Movimento e ação em Berson: a metafísica da duração

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V Seminá
inário de Pós-Graduação em Filosofia da UFSC
Car
19 a 23 de outubro de 2009
MOVIMENTO E A
AÇÃO EM BERGSON: A METAFÍS
FÍSICA DA
DURAÇÃO
Pablo Enrique Abraham
Ab
Zunino
Doutorado – Universidade dee São
S Paulo( USP)
Bolsista CNPq
[email protected]
Introdução
O título desta comu
municação expressa uma hipótese geral sobre
bre a filosofia de
Bergson, a saber, que a obse
bservação interior pela qual descobrimos em nó
nós a duração está
intimamente ligada à observ
ervação exterior que nos mostra a natureza em movimento. O
que pretendemos fazer aqu
qui é caracterizar a observação interior a parti
rtir dos diferentes
tipos de ação que Bergso
gson descreve em Matéria e memória335, articulando
a
essa
diferenciação com a noção
ção de movimento de modo a obter uma com
compreensão mais
abrangente da sua metafísic
sica da duração.
Para desenvolver o trabalho, estruturamos o texto em três part
artes: na primeira,
examinamos o problema do movimento, tal como ele é introduzido noo Ensaio sobre os
dados imediatos da consciê
ciência336 e retomamos essa análise à luz do qu
quarto capítulo de
Matéria e memória; na seg
egunda parte, estabelecemos uma relação entre
tre o primeiro e o
quarto capítulo dessa obra,
a, ttomando como fio condutor a idéia de que qu
quando os hábitos
contraídos na ação são trans
anspostos para a esfera da especulação criam fa
falsos problemas,
um deles é o dualismo met
etafísico ou separação radical entre corpo e cconsciência, que
3
Bergson deverá diluir afirm
irmando a “continuidade movente universal”337
; na terceira e
última parte, questionamos
os se a própria tentativa bergsoniana de superar
rar o dualismo não
engendra, por sua vez, nov
ovas dualidades. No caso específico da ação e do movimento,
poderíamos pensar que a atividade
ati
da consciência se opõe à passividade
de da matéria, isto
é, à maneira como nosso
so corpo recebe sensações ou movimentos qu
que estimulam a
percepção.
335
Bergson, H. Matéria e memór
ória: ensaio sobre a relação do corpo com o espírito.. São
Sã Paulo: Martins
Fontes, 2006, doravante citado co
como MM.
336
Bergson, H. Ensaio sobre oss ddados imediatos da consciência. Lisboa: Edições 70,, 1988,
1
doravante
citado como DI.
337
Bergson. MM, pp. 231-232.
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I
No Ensaio sobre os dados imediatos da consciência, parece qu
que Bergson está
confinando o movimento à interioridade do sujeito; será que não podem
emos encontrar já
aí uma passagem para o movimento fora da consciência – o movi
ovimento real? O
problema do movimento é iintroduzido pelo autor a partir das seguintess teses: a primeira
do Ensaio e a segunda do qu
quarto capítulo de Matéria e memória:
1) “O movimento é uma
u síntese mental”.338
2) “O movimento é um
u ato simples e indivisível da consciência”.
a”.339
As palavras “mental
tal” e “consciência” remetem imediatamente à interioridade do
sujeito, porém, como obser
serva Frédéric Worms340, não podemos ignorar
rar que a realidade
do movimento compreend
ende dois aspectos, um que diz respeitoo ao “espectador
consciente” e outro à próp
ópria “produção” do movimento. Em outrass ppalavras, “como
compreender que esse ato
to não esteja somente na consciência do espec
pectador e sim no
próprio movimento, naquil
uilo que se move, no mundo?”341 A realidade
de do movimento
será portanto uma questão
ão metafísica, que permitirá efetuar a passag
agem da dedução
teórica da duração a sua exi
existência real, em nós e nas coisas.
O primeiro passo nessa
ne direção já se encontra no primeiro livroo dde Bergson, pois
quando o filósofo introduz
uz a noção de “ato mental” não está se referind
indo apenas a uma
condição teórica e subjetiva
iva de possibilidade, mas a um ato empírico e rreal de produção
do próprio movimento. Iss
Isso indica que não podemos separar o ato
to necessário para
perceber o movimento noo eespaço do ato que faz com que o movimento
to transponha esse
mesmo espaço para não ser reduzido a ele. Desse modo, Bergson preten
tende demonstrar a
realidade e a atividade eefetiva da consciência no mundo sem “e
“espiritualizar” o
movimento.
