Interacção alimento – medicamento

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d o
m e d i c a m e n t o
ORDEM DOS FARMACÊUTICOS
Interacção alimento – medicamento
A interacção alimento – medicamento (IAM) é um fenómeno que, muito embora frequentemente descurado, merece
uma atenta reflexão na avaliação da eficácia da terapêutica medicamentosa, bem como na avaliação do estado
nutricional do doente. Sendo certo que interacções desta
natureza raramente ocasionam consequências fatais, é
relativamente frequente o surgimento de efeitos adversos,
mais ou menos importantes e, a priori, imprevisíveis, ou
que originam respostas farmacológicas diversas em intensidade das esperadas para uma determinada dosagem.
Com a presente sinopse é nosso objectivo sensibilizar os
profissionais de saúde, e em particular os farmacêuticos,
para a importância de considerar a IAM no processo farmacoterapêutico, enquanto mais um dos aspectos a levar em consideração na garantia do sucesso terapêutico,
bem como controlar eventuais consequências ao nível do
estado nutricional do doente.
A. InfluêncIA DoS AlImentoS
nA Acção DoS meDIcAmentoS
Os alimentos podem modificar os efeitos dos fármacos,
fundamentalmente por interferência no seu comportamento farmacocinético, designadamente nos processos
de absorção, distribuição, metabolismo e excreção, ou no
seu comportamento farmacodinâmico, originando, como
é natural, um viés, mais ou menos pronunciado e relevante, no efeito terapêutico pretendido.
A este respeito, e em rigor, devemos assinalar que as interacções que se descrevem para alimentos em geral se
devem, muitas vezes, a efeitos inespecíficos – provocados
pela sua presença – no tracto gastrointestinal, e não tanto
a características próprias dos alimentos em questão.
Interacções de natureza farmacocinética
As interacções de natureza farmacocinética são as mais
frequentes, e resultam da interferência do alimento ao
nível dos processos de absorção, distribuição, metabolismo ou excreção do fármaco.1,2,3,4,5,6 Sendo que os medicamentos são, na sua maioria, administrados por via oral,
é ao nível da absorção que se verificam as interacções
clinicamente mais significativas.
O processo de absorção dos fármacos pode ser condicionado pelos alimentos, ou por alguns dos seus componentes, quer ao nível da velocidade, quer ao nível da
quantidade de fármaco absorvida. Esta influência poderá
ser de natureza fisiológica, originando uma modificação
do esvaziamento gástrico ou um aumento da motilidade
intestinal, ou de natureza físico-química, onde se destacam os fenómenos de quelação e de adsorção.
A modificação da velocidade de esvaziamento gástrico é o
factor com maior implicação ao nível da absorção, sendo
que o efeito poderá ser de atraso, redução, aumento ou
antecipação da absorção.6,7
No grupo dos medicamentos em que se verifica um atraso na absorção, decorrente da administração concomitante com alimentos, incluem-se os fármacos com uma
elevada solubilidade e permeabilidade, em que o único
factor limitante se prende com o período de tempo necessário a que o mesmo atinja o local de absorção, não
sendo este processo influenciado na sua extensão. É o
caso de alguns AINEs, como o diclofenac e o cetoprofeno,
de alguns analgésicos, como o paracetamol, e de vários
antibióticos, barbitúricos e benzodiazepinas.6
De entre os fármacos nos quais se verifica uma redução
pronunciada no processo de absorção, por interacção com
constituintes da dieta, destaque para as tetraciclinas. De
facto, as tetraciclinas formam quelatos não-absorvíveis
com iões di ou trivalentes (e.g. Fe2+, Fe3+, Ca2+),2,3,5,6,7
particularmente abundantes em alimentos ou bebidas
contendo cálcio (e.g. queijo, leite, iogurtes) e em alimentos fortificados com ferro (e.g. alguns cereais). Outro dos exemplos clássicos é o da administração concomitante de fenoximetilpenicilina potássica, por via oral,
com alimentos, o que ocasiona uma notável diminuição
na biodisponibilidade do fármaco. Atendendo a que a absorção da penicilina se dá, fundamentalmente, ao nível
do duodeno e do íleo, e dado que sofre um processo de
decomposição no estômago devido ao pH ácido e à presença de enzimas digestivas, os alimentos, ao favorecerem a secreção ácida e o retardamento do esvaziamento
gástrico, constituem um importante factor de diminuição
da biodisponibilidade do medicamento.7,8
Ao contrário, existem alguns medicamentos cuja absorção
ou biodisponibilidade é aumentada pela presença de alimentos. Na maioria das situações este acréscimo na absorção está relacionado com alterações no pH gástrico, na
solubilidade do fármaco ou no esvaziamento gástrico.
