrínsecas do ombro, como lesões do manguito rotador, o que dificulta o diagnóstico e o tratamento. Este é quase sempre conservador, com medidas analgésicas e fisioterápicas, em boa parte dos casos de forma prolongada. A infiltração articular de corticoide e o bloqueio do nervo supraescapular podem trazer benefícios. São incomuns os casos em que está indicado algum procedimento cirúrgico de liberação da contratura capsular. Artroses A degeneração das articulações são condições mais prevalentes em pacientes com mais idade. A artrose glenoumeral e a acromioclavicular fazem parte do diagnóstico diferencial das dores do ombro. Podem ser primárias, quando não têm relação com outras condições clínicas, ou secundárias, principalmente póstraumáticas. A dor tende a ter início insidioso, com piora lenta e progressiva, da mesma forma que a limitação de movimento. O tratamento consiste em medidas de controle da dor (analgésicos e AINEs), exercícios contínuos para manutenção da amplitude de movimento. O uso de condroprotetores (glicosamina) é controverso, mas faz parte das possibilidades terapêuticas. Infiltrações intra-articulares de corticoide e viscossuplementação necessitam de profissional habituado com a anatomia articular para sua execução. Como última etapa do tratamento, a substituição das superfícies degeneradas por próteses é a indicação (Figura 14). Bibliografia 1. Rockwood CA, Matsen FA, The Shoulder, 4th ed. Philadelphia, Elsevier 2009. 2. Filho TA, Lech O. Exame Físico em Ortopedia Sarvier. 3. Canale ST, Beaty JH, editors. Campbell’s operative orthopaedics. 11th ed. Philadelphia: Mosby; 2008. 4. J.E. Hsu et al. Current review of adhesive capsulitis. J Shoulder Elbow Surg. 2011; 20, 502-514. 5. O. Lorbach et al. 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