Como é que Bergs
rgson vai equacionar a relação entre ação e movimento? O
movimento, dirá ele, é a na
natureza mesma de nossa consciência, pois su
sua atividade não
consiste em representar coi
coisas ou objetos, senão em reunir os momen
entos da duração,
isto é, produzir progresso
ssos. Para Bergson, perceber o movimento
to é um ato da
consciência e não mais um
uma representação. Nesse sentido, podemos
os afirmar que a
338
Bergson. DI, p. 79.
Bergson. MM, pp. 219-220.
340
Worms, F. Bergson ou les deu
eux sens de la vie. Paris: PUF, 2004.
341
Ibid., p. 68.
339
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consciência é imanente aoo aato, na medida em que o próprio ato de pass
assagem é sentido
internamente pela consciênc
ência que o produz e o vê como uma mudança.
a.
Mas ainda devemos
os precisar a relação entre esse “ato” da consc
sciência e a “ação
concreta” do sujeito no m
mundo, se quisermos compreender o sentido
tido metafísico da
noção de duração, pois “a ação não está no ato exterior como tal,
l, nnem apenas nas
intenções subjetivas, mass nna passagem de destas ao ato, na medida em que este supõe
um ator específico que reve
evela o esforço da sua própria duração”.342 Pen
ensamos que esse
“esforço” não é levado em
m conta por Zenão quando formula o paradoxo
oxo de Aquiles e é
justamente isso o que Ber
Bergson vai criticar, tanto no Ensaio quanto
to em Matéria e
memória.343 Indo um pouc
ouco mais longe, na conferência intitulada “A percepção da
mudança”, o filósofo aprese
esenta uma resposta hipotética que o próprio Aq
Aquiles daria para
Zenão:
“Eu, para
ara correr, procedo diferentemente. Dou um prime
meiro passo, depois
um segundo, e as
assim por diante: finalmente, após um certo núme
mero de passos, dou
um último passo
so com o qual pulo por cima da tartaruga. Realizo assim
as
uma série de
atos indivisíveis.
is. Minha corrida é a série desses atos”.344
Obviamente, ningué
guém corre pensando em chegar até um ponto,
p
onde se
encontrava um corredor pr
próximo que, no momento de nossa chegada
ada, se encontrará
noutro ponto, o qual devere
eremos ultrapassar e assim, ad infinitum, correr
rreríamos de ponto
em ponto sem nunca ultr
ltrapassar de fato o corredor a nossa frent
ente, embora nos
aproximemos dele cada vez mais. Zenão desarticula a corrida de Aquile
uiles ao privilegiar
as sucessivas posições em
m detrimento
d
da passagem pela qual se explica
lica a transposição
de um intervalo.
Mas o que é que Ber
ergson quer mostrar com tudo isso? Ele querr pprovar que existe
multiplicidade sem quantida
tidade. Por isso, quando consideramos algo que
ue se move ou que
dura, devemos apreendê-lo
lo como processo de transformação. Não podem
demos afirmar que
se trata do mesmo (já quee m
muda), nem dizer que é outro (porque nãoo hhá separação de
partes). A mudança, sendo
do uma passagem, exige um sentido novo ppara a noção de
342
Worms, p. 86.
Se a marca do movimento é a indivisibilidade e esta é incompatível com o instante,
te, por que insistimos
em atribuir “instantes” à duraçã
ação e ao movimento? A resposta a essa pergunta ddeve pautar-se pela
analogia que fazemos, talvez inco
nconscientemente, entre os “pontos da linha” e os “mom
mentos do tempo”. O
erro apontado por Bergson noss aargumentos de Zenão de Eléia ganha agora mais fôle
lego. Como vimos, a
ilusão consiste em tratar o tempo
po e o movimento como uma linha, isto é, espacialmente
nte. Nesse sentido, os
quatro paradoxos de Zenão (a Dicotomia,
Di
o Aquiles, a Flecha e o Estádio) acabam po
por “deixar de lado a
duração verdadeira para consider
erar apenas seu traço objetivo no espaço” (Bergson. MM
M, pp. 222-225).
344
Bergson, H. O pensamento e o movente. São Paulo: Martins Fontes, 2006, pp. 166-1167.