As interacções que se repercutem no processo de distribuição
são pouco relevantes do ponto de vista clínico, sendo que
as interacções que conduzem a alterações do metabolismo
dos fármacos resultam, fundamentalmente, da interferência
ao nível das enzimas de fase I, nomeadamente do sistema
enzimático citocromo P450 que, ao sofrer influência dos
constituintes da alimentação, pode resultar numa inibição
ou indução enzimática. Neste âmbito, têm sido identificadas numerosas interacções, com significado clínico, entre
o sumo de toranja e diversos medicamentos. Estas interacções traduzem-se num efeito inibitório do sumo de toranja
– provavelmente de alguns flavonóides, como a naringenina – sobre o metabolismo dos fármacos metabolizados
pelo CYP 3A4, o que ocasiona um aumento das suas concentrações plasmáticas, com eventual risco para o doente.
Nestas circunstâncias, as interacções conhecidas permitem
contra-indicar a ingestão de toranja / sumo durante a terapêutica com, por exemplo, alguns anti-histamínicos, como
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sejam a terfenadina, o diazepam e a carbamazepina, a lovastatina, a atorvastatina e a simvastatina, ou o sildenafil.9
No que respeita à eliminação dos fármacos, este processo
pode ser condicionado pelo pH urinário, que influencia o
processo de reabsorção tubular dos ácidos e bases fracas,
por alteração do grau de ionização das moléculas. De entre
os medicamentos que acidificam a urina contam-se a carne
de aves, o peixe, as uvas, o pão e o queijo, sendo que os
frutos (com excepção das uvas), os legumes (exceptuando
o milho e as lentilhas), o leite, as natas e a manteiga são
alimentos susceptíveis de alcalinizar a urina.6,8
Interacções de natureza farmacodinâmica
As interacções de natureza farmacodinâmica, sendo menos frequentes, ocorrem quando o efeito do fármaco no
seu local de acção é modificado pela presença do alimento, ou concretamente de alguns dos seus constituintes.1
Neste tipo de interacção poderá constatar-se um efeito
aditivo, como seja o resultante da administração concomitante de fármacos que actuam ao nível do SNC (e.g.
hipnóticos, anti-histamínicos) com álcool, que apresenta,
igualmente, uma actividade depressora.10
Noutras situações, a interacção origina um efeito do tipo
antagónico. Por exemplo os anticoagulantes que prolongam
o tempo de protrombina vêem o seu efeito antagonizado
pela vitamina K, muito abundante em certos alimentos
como a aveia, o trigo, fígados ou espinafres.6,10
Outro tipo de interacção, de natureza farmacodinâmica,
com consequências clinicamente relevantes prende-se com
alterações da actividade de algumas enzimas. Uma das situações perfeitamente descritas na literatura prende-se com
a presença de tiramina em elevada quantidade em alguns
alimentos e bebidas, como sejam bebidas alcoólicas fermentadas (cerveja, …), queijos curados e fermentados, carnes
fumadas, etc., que interferem com o tratamento crónico
com IMAOs. De facto, a tiramina é geralmente metabolizada pelas monoaminoxidases intestinais e hepáticas que,
ao serem inibidas, dão origem a um aumento de tiramina
na corrente sanguínea. Ao actuar como simpaticomimético indirecto, a tiramina pode originar graves crises hipertensivas que, em situações limite, poderão culminar em
hemorragia cerebral e coma11. Em 1964 foram registados
38 casos de hemorragia cerebral, dos quais 21 se revelaram fatais, em doentes a fazer terapêutica com IMAOs,
nos quais se constatou serem consumidores regulares de
queijos e outros alimentos e bebidas ricos em tiramina.5
Por outro lado, também os alimentos ricos em aminas
pressoras, como a histamina, são passíveis de determinar a mesma síndrome. De entre este tipo de alimentos
contam-se o queijo “gruyère”, alguns peixes e molhos
exóticos e o marisco.8
B. InfluêncIA DoS meDIcAmentoS
no eStADo nutrIcIonAl Do Doente
Outro dos aspectos a ter em consideração na IAM prendese com a influência de determinados fármacos no estado
nutricional do doente. Com frequência, as manifestações
clínicas (anemia, diarreia e perda de peso) são atribuídas à
doença quando, na verdade, poderão estar relacionadas com
uma IAM. A deficiente absorção induzida por fármacos pode
chegar a ser sintomática e causar deficiências nutricionais
originadas pelo uso crónico ou abuso de medicamentos.
