A Cura pelo Leite Materno

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A Cura pelo Leite Materno
By Nicholas D. Kristof, Dogon Doutchi, Niger
22/06/2011
Tradução: Regina Garcez
Imagine se os nutricionistas surgissem com uma cura milagrosa para a
desnutrição infantil? Uma substância rica em proteínas que não demandasse
refrigeração? Algo livre para uso e disponível, mesmo em locais mais remotos,
como este, em Niger, onde, rotineiramente, bebês morrem por causas causas
associadas à fome.
Você diria ser impossível? Pois, na verdade, essa cura milagrosa existe: tratase do leite materno.
Quando pensamos na pobreza global, por vezes pressupomos que os desafios
são tão imensos que qualquer solução deva ser extraordinariamente complexa
e cara. É o caso de algumas, mas quase nada existe com capacidade de fazer
tanto para o combate da inanição no mundo quanto a solução de baixa
tecnologia que é a amamentação exclusiva durante os seis primeiros meses de
vida. É essa a recomendação mais enfática da Organização Mundial da Saúde.
O paradoxo é que, ao mesmo tempo em que parece algo tão barato e óbvio,
virtualmente instintivo, é também raro. Aqui em Niger, somente 9% dos bebês
recebe apenas o leite materno durante os seis primeiros meses de vida,
conforme um levantamento nutricional nacional de 2007. Isso equivale a um
aumento de 1% desde 1998. Nos Estados Unidos, cerca de 13% dos bebês
são amamentados com exclusividade durante seis meses, conforme o Centers
for Disease Control and Prevention. Mais uma vez, a maior parte dos bebês
recebe fórmula, algo bastante seguro na America do Norte. Ao lado de Niger,
em Burkina Faso, menos de 7% das crianças recebe, com exclusividade, o leite
materno durante seis meses. No Senegal, os números ficam em 14%, na
Mauritânia, 3%. Esses são alguns países por onde estamos passando na
minha viagem-prêmio anual, este ano acompanhado por um estudante de
medicina de Atlanta, Saumya Dave e uma professora de Newark, Noreen
Connolly.
Corta o coração encontrar crianças excessivamente desnutridas e deparar-se
com uma mãe atrás da outra, que enterraram os filhos, quando não foi aplicada
solução tão simples para salvar vidas. O maior problema é que muitas mães
acreditam que seu leite não é suficiente e que, em dias quentes, seus bebês
precisam de água também.
Em uma via rural, perto da remota localidade de Dogon Doutchi, ao sul de
Niger, deparamo-nos com uma família de nômades Tuareg, deslocando-se
para o norte. Num dia quente, bebês precisam de água, disse-me Gayshita
Abdullah, a mãe. Disse-me também que tenta conseguir água de um poço; não
havendo um por perto, pega a água numa poça lamacenta.
Há, na verdade, muitos nutricionistas inflexíveis quanto à alimentação exclusiva
de bebês com leite materno e nada mais mesmo, durante seis meses de vida
(costumam mencionar quatro meses, mas recomendam agora seis). E a água,
nos países pobres, costuma estar contaminada, sendo perigosa para bebês.
Mesmo quando a própria mãe está desnutrida, o corpo, normalmente, oferece
leite suficiente para o bebê, dizem os nutricionistas.
Um relatório de 2008, no periódico médico The Lancet, informou que um bebê
parcialmente amamentado apresenta 2,8 vezes mais probabilidade de morrer,
na comparação com um bebê amamentado com exclusividade durante, pelo
menos, cinco meses. A criança não amamentada de forma alguma
apresentaria 14,4 vezes mais possibilidades de morte. Conforme The Lancet,
resumindo, 1,4 milhões de mortes infantis poderiam ser evitadas, anualmente,
se os bebês fossem amamentados de forma adequada. O que se tem é uma
criança que morre, sem necessidade, a cada 22 segundos.
Até onde as intervenções estudadas mostram, temos evidências esmagadoras
da eficácia da amamentação na redução da mortalidade infantil, disse Shawn
Baker, um especialista em nutrição da Helen Keller International, uma
organização que trabalha com essas questões. Trata-se da mais antiga
intervenção alimentar conhecida em nossa espécie e está disponível a todos,
acrescentou Baker.
No entanto, para comunidades em desenvolvimento, focalizada demais em
novidades tecnológicas, a amamentação não evoluiu como deveria. Os
desafios com o aleitamento materno, nos países pobres, não são os
enfrentados pelas mulheres ocidentais, e muitas delas, em países em
desenvolvimento, ainda amamentam os bebês durante dois anos. O maior
problema é oferecer água ou leite animal aos bebês, em especial, em dias de
calor. Outro problema é o fato de as mães terem dúvidas quanto ao valor do
colostro, o primeiro leite após o nascimento (espesso e amarelado, não muito
parecido com o leite), o que as leva a retardar o aleitamento por um ou dois
dias.
Uma mãe perto da cidade de Dosso, Fati Halidou, que perdeu quatro dos sete
filhos, disse-me que, após o nascimento, o melhor é oferecer água com açúcar,
ou água do Corão, que é a água feita através da escrita de um dos versos do
Corão em uma tábua, que é lavada, fazendo com que a água com a tinta seja
oferecida ao bebê para protegê-lo.
Ainda não está compreendido por que o instinto humano de amamentar se
desvia. Teria algo a ver com a sexualização das mamas? Ou com os
fabricantes de fórmulas, que, de forma irresponsável, espalhavam os produtos
no passado, embora hoje encontrem mais limitações? Ou é apenas o fato das
mães preocuparem-se com a necessidade de água pelos bebês, nos dias
quentes? Ninguém sabe!
O que é sabido é a existência, em todos os lugares, de uma solução
maravilhosa, de baixa tecnologia, para a desnutrição infantil.
Louise Arce Tellalian, RN, CLC, FACCE
1911 San Ysidro Drive
Beverly Hills, CA 90210
310-274-2272; Fax 310-859-7077
[email protected]
“Amamentar é o bem mais precioso que uma mãe pode dar ao filho. Diante de
doenças ou desnutrição, pode ser o bem que salva vidas; diante de pobreza da
pobreza, pode ser o único presente.”
Dr. Ruth Lawrence
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