343
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“diferença”.345 Esse sentid
tido indica precisamente que o “movimento”,
o”, assim como a
duração, é um processo de diferenciação sem separação, isto é, uma
ma multiplicidade
qualitativa: “A duração pro
propriamente dita não tem momentos idênticos
cos nem exteriores
uns aos outros, sendo essen
sencialmente heterogênea, indistinta, e sem a analogia com o
número”.346 Na multiplici
icidade qualitativa não identificamos “objet
jetos” iguais que
possam vir a repetir-se, portanto
p
é impossível representar os “instan
tantes” do tempo
numericamente, como po
pontos justapostos, à maneira de Zenão.
o. Esse tipo de
multiplicidade aparecerá ppara uma consciência capaz de conserva
var os “fatos de
consciência que se penetra
tram, se organizam insensivelmente em conj
njunto e ligam o
passado com o presente dev
devido a esta solidariedade”. A duração interna
rna é sentida como
um contato imediato com a realidade movente, ao passo que a percepçã
pção do fenômeno
exterior é a forma que toma
ma o movimento pra nós.
II
No início do primei
eiro capitulo de Matéria e memória, Bergson
on desenvolve sua
célebre teoria das imagens
ns, que nós interpretamos a partir dos diferente
ntes tipos de ação
envolvidos na sua argumen
entação. Se a ação é a “faculdade que nóss ttemos de operar
mudanças nas coisas”, pod
odemos procurar nela o caminho que nos mos
ostre o “ponto de
3
contato entre a consciência
cia e as coisas, entre o corpo e o espírito”.347
Distingamos,
então, quatro “ações” a par
artir das expressões literalmente presentes naa oobra de Bergson.
Estas ações são sempre rep
eportadas ao corpo e ao papel que este desemp
mpenha durante o
processo perceptivo. Antes
es de prosseguir, lembremos que Bergson cham
ama de “imagens”
não só os conteúdos na nos
ossa percepção, senão também as coisas em si mesmas, isto é,
a realidade material da qual
al nosso próprio corpo faz parte.
1) Ação real - No con
conjunto das imagens, na totalidade ou campo
po indistinto que
configuram as imaagens348, o corpo ocupa um lugar privileg
legiado, por que?
Precisamente, porqu
rque ainda que seja uma imagem como as outras
tras, ele é capaz de
345
Deleuze, G. Bergsonismo. São
Sã Paulo: Ed. 34, 1999, p. 95: “A noção de diferenç
nça deve lançar uma
certa luz sobre a filosofia de Berg
ergson, mas, inversamente o bergsonismo deve trazerr a maior contribuição
para uma filosofia da diferença”.
”.
346
Bergson. DI, p. 84.
347
Bergson. MM, pp. 66-69.
348
A leitura de Bento Prado Jr.. en
encontra aqui boas razões para compreender a gênesee dda subjetividade: “É
através de uma subjetividade que
ue o Ser pode tornar-se presente. A Presença (...) supõe
põe não apenas aquilo
que se torna presente, mas indica
ica também alguém a quem o que é presente se dá com
mo tal. Mais ainda, a
presença supõe, para além do ‘al
‘algo’ ou do ‘alguém’, um ‘lugar’ onde algo se torna pre
presente para alguém.
Isto é, a Presença só se dá no inte
nterior de um campo transcendental que a torna possível
vel” (Prado Júnior, B.
Presença e campo transcendenta
ntal: consciência e negatividade na filosofia de Bergson
on. São Paulo: Edusp,
1988, p. 68).
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exercer uma “açãoo rreal”, isto é, um movimento que modifique o conjunto, como
na metáfora do calei
leidoscópio.349
2) Ações virtuais ou possíveis
po
- Para cada ação real que o corpo exe
exerce, existe uma
infinidade de ações
es possíveis, que se encontram, por assim dize
izer, em estado de
latência. Por isso,, Bergson
B
compara a percepção a uma “ques
uestão elementar”.
Uma mesma questã
stão pode suscitar diversas respostas na form
rma de “atividade
motora”, já que “os
“
elementos nervosos não trabalham com vistas ao
conhecimento: apen
enas esboçam de repente uma pluralidade dee ações
a
possíveis”
(MM, p. 27).
3) Ações nascentes - O corpo prepara reações (respostas moto
toras) à ação do
ambiente e dos obje
bjetos circundantes. Como uma “bússola quee é deslocada”, ele
marca sua posição,
ão, enquanto imagem central, em relação às imagens que o
cercam. Isso não significa
sig
que devamos isolar alguma parte do co
corpo do restante
do universo materia
rial, como pretendem alguns, que atribuem aoo ccérebro humano
uma função repres
resentativa no ato da percepção. Existem re
reações reflexas,
executadas quasee imediatamente
i
pela medula espinhal ante
nte as excitações
recebidas. Esse mesm
esmo processo ocorre em outros seres vivos me
menos complexos,
onde o estímulo e a reação muitas vezes coincidem. O que o cér
cérebro pode fazer
é transmitir, metamo
morfosear, inibir ou prolongar os movimentos
tos de reação para
dispersá-los em “açõ
ações nascentes” que não se realizam efetivame
mente. Mas qual é
o critério, o filtro que
q deixa passar a ação real ao passo que fa
faz permanecer a
ação virtual? Ou será
se que mesmo nos mecanismos motores en
encontramos uma
franja de liberdade?
e?