Por exemplo, o uso prolongado de laxantes, como o bisacodil, ao induzir um aumento da velocidade do trânsito
intestinal, reduz a absorção de glicose, proteínas, sódio,
potássio e algumas vitaminas.2,8
Também o uso crónico de antiácidos (hidróxidos de magnésio, cálcio e alumínio) conduz à precipitação do fosfato da dieta, podendo ocorrer quadros graves de esgo-
tamento de fósforo e, consequentemente, o surgimento
de osteomalácia3,8.
Alguns fármacos hipocolesterolemiantes, como sejam o
clofibrato e a colestiramina, estão relacionados com fenómenos de má-absorção do ferro, de carotenóides e de
vitaminas A, D e E.8
O uso prolongado, ou a ingestão de doses elevadas, de
diuréticos provoca um aumento na excreção de minerais.
Por exemplo a furosemida origina a perda de potássio,
magnésio, zinco e cálcio.3
Para além das interacções de natureza físico-química entre o alimento e o medicamento, alguns medicamentos
poderão estar na base de uma deterioração no estado
nutricional do doente, seja pelas suas propriedades eméticas (e.g. digitálicos, fluoxetina, hormonas da tiróide),
seja pela diminuição da produção de saliva que induzem,
fazendo diminuir o aporte alimentar (e.g. antipsicóticos,
antidepressivos tricíclicos), ou ainda por alterarem a percepção do sabor (e.g. amiodarona, sais de ouro).4,10,11
Citando Basile, poderemos concluir dizendo que: “O conhecimento prévio das características do paciente (necessidades, idade, funções fisiológicas, estado nutricional,
hábitos de alimentação), da doença (crónica, aguda ou
ambas) e do medicamento (eficácia, margem de segurança, posologia, modo e tempo de utilização) constitui
conduta ética que, com certeza, cerceia os riscos advindos
das interacções entre fármacos e alimentos”.12
concluSõeS
A importância do conhecimento da causa e do efeito da
interacção provocada pela presença de alimentos na biodisponibilidade dos fármacos assume um papel preponderante
na obtenção da eficácia terapêutica pretendida. Questão
muitas vezes descurada na instituição da terapêutica medicamentosa, demonstra-se que os constituintes da dieta,
ou a mera presença de alimentos, condicionam a farmacocinética e a farmacodinâmica dos fármacos, por vezes com
repercussões importantes ao nível do resultado terapêutico.
Por outro lado, o estudo do efeito dos medicamentos na
utilização e aproveitamento dos nutrientes pode ajudar
a compreender, e a corrigir ou minorar, as deficiências
nutricionais associadas a determinadas terapêuticas.
Sendo que, normalmente, o farmacêutico é o profissional de saúde que contacta com o doente imediatamente
antes do início do processo farmacoterapêutico, cabe-lhe
promover, junto daquele, o uso racional e correcto dos
medicamentos, sublinhando a importância de compatibilizar a dieta com a terapêutica instituída no caso das
IAM clinicamente relevantes.
lúcia Santos
Farmacêutica, Mestre em Saúde Pública
fernando ramos
Farmacêutico, Doutor em Bromatologia e Hidrologia
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15(2): 223-38.