4) Ações indetermina
nadas ou zonas de indeterminação: O ccérebro, então,
comparado a uma “central
“c
telefônica”, pode efetuar a comunicaç
cação ou mantê-la
em espera e assim amplia
a
a nossa capacidade de ação e reação.
o. Trata-se de um
processo evolutivo,
o, através do qual os mecanismos motores see ttornam cada vez
mais complexos, deixando
dei
uma zona de indeterminação da ação
ão cada vez maior,
onde se insere por
or fim à escolha do ser vivo como uma ind
indeterminação do
querer: “Prossiga até
at o fim. O movimento irá atravessar a subs
ubstância cerebral,
349
O sentimento de “esforço”,, a “consciência de movimentos” e o “sentido muscula
ular” constituem uma
mudança de estado ou de qualida
lidade. Como distinguir, então, um movimento aparente
nte de um movimento
real? Em lugar de aceitar ingenu
nuamente a “divisão artificial” que funda a descontinuid
uidade entre corpos e
objetos independentes, devemos
os compreender como se realiza, na totalidade, uma m
mudança de aspecto:
“essa continuidade muda de asp
aspecto, de um momento a outro; mas por que nãoo constatamos
c
pura e
simplesmente que o conjunto mu
mudou, como se houvéssemos girado um caleidoscópio
pio?” (Bergson. MM,
p. 231).
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não sem ter aí perma
manecido, e se manifestará então em ação volu
oluntária” (MM, p.
38).
Ao descrever esses
ses diferentes tipos de ação, notamos quee o fenômeno do
movimento é um denomin
inador comum. Com efeito, “a experiência ddo movimento é
aquilo que nos dá acesso à totalidade continua e movente que caracteriz
eriza a matéria em
si mesma”.350 Vemos aquii uuma maneira de distinguir mais claramente es
espírito e matéria,
na medida em que a consciê
ciência é assimilada à ação e a matéria à totalid
lidade movente:
“A realid
lidade da matéria consiste na totalidade de seus elementos
ele
e de suas
ações de todo ti
tipo. Nossa representação da matéria é a medid
dida de nossa ação
possível sobre os corpos; ela resulta da eliminação daquilo que não interessa nossas
51
necessidades”.351
Neste ponto, cabe perguntar
pe
se existe alguma diferença no modo
do como Bergson
aplica os termos “ato” (l’ac
’act) e “ação” (l’action). No Ensaio, ele discute
ute o problema da
liberdade do ponto de vist
ista da “ação livre” e usa os dois termos dde maneira mais
imprecisa, como sinônimos
os, já que se trata de uma ação no sentido dee uuma conduta no
mundo, isto é, o momento
to em que o sujeito realiza um ato em consonâ
onância com a sua
duração. Mas à medida qque nos aprofundamos na análise de Maté
téria e memória,
notamos que cada um dess
esses termos assume um sentido próprio. Além
lém das diferentes
“ações” que acabamos dee elucidar, Bergson exprime noções mais es
especificas, como
“ato de tensão” e “ato de extensão”, que merecem um tratamentoo ddiferenciado, na
medida em que remetem aao “ato de inversão” da duração que cria a matéria. Nesse
sentido, a hipótese do quar
uarto capítulo de Matéria e memória pode se
ser formulada em
função da analogia da matér
téria com a nossa percepção e a nossa memória
ria:
“A matér
téria não será uma coisa, mas um ato e até mesm
smo um ato duplo,
extensão e tensã
são, análogo ao nosso espírito, à nossa memória
ria e à nossa vida,
distinguindo-se,
e, nno entanto, por uma diferença de grau”.352
Essas duas noções,
s, extensão e tensão, aparecem como uma gr
grande virada na
metafísica bergsoniana: a primeira
p
– extensão – porque indica que perc
erceber a matéria,
uma vez que esta é despojad
jada do substrato espacial e assimilada ao movi
ovimento, consiste
em perceber de uma só vez
ez uma totalidade indivisível e continua. A idéi
déia de tensão, por
sua vez, sugere que a matér
téria em si mesma depende de um ato, por míni
ínimo que seja, de
conservação temporal. Iss
Isso reforça a teoria do campo de imagens
ns, pois agora a
350
Worms, p. 123.
Bergson. MM, p. 35.
352
Worms, pp. 139-140.
351
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percepção nos faz reencont
ntrar não só a totalidade das imagens, senãoo ta
também o ato de
tensão pelo qual essa totalid
lidade se unifica, ato que não está em nosso es
espírito e sim nas
próprias coisas. Com efeito
eito, a percepção sensível é uma atividade rea
real na, ou antes,
sobre a matéria. Em lugarr de
d uma série de representações de “objetos”” nno espírito de um
“sujeito”, a percepção será
rá ffinalmente entendida como um reencontro:
“O reenc
encontro entre esses dois atos ou duas ativida
dades, uma tensão
temporal e intern
erna à matéria, de um lado, e do outro lado uma extensão
ex
material e
externa ao nosso
so espírito”.353
O dualismo tradicion
ional, baseado na tripla identificação matéria-eextensão-espaço,
será substituído por um ““dualismo intensivo interno à duração”354, que preferimos
chamar de dualidade, porqu
rque não é precisamente uma oposição radical
cal entre espírito e
matéria. Esta dualidade ex
exprime antes uma “distinção funcional” entr
ntre a ação (vida
corporal) e a vida do esp
spírito, representada pela memória naquiloo qque ela tem de
temporal”.355
III
Ora, se identificamo
mos, de um lado, movimento e ação à ativida
idade e, de outro,
percepção e matéria à pas
assividade, como é que Bergson rearticula a oposição entre
atividade e passividade? Te
Tendo em vista que ele trabalha o tempo todoo ppara dissolver as
oposições estanques da hist
istória da filosofia, terá também que balizar ess
esses pólos. Afinal
de contas, Bergson consegu
gue ou não dissolver a oposição entre atividade
de e passividade?
Tudo se passa como
mo se o esforço do filósofo no sentido de sup
uperar o dualismo
não fizesse outra coisa qu
que engendrar novas dualidades. Poderíamos
os mencionar, por
exemplo, a diferença entre
tre as duas espécies de memória ou a oposição
ção do passado ao
presente, mas, evidentemen
ente, nenhuma dessas diferenças e oposições
es constituem um
dualismo metafísico de sub
ubstâncias – como a separação radical entre es
espírito e matéria.
A filosofia de Bergson va
vai mostrar que a matéria não é pura passi
ssividade e que a
consciência não é pura ativ
tividade, na medida em que admite graus dee ppassividade e de
atividade que comportam,, por sua vez, graus de tensão. No lugar da uma separação
radical, Bergson reconhece
ce uma simples diferença pragmática ligadaa à ação do corpo,
56
uma “diferença de ação”.356
353
Ibid., p. 141.
Ibid., p. 136.
355
Ibid., p. 137.
356
Worms, p. 161.
354
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A diferença fundam
amental que explica todas as outras é que o passado puro é
inativo e impotente, porta
rtanto podemos falar de uma inconsciência que não é uma
inexistência, de uma virtua
tualidade que não é o contrário do atual ou do ativo e de um
passado que não se opõe ao
ao presente a não ser porque este último see ddefine pela vida.
Esta diferença de ação permitirá
per
ainda compreender o trabalho da me
memória. Como a
memória pura é inativa, é pr
preciso que um ato específico a traga à tona:
“Se a co
consciência não é mais que a marca característica
tica do presente, ou
seja, do atualmen
ente vivido, ou seja, enfim, do que age, então o qu
que não age poderá
deixar de pertenc
encer à consciência sem deixar necessariamente de existir de algum
modo”.357
Bibliografia
BERGSON, H. Matéria e mem
emória: ensaio sobre a relação do corpo com
m o espírito. São
Paulo: Martins Fontes, 2006
06.
__________. Ensaio sobre
re oos dados imediatos da consciência. Lisboa:: E
Edições 70,
1988. __________. O pensa
nsamento e o movente. São Paulo: Martins Font
ntes, 2006.
DELEUZE, G. Bergsonismo.. São Paulo: Ed. 34, 1999.
PRADO JÚNIOR, B. Presença
nça e campo transcendental: consciência e nega
egatividade na
filosofia de Bergson. São Pa
Paulo: Edusp, 1988.
WORMS, F. Bergson ou les
es ddeux sens de la vie. Paris: PUF, 2004.
357
Bergson. MM, p.165.
ISSN 2177-0417
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