Os dados disponíveis actualmente não permitem considerar
os medicamentos, quando usados correctamente, como
factores de risco desencadeantes dos estados patológicos
induzidos pelo calor.1-3 Não há uma relação causal entre
consumo de medicamentos e a aparição de um golpe de
calor.2.3 No entanto, pelos seus mecanismos de acção ou
pelos seus efeitos indesejáveis, alguns medicamentos poderiam ser responsáveis pelo agravamento de sintomas
ligados a temperaturas extremas.1-3
A adaptação do tratamento medicamentoso deve ser considerada caso a caso, devendo ter em conta a patologia, o risco
de síndroma de abstinência e de efeitos adversos.1-3
Uma educação apropriada dos doentes e eventuais alterações na prescrição ou posologia, especialmente quando
o tempo é muito quente, podem minimizar a ocorrência
de problemas como o golpe de calor.4
Alguns dados epidemiológicos permitem distinguir grandes
grupos de medicamentos que parecem agravar as consequências da exposição ao calor. Os estudos epidemiológicos
são pouco numerosos, mas a prudência justifica tomar em
consideração os dados clínicos disponíveis e os conhecimentos farmacológicos sobre estes fármacos.5
medicamentos que podem agravar
o esgotamento devido ao calor
e o golpe de calor
– Medicamentos que podem provocar alterações electrolíticas e na hidratação, principalmente os diuréticos, em
particular os da ansa (furosemida, torasemida).1,3,6
– Outros medicamentos susceptíveis de alterar a função renal:
– Todos os anti-inflamatórios não esteróides (AINE) incluindo os clássicos, os salicilatos em doses superiores
a 500 mg/dia e os inibidores selectivos da COX-2.1-3,5
– Os inibidores da enzima de conversão de angiotensina
e os antagonistas dos receptores da angiotensina II.1-3,5
– Alguns antibióticos como as sulfamidas e alguns antivíricos (principalmente o indinavir).1-3
A desidratação, frequente com o calor elevado, torna os rins
mais sensíveis aos efeitos tóxicos dos medicamentos.5
– Medicamentos com um perfil cinético que pode ser
afectado pela desidratação (por modificação da sua distribuição ou da sua eliminação):2 sais de lítio, antiarrítmicos, digoxina, antiepilépticos, alguns antidiabéticos
orais (sulfonilureias e biguanidas), (antidislipidémicos
- estatinas e fibratos).1-3 Há risco de acumulação com
efeitos graves particularmente nos medicamentos com
margem terapêutica estreita. Os doentes tratados com
medicamentos em que a eliminação se faz por via renal
estão particularmente expostos ao risco de sobredosagem
destes no decurso de uma onda de calor.5
– Medicamentos que podem impedir a perda calórica do
organismo:
A. Por alteração da termorregulação central: neurolépticos e agonistas serotoninérgicos.1-3
Os neurolépticos estão implicados nos mecanismos
da termorregulação,5,6 a eliminação do calor é reduzida.4 Os problemas com a regulação da temperatura
a nível central estão bem descritos com as fenotiazinas,4,5 existindo também com butirofenonas como
o haloperidol, tioxantenos como a flufenazina e com
outros neurolépticos mais recentes como a clozapina.
A olanzapina ou a risperidona recomendam precaução em caso de exposição a temperaturas extremas.5
Numerosos neurolépticos têm efeitos anticolinérgicos que intervêm também, bloqueando a excreção da
glândula sudorípara, como se refere seguidamente.5,6
Numerosos antidepressores têm sido implicados em
alteração da termorregulação: antidepressores com
efeitos serotoninérgicos, inibidores da monoaminoxidase (IMAO).5
B. Por alteração da termorregulação periférica:
– Medicamentos com propriedades anticolinérgicas limitam a sudação, diminuindo deste modo a capacidade
de termólise.1-5 São numerosos os medicamentos
com propriedades anticolinérgicas: antidepressores
tricíclicos (AT) (amitriptilina, imipramina, etc.); anti-histamínicos H1 de primeira geração (difenidramina,
dexclorofeniramina); alguns antiparkinsónicos (tri-hexifenidilo, biperideno); antiespasmódicos (mebeverina, trimebutina, alcalóides da beladona), em
particular os que actuam a nível urinário (oxibutinina,
tolterodina, tróspio); neurolépticos incluindo os antipsicóticos atípicos (haloperidol, clozapina, olanzapina,
risperidona, trifluoperazina); disopiramida (antiarrítmico) e pizotifeno (enxaqueca).1-3,5 Outros derivados
fenotiazínicos utilizados como antivertiginosos.5
Muitos dos anti-histaminicos H1 são derivados das
fenotiazinas, partilhando os efeitos sobre a termorregulação próprios dos neurolépticos e efeitos
anticolinérgicos. A associação dum anticolinérgico
a um neuroléptico para a prevenção e tratamento
dos efeitos extrapiramidais indesejáveis do neuroléptico, expõe particularmente o doente ao risco de
golpe de calor por adição dos efeitos.5
– Vasoconstritores periféricos por limitação da resposta vasodilatadora:
1. Agonistas e aminas simpaticomiméticas, usadas na
congestão nasal por via sistémica (pseudoefedrina,
fenilefrina, fenilpropanolamina, etc) e na hipotensão ortostática (etilefrina, heptaminol, etc).1-3,6
A vasoconstrição diminui a irrigação cutânea, reduzindo a perda de calor por convecção. Nos simpaticomiméticos a produção de calor é também
aumentada pela actividade muscular e agitação.4,5
A hipertermia é um dos sintomas de sobredosagem
dos vasoconstritores como efedrina e pseudoefedrina.5
Medicamentos com propriedades simpaticomiméticas também incluem: cocaína e anfetaminas.4 Outros anfetamínicos são usados como anorexígenos
(sibutramina) ou como estimulantes (metilfenidato).
O buproprion está comercializado para o tabagismo.5
2. Alguns medicamentos para a enxaqueca (triptanos e derivados da cravagem do centeio como
ergotamina).1-3
– Medicamentos que podem limitar o aumento do débito cardíaco, como reacção a um aumento do débito sanguíneo cutâneo, nomeadamente por depleção
(diuréticos) ou por depressão do miocárdio (bloqueadores beta, como propranolol, metoprolol, etc). 1-3
C. Medicamentos que aumentam o metabolismo basal
induzindo a produção endógena de calor: hormonas
tiroideias (levotiroxina, liotironina).1-3 Uma terapia substitutiva correcta não representa um risco especial.5
– Parassimpaticomiméticos, por aumento da sudação. Este
é um dos métodos mais eficazes de expulsão do calor corporal. Em caso de exposição a um calor forte, a sudação é a
causa da maior perda de água. A pilocarpina é um agonista
colinérgico que deve ser usado com prudência em caso de
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medicamentos e onda de calor
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risco de desidratação. Os anticolinesterásicos usados em
certas demências (donepezil, galantamina, rivastigmina)
levam a hipersudação pelos efeitos colinérgicos. Também
ocorre com os inibidores da colinesterase usados em miastenia (neostigmina, piridostigmina). 5
– O topiramato, antiepiléptico, pode ocasionar diminuição
da sudação e hipertermia, especialmente em crianças.2,5
Como já indicado, o uso de algumas drogas como anfetaminas, ecstasy, ou cocaína e o alcoolismo crónico são também
factores de risco que podem agravar as consequências do
calor.1-3,5 O uso de álcool leva a perda de água e sódio pela
urina, diminui o nível de consciência e a capacidade de se
proteger do calor e aumenta a circulação sanguínea a nível
cutâneo, com dissipação de calor. Em grandes quantidades,
intervém na termorregulação a nível central.5
medicamentos
que podem provocar uma hipertermia
Há duas situações que favorecem os desequilíbrios térmicos, tanto em condições normais de temperatura, como
nos períodos de canícula:
– A síndroma maligna dos neurolépticos pode ser provocada por neurolépticos ou antipsicóticos.1-3 Caracteriza-se por aumento da temperatura, rigidez muscular,
alterações no estado mental e disfunção do sistema
nervoso vegetativo.7 Não parece haver risco aumentado
em caso de temperatura ambiente elevada. Diferentemente do golpe de calor, aqui existe rigidez muscular
com profusa sudação.5
– A síndroma serotoninérgica, pode acontecer por agonistas serotoninérgicos e similares: inibidores da recaptação da serotonina, AT, IMAO, venlafaxina, triptanos
e buspirona. O risco está relacionado mais frequentemente com associações destes medicamentos.1-3
medicamentos que podem
agravar indirectamente os efeitos do calor
Prudência no caso de:
– Medicamentos que podem baixar a pressão arterial e
induzir uma hipoperfusão de certos órgãos (SNC), especialmente os anti-hipertensores e antianginosos.
– Medicamentos que actuam sobre o estado de vigília,
podendo alterar as faculdades para se defender do calor.1-3 O risco de doença relacionada com o calor pode
aumentar quando se tomam psicotrópicos que afectam
o funcionamento psíquico, a conduta ou a experiência
(por exemplo, haloperidol ou cloropromazina).8
Aconselhamento
Em caso de onda de calor recomenda-se, em relação ao
uso de medicamentos, que:
– Os profissionais de saúde revejam os medicamentos
que o doente toma, identificando os que podem alterar a adaptação ao calor e reavaliando a necessidade
de cada um em termos de benefício/risco.
– Se evite a prescrição de anti-inflamatórios, especialmente nefrotóxicos em caso de desidratação.
– Em caso de febre, se evite a toma de paracetamol,
pela sua ineficácia no golpe de calor e por um possível
agravamento da afectação hepática frequentemente
presente.2,3
– Se o doente toma qualquer medicamento deverá ter
atenção, lendo o folheto informativo, e respeitando as
posologias e horários das tomas.
– O tratamento não deve ser interrompido sem indicação médica, já que isto pode acarretar complicações
ligadas a interrupção súbita, ou aos efeitos da doença
não tratada.
– Não tomar medicamentos, mesmo os não sujeitos a
receita médica, sem orientação do seu médico ou farmacêutico.
– O médico deverá ser consultado se não se sentir bem,
pois poderá ser necessário adaptar o tratamento.9
Outros conselhos gerais para as épocas de calor são indicados na Ficha Técnica do CIM deste mesmo número
da ROF.
conservação de medicamentos
Para medicamentos que devem ser conservados ente 2 e
8ºC, a onda de calor não será motivo de problemas se estas condições forem respeitadas,1,10 já que a conservação
se efectua no frigorífico. Em caso de temperatura exterior
elevada, uma vez fora do frigorifico, recomenda-se a sua
rápida utilização ou a imediata reintrodução após o seu uso.10
Outros devem ser conservados a temperaturas inferiores a 25 ou 30ºC. A ultrapassagem pontual (alguns dias
a algumas semanas) não tem consequências para a sua
estabilidade ou qualidade.1,10 Numa onda de calor as temperaturas não estão sempre à volta dos 40ºC.10
Há medicamentos que se devem conservar à temperatura
ambiente (sem menção especial de conservação). Para
estes medicamentos demonstrou-se nos ensaios de estabilidade que não se degradam quando expostos a 40º
durante 6 meses.1,10
Algumas formas farmacêuticas (supositórios, óvulos, cremes) são bastante sensíveis à elevação da temperatura.
Pode-se avaliar se mantêm a qualidade pelo aspecto (aspecto normal, supositório não fundido, etc.) que indica a estabilidade.1,10 Produtos com aparência exterior visivelmente
modificada não devem ser utilizados porque pode indicar
modificação das propriedades da forma farmacêutica.10
Transporte de medicamentos por particulares: quando
se devem conservar entre 2 a 8ºC, transportam-se em
condições que respeitem a cadeia de frio (embalagem
isotérmica refrigerada) mas evitando sempre a congelação.9 Os medicamentos de conservação inferior a 25 ou
30ºC não devem ser expostos muito tempo a temperaturas elevadas como as alcançadas em porta-bagagens ou
no interior de veículos ao sol. Como precaução é aconselhável o transporte numa embalagem isotérmica não
refrigerada.10
Aurora Simón
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BOletim DO Cim - Publicação bimestral de distribuição gratuita da Ordem dos Farmacêuticos - Rua da Sociedade Farmacêutica, 18 - 1169-075 Lisboa - Telf. CIM 213 191 393. Director: J. Aranda da Silva
Comissão de Redacção: A. Simón (coordenadora); J. A. Aranda da Silva; M. E. Araújo Pereira; M. T. Isidoro; T. Soares. Os artigos assinados são da responsabilidade dos respectivos autores.
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